terça-feira, 16 de março de 2010

Ilha do Medo


Em 1954, dois policiais desembarcam numa ilha sombria onde funciona uma prisão especial para doentes mentais. Eles vão investigar o desaparecimento de uma paciente que teria fugido e se escondido em algum lugar na própria ilha, de onde seria impossível ela ter escapado. Dirigido pelo mestre Martin Scorsese.

Scorsese é um dos únicos cineastas que ainda sabem confeccionar um filme como antigamente (não é saudosismo meu não; os filmes eram realmente melhores). Ele tem um domínio perfeito da linguagem visual, sabe como usar o som (a trilha lembra Bernard Herrmann e os filmes de Hitchcock), é ótimo diretor de atores e tem bom gosto estético. Nesse nível, o filme é uma aula de cinema. Mas hoje em dia já acho que de nada serve todo esse requinte artístico se você não tiver aprendido o principal, que é saber envolver o espectador, cativar a platéia. E nesse nível, o filme deixa muito a desejar.

O primeiro erro foi ter montado um trailer que dava a impressão ser de um filme de terror. Isso pode ter atraído mais público inicialmente (o filme já é o maior sucesso de bilheteria da carreira de Scorsese) mas frustra o espectador que vai esperando sustos e dá de cara com um drama psicológico pesado - isso pode acabar gerando um boca a boca negativo. No Brasil ainda pioraram a situação colocando a palavra "medo" no título (talvez pra fazer um paralelo com Cabo do Medo de Scorsese, este sim um suspense tradicional). Pra mim, a única tensão do filme foi minha luta contra o sono. O filme tem um ritmo lento e é constituído principalmente de diálogos.

Mas o grande problema de Ilha do Medo é que o final é extremamente previsível (não leia o resto se não quiser suspeitar de nada). Eu sou bem trouxa pra essas coisas e mesmo assim já tinha imaginado a conclusão da história quando vi o trailer. É algo que já foi usado demais, o público já aprendeu a considerar essas coisas. E não é uma reviravolta do tipo O Sexto Sentido, que mesmo sabendo do final o filme continua interessante - você fica até com vontade de assistir de novo pra pegar os detalhes. Não. Aqui, quando você sabe o final, todas as cenas evaporam. A investigação parece irrelevante, as cenas de ação perdem o sentido.

Imagino que a diferença esteja no personagem central. Não nos importamos realmente pelo personagem de DiCaprio. Ele é um policial, apenas um personagem vago de film-noir que serve mais para conduzir a trama (o filme já começa com ele chegando na ilha; não há introdução, não há interesse nenhum em sua vida pessoal). O que mantém a curiosidade do espectador neste filme é a trama - a gente continua olhado pra tela porque quer saber onde está a paciente desaparecida, como ela fugiu e o que está por trás disso tudo, como num livro da Agatha Christie. O drama pessoal do policial não é o interesse, o roteiro não buscou isso. Então o final acaba sendo traiçoeiro. É sério e elaborado o suficiente pra platéia sair respeitosa da sala, mas não é satisfatório.

DiCaprio é esforçado e faz um trabalho bastante técnico. Mas não sabe cativar, não tem nenhum magnetismo. Sabe ser profissional e habilidoso. Mas ele tem um daqueles rostos meio cafonas, sem sal (está ficando cada vez mais parecido com o Celso Portioli). Acho que ele e Scorsese deviam se levar menos a sério; tirar o peso do gênio das costas. Eles não deviam entrar no set pra fazer um clássico. Deviam entrar lá pra ter idéias estimulantes e emocionar o espectador de uma maneira nova.

Shutter Island (EUA, 2010, Martin Scorsese)

INDICADO PARA: Quem gostou de A Janela Secreta, 1408, ou pra quem gosta de direção de cinema. Amigos: Givago, Márcio L, Rafael V, Thiago P.

NOTA: 6.0

5 comentários:

Tiffany Noélli disse...

Toc Toc... Assisti o filme antes de ontem, e achei uma ótima produção... Discordo com você nessas coisinhas, rsrs

*O filme não é chato (Tem muito diálogo até, mas algo que me prendeu e ñ senti sono)

*Coitado do Leo di Caprio, mesmo meio gordinho, ainda acho ele um chame, e nunca cafona. Não é parecido com Celso Portiolli. Pode ser no branco do olho, rsrs)

*A parceria Scorsese e Leonardo Di Caprio sempre dá certo

*O final foi até batido, mas ñ tão óbvio.

O que eu concordo com você: Trailer parecia mesmo terror, e vemos que não é isso.

Beijosssss :p

Fabio Rockenbach disse...

Hmm...cara, reeduque seu olhar e a percepção. Amplie os horizontes da tua própria cultura cinematográfica.
A última coisa que Lehane e Scorsese buscaram foi surpreender alguém. Nos diálogos na balsa, nas primeiras falas, nas reações dos personagens e na maneira gradual como ele insere o próprio Teddy no sanatório ele já fala, desde os primeiros segundos, que não há surpresa alguma.
Interessa a jornada e não o fim.
O problema de Scorsese é fazer filmes superiores demais ao mau senso comum do espetáculo de consumo automatizado.
Como narrativa e como CINEMA, com letras maiúsculas, em termos narrativos e estéticos, é uma obra muito superior às que surgiram nos últimos anos.

Caio Amaral disse...

Oi Tiffany! Sua primeira discórdia se explica na última - como pra você o final não foi tão óbvio, o filme não foi tão chato, hehe. Mas a produção é lindíssima mesmo... Um show. Beijos!

Caio Amaral disse...

Olá Fabio, ouso dizer que não se trata de falta de percepção e cultura cinematográfica - pelo menos quando se trata de Scorsese. Passei meses nos EUA estudando sua carreira e vida pessoal - vi todos os seus filmes (inclusive os curtas da época em que estudou na NYU), e também conheço bem as referências e influências dele (reparou, por exemplo, que os closes nos pés do DiCaprio subindo a escada em espiral são uma homenagem direta a Os Sapatinhos Vermelhos?). Scorsese sempre fez filmes pra públicos menores, fato, mas também sempre invejou seus amigos Lucas e Spielberg que conseguiam ao mesmo tempo serem autorais e comerciais. Acho exatamente o contrário do que vc diz: de uns anos pra cá, com Gangues de NY, Aviador, Infiltrados e Ilha do Medo, ele está tentando descobrir esse lado pop que nunca teve (e certamente está ganhando mais dinheiro - Ilha do Medo é sua 2ª maior bilheteria até hoje). Enfim, acho ele um brilhante técnico e diretor de atores, mas nunca teve tanto jeito pra entretenimento. Abraços!

Anônimo disse...

Não assisti o trailer então não sabia o que esperar, pelo nome Ilha do Medo tb esperava um terror mas o nome foi perdendo a importancia ao longo do filme, que ficava cada vez mais psicotico.
A minha impressão antes do desfecho foi: ele era um cara que perdendo a familia começou a ter certos rumpantes de loucura.
Pensando um pouco discordo de tenha sido um filme media 6,0 não é 10 mas vai lá um 8.5... Acredito que Scorsese tenha feito um bom trabalho na custura das dicas que ele faz durante o filme onde o desfecho já está dito desde que caprio entra na ilha... e depois de dar tantas dicas tem de chegar ao obvio... olha o que voces não viram e estava na sua cara.


bom é isso... abs e parabens pelo trabalho
sdds