terça-feira, 28 de março de 2023

John Wick 4: Baba Yaga


John Wick: Chapter 4 / 2022 / Chad Stahelski

Satisfação: 4

Categoria: IC

Filmes Parecidos: Trem-Bala (2022) / RRR (2022) / Batman (2022) / O Homem do Norte (2022) / O Protetor 2 (2022)

12 comentários:

Anônimo disse...

Eu dormi na parte 3 no cinema mesmo com todo aquele barulho. Não tem cafeína que me convença a ver 3 horas da parte 4.

Dood disse...

Eu nunca vi John Wick, mas é interessante ver tua análise e mostra que ele é um produto de uma demanda de um público masculino em crise. Como você cita a red pill ele é uma resposta a sociedade para os homens onde se cobram a responsabilidade e lhes tolhem o que eles produzem com opressão de minorias como feministas. Eu vejo o personagem como uma resposta a esse fenômeno social dos últimos anos. Não que seja positivo, mas que isso mostra um traço de um grupo social.

Quanto a esse lance de games, os mais comerciais apelam muito para músicas agitadas. Porém existem algumas exceções os quais eles tem um momento narrativo bem interessante. A indústria consegue surpreender em muitos momentos.

Caio Amaral disse...

Exatamente Dood.. é uma reação contrária à cultura da "lacração".. só que não orientada por valores positivos. O filme tem plena noção do seu público alvo, e lucra em cima desse ressentimento, da agressividade acumulada.. assim como muitos políticos/influenciadores têm que fazer pra ganhar fãs.

Caio Amaral disse...

A diferença é que o filme não ataca explicitamente as ideias da esquerda (como fazem políticos etc).. é através da celebração exagerada de valores opostos (armas, etc.) que ele passa seu recado.

Dood disse...

Exato, o que temos é um simbolismo em formato de filme. O que mostra uma cultura carente de uma narrativa envolvente que faça se identificar com esses valores, por que eles devem ser considerados ou celebrados. Ele é simplesmente exposto em "set pieces" artificiais que atendem a um nicho. O personagem não tem desenvolvimento ou vazio, ele não tá ali para criar conexão com o telespectador e sim atender a demanda de um nicho.

Rodrigo E. disse...

Vi nos cinema n sei pq, pois nem o primeiro John Wick que para mim é o único um pouco melhor eu gostei de verdade. Gostei de ter visto aquela cena no prédio de Paris, onde filmaram de cima. Mas acho que tirando a parte do estilo e que sempre que eu vejo um filme com o Keanu Reeves eu me sinto em boa companhia (deve ser reflexo do Point Break dele que adoro e assisti várias vezes), não tenho nada muito bom pra falar. Depois do filme eu fiz um exercício mental de imaginá-lo sem alguns dos personagens principais, e a minha conclusão 90% das vezes foi de que aquele personagem n faz a menor diferenca. Tudo é meio descartável.

Eu não sei se iria tão longe de tentar achar que John Wick é uma reacao a cultura da lacracao, eu acho que é tentar dar muito significado pra um filme que tem a intencao de ser simplesmente um "pornô", só que com armas no lugar do sexo, rs.

Entendo a comparacao que fazem de John Wick sendo gostável pelo público dos games. Acho que foi o criador do jogo Doom que uma vez disse que num jogo de vídeo game, a história é tão importante quanto num filme pornô. E Doom faz sucesso a cada novo lancamento, entao de fato existe um público que quer ver apenas aquilo que John Wick apresenta.

Eu faco parte do público de games, mas sou da parte que John Wick não agrada. Para mim tanto um filme quanto um game é movido pela história. E isso é perfeitamente possível (mesmo em retorno financeiro), um exemplo disso é Cyberpunk 2077 onde o próprio Keanu Reeves interpreta um dos protagonistas! Pena que John Wick não seguiu nessa linha, pq n nego que esse universo que eles tentaram construir tem seu charme e poderia criar algo bom. Consigo imaginar perfeitamente introduzir o personagem John Wick como uma lenda depois do primeiro filme, e desenvolver uma história secundária melhor daquele universo onde inevitavelmente as histórias se cruzam.

Caio Amaral disse...

Sim Dood.. é aquela noção de que o espectador não se conecta com valores, mas com alguém na tela que o "represente" em termos de grupo social, etc. Ou seja, um filme como este apenas reforça a lógica de que Hollywood precisa portanto produzir filmes com Pequenas Sereias negras, etc, pra atender os outros nichos que ficaram de fora.


Oi Rodrigo.. Sim, o visual e a presença do Keanu tornam o filme razoavelmente agradável de assistir.. mas como o roteiro é raso, acho que ele vai ficando meio repetitivo e vazio ao longo das 3 horas.

Quanto à reação à cultura lacração.. não estou dizendo que é algo consciente necessariamente.. mas há 30 anos não imagino um filme feito com a mesma atitude.. então o que permite que exista um filme assim hoje (e um público sedento por ele) é o clima da última década e tanto.. Mas talvez o filme só esteja sendo pragmático e querendo agradar um nicho que dará bastante retorno. E esse estudo acho que ele faz de forma consciente, pois são vários detalhes que se encaixam:

- o foco no público masculino que se sente excluído, alienado da sociedade
- que gosta de armas e de tudo que remeta a testosterona
- que vive num mundo meio virtual de games
- que despreza a sociedade atual por ter "tirado" tudo de bom e virtuoso deles
- inclusive a possibilidade de ter um relacionamento com uma mulher (as mulheres desejáveis estão no passado.. no filme vc só vê umas mulheres meio masculinizadas.. a única um pouco mais feminina é a DJ que o filme só mostra do nariz pra baixo, pois causaria até estranhamento uma energia muito feminina na tela)
- o personagem é cristão
- mas já não vê na instituição da Igreja um porto seguro, pois até ela foi corrompida (repare na cena em que o JW entra na igreja e o padre é um assassino disfarçado, e tira a arma de dentro da batina)
- então ele acaba achando apoio em outras filosofias também como o Estoicismo (o filme celebra essa coisa de se mutilar e não demonstrar dor)
- o filme celebra o homem rude, agressivo, de poucas palavras - o vilão, portanto, é o oposto; é bem nascido, da elite, frequenta o balé, é levemente afeminado, foge da batalha

quando penso no conservadorismo moderno (que é uma reação à esquerda em parte), vejo um "match" grande com esses elementos..

A analogia com filme pornô se encaixa bem mesmo hehe. No pornô, a nudez, o sexo, são um valor intrínseco pro espectador.. é aquilo que ele quer ver.. vc não precisa construir personagens, ter narrativa.. E em John Wick, as lutas e tiroteios parecem funcionar da mesma forma pra quem curte. abs!

Leonardo disse...

Olá, Caio.

Curioso tu não ter mencionado o teu texto sobre pseudo-sofisticação.

Caio Amaral disse...

Oi Leonardo! Tem filmes que reúnem múltiplos "pecados" do entretenimento hehe, daí eu busco me concentrar nos mais relevantes pra não tornar a crítica confusa demais.

Lá no texto teórico eu menciono que este fenômeno da Pseudo-Sofisticação seria da família do Idealismo Corrompido, porém os "pseudo-sofisticados" usam valores negativos com o propósito de parecerem complexos intelectualmente, um tipo mais elitizado de arte.. então costumo usar esse termo pra explicar aqueles filmes mais pretensiosos, tipo alguns do Nolan, Aronofsky, ou da A24.. O John Wick pode até ter uns toques disso, porém acho que ele está mais próximo do Idealismo Corrompido clássico.. o espectador não sai do filme com a falsa impressão de ter visto algo brilhante, inteligente (e que na realidade não é) e sim um entretenimento puro super bem produzido:

"Os Idealistas Corrompidos, em geral, querem apenas entreter, agradar o público, e inserem elementos Anti-Idealistas na obra pois eles refletem seus valores reais e os valores predominantes na cultura." Já no caso da Pseudo-sofisticação: "o desejo do artista é parecer inteligente, 'cerebral', ganhar créditos com a crítica..."

Meu problema maior com John Wick nem é tanto ele ser uma farsa, o diretor tapear o público pra parecer mais genial do que é.. e sim os valores negativos da história.. Pensando lá no diagrama ETHOS/LOGOS/PATHOS, não seria tanto uma trapaça no nível do ETHOS (autor), e sim uma má intenção no nível PATHOS (emoções e valores: autoestima / benevolência). Pelo menos como problema principal, mas claro que um filme pode ter todo tipo de "patologia" hehe.. abs!

Caio Amaral disse...

(consegui deixar clara a diferença, ou ainda tem algo no caso desse filme que parece mais pseudo-sofisticação pra vc?)

Leonardo disse...

Sim, ficou clara a diferença. Obrigado, Caio. A impressão que tive é a de que toda a produção passa a impressão de ser algo mais sofisticado, faz referências a coisas de luxo, à clássicos do cinema, a iluminação é toda elegante etc. Como se fosse uma embalagem transparente para esconder algo grotesco. Não como um Nolan que usa a história dentro da história, no nível dos valores para destruir valores, ou confusão da narrativa para esconder próprios elementos da narrativa. Mas como alguém que usa um visual para maquiar um outro visual, a superfície pela superfície. Uma forma ainda mais primitiva e sensorial da pseudo-sofisticação, uma imitação barata (pseudo-pseudo-sofisticação, talvez?) Neste caso, o diretor tentaria apenas imitar a estética percepto-sensorial dos filmes da categoria da pseudo-sofisticação, mas que não consegue chegar no nível conceitual – ou não conhece este nível, por isto é incapaz de corrompê-lo de forma como fazem os “Nolans”.

Perdão pela demora para responder. Cheguei naquela etapa de escrever e reescrever dissertação. Surpreendentemente, pelo menos aqui em Curitiba, nenhum dos professores (cerca de 15 pós-doutores) conhece Ayn Rand. Quanto aos colegas, nem chegam a discutir tradição inglesa, aristotélica, lockeana. Como se nunca tivessem existido ou se nem tivessem sido ensinados sobre eles na graduação em filosofia em primeiro lugar. Todos os autores são aqueles franceses e alemães com aqueles conceitos ininteligíveis que nunca são integrados à exemplos práticos a não ser nas críticas ao capitalismo. Uma colega minha que está no terceiro doutorado em filosofia, não conhecia a noção de direitos individuais em Locke. Outro colega que é professor de curso preparatório para vestibular disse que Hitler odiava os judeus em razão de um desentendimento em uma loja de penhores do judeu que aconteceu na infância do Hitler.

Caio Amaral disse...

Exato, é uma sofisticação na embalagem que dá a impressão do filme ser melhor do que é.. o pecado seria "estilo acima de conteúdo".. Só não coloco isso no mesmo saco da Pseudo-Sofisticação porque daí todo videoclipe da Anitta ou blockbuster bem produzido porém vazio artisticamente entraria pra este grupo.. e acho que aquele outro tipo de "trapaceiro" que deseja parecer cerebral merece uma categoria própria, rssss... Até porque há uma diferença importante, pois na Pseudo-Sofisticação como eu cito, os elementos que o autor inclui pro filme soar inteligente são coisas destrutivas: subjetivismo, pessimismo, tédio. Nesses casos mais pra linha John Wick, o visual sexy não é algo de fato destrutivo.. o roteiro pode não estar à altura da embalagem, dos clássicos que ele faz referência, porém eu não diria que o filme melhoraria se ele eliminasse a produção atraente (se o estilo fosse tão pobre quanto o conteúdo, pra dar match e não iludir ninguém rs). É a diferença entre tentar compensar sua futilidade usando roupas caras, investindo num corpo bonito, citando frases de livro que vc nunca leu... VS. se enfeando de propósito, falando de assuntos desagradáveis e deprimentes em festas pra passar uma aura profunda etc.

Claro que em exemplos concretos muita coisa se mistura.. dá pra argumentar que a ênfase em dor e sacrifício de John Wick seria um toque de Pseudo-Sofisticação - um elemento destrutivo que faz o filme parecer mais profundo do que é.. Mas isso ainda me parece algo secundário.. pois esse tipo de coisa "sombria" já é tão mainstream que é como tatuagem.. algo que ninguém registra mais como uma subversão do entretenimento.. então John Wick seria como o exemplo 1 - a pessoa tentando impressionar com roupas caras, corpo bonito, só que com o detalhe de estar cheia de tatuagens, dando um ar meio dark rss.. Porém ainda não despenca pro exemplo 2 do pseudo-intelectual chato, realmente querendo deprimir rss.

Bem fantástico esse cenário que vc pintou do ambiente acadêmico.. quase uma distopia tipo Anthem onde certos conceitos são propositalmente suprimidos da cultura! hehe. Abs!