sexta-feira, 30 de junho de 2017

O Jardim das Aflições

NOTAS DA SESSÃO:

- O documentário tem algumas boas imagens, e o fato de se passar nos EUA dá um ar mais sofisticado pra produção.

- Discordo dele que o trajeto natural da humanidade seja o de querer abandonar o mundo real e viver num mundo falso de pensamento; ou que viver no meio do mato seja viver no mundo real e viver na cidade seja viver num mundo irreal. Quer dizer que pra vida ser real o homem não pode usar sua razão? Não pode interferir na natureza pra sobreviver, ter uma vida melhor (como se a inteligência humana fosse um pecado, algo fora da natureza)?

- Discordo que a liberdade tenha diminuído no mundo por causa da tecnologia (pois agora podemos ser vigiados à distância pelo governo, etc). Se há menos liberdade, ele deveria enfatizar questões mais concretas, como as tendências autoritárias dos governos. Apelar pra conspirações tira credibilidade da discussão.

- Olavo é contra o crescimento do estado, o que acho bom. Mas não gosto como ele diz que esse crescimento é inevitável, como se fosse um fato irreversível da natureza. Então como é que alguns países são mais livres hoje do que eram há 100, 200 anos? Ele não aponta possíveis soluções. Parece achar cool essa postura de intelectual pessimista.

- Discordo que seja mais importante saber a origem das ideias do que os fatos que a suportam; que a gente temos que saber de onde um pensamento veio, se não estaremos sendo controlados por movimentos culturais. O que torna uma ideia válida é sua correspondência à realidade... Não importa quando ou por quem ela foi concebida. Isso parece paranóia, medo de estar sendo controlado. Há um senso de medo e perseguição por trás de tudo o que ele fala.

- Outro problema de Olavo é que ele não é claro e lógico em seu raciocínio. Vai apenas divagando sobre uma série de assuntos, se apoiando em sua enorme biblioteca pra parecer uma autoridade no que fala, mas sem explicar suas ideias claramente, sem estruturá-las. Por exemplo: ele começa a falar sobre hereditariedade, sobre o fato de nascermos com certas características que não podemos mudar. Qual o propósito dessa observação? Ele está falando sobre livre arbítrio? Sobre a felicidade humana e o que podemos fazer para atingi-la? Ele acredita que a felicidade seja o propósito da vida? Não sabemos... Não há um contexto claro, um propósito por trás da observação, são apenas "verdades" que ele vai jogando aleatoriamente. Mesmo as coisas que eu concordo com ele, não tenho como saber se concordamos pelos mesmos motivos, pois ele não explica o motivo dele acreditar naquilo. Ele é contra o estado por que? Ele acredita na liberdade? Nos direitos individuais? É a favor do livre mercado? Ele nem toca nesses termos. Só sabemos que ele é contra a esquerda por algum motivo.

- Divertida a passagem onde ele diz que costuma atrair malucos (fato que não me surpreende). Na vida pessoal ele não parece ser alguém desagradável.

- Um absurdo um homem que se diz interessado no conhecimento, na realidade, dizer que o cristianismo é totalmente baseado em fatos, e que não há dúvidas que Jesus ressuscitou, que milagres existem, etc. Não há nenhum esforço da parte dele de argumentar a favor disso, dar exemplos convincentes pra persuadir a plateia de forma honesta. Ele simplesmente afirma as coisas e acrescenta "evidentemente" às frases pra dar a sensação de algo óbvio.

- Outro absurdo é o trecho em que ele diz que ideias são como tábuas de salvação que os náufragos se agarram pra não afundarem, e que as ideias mais verdadeiras e importantes são aquelas que permanecerão com a gente até o momento da morte. Isso é puro subjetivismo. O fato de uma ideia te confortar no momento da morte não a torna real. Isso é uma tentativa de validar a religião. Ou seja: como na hora da morte ele precisará da religião pra amenizar seu medo (mais uma vez o medo parece estar ditando as crenças de Olavo), então a religião pode ser considerada a ideia mais verdadeira de todas! Não porque ela corresponde aos fatos e porque é necessária para a sobrevivência... Mas sim porque ela é necessária na hora da morte! A vida pra ele é como se fosse uma longa preparação para a morte.

- Todo esse papo sobre a imortalidade também não faz o menor sentido. A ideia de que se uma folha balança numa árvore, isso é um fato "eterno" que nunca poderá ser desfeito... Isso significa que eu sou imortal só pelo fato de existir? É claro que o fato de que eu existo agora nunca deixará de ser um fato. Mas como essa ideia poderia me confortar? Vai impedir que eu morra? Me torna alguém "importante" automaticamente, mesmo que eu tenha uma vida medíocre? Não... Mas talvez seja um truque mental que possa diminuir meu medo na hora da morte, então pra ele, isso já é o suficiente pra acreditar na ideia.

O Jardim das Aflições / Brasil / 2017 / Josias Teófilo

NOTA: 4.0

Okja


(Esta crítica está no formato de anotações - em vez de uma crítica convencional, os comentários a seguir foram baseados nas notas que fiz durante a sessão - um método que adotei para passar minhas impressões de forma mais objetiva.)

ANOTAÇÕES:

- Alerta Vermelho: o discurso inicial da Tilda Swinton passa a ideia de que a indústria e empresários em geral são maus.

- Fofa a Okja, bonitos os efeitos especiais e as locações no começo do filme.

- Mas péssima a tentativa de tornar a criatura simpática dando um close em seu ânus e mostrando fezes saindo por todos os lados (a ideia do filme de "humanizar" um personagem).

- Auto-sacrifício: o filme acha positivo o fato da Okja se jogar do penhasco pra salvar a Mija, como se isso a tornasse um ser melhor (fezes, auto-sacrifício - observem as estratégias que o filme está usando pra tornar Okja uma criatura gostável).

- Performance mais ridícula da carreira de Jake Gyllenhaal. Só o fato do filme escalar um ator tão charmoso quanto ele pra agir de forma constrangedora em frente às câmeras já diz algo a respeito da atitude da produção.

- Por mais triste que seja separar a garotinha de Okja, não dá pra torcer pra que ela invada a empresa, resgate o animal, pois ela estaria cometendo um crime. Okja não é dela, apesar do apego emocional. Se ela tivesse propondo uma negociação amigável, tudo bem, mas ela já chega estilhaçando o vidro da empresa, fazendo vandalismo, etc.

- Todo o conflito é forçado, feito pra gerar confusão, só pra tentar provar a mensagem mal intencionada do filme. Se Okja estava sendo criada pra ser um animal especial, que iria participar de concursos de beleza, etc, ela teria sido criada de fato no meio do mato, sem cuidados especiais? Num lugar que seus "donos" criariam apego por ela ao longo dos anos? E Okja viraria comida assim como os outros super-porcos comuns? O simples fato de Okja ser uma "celebridade" já não impediria a empresa de abatê-la?

- Esses ativistas da Liberação dos Animais são criminosos e o filme os retrata de maneira positiva, como se eles fossem os mocinhos. Eles batem no caminhão da Mirando, causam acidentes, apontam armas contra pessoas inocentes, roubam a propriedade da empresa - mas tudo é válido pois é por uma "boa causa". A narrativa não funciona pois não dá pra torcer nem por eles, nem pela garotinha.

- A empresa coloca Okja pra cruzar com outro super-porco, e a cena é mostrada como se Okja estivesse literalmente sendo estuprada!!! Uma prova de que a empresa abusa dos animais (e uma crítica ao machismo talvez??)! Ridículo.

- Paul Dano (o ativista) se mostra uma "ótima" pessoa quando espanca violentamente o amigo por ter traduzido errado o que a garotinha falou. E por que o Paul Dano dá todo esse poder pra Mija de decidir qual o destino de Okja? Se o animal não é da empresa (segundo ele), então teoricamente Okja deveria ser do pai da Mija, e não da Mija que é uma criança - e o pai autorizou que Okja fosse devolvida pra empresa.

- A empresa corta pedacinhos de Okja pra eles provarem sua carne? Antes do concurso de beleza? E as cicatrizes? Obviamente isso não aconteceria (existem milhares de outros super-porcos, e a carne já está sendo produzida em grande escala) - mas claro, o filme precisa provar seu argumento de que os empresários e cientistas são malignos e gostam de torturar criaturas fofas! Como se o fato da humanidade comer carne fosse culpa da indústria, do "consumismo", e não algo que sempre ocorreu em todas as culturas por toda a história.

- Os ativistas são tão "benevolentes" que quando eles invadem a propriedade da empresa e estrangulam os guardas, um deles diz pro guarda: "Eu sinto muito por isso, esse não é um estrangulamento letal"!!!! (Não, isso não é uma piada.)

- SPOILER: No fim Mija consegue comprar de volta a Okja oferecendo ouro pra Tilda Swinton? Por que venderam pra ela agora e não pro pai no começo do filme, que tentou a mesma coisa? E isso é um final "feliz"? Ou o "mal" (a empresa) venceu? Okja voltou pra casa, mas os ativistas não conseguiram parar o consumo de super-porcos. Os outros todos serão mortos. Se o filme fosse apenas sobre a amizade entre Mija e Okja, bastaria as duas ficarem juntas no fim pra haver um final feliz. Mas claramente o filme queria passar uma mensagem maior, pró-vegetarianismo, direitos dos animais, etc. Então esse "final feliz" onde Okja é salva porém milhares de outros super-porcos são mortos acaba tendo um tom inapropriado e inconclusivo.

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CONCLUSÃO: Uma história tola pra te dizer que, se você come carne, você é imoral e inferior aos realizadores do filme (apenas carne vermelha - peixe aparentemente está liberado pois a protagonista pesca no começo do filme e não é retratada negativamente por isso).

Okja / Coréia do Sul, EUA / 2017 / Bong Joon-ho

FILMES PARECIDOS: Zootopia (2016) / Expresso do Amanhã (2013) / Como Treinar o Seu Dragão (2010)

NOTA: 2.5

terça-feira, 27 de junho de 2017

Twin Peaks - Episódio 8

Não é longa mas foi uma das melhores coisas que vi nos últimos anos. David Lynch certamente não é pra todos os gostos, e essa nova temporada de Twin Peaks até agora estava dividindo um pouco as opiniões dos fãs, mas quem curte seu estilo não pode deixar de chegar até (pelo menos) esse 8º Episódio, que é possivelmente uma das horas mais inspiradas de sua carreira.

Não importa a arte, o gênero, o estilo... Ver um artista se superando (ainda mais aos 71 anos de idade) e criando algo realmente extraordinário como Lynch faz aqui é algo que sempre me tira o fôlego.

domingo, 25 de junho de 2017

Ao Cair da Noite

NOTAS DA SESSÃO:

- Fortíssima a sequência inicial (eles tendo que sacrificar o pai da Sarah). Pra quem ainda não sabe sobre o que é a história (como eu), é um início intrigante que levanta uma série de perguntas e gera curiosidade.

- Tudo no filme soa bastante autêntico, autoral, a direção soa "simples" e (talvez por isso) diferente da maioria dos filmes atuais. A fotografia é ótima - os planos mais abertos, sem muitos cortes - há uma qualidade orgânica na imagem que dá a impressão que o filme foi rodado em 35mm (o que eu duvido), e que acaba remetendo a produções dos anos 70/80 (a locação na floresta ajuda também).

- O protagonista (Joe Edgerton) não é um personagem muito gostável - a atitude dele em relação ao invasor (Will) é excessivamente violenta, e mesmo a relação dele com a própria família é meio dura e desagradável.

- Depois que as 2 famílias se juntam na casa e começam a conviver, a história dá uma estacionada. Falta uma ameaça mais específica, algo pro espectador temer, pros personagens buscarem. Dá a impressão que nem monstro vai ter no filme. Que vai ser apenas um filme sobre pessoas confinadas numa casa (tipo Rua Cloverfield, 10). O problema é que nenhum dos personagens é muito gostável e não há nada de divertido pra aguardar na história. O filme é totalmente focado em relações conflituosas. Um grupo não confia no outro, todos são ameaças em potencial, o filme insiste o tempo todo em criar situações desagradáveis entre os personagens: o filho adolescente sendo inconveniente ao dar em cima da mulher do Will, ou então quando ele corre pra floresta atrás do cachorro e leva uma dura do pai, ou quando os 2 homens vão tomar um drink (e quase surge um clima de amizade), mas tudo é arruinado com a mentira que o Will conta a respeito do "irmão", ou a porta vermelha que aparece aberta e cria um clima de medo e desconfiança entre todos. Ninguém vivencia nada de positivo na história do começo ao fim. É só um retrato de gente paranóica, obcecada por segurança, vivendo numa situação horrível pra não serem infectadas por algo que nem sabemos o que é.

- Se formos pensar, a premissa não é muito realista e parece ter sido criada só pelos problemas que iria causar (juntar as 2 famílias na mesma casa, etc). No começo do filme, o Will invadiu a casa pois achou que ela estava vazia. Mas o cachorro latiu dentro da casa enquanto ele tentava arrombar a porta. Como ele achou que ela estava vazia? Por que ele invadiu a casa então se sabia que tinha gente dentro e estava correndo perigo?

- SPOILER: Quando eles começam desconfiar que o filho pequeno do Will pode estar infectado, eles deviam simplesmente expulsar a família da casa, e assim ficaria tudo bem. Mas não: eles decidem permanecer juntos, e claro que não dá certo. O final todo é apenas uma desculpa pra mostrar violência. Não faz nenhum sentido toda essa matança, é um conflito forçado que só serve pra expressar o senso de vida negativo do cineasta - como se tragédia e brutalidade em si fossem sinal de sofisticação, maturidade artística.

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CONCLUSÃO: Bem dirigido, autêntico, bonito visualmente, mas a história é pouco divertida e excessivamente focada no negativo.

It Comes at Night / EUA / 2017 / Trey Edward Shults

FILMES PARECIDOS: O Homem nas Trevas (2016) / Rua Cloverfield, 10 (2016) / A Bruxa (2015) / Ex_Machina: Instinto Artificial (2014)

NOTA: 5.5

sexta-feira, 23 de junho de 2017

O Círculo

NOTAS DA SESSÃO:

- É tudo meio esquisito desde o começo. A primeira cena é a Emma Watson num caiaque, daí ela olha o telefone não se sabe por que, depois conhecemos o trabalho dela, depois tem a cena em que o carro quebra e é introduzido um interesse romântico com o Mercer, daí surge o tema do pai doente... Tudo isso em menos de 10 minutos, e nem sabemos ainda sobre o que é o filme, o que é o Círculo, qual o objetivo da menina, etc.

- Boa a entrevista que ela dá quando chega no Círculo. Mostra uma garota sofisticada, inteligente, sensata.

- É interessante a maneira como O Círculo é apresentado. À primeira vista o lugar impressiona, a protagonista parece estar interessada, mas pra plateia já fica uma sensação de que há algo de errado com a filosofia da empresa (a nova câmera que eles inventaram, etc), o que cria um interesse central na história (queremos saber quando a Emma Watson irá descobrir que o lugar é "do mal", e quando tudo entrará em colapso).

- O tom do filme sempre parece um pouco errado. A relação da Emma com os pais não convence, a maneira forçada como ela aborda o rapaz negro na festa, a cena "cômica" onde os 2 funcionários abordam ela no trabalho e começam a fazê-la socializar mais, etc.

- Meio falso o John Boyega ser o tal do Ty Lafitte, alguém extremamente importante, e viver dentro do Círculo sem que ninguém saiba. Parece estranho também ele ter que convencer a Emma Watson de que a empresa está indo pelo mau caminho. Ela já deveria ter sacado isso por conta própria (tanto que achou um absurdo a ideia de implantar chips nos ossos de bebês, etc).

- A mesma coisa quando o Mercer vai até o Círculo conversar com ela: ele dá uma "dura" nela como se ela tivesse mudado de caráter, estivesse "possuída" pelo Círculo, mas pra plateia ela ainda parece perfeitamente normal. Não fez nada de estranho ao publicar a foto do trabalho dele.

- Péssima a cena do acidente de caiaque! Por que ela sai de caiaque no meio da noite? Invade o lugar? O acidente todo é muito mal filmado / dirigido.

- A personagem começa a perder toda a simpatia do público (e a verossimilhança) quando começa a se "vender" pro Tom Hanks, apoiar as ideias dele, faz aquele discurso ridículo no Círculo sobre "direitos humanos", etc. Uma personagem tão equilibrada como ela se mostrou no começo jamais mudaria assim de uma hora pra outra. A gente perde toda a conexão com a história.

- E a crítica do filme é mal feita. Essa ideia de acabar com a privacidade de todo mundo nunca seria aceita pelas pessoas normais. Já não está dando certo até dentro do Círculo, com apenas a Emma Watson expondo sua vida. Imagine isso aplicado à população inteira. Em Black Mirror há uma discussão parecida sobre privacidade, mas lá a situação assusta e parece possível, pois mostra como pessoas mal intencionadas poderiam usar a tecnologia moderna pra invadir sua vida... Mas não tenta criar um mundo fictício onde a própria população seria a favor do fim da privacidade.

- As pessoas ficam dizendo pra Emma Watson que ela é incrível, que ela está mudando o mundo. O que ela fez de tão revolucionário até agora? Expor a própria vida online como tanta gente já faz? Ter a ideia das eleições acontecerem através da conta do Círculo? Não vimos nada de genial até agora que justifique todo esse status.

- SPOILER: Divertido o Mercer morrer, embora seja forçada a maneira como todos saem correndo atrás dele - até parece que a Emma Watson (e a empresa) deixaria as coisas chegarem a esse ponto. E essa morte acaba criando um anticlímax... Já aconteceu o pior que poderia acontecer no filme e ainda falta meia hora pra acabar. Pra onde a história poderá ir depois disso?

- SPOILER: A gente espera que depois da morte do Mercer a Emma Watson finalmente "acorde" e faça algo pra destruir a empresa... e por um momento dá a impressão que é isso que ela está fazendo (quando parece estar desmascarando o Tom Hanks em público, etc). Mas depois é confuso... Em vez de desmascarar o Tom Hanks, fica a impressão de que ela estava de fato acreditando na ideia de que com o fim da privacidade as coisas irão melhorar; que ela continua apoiando O Círculo. É certamente um dos piores finais de filme que eu já vi.

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CONCLUSÃO: Começa com uma premissa interessante, mas o roteiro se perde completamente da metade pra frente.

The Circle / Emirados Árabes Unidos, EUA / 2017 / James Ponsoldt

FILMES PARECIDOS: A Cura (2016) / O Doador de Memórias (2014) / Ender's Game: O Jogo do Exterminador (2013) / A Hospedeira (2013)

NOTA: 3.5

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Colossal

NOTAS DA SESSÃO:

- Anne Hathaway fica sempre bem fazendo essas garotas meio losers, perdidas na vida (e ao mesmo tempo atraentes, divertidas).

- O filme começa com um tom excêntrico, uma mistura incomum de gêneros, diálogos e personagens divertidos. Prende a atenção simplesmente por ser absurdo - queremos saber a relação do monstro do prólogo com o resto da história, coisas que parecem completamente incompatíveis.

- Hilário a Anne vendo as notícias de Seul, e toda a sequência em que ela começa a descobrir sua relação com a criatura. A premissa é absurda, mas como a abordagem é cômica, acaba convencendo (lembra coisas do Spike Jonze). Só espero que haja um significado maior pra isso tudo, não seja apenas bizarrice pela bizarrice.

- Uma coisa estranha no filme é que ele tem uma linguagem absolutamente convencional. Nada no visual, nas performances, na fotografia, na direção, na trilha sonora sugerem um filme excêntrico. Apenas os acontecimentos do roteiro. Quando você vê um filme de um autor realmente excêntrico, mesmo que a história seja normal, essa característica acaba se revelando na obra em diversos elementos, pois tudo está sendo decidido por uma pessoa que realmente pensa de forma única e diferente. Aqui fica parecendo um cineasta cult "wannabe".

- A história é interessante até o momento em que a protagonista descobre que controla o monstro, conta pros amigos, etc. Depois disso o roteiro perde a força e não sabe muito bem o que fazer com essa premissa.

- O que alcoolismo tem a ver com isso tudo? A conexão entre os diversos temas do filme não é clara.

- Os conflitos que vão surgindo entre os personagens não são muito sólidos e convincentes. Eles estão no meio de um evento inexplicável, com a vida de milhares de pessoas nas mãos, e ficam se desentendendo por causa de álcool, drogas, fazendo chantagens sem sentido. Não fica claro qual o tema do filme, o que está sendo discutido, e como a ideia do monstro em Seul se encaixa nisso tudo.

- Aos poucos o filme vai mostrando que não tem um grande conteúdo por trás da maluquice. Que o cineasta está apenas brincando de ser excêntrico, como se isso fosse um valor em si. A cena em que o Oscar explode fogos de artifício dentro do bar, por exemplo, não tem o menor sentido, exceto o de provar pra plateia o quão "diferente" é o filme.

- Por que Oscar quando criança destrói o trabalho da amiga? Qual a motivação por trás dessa agressão? O que isso diz a respeito da relação entre os dois? Falta desenvolvimento de personagem. Por mais que a história do monstro seja absurda, o filme deveria ser claro pelo menos no que ele quer dizer num nível humano / emocional.

- SPOILER: O final é uma tolice (Anne viajar pra Seul e de lá conseguir ficar maior que o robô, porém invisível - só na mente do roteirista isso deve ter qualquer lógica).

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CONCLUSÃO: Interessante pela originalidade, mas a excentricidade do filme não parece fundada em real talento e conteúdo.

Colossal / EUA, Canadá, Espanha, Coréia do Sul / 2016 / Nacho Vigalondo

FILMES PARECIDOS: Sete Minutos Depois da Meia-Noite (2016) / O Lagosta (2015) / Quero Ser John Malkovich (1999)

NOTA: 5.5

quarta-feira, 14 de junho de 2017

A Múmia

NOTAS DA SESSÃO:

- O prólogo todo é meio clichê e desinteressante (os flashbacks explicando a maldição da Princesa Ahmanet, etc). Há algo de estranho no conceito do filme - histórias sobre múmias, faraós, não parecem combinar com um filme que se passa nos tempos atuais, na Inglaterra, em guerras no Oriente Médio, etc (é tudo pra tentar enfiar a história nesse "Dark Universe" que a Universal inventou). O filme também tenta forçar um tipo de humor / alívio cômico nos personagens que remetem a filmes escapistas do passado, o que também não combina com o ambiente em que ele se passa. Pra ficar tudo ainda mais estranho, Tom Cruise parece errado no papel, como se o personagem tivesse sido escrito pra um adolescente interpretar (algo meio Shia LaBeouf em Transformers), e na última hora ele tivesse assumido o papel.

- Por que militares pegam o sarcófago da múmia, colocam num avião, como se fosse uma operação de guerra? Dá a impressão que só inventaram isso pra ter a cena da queda do avião e o Tom Cruise poder fazer os "stunts" que ele adora. Mas não faz muito sentido.

- A química entre o Tom Cruise e a mocinha (Jenny) não funciona em nada. Ele parece estar tentando agir como um galã novinho, e ela com essa aparência não convence em nada como uma arqueóloga séria realizando o trabalho de sua vida.

- Tudo é meio falso. Tom Cruise sofre uma queda de avião, depois é surpreendentemente encontrado vivo no necrotério, e as pessoas reagem como se fosse uma questão de "sorte"? No dia seguinte ele está no bar com a Jenny tomando uns drinks de forma descontraída? Daí no local da queda de avião, a múmia é encontrada à noite por 2 policiais que passavam por ali... Cadê os bombeiros, os helicópteros, a mídia, etc?

- Coincidências ruins: por que a tumba na Inglaterra (nas escavações do metrô) é encontrada praticamente ao mesmo tempo em que a múmia no Iraque?

- Péssima a ideia de transformar o Vail numa espécie de fantasma / zumbi engraçado que aparece pro Tom Cruise no espelho, etc. De repente o filme parece ter virado uma comédia explícita. Há um sério problema de tom no filme (além do "tom do Tom").

- Odeio essa mistura de filme de monstro com filme de visões, alucinações. Tom Cruise de repente começa a viajar mentalmente de um lugar pro outro, não sabemos mais o que é real e o que é imaginação, o que só ele vê e o que as outras pessoas também podem ver.

- A múmia não é nada assustadora como vilã. Ridícula a cena em que ela faz cócegas no Tom Cruise, depois ele brinca que ela está tentando dar em cima dele.. O filme não sabe inserir humor nos momentos certos, sem comprometer a seriedade da história.

- SPOILER: Além de múmias, fantasmas, zumbis, alucinações, agora temos também O Médico e o Monstro???? Que bagunça!!!!

- Horrível essa cena em que a múmia grita e todos os vidros começam a explodir, de repente surge uma tempestade de areia em Londres, Cruise é ajudado pelo amigo zumbi/fantasma... É uma ideia ruim após a outra.

- No momento de maior "tensão", Cruise simplesmente tapeia a múmia com uma brincadeira infantil, faz umas piadinhas, e rouba a adaga da mão dela.

- SPOILER: Toda a conclusão é péssima. Cruise se sacrificar pra ressuscitar a mocinha, como se fosse um romance épico pelo qual a plateia se importasse. E no fim o deus Set era tão fraco que simplesmente por Cruise ser um "bom homem", ele não se torna a personificação do mal como deveria.

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CONCLUSÃO: Simplesmente errado.

The Mummy / EUA / 2017 / Alex Kurtzman

FILMES PARECIDOS: Êxodo: Deuses e Reis (2014) / O Cavaleiro Solitário (2013) / Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo (2010) / A Lenda do Tesouro Perdido (2004)

NOTA: 3.5

sábado, 3 de junho de 2017

Real - O Plano por Trás da História

O filme passa a estranha sensação de ser algo feito pra ser exibido em faculdades, telecursos ou algo do tipo (a direção, os atores - é tudo meio antiquado mas tentando parecer moderno). Outro fator que enfraquece o filme é a falta de valores positivos na história. O protagonista tem um caráter duvidoso, é retratado de maneira ambígua. Ao mesmo tempo em que o filme o glamouriza, ele faz uma crítica à sua ambição (enfatizando seus aspectos negativos) que me parece inadequada pro propósito da história. Ao longo do filme surgem várias questões que deixam o espectador na dúvida de se Gustavo Franco fez bem de fato para o país, ou se é uma espécie de anti-herói. Você não sente que ele é alguém com um sonho nobre fazendo de tudo para realizá-lo (como você sente num filme como Steve Jobs, por exemplo) - fica mais a impressão de um homem de baixa autoestima buscando poder a qualquer custo, querendo subir na vida pra conquistar mulheres, controlar os outros (ele é fã de Napoleão, etc). É como se os produtores quisessem ter dado um tom meio House of Cards pro filme pra torná-lo mais "cool", porém isso acaba deixando tudo com um tom moralmente duvidoso. A estrutura do roteiro também é insatisfatória... O Real já "dá certo" bem no meio do filme, e a partir daí não há muito mais o que esperar... O filme termina num bate boca inconclusivo entre Gustavo e um petista durante a CPI, e fica a cargo dos letreiros finais explicar o que aconteceu depois. Teria funcionado melhor como documentário pois as pessoas por trás da produção pareciam estar mais interessadas no aspecto político / econômico do filme do que em fatores cinematográficos (como ficção não funciona nem como um bom filme, e nem serve pra esclarecer o Plano Real termos econômicos pro público leigo).

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(Brasil / 2017 / Rodrigo Bittencourt)

FILMES PARECIDOS: Margin Call - O Dia Antes do Fim (2011)

NOTA: 4.0

quinta-feira, 1 de junho de 2017

Mulher-Maravilha

NOTAS DA SESSÃO:

- Lindo todo o visual da ilha na primeira parte. Interessante a apresentação da personagem, o mistério a respeito de sua origem, Diana desde pequena querendo aprender a lutar, depois de grande começando a descobrir seus poderes especiais. Gal Gadot está simplesmente fenomenal.

- Ótima a sequência da batalha na praia. Visualmente atraente, dá uma dimensão real das forças e das fragilidades das Amazonas (elas podem ser mortas por balas, por exemplo - detalhes importantes de serem estabelecidos que quase todos os filmes de super-heróis ignoram).

- Chris Pine também está excelente como par da Gal Gadot. A história dele é interessante, bem introduzida (toda a mistura da guerra com esse elemento fantástico cria um contraste muito bem dosado).

- A Mulher-Maravilha em si não tem uma motivação muito interessante (como quase todos os super-heróis ela luta pois esse é o seu "dever"). Porém, como disse no vídeo Motivação de Personagem, o mais importante no fim não é a motivação do personagem, e sim a motivação da plateia. E aqui há vários elementos que geram curiosidade na história - a tensão romântica entre o casal, o desejo de ver a heroína explorar seu potencial (é tudo muito contido no começo), o fato dela esconder seus poderes dos humanos e ir revelando suas virtudes pros outros aos poucos, etc.

- Interessante quando a Gal Gadot flagra o Chris Pine pelado na banheira - há uma inversão de papeis divertida aqui: o homem sendo mais sexualizado, virando a figura mais vulnerável, e a mulher na posição de controle (como na cena do barco onde a Gal Gadot praticamente força o Chris a dormir junto com ela).

- Que alívio ver um super-herói que realmente honra a palavra "super". Quando ela escala a torre, pega a espada, começa a se preparar pra missão, a plateia realmente sente que não há limites pra força dela. Diferente da maioria dos filmes atuais do gênero que ficam se esforçando pra mostrar os defeitos do herói, acrescentar detalhes realistas pra tudo. Aqui, mesmo nas batalhas mais intensas, não temos a sensação de que a heroína está sendo danificada, perdendo sua força, ela brilha do começo ao fim.

- Princípio da Ascensão: O roteiro é muito bem estruturado. Estamos em 40 minutos de filme e a protagonista só agora vai pegar o barco e ir pro mundo real. Já aconteceu um monte de coisa interessante mas a sensação é que o melhor ainda nem começou. Em 1 hora de filme temos a primeira luta real dela sozinha no mundo real (na cena do beco).

- A relação entre o casal é ótima: a Gal Gadot sendo extremamente ingênua em relação a tudo e as reações divertidas do Chris Pine (ela falando da guerra como se tivesse indo à feira, as discussões sobre sexo, ela querendo tirar a roupa no meio da rua, etc). Amo a pureza da personagem, não há um pingo de malícia e cinismo nela. E ela parece estar se divertindo na história, não é desses heróis que agem como se a vida fosse trágica (e também não é dessas heroínas mulheres que precisam perder a feminilidade pra se provarem fortes).

- Algo atraente na produção é que a fotografia / direção de arte tem cara de cinema mesmo, e não de vídeo game.

- Outra coisa que gera interesse é a certeza dela de que o Ludendorff é Ares, o Deus da Guerra, algo que soa absurdo tanto pros outros personagens quanto pra plateia. Queremos descobrir se ela está certa.

- Fantástica a cena na guerra onde ela se "veste" pela primeira vez de Mulher-Maravilha e sai enfrentando os alemães (os detalhes lindos das faíscas em câmera lenta quando as balas atingem o traje dela).

- SPOILER: É divertida a sequência em que ela mata o Ludendorff com a espada (beira o politicamente incorreto), mas fica a sensação de que a balha foi muito simples, que ele não era páreo pra ela - frustração que é compensada logo na sequência, quando descobrimos que o vilão no fundo era outro. Agora sim ela parece ter um obstáculo à altura.

- Por sinal, a trilha sonora é ótima!

- O vilão é bom e a conversa que ele tem com ela é fascinante, faz o espectador pensar, questionar se ele está de fato errado, traz toda uma discussão filosófica sobre a natureza humana que aprofunda conflito. No meio disso Diana também aprende sobre suas origens, o que torna a personagem mais interessante, etc.

- SPOILER: Claro que não ia faltar a cena obrigatória de auto-sacrifício. Mas mesmo isso aqui é bem feito. Primeiro porque não é um auto-sacrifício fajuto, onde o personagem depois dá um jeito de sobreviver. Chris Pine decide morrer, e o faz sem hesitar e sem lamentar. Além disso, não foi uma morte inútil, só pra mostrar que o personagem é altruísta - na história, ela é fundamental pra vitória da Mulher-Maravilha, pois após esse ato, ela vê que as afirmações do vilão a respeito da raça humana não são verdadeiras - e assim consegue derrotá-lo. É um conflito de bem versus mal simples mas ao mesmo tempo muito bem elaborado e de certa forma inspirador.

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CONCLUSÃO: O melhor filme de super-herói de toda essa "era".

Wonder Woman / EUA / 2017 / Patty Jenkins

FILMES PARECIDOS: O Espetacular Homem-Aranha (2012) / Capitão América: O Primeiro Vingador (2011) / Supergirl (1984) / Superman: O Filme (1978)

NOTA: 8.5