sexta-feira, 29 de julho de 2016

O Bom Gigante Amigo

Tinha um mau pressentimento a respeito desse filme desde que Spielberg o anunciou. Por algum motivo, a história de uma amizade entre uma garotinha inglesa e um gigante idoso não me parecia muito empolgante. Resolvi assistir à animação de 1989 pra ver do que se tratava, e continuei achando que o material era fraco e que não renderia um bom filme. Ainda assim, minha confiança no Spielberg é tanta que eu estava pondo fé que ele acharia uma forma de modificar o material original e transformá-lo num grande entretenimento (ainda mais o roteiro sendo da Melissa Mathison, que apesar de não ter uma carreira muito extensa, escreveu E.T. - O Extra-Terrestre que eu considero um dos melhores filmes já feitos). Infelizmente isso não aconteceu. Spielberg parece ter confiado cegamente que o livro de Roald Dahl era um clássico, e se propôs apenas a transpor a história para as telas, emprestando seu talento apenas como narrador visual (não li o livro, mas pela semelhança do filme com o desenho de 89, suponho que ele seja uma adaptação fiel).

NOTAS DA SESSÃO:

- A fotografia, os cenários / direção de arte são lindíssimos.

- O começo da história é ruim. Mal somos apresentados à personagem e ela já é raptada por um gigante. Como assim? Por que gigantes caminham por Londres à noite e ninguém os vê? Não sabemos quem é essa menina, o que ela busca, o que o fato dela ser raptada muda na vida dela. Não existe nem o simples desejo de voltar pra casa (como Alice ou Dorothy), afinal ela vivia num orfanato e não tinha ninguém em sua vida. E ela gosta do gigante. Sem falar que é aquilo que eu chamo de "fantasia dentro da fantasia". Antes de aparecer o gigante, esse universo de Londres já parecia um lugar fantasioso. Não há um contraste interessante com a realidade. Spielberg raramente comete esse erro. Ele costumava dizer que não fazia filmes de fantasia como Star Wars, etc, porque gostava de trazer o fantástico pro mundo familiar do espectador (E.T. aparece numa típica casa americana, etc).

- A reação da Sophie ao gigante é meio falsa. Em vez de estar apavorada, ela já fala com ele de forma confiante, o desafia, etc. Não dá pra acreditar no que está acontecendo. Ele não é uma figura muito atraente, e a amizade entre os dois não empolga. Até porque o personagem da menina é muito raso. Em E.T., por exemplo, o Elliott era visto como loser, imaturo, não era aceito no grupo do seu irmão... E o E.T. vem pra dar a ele independência, poder e maturidade. Em vez de filho, ele passa a ter um papel de protetor, e ao longo da aventura prova seu valor e sua coragem. Não há nada parecido aqui. Não temos uma conexão emocional com a história.

- A ideia de transformar flatulências em uma coisa mágica e divertida simplesmente não dá!

- Talvez o Spielberg tenha se identificado com essa ideia do BFG ser uma criatura benevolente que traz sonhos pra vida das pessoas - algo que ele sempre fez com seus filmes. É uma metáfora bonita, mas que não está embutida em uma boa história.

- Faltam conflitos, antagonistas... Esses gigantes "do mal" não são nada ameaçadores. E não faz sentido eles se mobilizarem todos pra encontrarem 1 garotinha. O que eles vão fazer com ela, comê-la? A Sophie não serviria nem como um lanche da tarde pra 1 deles. Por que eles dão tanta bola pra ela? No fim da sequência em que eles invadem a casa do BFG, o BFG consegue espantá-los facilmente com um balde d'água. Ou seja, não são obstáculos sérios que precisam ser superados. O BFG não pode simplesmente se mudar pra outro lugar e deixar os "bullies" de lado?

- Essa mudança no ato final da história me parece estranha (no desenho já achei isso). O filme todo é uma fantasia na terra dos gigantes que foca apenas na garotinha e no BFG. Depois de uma hora e tanto de filme, de repente somos jogados no Palácio de Buckingham e estamos com a rainha da Elizabeth discutindo estratégias militares pra derrotar os gigantes?! Isso não parece fazer parte do mesmo filme. E qual a necessidade deles criarem esse sonho pra rainha antes de aparecerem? Se ela visse o gigante e a Sophie sem ter sonhado com eles antes, ela não iria acreditar no que estava vendo?! Não é uma história inteligente.

- O capricho técnico do Spielberg acaba irritando numa história tão sem vida e sem emoção como essa. Incomoda ver ele se divertindo criando planos bem coreografados, cuidando obsessivamente do visual a ponto de deixar tudo plastificado - quando algo tão mais importante está sendo ignorado (a alma do filme).

- Se o Spielberg se identifica com o papel do BFG de implantar sonhos na cabeça das pessoas, o que esse trecho da rainha significa, simbolicamente? Que as decisões políticas de um país também estão à mercê dos "sonhos" dos governantes? E que quem cria e controla esses sonhos (o artista) no fim é quem governa o mundo? Dá pra viajar um pouco nessas teorias.

- A sequência final da captura dos gigantes não interessa porque é muito falsa fisicamente (esses helicópteros não conseguiriam derrubar gigantes desse tamanho). E também pelo fato dos vilões serem fracos e não representarem uma grande ameaça no contexto da história.

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CONCLUSÃO: Tecnicamente bem feito, mas a história é fraca e sem vida.

The BFG / Reino Unido, Canadá, EUA / 2016 / Steven Spielberg

FILMES PARECIDOS: Jack, o Caçador de Gigantes / As Aventuras de Tintim / A Invenção de Hugo Cabret / Os Fantasmas de Scrooge / O Expresso Polar

NOTA: 6.0

quinta-feira, 28 de julho de 2016

Mãe Só Há Uma

NOTAS DA SESSÃO:

- Naturalismo: o filme registra tudo de maneira crua, externa, tem uma fotografia sem tratamento - espera que o espectador vá tirando suas próprias conclusões a respeito da "realidade" que está vendo.

- Eventos essenciais da história não são mostrados (a mãe vai presa sem que tenha havido uma conversa entre ela e o filho sobre a situação toda).

- Naturalismo: o protagonista não tem um desejo. As coisas vão acontecendo a ele (ele é forçado a mudar de família), mas não sabemos o que ele busca internamente. Se o filme fosse sobre ele lutando pra fugir de casa ou restaurar sua antiga família, aí pelo menos a história teria uma "espinha".

- Outra cena essencial que não é mostrada: o encontro entre o Pierre e a nova família. O filme já corta pra uma cena onde todos estão no restaurante, fica mostrando a conversa do irmão mais novo no celular que não tem nenhuma relação com nada. A única função disso é mostrar pra plateia que o filme não tem uma estrutura lógica, portanto, é "de arte".

- Os personagens se comportam de maneira artificial. Tudo parece aleatório, incoerente: o irmão mais novo acabou de conhecer o Pierre e já fala com ele de forma íntima, entra no banheiro atrás dele no restaurante... Depois tem a cena do ensaio da banda onde o cara beija o Pierre do nada... Ou depois quando os pais biológicos da irmã chegam e tratam ela como se fosse um cachorro... As pessoas só se comportam assim em filmes de estudante.

- Quando vai pra nova casa, o filme começa a ridicularizar a "burguesia" e se torna uma declaração de ódio contra os mais ricos, assim como Que Horas Ela Volta? (o quadro patético com o retrato da mãe na parede, etc).

- Cena em que o Pierre quebra pratos na parede: a ideia é mostrar que ele está à beira de um ataque, chegando no limite, só que isso contradiz toda a caracterização dele até aí. É uma atitude que vem do nada, sem o menor preparo. A construção dos personagens é muito pobre. O filme não demonstra uma noção realista da natureza humana. Outra cena: a mãe biológica tentando criar intimidade com o filho e insistindo pra entrar no quarto dele, quando ele obviamente quer ficar sozinho. É muito sem noção a atitude dela. E não chega a ser algo obviamente forçado, tipo coisas do Lars von Trier, que vão mais pra um lado de surrealismo. Fica parecendo algo mal atuado.

- Esse personagem da mãe é odioso, assim como a patroa em Que Horas Ela Volta? A motivação do filme é expressar ódio e atacar a classe de pessoas que a cineasta detesta (os "coxinhas" que gostam de usar camisa polo, etc). A cena no provador onde o Pierre sai vestido de mulher é ridícula. Uma atitude que não tem nada a ver com o personagem. Ele não era um garoto transgressor e irreverente nem na própria casa, até parece que com estranhos agiria assim. E depois de todo esse escândalo, o filme mostra eles assistindo TV em casa como se nada tivesse acontecido (e o Pierre ainda de vestido). Pra um filme Naturalista não há nada de natural no comportamento das pessoas. O filme é apenas uma desculpa pra cineasta passar suas opiniões políticas.

- A cena da paquera no colégio (onde o irmão mais novo é rejeitado pela garota bonita) não tem nada a ver com o resto da história. Parece um sketch enfiado de qualquer jeito no meio do filme pra condenar um outro grupo de pessoas que a cineasta detesta: os "opressores" que levam em conta a beleza dos outros na hora do flerte.

- Ridículo o Pierre ir jogar boliche de vestido. Não tem nada a ver com ele essa atitude, e mesmo que tivesse, uma família conservadora como essa não estaria aí tentando se divertir em público. Eles nem teriam saído de casa se o Pierre quisesse ir desse jeito. Os personagens são tão falsos que o filme conseguiu deixar até o Matheus Nachtergaele ruim.

- Irritante o filme expressar afeto pelo personagem do irmão mais novo (ele encostando a cabeça no ombro do Pierre no final). É igual em Que Horas Ela Volta? (e em Casa Grande) que por um lado quer vilanizar a burguesia, mas por outro mostra o filho da patroa de forma carinhosa, como alguém que respeita os não-privilegiados. Seria isso uma tentativa furada de não parecer generalista e preconceituoso? Ou um desejo inconsciente de ser aceito pelos "inimigos"?

Brasil / 2016 / Anna Muylaert

FILMES PARECIDOS: Que Horas Ela Volta? / Casa Grande / O Som ao Redor

NOTA: 1.5

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Dois Caras Legais

NOTAS DA SESSÃO:

- Não vejo muita graça nesses personagens nem acho a relação entre os 2 divertida (o Russell Crowe em particular não combina com papéis cômicos).

- O humor parece forçado e inapropriado em alguns momentos: o garoto da bicicleta oferecendo pra mostrar o pinto, as piadas sexuais envolvendo a filha do Ryan Gosling...

- A trama não tem o menor interesse (a investigação dos crimes). Os personagens não têm nenhum desejo pessoal pra buscar, e também não há nada de tão misterioso ou promissor assim na investigação pra deixar a plateia envolvida até o final. No máximo iremos descobrir o que houve com a atriz pornô ou com a Amelia - personagens que nem conhecemos e pelos quais não nos importamos.

- O foco deveria ser no desenvolvimento da amizade entre os 2 protagonistas, mas os personagens são superficiais, caricatos, desinteressantes. As tentativas de dar mais dimensão a eles são terríveis (o diálogo na piscina onde o Russell Crowe conta sobre seu passado, ou então a tatuagem na mão do Ryan Gosling... Isso não revela nada de interessante sobre o caráter dos personagens, algo que esteja sendo afetado por essa investigação e sofrendo uma transformação).

- A Amelia (que é o centro da investigação) quando aparece é uma menina tola e burra. Não um personagem interessante com um grande segredo por trás, algo que faça a plateia ficar curiosa e mais envolvida na trama.

- A história não é particularmente engraçada. O humor muitas vezes só existe porque os personagens são atrapalhados. Mas não há uma razão lógica pra eles serem tão atrapalhados assim (não são personagens comuns disfarçados de detetives, e sim detetives de verdade).

- A história vai ficando cada vez mais impossível e artificial. É ridículo por exemplo a filha do Ryan Gosling ter toda essa coragem, conseguir render o vilão... Ou então a história da tia da Misty ter confundido uma projeção na parede com a própria sobrinha... A plateia não vai querer usar neurônios numa trama onde as coisas acontecem sem nenhuma lógica.

- E tudo isso é só pra impedir um filme de ser exibido, porque o filme tem uma mensagem política controversa. E daí? A Amelia já está fazendo protestos pela cidade. Que diferença 1 protesto a mais iria fazer? Quem iria absorver a mensagem do filme num ambiente como essa exposição de automóveis? E mesmo que absorvessem, as pessoas provavelmente iriam apenas ignorar a mensagem do filme. Não é que a vida de pessoas está em risco... Que uma grande tragédia pode acontecer caso os protagonistas fracassem. A história toda é uma chatice sem fim.

- A ação no final vai ficando cada vez mais forçada e sem graça. A negra escorregando no café e desmaiando... O Ryan Gosling caindo de cima do prédio e vendo o Nixon na piscina... Toda a perseguição pelo rolo de filme... O filme não sabe se é um filme de ação normal, que apenas tem protagonistas engraçados, ou se é uma comédia absurda onde tudo é possível. Em filmes como Máquina Mortífera, há humor no meio, mas a parte policial é levada a sério e por isso prende a atenção do espectador.

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CONCLUSÃO: Se o humor funcionasse, daria pra perdoar a trama desinteressante e sem sentido. Se a trama funcionasse, daria pra perdoar a falta de humor.

The Nice Guys / EUA / 2016 / Shane Black

FILMES PARECIDOS: Vício Inerente / Trapaça / Red: Aposentados e Perigosos / Beijos e Tiros

NOTA: 3.0

sexta-feira, 22 de julho de 2016

A Lenda de Tarzan

NOTAS DA SESSÃO:

- A história começa mal. Por que a tribo mata todo mundo exceto o Christoph Waltz? Por que o líder da tribo acha que o Waltz tem mais capacidade de capturar o Tarzan do que eles próprios? E será que ele daria essa fortuna em diamantes em troca disso?

- Como assim o Tarzan está civilizado, usando terno e falando inglês perfeitamente?? Isso tira toda a graça da história. O filme foi vendido como se fosse a história da lenda de Tarzan, e não isso.

- Os protagonistas são superficiais e não têm o menor carisma ou química - tampouco convencem como pessoas que já viveram na África.

- Os coadjuvantes estão sempre dizendo como o Tarzan é incrível, lendário, só que nós nunca VEMOS por que ele é isso tudo, então não admiramos o personagem. Filmes têm que mostrar, não dizer.

- A primeira meia hora de filme é um monte de cena chata de exposição mal feita. Os personagens não têm nenhum objetivo interessante até serem capturados pelo vilão. E essa cena da captura também é bem mal feita (a maneira como eles deixam o Tarzan escapar e ficam só com a Jane).

- Os personagens estão sempre falando sobre o Tarzan como se dentro do universo do filme ele já fosse uma lenda histórica... Não faz sentido. Ele voltou pra Inglaterra há poucos anos, não deu tempo dele se tornar um lorde civilizado, e nem de se transformar nessa lenda toda. Seria no máximo uma celebridade do momento.

- Os personagens e os diálogos são péssimos e as tentativas de humor nunca funcionam (a Jane provocando o vilão dizendo que o bigode dele está torto, etc).

- A ação também é falsa. O Samuel L. Jackson com essa idade jamais poderia acompanhar o Tarzan nas árvores. Num desenho animado até daria pra deixar passar, mas não num filme que tenta dar um tom mais adulto e político pra história. O Tarzan conseguir derrotar dezenas de soldados armados sozinho no trem também é um absurdo. O colar do vilão que serve como arma também não faz sentido.

- Mal explicado esse conflito entre o chefe dos gorilas e o Tarzan. Eles conviveram esses anos todos na selva e ainda não se entendem? Por que eles tem que ter esse duelo do nada? Isso não serve nenhum propósito na história (exceto mostrar o ator sem camisa).

- Mais ação mal feita. Como a Jane consegue escapar do barco, abrir a jaula do prisioneiro, fugir dos hipopótamos? E por que depois ela fica com medo do gorila? Ela e o Tarzan não deveriam se dar bem com os animais? O pior é o vilão aparecer no meio da selva logo em seguida com dezenas de pessoas. Eles não estavam no barco? Como acharam a Jane? Por que o gorila não o ataca também?

- Péssima a luta entre o Tarzan e o líder da tribo... Os dois "discutindo a relação" no meio da briga. E por que os gorilas salvam o Tarzan no fim? Essa subtrama dos gorilas foi muito mal desenvolvida.

- Diferente de Mogli, que apesar de condenar o lado destrutivo do homem tinha algo de bom a dizer a respeito da civilização, esse aqui vilaniza sem culpa o homem civilizado. No fim o Tarzan chega triunfante com sua manada de gnus e destrói todo o acampamento (ele nem parou pra pensar que a Jane estava ali e poderia ser pisoteada pelos animais).

- O Samuel L. Jackson atira no barco e o barco afunda em questão de segundos?!?! Todo o final é ruim demais pra ser comentado.

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CONCLUSÃO: Visual de bom nível não consegue compensar a falta de carisma dos personagens e o roteiro pavoroso.

The Legend of Tarzan / EUA / 2016 / David Yates

FILMES PARECIDOS: Peter Pan (2015) / Hércules (2014) / Transformers: A Era da Extinção / O Cavaleiro Solitário (2013)

NOTA: 3.5

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Caça-Fantasmas

NOTAS DA SESSÃO:

- Muito legal o prólogo na mansão assombrada / o tema original de Os Caça-Fantasmas tocando.

- O roteiro começa muito bem estruturado: a Kristen Wiig cética em conflito com o passado "esotérico" dela, a maneira como o livro acaba reconectando a Kristen à Melissa McCarthry e levando elas a embarcarem na investigação. A motivação das personagens é bem fundada... Elas não querem apenas proteger a cidade de forma altruísta como muitos super-heróis. Além da curiosidade científica, achar fantasmas era o sonho de infância das duas. E além disso agora elas precisam provar pra todos que não são loucas.

- "Ed está morto há 15 anos", hahaha. As piadas são ótimas, há uma pegada bem SNL.

- Kristen Wiig e Melissa McCarthy estão excelentes (como já se podia prever) mas as outras 2 da equipe também são ótimas (a Kate McKinnon que faz a Jillian tem uns momentos geniais). Cada uma tem uma personalidade distinta e um estilo próprio de humor. O Chris Hemsworth fazendo o recepcionista também está ótimo. O diretor Paul Feig é mestre nesse tipo de humor e tem um "dream team" nas mãos.

- Debarge - Rhythm of the Night: adoro que o filme não tem medo de sair um pouco dos trilhos só pra tornar as coisas mais divertidas.

- Não há 1 cena desnecessária, confusa, repetitiva. Parece que estava sobrando conteúdo e imaginação. Cada cena tem algo novo, alguma ideia criativa, personagens gostáveis, uma boa piada, ajuda a avançar a história, termina numa nota alta.

- Curioso as TVs serem quadradas, como se o filme se passasse no passado. A gente sabe que o filme é atual porque elas assistem vídeos no YouTube, mas em geral ele parece atemporal... Felizmente ele não fica fazendo piadas baseadas em atualidades, etc, como muitas das comédias. Daqui a 20 anos ele ainda irá funcionar. Gosto também que (quase) não há baixaria e piadas de mau gosto.

- Divertida a sacada do monstro aparecer no show de rock. A sequência toda é ótima. Maravilhosa a Leslie Jones caindo no chão e culpando machismo/racismo! E a cereja do bolo é a Jillian quebrando a guitarra.

- Demais as participações especiais do elenco original (Bill Murray, etc)! Cada um aparece num ponto diferente do filme e tem alguma fala legal (e estão integrados à história, não fica parecendo algo desnecessário só pra fazer uma citação ao original).

- Apesar de ser uma comédia sobrenatural despretensiosa, você percebe bastante respeito pela ciência e em tornar a história o mais convincente possível. A história das Linhas de Ley por exemplo é um conceito bem interessante. Não fica parecendo uma trama nonsense só pra pendurar um monte de piadas, e isso faz a gente entrar no universo do filme.

- Legal o visual dos fantasmas tomando Nova York (o 3D é bom e faz algumas coisas saltarem da tela). As armas que elas usam pra capturar os fantasmas são ótimas.

- Pra que essa pose de dança que o Chris Hemsworth faz com as pessoas na rua? Parece uma cena que acabou sendo cortada. Há um ou outro detalhe meio forçado nessa sequência final, mas que não chegam a prejudicar o ritmo do filme.

- O ritmo e o nível das piadas foi muito bom o filme inteiro. (Ex: "Se você vir algo, diga algo" / o logotipo que o Chris Hemsworth cria / "Não seja o prefeito de Tubarão" / "Nosso presidente é uma planta", etc, etc). Hoje em dia é rara essa combinação de diversão com talento/inteligência.

- É engraçado o filme ter sido acusado na internet de ser "politicamente correto" (por ter tornado os Caça-Fantasmas mulheres) quando na prática ele tira o maior sarro dessas discussões e é um dos raros blockbusters recentes que não abraçam essas tendências (e nem a tendência de tornar os filmes antigos mais dark/realistas - talvez seja essa diversão sem culpa que tenha revoltado tanto as pessoas).

- Créditos finais interessantes até o último segundo.

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CONCLUSÃO: Um dos melhores remakes que já vi; ótima direção, elenco estelar, história bem contada e piadas incríveis do começo ao fim.

Ghostbusters / EUA / 2016 / Paul Feig

FILMES PARECIDOS: Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros / Poltergeist: O Fenômeno (2015) / A Escolha Perfeita / Anjos da Lei / Missão Madrinha de Casamento

NOTA: 8.5

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Julieta

NOTAS DA SESSÃO:

- Intrigante o mistério da protagonista, ela decidir abandonar o marido depois do encontro com a amiga, etc. Divertida a trilha sonora de suspense, lembra Bernard Herrmann, filmes do Hitchcock, etc.

- Não dá pra ter muita empatia pela personagem, pois não entendemos o que se passa na cabeça dela, qual sua motivação.

- A sequencia no trem é interessante em termos de atmosfera, direção de arte. Tudo parece meio teatral, surrealista (o galho batendo na janela, o alce correndo em câmera lenta...).

- É típico de filmes de "arte" ficarem à frente do espectador e tentarem envolver a gente artificialmente, não por discutirem temas realmente interessantes, criarem empatia pelos personagens, expectativa pelo que vai acontecer - mas omitindo informações da plateia, tornando os personagens misteriosos, incompreensíveis. Daí ficamos nos perguntando: O que essa mulher quer? Por que ela brigou com a filha? Quem é essa personagem que apareceu agora? Em filmes comerciais, a plateia se sente inteligente - tem o prazer de enxergar através das ações e entender a verdadeira essência dos personagens.

- Naturalismo: Que interesse nós temos em saber a história de vida da Antía? A filha não conhece a própria história? Por que a Julieta vai contar tudo de novo através de uma carta - "quando você tinha 10 anos, tal coisa aconteceu..."?

- O simples fato das 2 estarem brigadas não é o bastante pra me envolver na história e torcer por um reencontro. A gente primeiro teria que saber como era a relação das 2, por que elas se desentenderam, quais valores estão em jogo, por que é importante pra protagonista fazer as pazes com a filha, etc... E contar a história da menina desde a concepção até a vida adulta não parece ser necessário pra isso. O filme poderia simplesmente começar explicando o motivo da briga e partir daí.

- O filme apenas registra uma série de eventos: a empregada é despedida, o pai sofre um acidente, há uma traição... Mas não há um interesse que sustente a história como um todo, pois não nos identificamos com a protagonista e com o desejo dela.

- Muito boa a transição da Julieta jovem pra Julieta mais velha!

- SPOILER: Não faz o menor sentido a Antía abandonar a mãe sem explicação. Ninguém faz isso. O filme se propõe a focar em personagens, relacionamentos, mas ele não parece entender nada sobre seres humanos. Os personagens soam distantes e falsos.

- SPOILER: A Antía culpa a Julieta pela morte do pai? Bom, pra começar ela está totalmente enganada. Mesmo assim, se ela fosse tonta a ponto de abandonar a mãe por causa disso e não dar notícias por 12 anos, as coisas não teriam acontecido dessa forma. A Julieta certamente saberia o motivo da revolta da filha. Não iria descobrir isso mais de uma década depois. É uma história falsa que serve apenas transmitir um Senso de Vida negativo: dar uma ideia de que os seres humanos são incompreensíveis, as relações complicadas, a vida cheia de tragédias inesperadas e inevitáveis (doenças, afogamentos, abandonos, atropelamentos..), etc.

- SPOILER: Pra piorar o filme acaba sem dar essa mínima satisfação pro espectador de mostrar as 2 se reencontrando e o desfecho da história.

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CONCLUSÃO: Almodóvar continua um bom diretor, mas vem se tornando um roteirista cada vez mais tedioso.

Julieta / Espanha / 2016 / Pedro Almodóvar

FILMES PARECIDOS: Os Amantes Passageiros / Abraços Partidos

NOTA: 4.5

segunda-feira, 11 de julho de 2016

A Era do Gelo: O Big Bang

NOTAS DA SESSÃO:

- Péssima a sequência inicial do Scrat no espaço. Se fosse tudo um sonho ainda seria aceitável, mas isso ser realmente a premissa do filme é ridículo. E por que o filme se chama o "Big Bang" se a história é sobre um asteroide? O "bang" seria o impacto do asteroide na terra?

- O humor é muito primitivo e se resume a personagens desesperados gritando o tempo todo.

- Herói Envergonhado: não há protagonista, todos os personagens são losers, sidekicks, etc.

- O desejo dos personagens não é interessante... Eles só querem "não morrer". E como eles vão fazer pra impedir o asteroide de bater na Terra? Não consigo imaginar uma série de ações que eles possam tomar pra atingirem o objetivo.

- O plano da doninha não faz o menor sentido (usar ímãs pra atrair o asteroide). Como eles vão lançar os cristais no espaço? Vão usar o disco voador do Scrat? E qual a necessidade dessa tempestade elétrica que vem de Júpiter? Desde o começo o filme apresenta uma ideia burra atrás da outra. Não é porque um filme é infantil que ele não pode ser inteligente.

- As sub-tramas também não são nada interessante (os dinossauros voadores atrás deles, o conflito do pai com a filha). O futuro genro é tão bobo que eu não torço nem pelo casamento, nem pela aproximação dele com o pai.

- Mais ideias horríveis: o coelho massagista que vive dentro do asteroide, a Shangri-Lhama, a Preguiça que consegue destruir o asteroide inteiro só por tirar um cristal da parede, a ideia dos bichos não envelhecerem lá dentro, o plano de colocar os cristais dentro do vulcão... É como se o filme estivesse de propósito tentando criar a história mais ridícula possível. E isso tem tudo a ver com o conceito de Herói Envergonhado e Idealismo Corrompido. É uma forma do filme dizer pra plateia: "Viram, isso tudo não passa de um besteirol infantil... Aventura, inteligência, salvar o mundo - nós não acreditamos nessas tolices".

- Final péssimo. A sub-trama do casamento da filha nada tinha a ver com a principal do asteroide. A do Scrat também. O filme não tem nenhum senso de unidade estética. E esse final clichê com música alegre e todo mundo dançando também não dá mais.

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CONCLUSÃO: Lixo comercial oportunista sem um pingo de autenticidade.

Ice Age: Collision Course / EUA / 2016 / Mike Thurmeier, Galen T. Chu

FILMES PARECIDOS: Angry Birds: O Filme / Cada Um Na Sua Casa / Minions / Os Croods

NOTA: 3.5

sexta-feira, 8 de julho de 2016

Florence: Quem É Essa Mulher?

NOTAS DA SESSÃO:

- Meryl consegue cativar no primeiro segundo em que surge na tela - ela pendurada no teatro com uma expressão totalmente fora do contexto da cena, deixando transparecer a vaidade e a ingenuidade da Florence. Que papel incrível pra ela... Interpretar uma péssima intérprete, mas fazendo isso com talento!

- Produção de bom nível: figurinos, direção de arte, etc.

- Já o ator que faz o pianista é um desastre! Parece estar forçando trejeitos e um tipo de personalidade que não tem nada a ver com ele. Toda vez que ele aparece eu saio da história. Atores têm que encontrar o personagem dentro da natureza deles, e não tentando ser uma pessoa totalmente diferente.

- Acho demais as reações da Meryl quando alguém elogia o talento dela - em vez de agradecer como uma profissional acostumada com isso, ela fica envaidecida e disfarça, como uma criança. A caracterização da personagem é incrível. Existe muita gente assim na vida real, que se ilude em relação às próprias virtudes. Acho que todos nós temos um pouco disso em alguma área, mas Florence leva essa falta de sensatez ao extremo.

- Hilária a primeira aula de canto da Florence. Meryl dá show. E o melhor é a maneira como o professor encontra pra fazer ela se sentir bem sem ter que mentir que ela canta bem: ele diz que ela é "única", "autêntica", que "nunca estará mais pronta"!

- Roteiro muito bem escrito. O desejo da Florence é bem estabelecido: ser uma grande soprano. E o do Hugh Grant também: não deixar que ela descubra a verdade. A narrativa vai se complicando e caminhando em direção ao clímax inevitável: o momento onde Florence terá que se deparar com os fatos.

- O filme poderia ser mais rico psicologicamente, revelando por que Meryl precisa viver essa ilusão... Qual a necessidade inconsciente por trás disso (como em Crepúsculo dos Deuses, onde a protagonista não quer aceitar a passagem do tempo).

- Eticamente a situação é interessante. Hugh Grant está fazendo mal em não dizer a verdade? Será que ela suportaria a verdade? Ou é como um paciente à beira da morte, que tem mais chances de sobreviver se for iludido pelo médico?

- Divertida a reviravolta dela fazer sucesso no rádio (por ser péssima), e depois o Hugh Grant tentando convencê-la a não se apresentar no Carnegie Hall, pois seria demais pra ela. A resposta dela é assustadora e fascinante - ela imediatamente descarta o "pessimismo" dele citando exemplos de pessoas de sucesso: "Se Fulano tivesse escutado pessimistas como você, ele não teria chegado onde chegou!" - coisa que toda pessoa ambiciosa se diz, só que nesse caso ela está totalmente enganada em não ouvir o pessimista (que na verdade está apenas sendo realista).

- Ótima a cena da apresentação no Carnegie Hall! As coisas que ela faz com a voz, com o corpo, as expressões faciais, ela cantando a Rainha da Noite... Palmas pra Meryl!

- SPOILER: O clímax é bom (ela lendo a crítica no jornal, desmaiando, etc), embora a reação dela e a "moral" final da história sejam meio previsíveis.

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CONCLUSÃO: História divertida, bem contada, com uma performance memorável da Meryl Streep.

Florence Foster Jenkins / Reino Unido / 2016 / Stephen Frears

FILMES PARECIDOS: Julie & Julia / O Discurso do Rei / Walt nos Bastidores de Mary Poppins / Ed Wood / Crepúsculo dos Deuses

NOTA: 8.0

domingo, 3 de julho de 2016

Porta dos Fundos: Contrato Vitalício

NOTAS DA SESSÃO:

- A produção no começo parece barata. Quiseram colocar os personagens no festival de Cannes, em festas glamourosas, mas parece que eles não tinham dinheiro pra recriar essas locações de maneira convincente.

- Fábio Porchat e Gregório Duvivier funcionam muito bem e os dois têm uma ótima química (seria difícil errar nisso depois de tantos vídeos do Porta dos Fundos!).

- Divertida a maneira em que o filme zomba da cultura - a namorada ridícula do Fábio Porchat, etc. E muitas das piadas são "internas", pra pessoas que trabalham com roteiro, cinema, TV, que conhecem figuras do meio aqui no Brasil, histórias, fofocas, etc. O filme faz um equilíbrio legal entre piadas escrachadas que todo mundo entende e essas mais sofisticadas que apenas um ou outro irá pegar.

- Curioso que o filme tira sarro tanto dos filmes de arte pretensiosos e anti-comerciais, quanto dos filmes comerciais de baixa qualidade (interpreto isso como uma rejeição da dicotomia "arte vs. entretenimento", mas de repente eles só querem zombar de tudo e de todos).

- A história do contrato vitalício não parece tão fundamental pra trama. O Fábio Porchat parece estar fazendo o filme mais por causa da amizade do que por estar sendo forçado.

- Não gosto de comédias cheias de referências a atualidades e coisas regionais (piadas com Snapchat, Anitta, etc.). Torna tudo meio vulgar e descartável. Quem assistir ao filme em outro lugar ou época não vai ver nenhuma graça nessas coisas.

- A história vai ficando cansativa depois que começam as filmagens. Não dá pra acreditar que esse diretor realmente está produzindo esse filme, então o universo todo começa a ficar falso. Não dá pra embarcar na brincadeira. Não é como em Primavera para Hitler ou Saneamento Básico, o Filme, onde existe uma desculpa plausível pra uma produção tosca estar sendo feita. Estou mais curioso em saber o que houve com o Gregório Duvivier nesses 10 anos do que em acompanhar a produção do filme (embora algumas piadas sejam divertidas, como a da preparadora de elenco, o merchandising da "Oi", etc.). Essas filmagens renderiam uma boa sequência, mas não sustentam metade do filme.

- Não faz sentido essa transformação do personagem do Fábio Porchat no final. Ele tendo um surto, dizendo que virou um babaca, como se estivesse arrependido. Não é esse o arco do filme, se é que existe um. Ele é inocente, está apenas sofrendo nas mãos de pessoas malucas. Nada disso é culpa dele.

- A história do Gregório Duvivier usar o contrato vitalício pra parar o sangramento do Fábio Porchat também não faz sentido (prático ou simbólico).

- SPOILER: Final insatisfatório. Não ficamos sabendo qual o destino do filme (se acabou fazendo sucesso - o que seria uma cópia de Primavera para Hitler), também não ficamos sabendo da história dos aliens, etc.

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CONCLUSÃO: História fraca, mal contada, mas o filme serve como entretenimento passageiro por causa das diversas piadas e da química entre os atores principais.

Brasil / 2016 / Ian SBF

FILMES PARECIDOS: Entre Abelhas / Saneamento Básico, o Filme

NOTA: 5.5

Story: Substância, Estrutura, Estilo e os Princípios da Escrita de Roteiro

Sabem a cena do filme Adaptação que eu postei recentemente? Brian Cox está interpretando o Robert McKee, autor do livro Story: Substância, Estrutura, Estilo e os Princípios da Escrita de Roteiro, que é considerado a Bíblia dos roteiristas. Conhecia McKee por sua reputação, mas nunca tinha parado pra ler o livro. Sempre fui mais familiarizado com o trabalho do Syd Field, outro professor de roteiro bastante respeitado em Hollywood e que segue princípios parecidos com os de McKee. Ainda não terminei de ler Story, mas já deu pra ver que ele é superior, mais completo, sábio e profundo do que os livros do Syd Field. O apelido de "Bíblia dos roteiristas" não surgiu à toa, e eu realmente indico pra quem quiser entender melhor sobre os alicerces do cinema.

A dúvida que fica é: com todo esse conhecimento disponível pra qualquer um ler, e o livro sendo uma das maiores referências em Hollywood há tantos anos, como é que o cinema e a arte da história estão em declínio? McKee diz no livro:

"Não existe nenhuma conspiração pra manter ocultas as verdades da nossa arte. Nos 23 séculos desde que Aristóteles escreveu Poética, os "segredos" da história são tão públicos quanto a biblioteca da esquina."

É como economia. Já se sabe há muito tempo o que é que faz uma sociedade progredir ou regredir. Ainda assim, ano após ano vemos as pessoas tomando decisões que vão contra o progresso. Mais um indício de que no fim das contas é filosofia que guia uma cultura. E se a filosofia está em mau estado e toma um determinado rumo, todo o conhecimento que não sirva ao seu propósito acaba sendo ignorado.

A versão em inglês do livro eu comprei pelo Kobo por pouco mais de R$6,00.