sábado, 18 de junho de 2016

Mais Forte que o Mundo - A História de José Aldo

NOTAS DA SESSÃO:

- José Aldo e os amigos são totalmente imorais. O filme tenta mostrá-los como vítimas da sociedade, mas não há como perdoar eles saírem pelas ruas espancando estranhos por puro prazer. Se o filme fosse uma denúncia do comportamento deles tudo bem. Mas o propósito aqui é criar empatia pelo protagonista, daí não dá pra perdoar.

- Alerta Vermelho (ódio de ricos): o pai do protagonista é um bêbado decadente e agressor de mulher, mas o grande vilão no fim não é ele, e sim o patrão rico, por fazer o protagonista se sentir humilhado pelo pai que tem.

- A produção está bem acima da média dos filmes brasileiros. A fotografia é bem feita, a direção tem estilo, consegue criar momentos dramáticos, o elenco está ótimo, José Loreto convence totalmente como José Aldo.

- Rafinha Bastos me parece um pouco deslocado aqui. Ele parece um cara muito sensível e intelectual pra ser lutador, e os 2 têm personalidades tão diferentes que não convencem como amigos.

- Continuo com sensações mistas em relação ao protagonista. Por um lado é inspiradora a história de alguém que sai do nada e se revela um grande talento (o roteiro funciona nesse nível mais básico de história de sucesso). Por outro lado, o filme glamouriza o lado agressivo e animalesco de José Aldo. O grande "talento" dele é ser forte e violento. Quando ele arruma uma briga e destrói a lanchonete onde trabalha, em vez de ser repreendido pela irresponsabilidade, ele é recompensado e se torna lutador profissional! É um esporte tão duvidoso que recompensa o que há de mais animalesco nas pessoas. Parece quase impossível alguém ser um gênio do UFC e ao mesmo tempo ser um personagem muito admirável em termos de caráter, etc.

- Boa a cena da primeira luta (onde o José Aldo derrota o adversário em poucos segundos). Embora usar a trilha do Era Uma Vez no Oeste seja um golpe baixo (não é tão difícil criar um momento de impacto se você pode "emprestar" uma das melhores trilhas do cinema, hehe).

- Cléo Pires está ótima no filme e tem uma química perfeita com o José Loreto. Ao contrário do Rafinha Bastos, ela convence como alguém que pertence a esse universo e se relacionaria com um cara desses.

- Quando ele vai pra Inglaterra ele já está no UFC? Não fica muito bem explicado em qual estágio da "corrida" ele está.

- A luta dele em Las Vegas é muito bem dirigida!! Conseguimos acompanhar cada golpe, entendemos o que está acontecendo em cada estágio da luta, tudo é sublinhado com closes, câmeras lentas. Não dependemos da narração pra entender, como de costume - nós realmente vemos a luta.

- SPOILER: Só acho estranho em termos de roteiro o filme ter dado pouca ênfase pro fato dele ter se tornado campeão mundial nessa luta! Não criaram um momento emocionante na vitória, foi algo bem casual, como se ele ainda tivesse pra onde crescer depois disso.

- SPOILER: Irrita o apego que José tem pelo pai, depois de tudo o que ele fez. E o fato também dele trair a namorada com a menina de Manaus. É difícil não torcer por José na questão do esporte, mas quando você para pra pensar ele não é nem um pouco respeitável como pessoa.

- SPOILER: As alucinações que o José tem com o Fernandinho são sutis e muito interessantes. Acho questionável o ódio que ele tem do rapaz, que apesar de ser babaca está longe de ser um arqui-inimigo como é retratado no filme. Ainda assim, o filme é eficiente em mostrar como o sentimento de humilhação que o José sente diante da figura do Fernandinho abastece a raiva dele e faz com que ele tenha mais força nas lutas. No fim não é o pai do José que o "motiva" no sentido tradicional. É a vergonha que o José sente do pai, somada com a humilhação provocada pelo Fernandinho que geram a tal fúria que faz com que ele vença as lutas. E a cena em que o José Aldo "alucina" que está lutando contra si mesmo, e não contra o Fernandinho, pode parecer meio clichê mas é muito apropriada e perspicaz psicologicamente.

- Tocante a cena em que o José vai visitar o pai no hospital. Os 2 atores estão muito bem.

- SPOILER: Um absurdo a Cléo Pires aceitar o José de volta toda animada logo após ter sido traída. É igual quando o José destruiu a lanchonete e foi recompensado. A filosofia do filme é: "dane-se a ética" - você pode ser a pessoa mais irresponsável do mundo, se você for gostoso e tiver talento, tudo será perdoado.

- SPOILER: Incrível a última luta! Muito bem dirigida a ação (consegue envolver a plateia e mostrar tudo sem apelar pra violência de maneira desagradável). Apesar dele já ser campeão, essa luta acaba sendo mais dramática que a última. O filme une esse momento à morte do pai, e também revela de maneira incrível a história por trás da cicatriz que o José tem no rosto. A vitória é realmente de arrepiar - o uso da música, a imagem épica dele segurando o cinturão, os textos explicando o que houve depois, etc.

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CONCLUSÃO: Apesar do filme celebrar um personagem em muitos aspectos imoral, é um dos filmes brasileiros mais bem feitos que já vi. Tem ótimas performances, profundidade, sensibilidade, é tecnicamente bem realizado, e provoca a emoção do esporte de forma memorável.

Brasil / 2016 / Afonso Poyart

FILMES PARECIDOS: Creed: Nascido para Lutar / Trinta / Faroeste Caboclo / 2 Filhos de Francisco

NOTA: 7.8

6 comentários:

Marcus Aurelius disse...

Oi Caio. Se o personagem principal fosse uma pessoa moral, você acha que valeria um dez? E o filme chega a ser melhor que Creed no que se refere a filme de "luta"?

Caio Amaral disse...

Talvez Marcus.. Achei tão satisfatório quanto o Creed.. Em alguns aspectos achei esse até mais envolvente e sensível, mas ele também tem problemas que o Creed não tem (por exemplo esse do caráter do personagem).. Acho meio difícil ficar supondo essas coisas - que nota daria se tal elemento mudasse, etc.. É que nem dizer: se pessoa X não tivesse a crença Y, você se apaixonaria por ela? kkk.

Mas o protagonista nem teria que ser diferente necessariamente pro filme ser melhor.. O que importa mais é a *moldura* que o filme coloca no personagem. Por exemplo: eu dei 10 pro Ninfomaníaca - Parte 1 mesmo a personagem sendo uma maluca. Pq? Pq o filme coloca a moldura certa na personagem.. Não tenta torná-la uma heroína.. Ele tem plena consciência da figura decadente que ela é e a retrata desse jeito. Então não vejo muito problema. Abs!

Unknown disse...

Caio vc sabe me dizer qual o nome da musica que toca no final da ultima luta inmendando com os creditos, grato.

Caio Amaral disse...

Oi Antonio.. acho que vc está falando dessa aqui do Ennio Morricone:

https://www.youtube.com/watch?v=MrzukPzGqow

Unknown disse...

Excelente dissertação!

Caio Amaral disse...

Valeu Celio.. deve ter passado na TV pq essa postagem teve vários acessos esses dias hehe.. abs!