sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Trumbo - Lista Negra

NOTAS DA SESSÃO:

- Boa a produção, reconstituição de época, elenco. Bryan Cranston está ótimo e Helen Mirren também.

- Um absurdo o filme retratar um comunista de maneira positiva e fazer a oposição parecer um bando de gente alienada e antipática. Mais surreal é Trumbo explicando pra filha pequena que ser comunista significa você querer dividir o seu sanduíche com alguém que está passando fome (!!!). Óbvio que não: é você querer tirar o sanduíche do seu vizinho à força pra dar pro outro que não tem (ou sob esse pretexto pelo menos).

- O filme critica Hollywood por temer a infiltração comunista na indústria, como se isso fosse apenas paranoia, mas eles tinham mais é que temer mesmo. A influência de Hollywood na cultura é incalculável.

- Do jeito que a história está sendo contada, dá a impressão que o personagem comunista está lutando pela liberdade (seu direito de trabalhar, de se expressar), e que as pessoas defendem a liberdade estão tentando impedi-lo através da força! Ou seja, é quase uma piada. Se aceitarmos esse contexto, daí é possível torcer por Trumbo, simpatizar por ele, pois ele quer apenas trabalhar honestamente sem ser punido pelo governo por causa de suas crenças. Porém até onde eu conheço a história, o governo não impediu nenhum comunista de trabalhar na época. Eram os estúdios que não iriam contratar comunistas assumidos por causa da opinião pública. Mas daí tudo bem - os estúdios tinham todo o direito de fazer isso.

- De qualquer forma, o filme é muito bem feito, cheio de conflitos interessantes... Ele foca muito pouco na parte ideológica - parece apenas querer contar uma história verídica impressionante. É muito legal ver o processo criativo de Trumbo, ele tendo que se passar por outras pessoas pra poder trabalhar, ganhando prêmios secretamente... É uma ótima história. Pra quem é fã de cinema então, é incrível ver todos esses bastidores, a interação entre as celebridades da época, etc.

- Apesar da história ser sobre um comunista, o filme no fundo é o oposto: celebra Hollywood, o talento individual, mostra Trumbo se tornando bem sucedido na carreira e lutando por reconhecimento. Chega a ser cômico - filmes hollywoodianos de super-heróis, animações da Disney (que tradicionalmente celebram valores americanos) estão cada vez mais coletivistas. E agora vem um filme sobre um comunista que no fundo celebra individualismo, livre concorrência, a busca da felicidade (!).

- SPOILER: Bonita a sequência quando estréia Spartacus e ele finalmente recebe o crédito de roteirista, quebrando com a lista negra.

CONCLUSÃO: Muito contraditório politicamente, mas é um filme bem feito, com ótimos atores, uma história envolvente, e mostra um dos períodos mais interessantes da história de Hollywood.

Trumbo / EUA / 2015 / Jay Roach

FILMES PARECIDOS: Capote / Verdade Nua / O Aviador / Chaplin

NOTA: 7.5

Shaun: O Carneiro

NOTAS DA SESSÃO:

- Shaun não tem uma personalidade definida, gostável. Os personagens são inexpressivos - a ausência de diálogos também não ajuda e deixa tudo com uma cara meio amadora.

- A história é muito fraca - não faz o menor sentido o fazendeiro ir parar na cidade acidentalmente dentro do trailer, e nem os carneiros irem atrás dele pra trazê-lo de volta (até onde sabemos, os carneiros odiavam o "chefe" e deviam estar alegres de se verem livres dele por uns tempos). Não há nenhum drama ou interesse na missão dos personagens. É uma historia apenas "fofinha" e despretensiosa tipo um episódio da Peppa Pig ou algo do tipo (só que menos divertida).

- Humor sem graça, sem ousadia, surpresa, e cheio de clichês (os carneiros "congelados" pra fingirem que são da imagem do painel; eles amontoados vestidos com roupas de gente, etc.).

- Herói Envergonhado. O Shaun não tem o menor destaque na história. Mal sabemos quem é ele. O filme devia se chamar "Os Carneiros" e enfatizar o grupo, e não Shaun.

- Por que os carneiros vão comer num restaurante chique? Por que o fazendeiro entra num cabeleireiro (e se torna famoso)? O roteiro não se esforça nem um pouco pra ser inteligente. É feito pra crianças pequenas sem senso crítico. Se ao menos fosse hilário daria pra perdoar.

- Péssima a "reviravolta" em que o fazendeiro joga o papel amassado pela janela e ele cai justamente na fogueira dos carneiros, revelando que ele tinha perdido a memória. A sequência do cavalo mecânico também é um absurdo. É uma ideia fraca após a outra.

- Toda essa aventura pra resgatar o fazendeiro e daí voltar pra rotina chata que os carneiros tanto detestavam no começo do filme!

CONCLUSÃO: Animação fraquíssima que não merecia a indicação ao Oscar nem pela parte técnica.

Shaun the Sheep Movie / Reino Unido, França / 2015 / Mark Burton, Richard Starzak]

FILMES PARECIDOS: Os Boxtrolls / Frankenweenie / Wallace & Gromit - A Batalha dos Vegetais

NOTA: 3.0

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Boi Neon

NOTAS DA SESSÃO:

- A produção é simples mas o visual é muito bem cuidado! Boa fotografia, direção de arte, etc. Interessante essa mistura de elementos "rústicos" (curral, bois) com moda, estilo, etc. O título é bem apropriado.

- Naturalismo. Não há história - é um retrato monótono de determinadas pessoas vivendo num determinado lugar. Só não é um tédio completo por causa das imagens interessantes.

- Juliano Cazarré é bom ator, convence totalmente como vaqueiro, e o personagem dele é gostável - não porque ele tenha algo de especial, mas ele é trabalhador, humilde, não há muito o que não gostar. Ainda assim, é uma caracterização meio vazia. Muitos filmes nacionais têm esse mesmo tipo de protagonista humilde, sem muita cultura, que não abre muito a boca mas é fisicamente atraente.

- Outro padrão no cinema nacional é fazer filmes Naturalistas com roteiros parados, pouco comerciais, mas que têm algumas cenas de sexo subversivas, atores globais sem roupa (Praia do Futuro, Sangue Azul, etc), que geram certa publicidade. Pelo menos esse não tem um tom negativo, não apela pra violência e coisas desagradáveis, etc.

- O filme pretende quebrar com a visão que temos do nordeste, de vaqueiros (mostrando que vaqueiros fazem chapinha, se interessam por moda), mas isso não está integrado em uma boa história. O cineasta apenas usa o cinema pra fazer um comentário social vago, e seu "comentário" pra ele justifica todo o filme.

- SPOILER: Bizarra a masturbação do cavalo, a mulher se depilando no caminhão, o sexo com a grávida. Pelo menos algumas coisas assim acontecem de vez em quando pra "acordar" a plateia.

- O filme termina do nada, no meio de uma cena qualquer, sem o menor propósito e senso de conclusão.

CONCLUSÃO: Visualmente bem cuidado e com algumas cenas divertidas, mas extremamente Naturalista, o que torna a experiência insatisfatória e vazia intelectualmente.

Boi Neon / Brasil, Holanda, Uruguai / 2016 / Gabriel Mascaro

FILMES PARECIDOS: Ausência / Sangue Azul / Praia do Futuro / Shame / À Deriva

NOTA: 4.0

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Anomalisa

NOTAS DA SESSÃO:

- Demais o começo com a tela preta e só o som das vozes. Transmite de maneira interessante o sentimento de alienação do personagem.

- Muito diferente e bem feita a técnica de animação.

- Incrível a ideia de todas as pessoas terem o mesmo rosto, exceto o protagonista. É outra forma interessante e original de mostrar como ele se sente entediado com sua rotina e desconectado de todo mundo (as interações dele com o taxista, os funcionários do hotel, com a esposa, também são divertidas de tão enfadonhas).

- Estranho a Lisa ter uma voz diferente, olhos castanhos, mas ainda ter um rosto bem parecido com o de todo mundo. Sem falar que ela não é nada atraente: é burra, desinteressante... Ou seja, não é que o Michael encontrou a mulher de sua vida. É que as outras pessoas são tão entediantes que, quando ele viu qualquer detalhe surpreendente em alguém, já achou que estava apaixonado!

- Ele quer beijar a cicatriz da menina? Michael parece estar ficando com Lisa por pena, por um ato de altruísmo, não por amor. O que ele acha "extraordinário" nela parece ser justamente o fato dela não ter nada de extraordinário e ser absolutamente comum. São meio suspeitas as noções de amor do filme.

- SPOILER: A cena de sexo é uma das mais estranhas que já vi! É uma cena feia, mas tenho que aplaudir pela ousadia e até pela sensibilidade (apesar de ser uma animação, foi uma das mais realistas que já vi).

- SPOILER: Genial que quando eles "oficializam" a relação, Michael subitamente começa a enxergar todos os defeitos nela. A ideia da voz e do rosto da personagem se transformando é incrível. O filme acaba se redimindo, pois mostra que não estava elogiando o romance entre ele e Lisa... Estava apenas retratando algo que não teria futuro. A atração que Michael sentiu por ela foi altamente subjetiva, irracional, não era uma base sólida pra um relacionamento, então faz sentido esse desfecho.

- Horrível a palestra que ela dá. Não dá pra saber se o filme quer mostrar apenas o personagem como um fracassado, ou se ele está também tirando um sarro do mundo corporativo, do sucesso, etc. O filme é bom mas certamente perde uns pontos em termos de Senso de Vida.

- Fantástico no final podermos ver Lisa e a amiga como elas realmente são, sem ser pelo ponto de vista de Michael - e a amiga de Lisa ter um rosto totalmente diferente do que vimos antes.

CONCLUSÃO: Apesar de alguns valores suspeitos, é um retrato altamente original, criativo e inteligente um homem frustrado.

Anomalisa / EUA / 2015 / Duke Johnson, Charlie Kaufman

FILMES PARECIDOS: Birdman / Ninfomaníaca / Ela / Adaptação

NOTA: 8.0

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Joy: O Nome do Sucesso


(Esta crítica está no formato de anotações - em vez de uma crítica convencional, os comentários a seguir foram baseados nas notas que fiz durante a sessão - um método que adotei para passar minhas impressões de forma mais objetiva.)

ANOTAÇÕES:

- A vida da Joy é horrível, mas pelo menos é retratada de uma maneira cômica, caricata, e não deprimente.

- Jennifer Lawrence não está fazendo nada de novo como atriz, mas está bem e se encaixa perfeitamente no papel. Lembra a Julia Roberts em Erin Brockovich.

- Gosto da ideia de um filme sobre uma inventora, uma mulher comum que cria um produto e se torna um sucesso. Porém o filme dá uma ênfase muito maior para os problemas do dia a dia da protagonista do que pro lado criativo dela. A mensagem que chega pro espectador acaba sendo muito mais "a vida é dura" do que "siga os seus sonhos". Até pelo fato da invenção dela ser retratada de maneira meio banal, apenas um utensílio doméstico, e não algo inovador, algo que represente uma paixão pra personagem.

- Engraçada a cena no estacionamento do K-Mart em que a Joy finge ser uma cliente e testa o esfregão na frente dos outros.

- A cena em que ela pega o rifle e começa a atirar pra "descarregar" o ódio resume bem o tom do filme. Não é um filme com um Senso de Vida positivo como Edison, O Mago da Luz (sobre a vida de Thomas Edison) que era uma história inspiradora e uma celebração da mente de um grande inventor. Joy é muito mais um filme sobre uma mãe solteira, feito pra pessoas comuns se identificarem com ela e pensarem "minha vida também é assim", e poderem rir um pouco da própria desgraça.

- SPOILER: Legal ela aparecer na TV pra vender o esfregão. A cena da apresentação dela é ótima. Um pouco manipulativa (Joy nunca ficaria "congelada" por tanto tempo, quase arruinando tudo). Mas depois que ela se solta o filme consegue criar um bom clímax.

- O problema é que depois dessa cena cai um pouco o interesse pela história. O clímax veio cedo demais. O produto já se provou um sucesso - daqui pra frente são apenas questões burocráticas, negócios, etc. E as pessoas são tão corruptas e o sistema tão difícil que o filme faz você questionar se vale a pena todo esse esforço.

- Embora o filme tente criar um final feliz, no fim (quando Joy está em seu escritório como uma empresária de sucesso), ela parece uma mulher exausta, cínica. O processo de se tornar bem sucedida tirou todo o brilho e a energia que ela tinha no olhar.

CONCLUSÃO: Um bom filme sobre negócios com uma boa performance de Lawrence, embora a história não seja das mais empolgantes e o filme acabe mais assustando do que inspirando novos empreendedores.

Joy / EUA / 2015 / David O. Russell

FILMES PARECIDOS: Whiplash: Em Busca da Perfeição / O Lado Bom da Vida / Erin Brockovich: Uma Mulher de Talento / Jerry Maguire: A Grande Virada

NOTA: 6.5

Reza a Lenda

NOTAS DA SESSÃO:

- Pra uma produção nacional, o visual é interessante, diferente, foge do naturalismo... Mas é inevitável a comparação com Mad Max e outros filmes maiores, e isso prejudica o filme. As cenas de ação são poucas e mal feitas. Mesmo o primeiro Mad Max que tinha um roteiro simples e um orçamento pequeno, funcionava porque a ação era incrível.

- Os personagens são distantes e mal apresentados. Não dá pra se identificar com ninguém. Não sabemos quem são essas pessoas e o que elas querem.

- A história também é fraca e mal contada. Não dá pra se envolver com a trama da santa que é roubada, etc. Se ela de fato tivesse poderes (tipo os artefatos dos Indiana Jones) talvez fosse mais interessante a caçada. Mas pra plateia ela é apenas uma santa comum como qualquer outra. Não gera um conflito muito dramático.

- Não gosto da narrativa fragmentada, dos saltos no tempo, etc. Contar uma história fraca de maneira não-linear não a torna mais interessante. O filme parece só um exercício de estilo, feito por causa da aparência, não porque a história é minimamente interessante. Teria sido melhor um videoclipe ou um comercial.

- Por que os protagonistas precisam tanto que chova? Eles trabalham com agricultura ou algo do tipo? Não podem mudar pra uma região menos miserável? Não se trata de um deserto inescapável como em Mad Max. E eles não são pessoas tão pobres e frágeis que não têm a opção de fugir daí.

CONCLUSÃO: História chata e vazia que parece ter sido contada apenas por causa do visual - que é interessante pros padrões nacionais, mas soa pobre quando comparado com as produções de Hollywood.

Reza a Lenda / Brasil / 2016 / Homero Olivetto

FILMES PARECIDOS: 2 Coelhos / Casa de Areia

NOTA: 3.0

sábado, 23 de janeiro de 2016

Creed: Nascido para Lutar

NOTAS DA SESSÃO:

- Chocante a cena inicial com as crianças no "presídio" (existe isso?!). Bonito a senhora revelando quem ela é pro garoto e chamando ele pra ir morar com ela.

- Bom o ator que faz o Creed (Michael B. Jordan) - passa um senso de dignidade, responsabilidade... Interessante ver um personagem negro que cresceu numa mansão, numa família super privilegiada... Incomum no cinema.

- Filme muito bem dirigido, produzido, com bom elenco, fotografia, etc.

- Meio batido isso do Stallone ficar relutante, não querer a princípio treinar o garoto... quando sabemos que no fim ele vai topar. Mas os dois têm química e formam uma relação positiva de respeito mútuo, quase de pai e filho. 

- Filmes de esporte sempre sofrem um pouco com o excesso de clichês e convenções: a apresentação do adversário "imbatível" (que além de ser mais forte é mau caráter), as cenas de treinamento, o romance paralelo que não serve pra muita coisa, etc. Mas os personagens aqui têm vida e isso mantém a história interessante.

- Como eu não sou fã de boxe acho meio difícil de me identificar com o sonho dele de lutar. Ainda mais quando ele não precisa disso pra viver, pois já é rico. Normalmente nos filmes o cara luta porque é pobre e não tem outra escolha. Além disso, em geral o protagonista tem alguma grande desvantagem. Aqui o Creed já é muito bom lutador. Só precisa se esforçar um pouco mais pra ficar entre os melhores do mundo. Então não há tanto aquele elemento inspirador de quando o underdog se supera. Mas por outro lado, o fato do Adonis já ser privilegiado, filho do Creed, cria um conflito diferente e curioso pra história: as pessoas acabam não acreditando nele, não por ele ser fraco, mas por ele parecer apenas um herdeiro pretensioso tentando se aproveitar da fama do pai, mas sem o mesmo talento. Acaba sendo um "underdog" de uma maneira inesperada, e torcemos por ele.

- Primeira luta de Creed muito bem feita, filmada aparentemente sem cortes! Como fizeram isso?!

- SPOILER: Stallone está ótimo! Bons momentos quando ele recebe a notícia de que está doente, e depois nos diálogos tensos entre ele e o Creed. Caiu uma lágrima na discussão entre os dois na prisão!! Amizade bonita entre os dois... Creed convencendo Rocky a seguir com o tratamento, etc ("Você luta, eu luto").

- Eles tentam repetir o momento da escadaria de Rocky: Um Lutador, mas não fica tão empolgante com Creed. Ele está numa posição bem diferente da de Rocky no primeiro filme.

- A luta final é impecável! Muito envolvente, bem dirigida... A cena do Creed caindo em câmera leta é fantástica (quando achamos que ele foi nocauteado). O olho dele inchado torna tudo mais tenso de assistir. 

- SPOILER: Meio chato isso dele "perder mas ganhar". Ainda assim, é emocionante o público gritando o nome dele no fim, etc. Acaba conseguindo criar uma sensação real de vitória. 

- SPOILER: Bonito o desfecho com os dois subindo a escadaria, vitoriosos. A trilha sonora é muito boa também. Várias pessoas saíram do cinema assobiando o tema principal.

CONCLUSÃO: Filme de esporte convencional mas muito bem realizado, bom boas performances de Stallone e Michael B. Jordan. Apesar dos clichês inevitáveis, consegue envolver e emocionar. 

FILMES PARECIDOS: O Homem que Mudou o Jogo / Rocky Balboa / Menina de Ouro / Seabiscuit - Alma de Herói / Karatê Kid - A Hora da Verdade

NOTA: 7.5

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

The Room

Um dos leitores do blog me pediu pra assistir e comentar esse filme, então aí vai! (contém SPOILERS).

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Filme de 2003 (escrito, dirigido, produzido e estrelado por Tommy Wiseau) que ganhou status de cult por ser considerado um dos piores de todos os tempos. O drama de baixo orçamento se passa quase todo em uma casa e conta a história Johnny (Tommy Wiseau), que é traído por sua noiva e seu melhor amigo - Lisa e Mark - que começam a ter um caso pelas costas dele. É um dos filmes mais geniais (não-intencionalmente) que eu vi nos últimos tempos.

A produção realmente é uma das coisas mais estranhas já feitas num nível profissional (muitos pornôs são melhores em termos de interpretação, diálogos, direção de arte, fotografia).

Se o filme fosse pretensioso e tivesse tentando se passar por uma superprodução, ou se Wiseau tivesse tentando usar The Room pra se lançar como astro de Hollywood, realmente a ruindade imbatível da produção tornaria o filme patético e digno de riso. Mas a natureza do filme acaba tornando a inadequação de Wiseau (como cineasta, roteirista e ator) algo fascinante e que comunica o tema de rejeição da história de uma maneira extremamente dramática.

Sobre o que é a história no fundo? É sobre um cara que, apesar de ter um bom coração, ser bem sucedido no trabalho e querido por alguns amigos, acaba sendo rejeitado pelas pessoas que mais ama por causa de sua aparência estranha e inadequação social. Lisa e Mark são atraentes, simpáticos, e representam o mundo das pessoas ajustadas e normais que ele tanto admira e no qual tenta se inserir. E a história basicamente é sobre Johnny sendo expulso desse mundo - sendo traído por sua noiva e melhor amigo, e tendo que encarar a sua realidade (o que o leva ao suicídio).

Obviamente é um filme autobiográfico e Johnny é o próprio Wiseau, que certamente sofreu muito na vida por ser como ele é. O filme acaba tendo um tom de sessão de terapia - um artista se expondo da maneira mais íntima e vulnerável possível (achei até apropriada a cena do traseiro de Wiseau!).

Pela maneira dele atuar, de se vestir, e só de ver o filme surreal que ele fez, fica óbvio que Wiseau na vida real também é uma pessoa sem muita sensibilidade intrapessoal/interpessoal - alguém que não se enxerga objetivamente, que não tem noção de suas qualidades, talentos, limitações e da impressão que causa nos outros - algo que certamente deve ter gerado bastante sofrimento em sua vida e uma série de rejeições dolorosas.

O triste de tudo isso é que Wiseau provavelmente fez o filme pensando que estava dando a volta por cima, se vingando dessas pessoas que o magoaram na vida real, ao realizar uma grande obra-prima onde ele é o mocinho que expõe a crueldade e insensibilidade dos vilões. O resultado foi que, em vez dessa volta por cima, o filme só serviu pra confirmar de uma vez por todas a bizarrice de Wiseau, o tornando uma pessoa ridícula não apenas para os seus conhecidos, mas para o mundo inteiro. Ao lançar The Room, Wiseau iria viver em sua carreira artística a mesma experiência de rejeição que viveu em sua vida pessoal - ele é rejeitado pelo público assim como Johnny foi rejeitado por Lisa e Mark, tendo que lidar agora com a realidade de que ele é um "weirdo". Me surpreende que Wiseau, após o lançamento de The Room, não tenha tido o mesmo destino de Johnny no filme.

Me identifiquei muito com o filme pois eu desde criança vivi esse drama de Wiseau - sempre me sentindo um alien, alguém que não se enquadra em nenhum grupo, mas tentando conviver harmoniosamente num mundo de pessoas normais. Na verdade meu conflito era diferente, pois apesar de eu me sentir por dentro um "Johnny", externamente eu sempre pude me passar por um "Mark". Então eu tenho dentro de mim 2 identidades incompatíveis que vivem brigando entre si - uma tentando dominar a outra sem sucesso. E socialmente não funciona: quando eu assumo o Johnny, eu sou abandonado pelos "Marks" do mundo, que sentem que eu não sou como eles, mas também sou rejeitado pelos "Johnnys" por não ser um Johnny autêntico o bastante. E quando eu assumo o Mark, eu sou abandonado pelos "Johnnys", que sentem que eu não sou como eles, mas também sou rejeitado pelos "Marks" por não ser um Mark autêntico o bastante. E tudo isso parece gerar certa suspeita e intriga ao meu respeito. Já cheguei a uma solução pro problema? Não. Enquanto isso, vou produzindo meus "The Rooms" pessoais e tentando não me chocar demais com a reação dos outros, rs.

The Room / EUA / 2003 / Tommy Wiseau

FILMES PARECIDOS: Mamãezinha Querida / The Apple / Orca: A Baleia Assassina

NOTA: 7.5

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Steve Jobs

Retrato muito bem feito da personalidade e do gênio de Steve Jobs. Em vez de um filme biográfico contanto toda sua trajetória (o que o filme com o Ashton Kutcher já fez), o filme foca em 3 dos momentos mais importantes de sua carreira (e de sua vida, afinal as 2 coisas eram 1 só), quando ele estava prestes a apresentar para o mundo o Macintosh, o computador NeXT e o iMac. E durante esses lançamentos, temos um retrato vívido de quem era Jobs, como ele se relacionava com as pessoas, quais eram suas virtudes, defeitos, conflitos pessoais, etc.

Normalmente não gosto de filmes onde todo o foco é na caracterização, no estudo de personagem - prefiro histórias que além de boas caracterizações têm tramas envolventes, etc. Mas se você vai fazer um filme que é um estudo de personagem, Steve Jobs como figura é uma das pessoas mais interessantes, e qualquer espectador com alguma ambição e interesse em saber como funciona a mente de um visionário (e que não tenha nenhum ressentimento contra pessoas de sucesso) achará o filme interessante de assistir, apesar de não haver uma narrativa cheia de suspense, etc. E além do ótimo tema, tudo é muito bem realizado: Michael Fassbender está impecável e tem uma ótima química com a Kate Winslet. Os diálogos são provavelmente os melhores que vi esse ano, cheios de frases inteligentes, ricas psicologicamente, algumas dignas de pausar e anotar num caderno (o roteiro foi adaptado de um livro pelo Aaron Sorkin, que escreveu a peça e o filme Questão de Honra e ganhou o Oscar por A Rede Social). 

O filme mostra o lado genial e também as limitações de Jobs: a arrogância em certos momentos, a dificuldade de expressar afeto e gratidão - mas sem nunca tentar diminuir a estatura dele, que é o objetivo de muitas biografias hoje em dia. O filme é sempre uma celebração de Jobs, e não uma crítica.

Algumas escolhas de direção não me agradam - no meio do filme alguns diálogos começam a ficar cansativos demais - nem tanto pelo conteúdo, mas porque em vez de parar a câmera e assumir o tom estático da narrativa, Danny Boyle usa música dramática, movimentos de câmera, tentando dar um senso de agilidade artificial pro filme, o que acabou me alienando em certos momentos. O final também não é dos melhores  - a "redenção" dele com a filha me pareceu um pouco apressada, superficial: um gesto que ele fez pra impressionar a garota no momento mas não uma mudança convincente de caráter. Ainda assim, os acertos do filme são maiores que os problemas.

CONCLUSÃO: Biografia sem uma narrativa muito dinâmica, mas ainda assim um retrato fascinante de Steve Jobs, com ótimas performances e diálogos ricos em conteúdo. 

Steve Jobs / EUA, Reino Unido / 2015 / Danny Boyle

FILMES PARECIDOS: Birdman / Jobs / O Homem que Mudou o Jogo / A Rede Social

NOTA: 7.5

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Snoopy & Charlie Brown: Peanuts, o Filme

NOTAS DA SESSÃO:

- Legal essa animação 3D meio com cara de 2D. Fica moderno, mas sem se distanciar muito do desenho original.

- Tudo muito fofo. Os personagens, a história de amor (que cria interesse na trama até o final). Charlie, apesar de ser atrapalhado e inseguro, não cai na categoria de herói envergonhado. Ele é sensível, íntegro, não gosta de suas falhas e luta para superá-las, se interessa por uma menina que ele realmente admira e acha atraente, o que mostra uma ambição saudável, etc.

- O filme tem um tom mais infantil que outras animações modernas, pois não lida com temas controversos e não tem elementos agressivos: violência, morte, cenas assustadoras, etc. Mas psicologicamente é um roteiro mais sofisticado que a média, cheio de sacadas inteligentes e diálogos perspicazes.

- Hilário que depois que Charlie tira nota 100 na avaliação, tudo o que ele faz é considerado genial pelos colegas. Uma crítica inteligente à falta de objetividade das pessoas, principalmente ao julgarem artistas e pessoas famosas.

- Brilhante ele colocando Guerra e Paz em cima do trenó, hahaha. Acho legal que o filme cite literatura, compositores como Beethoven, e que os personagens se envolvam em atividades como escrever, dançar, tocar piano, etc. Dá uma noção pras crianças de que cultura é algo importante.

- Esses "devaneios" do Snoopy com o avião ficam um pouco longos, principalmente no final, quando estamos mais interessados em saber se o Charlie Brown vai conquistar a ruiva.

- SPOILER: Bonita a cena no ônibus e a ideia de que a ruiva o tempo todo estava enxergando além das aparências e se encantando pelo caráter de Charlie.

CONCLUSÃO: Filme leve, menos ambicioso que as produções da Disney ou da Pixar, mas sempre divertido, com personagens carismáticos, feito com sensibilidade, inteligência e transmitindo bons valores.

The Peanuts Movie / EUA / 2015 / Steve Martino

FILMES PARECIDOS: Bob Esponja: Um Herói Fora d'Água / Meu Malvado Favorito

NOTA: 7.5

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

A Grande Aposta

NOTAS DA SESSÃO:

- A história não é contada adequadamente pra quem não entende de bancos, mercado financeiro, etc. (eu por exemplo). No máximo ela pode ser vista de maneira vaga como a história de uns caras que estavam certos e previram a crise antes de todo mundo, mas não há como aproveitar o filme cena a cena, pois ele é basicamente formado de diálogos e não conhecemos bem os termos técnicos.

- A produção não me agrada visualmente. A fotografia parece desleixada e a edição caótica atrapalha a compreensão dos diálogos.

- A ideia da Margot Robbie na banheira é boba e mais distrai do que esclarece qualquer coisa. O diretor parece estar tentando imitar cineastas irreverentes como Scorsese ou Guy Ritchie, mas o estilo aqui parece forçado, de segunda mão. O humor serve apenas pra ridicularizar os protagonistas e o universo de Wall Street.

- O filme ataca o dinheiro e faz o espectador pensar que o colapso foi culpa do "livre mercado" da época. Não é à toa que Bernie Sanders gostou do filme. Outros detalhes também demonstram essa antipatia pelo capitalismo e pela cultura americana: imagens irônicas de artistas pop, fast-food, Las Vegas, etc.

- Há certo interesse na trama pois ela foca em pessoas que podem se dar muito bem com a crise. Ainda assim, não consigo torcer demais pelos personagens e admirar a profissão deles. O Christian Bale pelo menos tem um ar de visionário que é atraente.

- Um problema básico do roteiro é que não sabemos claramente o que está em jogo. Eles falam em milhões, bilhões de dólares, mas é tudo muito relativo - não sabemos o que cada personagem individualmente tem a ganhar ou a perder. Se eles estiverem certos, quanto ganharão especificamente? Se estiverem errados, quais as piores consequências? A história é mal contada. Só temos uma dimensão das coisas pelas reações dos atores.

CONCLUSÃO: Vagamente interessante como a história de um cara que enxergou a crise antes de todo mundo - mas como cinema é fraco, e a análise que o filme faz da crise é tendenciosa e incompleta no mínimo.

The Big Short / EUA / 2015 / Adam McKay

FILMES PARECIDOS: O Lobo de Wall Street / Trapaça / Margin Call - O Dia Antes do Fim / Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme

NOTA: 5.0

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Carol

NOTAS DA SESSÃO:

- O tema principal da trilha sonora é lindo! E que produção incrível! O visual parece de um filme dos anos 50 mesmo. Figurinos, direção de arte... Tudo impecável.

- Não há muita química entre as 2 mulheres - as personagens parecem distantes, como se estivéssemos vendo tudo de longe, sem enxergar as emoções de cada uma. São mulheres lindas, elegantes, mas como personagens não geram tanta empatia, pelo menos no começo.

- Outro problema é que não há muitos conflitos. As duas se vêem e já parecem imediatamente atraídas uma pela outra. Não há grandes conflitos internos, entre elas, e nem com a sociedade (não se cria um receio de alguém poderá descobrir que elas são lésbicas, etc.). Os próprios homens não representam grandes problemas. O único conflito real da história é a questão da guarda da filha, que é algo burocrático e não algo que nos prenda emocionalmente.

- A Rooney Mara é tímida, fechada, e sem muita personalidade. A Cate Blanchett às vezes se comporta como se fosse de uma vilã. Imagine um romance entre a madrasta má e a Cinderela. Não consigo imaginar algo físico entre essas duas. Elas não demonstram muita emoção, paixão. Nem assunto elas parecem ter. Elas ficam indo de encontro em encontro falando sobre banalidades do cotidiano sem grande interesse. Não acontece quase nada na história, o que torna a narrativa um pouco monótona.

- Elas não se beijam nem fazem sexo até uma hora e pouco de filme. Mas como elas não parecem ter grandes problemas com o fato de serem lésbicas/bissexuais, e já está claro que uma gosta da outra, não se cria um grande suspense em relação a isso. Quando elas finalmente vão pra cama, é apenas algo físico. Não representa uma transformação interna, uma decisão de alguma delas, algo significativo em termos de roteiro.

- Boa a performance da Cate Blanchett na cena em que ela concorda em dar a guarda da filha pro marido.

- SPOILERS: No final, tenta-se criar um suspense em relação ao romance mas não funciona totalmente. A Cate Blanchett se afastou da Rooney Mara só pra tentar recuperar a guarda da filha (algo que a Rooney iria entender perfeitamente). Em nenhum momento achamos que ela queria abandonar a relação. A Cate nem precisaria ter fugido no meio da noite na minha opinião. Não há um medo de rejeição na história, então essas idas e vindas das duas não têm tanto impacto. Ainda assim, é bonito o final feliz com as duas se olhando.

CONCLUSÃO: Produção linda com boas atrizes e um tema interessante, mas o roteiro não é dos mais bem desenvolvidos e emocionalmente deixa um pouco a desejar.

Carol / Reino Unido, EUA / 2015 / Todd Haynes

FILMES PARECIDOS: Direito de Amar / Longe do Paraíso / As Horas

NOTA: 7.0

domingo, 10 de janeiro de 2016

O Bom Dinossauro


(Esta crítica está no formato de anotações - em vez de uma crítica convencional, os comentários a seguir foram baseados nas notas que fiz durante a sessão - um método que adotei para passar minhas impressões de forma mais objetiva.)

ANOTAÇÕES:

- O curta que passa antes é a pior coisa que já vi da Pixar (Sanjay's Super Team). A mensagem é: vamos distorcer a realidade para que possamos chegar a um acordo entre filosofias opostas e incompatíveis.

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- A animação é impressionante (as imagens da natureza, etc.).

- De cara o filme já tem um problema: os personagens não são nada carismáticos. Não há química entre os familiares, as caracterizações são superficiais - eles não têm personalidades bem definidas e convincentes, Arlo não é engraçado nem fofo, é apenas fraco e desajeitado (herói envergonhado).

- Estranha a estrutura da história. Primeiro morre o pai num acidente improvável, depois tem que haver um segundo acidente improvável pro Arlo se perder de casa e viver sua aventura.

- Arlo ficou tanto tempo assim desacordado no rio??? Até parece que ele teria se afastado tantos quilômetros de casa, a ponto de levar dias pra voltar e viver uma experiência transformadora no processo!

- A história é muito mal escrita. Pra começar, se você vai contar uma história sobre coragem, é estranho escolher como protagonista um dinossauro que é de uma raça conhecida por ser pacífica, herbívora (faria sentido se ele tivesse sido adotado por uma família de Tiranossauros e tivesse que se adaptar, quem sabe). Não é como em O Rei Leão, onde é esperado que o Simba cresça se torne um líder forte. Ou mesmo em Como Treinar o Seu Dragão, onde o menino é frágil mas é de uma família de vikings e tem que se tornar um guerreiro. Além disso, o título é confuso. A história não é sobre ser bom ou mau, e sim sobre ser corajoso ou medroso, forte ou fraco. Não é um título como "O Bom Vampiro" - onde "vampiro" é algo mau, portanto se torna interessante o fato deste em particular ser bom.

- Estranha também a decisão de ter 1 único personagem humano no filme, mas que não fala e se comporta como um cachorro. Acaba sendo um filme sobre uma amizade entre uma figura humana e um animal, só que a figura humana é o dinossauro e o animal é o humano! É simplesmente uma bagunça.

- Arlo não tem nenhum desejo interessante. "Deixar de ser medroso e de se apavorar com qualquer coisa" não é um destino que empolgue plateia. Ele só quer mesmo voltar pra casa, que era um ambiente entediante, e não um lugar maravilhoso que sonhamos em rever na história.

- Roteiro cheio de ideias ruins. Como o rio desaparece de um momento pro outro? O humano tem um faro mais aguçado que os Tiranossauros?

- O filme foca no medo, na dor, e não em soluções, em coisas positivas (os personagens ficam comparando cicatrizes, o número de parentes que perderam, etc.).

- Falso os pterodáctilos não conseguirem matar facilmente o Spot só pra dar tempo do Arlo salvá-lo.

- SPOILER: De novo essa tsunami? Qual a probabilidade disso? E é claro que o filme não poderia terminar sem o Arlo mostrar que morreria pra salvar o amigo! Tendências Irritantes em Hollywood.

- SPOILER: Pra piorar há um duplo ato de sacrifício no final: primeiro, Arlo se jogar no meio da tsunami, e depois abrir mão do amigo pra que ele vá viver com os outros humanos! É uma despedida forçada pra tentar fazer o público chorar. Eles não vivem próximos? Não podiam conviver? Spot não podia preferir viver com os dinossauros? Não é como em E.T., onde o E.T. vivia num outro planeta e não podia ficar na Terra pois seria perseguido e mesmo biologicamente não sobreviveria.

CONCLUSÃO: O pior filme da Pixar.

The Good Dinosaur / EUA / 2015 / Peter Sohn

FILMES PARECIDOS: Como Treinar o Seu Dragão 2 / Turbo / Os Croods / Irmão Urso

NOTA: 3.5

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Spotlight - Segredos Revelados

NOTAS DA SESSÃO:

- Elenco ótimo! Todos muito bem escalados: Michael Keaton, Rachel McAdams, Mark Ruffalo, etc. Os personagens são atraentes, bons profissionais, têm relações positivas. O universo do jornal é bem recriado e convincente.

- A história é um pouco impessoal (é o que chamo às vezes de "filme de serviço" - quando o filme é apenas sobre o trabalho dos protagonistas e nada de muito íntimo está em jogo). Ainda assim o assunto dos abusos sexuais na igreja é interessante. O que me envolve na história é que eles pegam um caso aparentemente pequeno, de 1 único abuso, mas sabemos que o escândalo será muito maior do que esse e será um marco na carreira de todos como jornalistas. No fundo é uma história de sucesso, então a narrativa é prazerosa pois vamos vendo o caso ganhando dimensões cada vez maiores e surpreendendo os personagens. Há também a expectativa do "segredo" ser revelado para o mundo.

- Em termos de produção, direção, fotografia, o filme é bastante simples, sem nada de muito imaginativo e notável esteticamente. Mas é uma boa história, contada de maneira clara, com bons atores, então o filme funciona. A investigação evolui em passos lógicos, fáceis do espectador acompanhar, tornando tudo mais agradável.

- SPOILER: Chocante que 6% de todos os padres cometiam abusos! Ainda assim, o filme não parece atacar os valores da igreja (o que eu iria preferir), apenas condena as ações dos padres, então acaba sendo um filme "politicamente correto", que apesar expor os casos de pedofilia, não agride muito os valores do espectador mais religioso/conservador.

- Uma dimensão um pouco mais pessoal surge mais pro fim do filme, o que é bom: a decepção pessoal do Mark Ruffalo com a igreja, a história do Michael Keaton ter ignorado o caso dos abusos em 1993 e se sentir culpado por não ter feito algo mais cedo, etc.

- Satisfatório o final: os telefones tocando no jornal e depois a lista dos lugares onde outros escândalos foram descobertos.

CONCLUSÃO: Produção simples esteticamente, mas com um tema interessante, apoiada num bom roteiro e com bons atores.

FILMES PARECIDOS: Argo / O Discurso do Rei / A Hora Mais Escura / Frost/Nixon / Dúvida / Todos os Homens do Presidente

NOTA: 8.0

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

O Clã / Mistress America

Vou fazer um breve comentário a respeito desses 2 filmes que assisti há umas semanas e acabei não fazendo postagem por falta de tempo.

O Clã (El Clan / Argentina, Espanha / 2015 / Pablo Trapero)

Retrato de uma família de criminosos que, além de ter uma narrativa fraca, muitas vezes confusa, me irrita por glamourizar bandidos, violência, retratando os personagens como se eles fossem cool, quando na realidade eles não têm nada de interessante que mereça estar num filme além do fato de serem sequestradores.

FILMES PARECIDOS: Selvagens / O Homem da Máfia

NOTA: 4.5


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Mistress America (EUA, Brasil / 2015 / Noah Baumbach

Filme Naturalista mas sobre personagens muito bem escritos, com diálogos sensíveis, frequentemente brilhantes (que lembram os dos filmes do Woody Allen). O problema é que, ao contrário dos personagens do Woody (que costumam ser carismáticos e divertidos), a personagem da Greta Gerwig é bastante irritante e não chega a provocar grandes risadas - o filme tem uma relação de amor e desprezo por ela, a retratando ao mesmo tempo como heroína e como fracassada (Noah Baumbach parece ter uma relação mal resolvida com o sucesso profissional e muitas vezes retrata personagens fracassados de maneira ambígua, demonstrando certo afeto mas sem deixar que o público simpatize demais por eles).

FILMES PARECIDOS: Frances Ha / Antes da Meia-Noite / Margot e o Casamento

NOTA: 6.5

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

As Sufragistas

NOTAS DA SESSÃO:

- A direção de arte é bem feita, mas a fotografia é ruim (câmera tremida em planos fechados, problemas de foco, tratamento de cor feio, etc.).

- Irritante toda essa vitimização. O filme quer vilanizar homens, o industrialismo, qualquer figura de autoridade, e mostrar as mulheres sendo vítimas constantes de abusos de maneira exagerada: são abusadas sexualmente no trabalho, espancadas pela polícia, o marido da Violet é completamente odioso (por que ela se casou e teve filho com ele?).

- Acho um absurdo elas fazerem vandalismo, destruírem propriedade privada, como forma de conquistar direitos. Acho detestável esse tipo de ativista. O prazer delas parece estar no conflito em si, não na busca pela paz, pela justiça, pelo respeito, etc.

- O roteiro é bem estruturado - a história é contada de maneira tradicional, porém eficiente. É apenas difícil de simpatizar pela protagonista e pela causa dela. O filme não é sobre uma pessoa infeliz lutando pela própria felicidade. É sobre uma pessoa pacífica que passa a ser uma rebelde - como se isso fosse uma virtude em si.

- As cenas mais dramáticas da Carey Mulligan são prejudicadas pela fotografia. Mal vemos o rosto dela enquanto ela está chorando, se despedindo do filho, etc.

- SPOILERS: A questão do voto é legítima e nesse ponto eu simpatizo pelas mulheres, pois de fato elas deveriam ter os mesmos direitos dos homens, o problema é a abordagem do filme - ele não é motivado por questões intelectuais, filosóficas, e sim por ódio dos homens. Não há nenhuma figura masculina positiva no filme. E basta observar a estrutura do roteiro: quanto mais detestável o marido da Violet se torna, mais ela vai se tornando agressiva e abraçando a causa das mulheres, como se tudo fosse motivado por questões domésticas pessoais. Quando o marido coloca o filho pra adoção (o pior ato dele no filme), na cena seguinte Violet sai com as outras sufragistas e comete o maior ato de destruição até então (a bomba na casa). A estratégia do filme é a seguinte: provocar ódio contra os personagens masculinos, e na sequência "aliviar" a plateia mostrando elas se vingando: explodindo coisas, Violet queimando a mão do patrão, etc. Pouco se fala de ideias, política, etc.

- SPOILERS: É impactante o final na corrida de cavalos, porém acho um tédio essa glamourização do martírio. Morrer pela causa parece um grande sonho pra pessoas que gostam de se fazer de vítima. Melhor ainda é morrer nas mãos dos "agressores"! Elas podiam ter escolhido qualquer evento público pra chamar a atenção da mídia, então é curioso que a personagem tenha escolhido ser atropelada justamente por um homem montado num cavalo (símbolos de masculinidade e força: os grandes vilões do filme).

CONCLUSÃO: História bem contada e com uma boa performance de Carey Mulligan, porém sem muita originalidade ou méritos artísticos, e promovendo atitudes negativas, destruição, etc.

Suffragette / Reino Unido / 2015 / Sarah Gavron

FILMES PARECIDOS: Orgulho e Esperança / Milk: A Voz da Igualdade / Em Nome de Deus

NOTA: 5.5

sábado, 2 de janeiro de 2016

Melhores de 2015

Favorito lançado no Brasil em 2015:

A Travessia

Outros favoritos:

Amy
Corações de Ferro
Enquanto Somos Jovens
Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo
O Homem Irracional
O Jogo da Imitação
Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros
Ponte dos Espiões
Trinta

Problemáticos mas memoráveis:

Mad Max: Estrada da Fúria
Star Wars: O Despertar da Força

Os Oito Odiados

NOTAS DA SESSÃO:

- A tradução correta do título seria "Os Oito Odiosos", não?

- Fotografia linda, a trilha sonora do Ennio Morricone é excelente. Tarantino é um realizador muito habilidoso e toda a "embalagem" de seus filmes é sempre atraente (a sequência de créditos retrô, etc.).

- Engraçada a performance da Jennifer Jason Leigh, embora a graça venha do fato da performance ser absurda, das reações dela não fazerem sentido. Numa comédia escrachada isso me divertiria sem culpa, mas aqui acaba me incomodando um pouco, pois isso é um reflexo da atitude cínica de Tarantino, que quer fazer um filme sério, belamente filmado, e ao mesmo tempo zombar dele, mostrar pro público que não se leva a sério, etc.

- Os diálogos são criativos e divertidos, o problema é que o filme só tem diálogos. E eles são basicamente inúteis: não avançam a história, não discutem valores sérios de interesse do público, nem levantam questões intelectuais interessantes. Servem basicamente pra apresentar os personagens - eles ficam falando sobre histórias do passado (que teriam sido melhores vistas em flashback), etc. Nada do que está acontecendo no presente da história é interessante. Não há uma trama envolvente, relacionamentos interessantes, uma curiosidade em relação ao destino dos personagens (se eu bem conheço o Tarantino, vai acabar tudo num banho de sangue, que é a maneira mais fácil de se criar um final de impacto quando não se tem um bom conteúdo).

- 3 horas de duração pra uma história como essa é imperdoável! O filme parece querer ser algo na linha de 12 Homens e Uma Sentença - um filme que se passa todo numa única locação, mas com uma trama engenhosa cheia de reviravoltas, etc. O problema é que nada é surpreendente aqui. Os personagens são todos vilões. Que surpresa é pra plateia descobrir quem envenenou o café, quem matou quem...? São todos bandidos, não torcemos pra nenhum deles em particular, não há nenhuma questão ética interessante em jogo.

- SPOILER: A história parece forçada. Será que o Channing Tatum precisaria mesmo matar todo mundo na cabana, armar todo esse teatro, só pra conseguir resgatar a irmã?! Não me parece uma estratégia inteligente.

- Intelectualmente o filme é vazio. Por tocar em temas como racismo, história americana, etc, alguns críticos pretensiosos podem querer dizer que o filme é sobre "algo mais", que é algum tipo de alegoria, quando na prática ele é apenas sobre um conflito entre grupos de bandidos.

CONCLUSÃO: Tecnicamente bem realizado, porém com uma história tediosa, vazia de drama e intelecto, que só causa impacto por causa da parte técnica, da atitude subversiva de Tarantino e do apelo pra violência.

The Hateful Eight / EUA / 2015 / Quentin Tarantino

FILMES PARECIDOS: Django Livre, O Lobo de Wall Street, Bastardos Inglórios, Bravura Indômita (2010), Sangue Negro.

NOTA: 4.5