terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Enterrado Vivo


A pergunta que se faz aqui é: por que alguém iria querer entrar numa sala de cinema e acompanhar durante 1 hora e meia a agonia de um homem preso dentro de um caixão? Qual o propósito de um filme com este? Pra que serve o cinema? Fico imaginando extraterrestres descendo na Terra pra estudar o comportamento humano e se deparando com uma platéia desse filme. O que iriam imaginar? Você paga, entra numa sala escura, e acompanha a história de um outro ser humano como você numa das piores situações imagináveis. "Pra ver como ele escapa da situação com coragem, habilidade e inteligência?". Não, apenas pra ter a sensação de como seria estar naquela situação. As ações do personagem são apenas senso comum - não há nada de tão impressionante que ele faça que justifique a existência de um filme.

Alguns filmes como Mar Aberto ou Os Estranhos também mostravam vítimas agonizantes mas sob o pretexto de que aquilo havia "realmente acontecido". Ah claro, se a história é baseada em fatos reais, hoje em dia qualquer porcaria está justificada. Mas aqui nem essa desculpa se tem.

Geralmente a graça desses filmes que se passam em lugares pequenos (como Demônio) está no desafio do roteirista e do diretor desenvolverem uma trama complexa e envolvente com pouquíssimos elementos (o exemplo clássico disso seria 12 Homens e Uma Sentença de 1957). Mas acho que nunca houve um filme que se passasse num lugar TÃO apertado.

Até que o filme começa bem, num espírito meio Hitchcock, mas eventualmente tem que abandonar a lógica pra tornar as coisas mais interessante. Por exemplo: há um isqueiro que funciona por mais ou menos 1 hora aceso (o pior é que em vários momentos não há motivo algum pra ele estar ligado exceto para facilitar a vida do diretor de fotografia). Outra surpresa: enquanto na maioria dos suspenses os telefones celulares nunca funcionam quando se precisa deles, aqui é o oposto: a bateria não acaba, o sinal é ótimo e dá até pra postar vídeos na internet de dentro tumba.

De todas as coisas improváveis do filme (incluindo o tamanho do caixão que é bastante confortável, o ar que nunca acaba, o FBI que nunca consegue triangular o sinal do telefone) nenhuma supera a aparição de uma cobra de 1 metro e meio dentro da calça de Ryan Reynolds. Essa eu deixo pra vocês explicarem.

Manipulação é perdoável num filme despretensioso, que tem o intuito de entreter. Manipular a realidade pra trazer desconforto pra platéia é um sadismo muito difícil de justificar.

Enterrado Vivo
Buried (ESP/EUA/FRA, 2010, Rodrigo Cortés)

Orçamento: ?

Bilheteria atual: US$ 17 milhões

Nota do público (IMDb): 7.6

Nota da crítica (Metacritic): 6.5

Assista o
trailer

INDICAÇÃO: Quem gostou de Mar Aberto, Os Estranhos, da série Jogos Mortais, etc.

NOTA: 5.0

5 comentários:

renatocinema disse...

Estava animado....mas, depois de seu comentário desisto. Assistirei em dvd.

Nessa linha, um que eu gostei, apesar da "simplicidade" foi Por um Fio. Não é nenhuma obra-prima. porém, eu achei razoavelmente agradável.

Caio Amaral disse...

O público tem gostado muito.. Eu que destoei.. Por um Fio é interessante.. Mas é mais dinâmico; a câmera não fica lá dentro o tempo todo, há outros personagens, a cabine é de vidro; ou seja, dá pra ver um monte de coisa em volta, etc... Aqui é um close no Ryan Reynolds do começo ao fim..

Wesley Soalheiro disse...

Sinceramente achei seu comentário do filme muito fraco, a começar pela divagação sobre o fazer do filme. Filmes são como pinturas, não precisa-se de 'necessidade' para se fazer.
E dizer que o filme começa hitckcockiano e depois se perde por usar elementos não-verossimilhante é absurdo, pois esse é um dos maiores artificios do hitchcock, só ter um conhecimento médio da obra dele e um pouco de leitura que percebe-se isso.
Bom, era isso principalmente, quanto a gostar ou não do filme é muito pessoal, é realmente um filme difícil para a maioria. Mas é um filme muito interessante, e eu gostei.

Caio Amaral disse...

Eu escrevi: "Até que o filme começa bem, num espírito meio Hitchcock, mas eventualmente tem que abandonar a lógica" - o espírito Hitchcock na verdade foi só por causa da sequência de créditos, que dava a impressão de um suspense bem mais divertido do que o que veio em seguida. Não quis associar Hitchcock a verossimilhança - desculpe se confundi mais alguém.

Não precisa-se de 'necessidade' para se fazer um filme? Isso quer dizer o que? Que liberou geral? Que TODOS os filmes são igualmente válidos independente do conteúdo?

Caio Amaral disse...

Um detalhe importante: mesmo os mais inverossímeis filmes do Hitchcock - pegue "North by Northwest" por exemplo e a cena do monomotor - não chegavam ao nível óbvio de inverossimilhança de "Enterrado Vivo". Hitchcock tomava certas liberdades em algumas cenas pra tornar o filme mais interessante, mas não cometia 'erros' tão óbvios que até uma criança poderia apontar - nem baseava o filme TODO numa premissa já difícil de acreditar. E nem cometia o pior erro de todos (SPOILERS!!!) que é usar a técnica do suspense pra fazer você torcer pelo personagem - só pra no fim matá-lo. Ele cometeu esse erro apenas 1 vez na carreira - em Sabotage - e se arrependeu pelo resto da vida. E isso era apenas 1 cena do filme - aqui é o filme todo.