domingo, 27 de novembro de 2011

Contra o Tempo


Quando o filme começa estamos tão desorientados quanto Jake Gyllenhaal - ele acorda num trem mas não sabe como foi parar lá. Uma mulher (Michelle Monaghan) está no meio de uma conversa com ele, mas ele não sabe quem ela é. Quando ele se olha no espelho, ele vê o rosto de um estranho. Alguns minutos depois, uma bomba explode no trem, matando todo mundo.

Num momento meio Matrix, Jake acorda numa outra realidade, numa capsula estranha onde ele descobre que faz parte de uma missão secreta do governo cujo objetivo é impedir um grande ataque terrorista em Chicago (não tem como explicar a história sem alguns SPOILERS, mas isso o próprio trailer já revela).

O tal do trem havia sido o último ataque do terrorista, que planeja algo muito maior pra cidade. A missão de Jake é voltar no trem e tentar descobrir quem é o terrorista, pra que possam impedi-lo de realizar o novo ataque. O processo que leva Jake de volta à cena do trem é pura ficção-científica, embora seja quase um crime falar em "ciência" aqui.

Ele não volta no tempo - a realidade pra qual ele vai na verdade é apenas um "eco", um holograma criado a partir da memória de uma das vítimas (ou de várias vítimas, não sei ao certo). Dizem que o cérebro humano tem uma memória a curto prazo que deixa registrado tudo o que aconteceu nos últimos 8 minutos, e que isso pode ser recuperado mesmo depois que a pessoa morreu!

Então, pelo que entendi, o governo pegou cérebros de vítimas do trem, "baixou" esses 8 minutos que antecederam a explosão (como se fossem fitas de segurança), e plugou a mente de Jake nessas memórias pra tentar achar o terrorista. Ele pode voltar quantas vezes for preciso, mas em cada vez só tem os 8 minutos pra vasculhar o trem (a mesma cena do trem se repete dezenas de vezes, no estilo de Feitiço do Tempo).

A pergunta que não quer calar: se Jake não volta de fato no tempo, ou seja, se ele só está no fundo analisando as memórias das vítimas (assistindo "fitas de segurança"), como é que ele pode interagir com o ambiente - conversar com as pessoas no trem, se meter em brigas, criar novos acontecimentos, e inclusive encontrar a bomba, algo que nenhuma vítima viu e portanto não poderia estar na memória de ninguém?!

A premissa do filme é tão bagunçada e sem sentido que impede todo o aproveitamento da história. Como vou me importar pelo romance que desperta entre ele e a mocinha se eu não sei se ela é real ou se é apenas um holograma? E por que vou me importar pela missão ou por qualquer coisa, se nem o protagonista sabe direito o que está fazendo ali ou mesmo se está ali? (Há algo de platônico no filme - a ideia de que a realidade é subjetiva; que a consciência cria o mundo externo, e que nossa experiência não tem uma conexão necessária com os fatos - e que isso por algum motivo é "poético".)

Em algum lugar desse roteiro existia a promessa de um filme inteligente e ousado, mas assim como em muitos filmes recentes do gênero, a promessa vai por água abaixo por falta de clareza, lógica, e uma pretensão intelectual que o filme não consegue sustentar (pra mim, esses filmes todos querem ser o novo Matrix, que deve ser o filme mais imitado dos últimos 15 anos).

Source Code (EUA, FRA / 2011 / 93 min / Duncan Jones)

INDICAÇÃO: Quem gostou de A Origem, O Preço do Amanhã, Agentes do Destino, Efeito Borboleta, Tempo Esgotado.

NOTA: 4.5

domingo, 20 de novembro de 2011

A Saga Crepúsculo: Amanhecer - Parte 1


O que as pessoas costumam ridicularizar nessa saga é justamente a única coisa que eu gosto: a tentativa de retratar uma paixão intensa, pura, idealizada, como nos filmes de antigamente. É por causa disso que eu tenho um mínimo de simpatia pela série e vou sempre ver os filmes com boa vontade. Mas toda vez é a mesma frustração - embora a intenção seja boa, o romance é ilustrado de forma tão superficial, o roteiro é tão vazio, o filme é tão ruim em todos os outros sentidos, que no fim acabo perdendo a boa vontade inicial.

Esse pra mim foi um dos mais chatos, pois nos outros ainda havia a dúvida de Bella, que não sabia se ficava com Jacob ou Edward. Nesse ela já escolheu Edward, eliminando o único conflito que tornava a história envolvente.

Sem um conflito, o filme fica apenas com um problema físico, como num filme de ação - Bella está grávida de Edward e corre risco vida, pois seu corpo pode ser incompatível com o feto. O problema é que uma gravidez perigosa não é um evento muito cinematográfico e não gera ação pra preencher o filme (voar com a câmera por dentro da corrente sanguínea de Bella é uma tentativa patética de tornar a gravidez algo mais interessante de assistir).

Pra piorar o filme é cheio de cenas ridículas, como a imagem da cama destruída após a primeira cena de sexo (se Edward fez aquilo com a cama a gente fica imaginando como ficou a "periquita" da menina na manhã seguinte), todas as cenas que envolvem lobos discutindo com vozes humanas, ou então Bella bebendo sangue de canudinho, que é simplesmente nojento.

Assim como no último Harry Potter, é óbvio que a divisão do filme em 2 partes é apenas uma estratégia pra faturar o dobro da bilheteria. Tão pouco acontece no filme que, pensando agora, fica até difícil de entender como é que eles preencheram as 2 horas de projeção.

The Twilight Saga: Breaking Dawn - Part 1 (EUA / 2011 / 117 min / Bill Condon)

INDICAÇÃO: Desnecessária.

NOTA: 4.0

domingo, 6 de novembro de 2011

O Palhaço


Remetendo a A Estrada da Vida de Federico Fellini, o filme foi co-escrito, dirigido e estrelado por Selton Mello e mostra uma trupe de circo que viaja por cidadezinhas do interior de Minas Gerais apresentando números (infelizmente) muito sem graça, tanto pra plateia do circo quanto pra plateia do cinema.

No centro do filme está o palhaço Benjamim (Selton), que parece estar passando por uma crise existencial - questionando se "nasceu" mesmo pra ser um palhaço ou se deveria explorar outros talentos. Mas na verdade esse conflito só fica explícito após 1 hora de filme - não é correto dizer que o filme é sobre isso ou sobre qualquer outra coisa, até porque tudo é resolvido de maneira muito casual. O filme é basicamente um retrato naturalista da rotina dessa trupe; não chega a ter um arco dramático, uma história, personagens bem desenvolvidos... A característica do filme naturalista é justamente não ter enredo (que pra mim é um elemento indispensável do cinema, por isso não gosto muito desse tipo de filme).

É um filme mais "contemplativo". Geralmente quem gosta de filmes assim costuma dizer que achou o filme "poético", sem saber definir bem o que é isso. Esse conteúdo vem muito mais das emoções do público do que do filme em si; o filme serve mais como uma base pra essas divagações pessoais da plateia, que vai preenchendo as lacunas por conta própria (os closes nos ventiladores, por exemplo, são exemplos desses vazios que o espectador pode confundir com conteúdo). Eu não colaboro dessa forma com os filmes que assisto.

O Palhaço (BRA / 2011 / 90 min / Selton Mello)

INDICAÇÃO: Quem gostou de Cinema, Aspirinas e Urubus, Viagem a Darjeeling, A Estrada da Vida (embora todos esses sejam mais interessantes).

NOTA: 4.0

sábado, 5 de novembro de 2011

O Preço do Amanhã

Imagine o seguinte contexto: no futuro, as pessoas só envelhecem até os 25 anos de idade; após isso, elas precisam trabalhar pra ganhar seu tempo de vida na Terra. Ou seja, o dinheiro foi substituído por "tempo" e as pessoas andam por aí com um painel no braço indicando quanto tempo ($) elas ainda têm de vida. Se o relógio atingir o zero, elas morrem instantaneamente; se elas trabalharem e ganharem mais, poderão até se tornar imortais (um dos furos do roteiro é que ele tenta passar a ideia de que apenas os ricos podem ser imortais; mas, se você seguir a lógica, verá que bastaria alguém acumular 1 minuto por dia pra se tornar imortal; a diferença dos ricos é que eles têm séculos de estoque, mas um pobre também poderia ser imortal, desde que ganhasse mais do que consome). Quem inventaria uma sociedade impossível (e nada prática) como essa? A população aceitou viver assim? Por que não está todo mundo revoltado nas ruas exigindo a remoção do tal dispositivo (ou pelo menos tentando fazer isso clandestinamente)? O mundo inteiro vive dentro desse sistema? O governo cobra impostos? As pessoas não podem ir morar num outro país? Não sabemos. O vilão óbvio numa trama como essa é o governo. O conflito principal aqui é entre o homem e o sistema estatista, que roubou a liberdade do cidadão quando instalou uma bomba relógio no corpo dele. Mas estranhamente, o filme não questiona o sistema - ele vira um ataque contra os ricos! Sim, é tudo um grito de ódio contra aqueles que têm mais - não porque eles roubaram os pobres ou porque ficaram ricos ilegalmente, mas simplesmente pelo fato deles terem mais. Quem criou essa situação toda foi o estado - o governo é o vilão, não o rico. A "crítica" ao capitalismo e às classes altas que o filme faz é burra e contraditória, afinal o capitalismo é um sistema baseado em princípios como liberdade e direito à propriedade. Eles deviam estar lutando pelo capitalismo, não contra ele. Lutar pela liberdade E pelo direito de assaltar os outros é uma contradição absurda (isso me irrita nesse caso pois o filme é pretensioso intelectualmente e leva a sério suas ideias, não se trata de uma aventura tipo Robin Hood - O Príncipe dos Ladrões, que parte dos mesmos princípios mas não chega a ser ideológico). O filme te pergunta: e se no futuro você fosse imortal? E se no lugar de dinheiro as pessoas trocassem tempo? E se você não pudesse guardar suas economias num banco ou num lugar seguro, mas andasse com tudo à vista pra qualquer um tomar de você num simples aperto de mão? E se o tempo fosse um recurso limitado no mundo e controlado por poucos, de forma que pra uns terem mais, outros precisassem ter menos? E se você tivesse um mecanismo instalado no seu corpo que pudesse te matar? E se você fosse acusado de um crime que não cometeu e não houvesse justiça? Após tantos "e se" que não têm nenhuma relação com a realidade, como é que um filme pode querer fazer parábolas ou críticas a qualquer coisa? (Esse é o mesmo problema de Ensaio Sobre a Cegueira.) Em termos de ideias, é um dos filmes mais confusos e imorais que eu já vi. Nem num nível de "distração" ele funciona muito bem, afinal o casal não tem química e a ação não empolga (há o assalto a banco mais sem graça da história do cinema, além da péssima disputa de "queda de braço" onde Justin Timberlake demonstra uma técnica tão insana que só deve ter lógica na mente desse roteirista - alguém capaz de ter bolado o resto do filme). Aliás, o diretor/roteirista é Andrew Niccol, o mesmo de S1m0ne, Gattaca e do bem superior O Show de Truman (esse último ele só escreveu mas não dirigiu). In Time (EUA / 2011 / 109 min / Andrew Niccol)

Pra quem gostou de: Agentes do Destino, Distrito 9, Filhos da Esperança, Ensaio Sobre a Cegueira, etc.

NOTA: 3.0