sexta-feira, 14 de setembro de 2018

O Predador

Apesar do título dar a impressão de um reboot ou remake, essa na verdade é uma sequência de O Predador que reconhece a existência dos filmes de 87, 90 e 2010. O filme foi co-escrito e dirigido por Shane Black (de Beijos e Tiros e Homem de Ferro 3) que é conhecido por seu humor irreverente. Em vez de ser respeitoso em relação à franquia e manter um tom coerente com o dos outros filmes, Black decidiu reinventar a série, a transformando numa pseudo-paródia, mais ou menos como temos visto em filmes como Deadpool e Thor: Ragnarok. Ao fazer isso, na minha opinião ele arruinou o filme e o transformou numa grande fraude, que atrai o público sugerindo um tipo de coisa, e na prática entrega uma "anti-coisa".

Quem já leu minhas postagens sobre Anti-Idealismo e Idealismo Corrompido sabe bem do que estou falando, e não cometerá o erro de enxergar a atitude do filme como "irreverência", ou apenas um erro inocente de tom. Se trata de uma tentativa consciente de ridicularizar o gênero e tudo aquilo que nos remete aos filmes dos anos 80 - ou seja, tudo aquilo que o espectador deveria buscar quando vai ao cinema ver um lançamento como esse.

O filme usa 2 estratégias principais para essa ridicularização - a mais óbvia é o uso destrutivo de humor - que é inserido não pra aumentar o carisma dos personagens ou oferecer um alívio entre cenas mais dramáticas - mas pra diminuir a estatura dos personagens e a seriedade das cenas dramáticas. Não só os supostos heróis do filme são ridicularizados, como os próprios monstros são alvos de zombaria (em determinada cena, o Predador é descrito como uma "Whoopi Goldberg alienígena" por um dos coadjuvantes). É importante constatar que zombar do vilão dessa maneira é tão destrutivo quando zombar dos heróis. As 2 coisas buscam minar a seriedade da história, o tom épico da batalha. Filmes que são pró-heróis, pró-autoestima, investem um esforço enorme em também glamourizar os vilões, torná-los ameaçadores, imponentes, icônicos - afinal, não há muita graça em superar um obstáculo medíocre.

A outra estratégia de ridicularização é a do exagero - tornar algumas ações tão forçadas, tão ilógicas, que se perde toda a realidade da situação. Pegue por exemplo a personagem da bióloga - uma cientista exageradamente esperta, que está sempre deduzindo coisas que ela não teria a menor condição de saber. Quando a vemos, ainda no começo do filme, pegando uma espingarda e saindo correndo atrás do Predador, saltando em cima de ônibus em movimento (sem que ela tenha qualquer treinamento militar ou conhecimento especial sobre a criatura), isso não é feito pra gerar admiração pela personagem. É na verdade uma forma de tornar a cena propositalmente ridícula; gerar "admiração" apenas pelo cinismo do cineasta talvez, que está claramente se divertindo ao zombar dos "filmes tolos" dos anos 80 com Schwarzenegger, Stallone ou Sigourney Weaver, onde os protagonistas eram exércitos-de-1-homem-só e pareciam poder tudo. Ou seja, o filme não foi feito por alguém que respeita o Predador original, e sim por alguém que considera o filme meio ridículo - só que em vez então de torná-lo respeitável (de acordo com seus próprios critérios) o cineasta resolveu torná-lo mais ridículo ainda, exagerando justamente aquelas características que ele considerava tolas.

É uma pena, pois dá pra ver pelas entrelinhas que Black tem bastante habilidade e energia como cineasta (não me parece desses que abraçam o Anti-Idealismo como forma de ocultar a própria falta de talento). Fica a impressão que, se ele não estivesse tão comprometido com seu cinismo, ele teria sido capaz de fazer um filme respeitável (e respeitoso), no espírito do original.

The Predator / EUA, Canadá / 2018 / Shane Black

NOTA: 2.5

2 comentários:

Dood disse...

Essa forcação de colocar humor em filmes de terror me desagrada, me lembro uma vez que em The Walking Dead por conta da dublagem que comparava o Zumbi com a Bruxa do 71 me desagradou muito.

O humor mesmo dentro dessas produções deve passar o clima tenso delas, algo como um escapismo do protagonista visto o perigo real. Senão você acaba com tudo o que aquela situação representa.

Caio Amaral disse...

É Dood.. pouca gente consegue fazer essa distinção entre o humor bem intencionado, e esse outro que é voltado contra a própria obra..