Documentário indicado ao Oscar sobre a carreira do fotógrafo Sebastião Salgado, dirigido por Wim Wenders e por Juliano Ribeiro Salgado, filho de Sebastião.
Como um relato da carreira de Sebastião, o documentário é muito bem feito e cheio de imagens deslumbrantes, mas o quanto você irá apreciar o filme depende muito do quanto você se identifica com Salgado e com seu trabalho - o que pra mim foi difícil pois ele tem uma visão de mundo muito distante da minha. Certamente acho ele talentoso como fotógrafo (os enquadramentos, o uso lindo do preto e branco, etc) e admiro sua dedicação ao trabalho - mas não me identifico em nada com seus valores e com o tema de suas fotos. Ele é um homem obcecado pela morte, pelo sofrimento, pela violência... Sua missão parece ser mostrar que o ser humano é mau e que a vida é um horror. Ele acha que há algo de belo e nobre na miséria. Ele vive usando a palavra "profundo" pra descrever qualquer coisa que esteja distante da felicidade, da saúde, do progresso - sejam gorilas ou moradores do nordeste. Por que a figura de uma pessoa doente e faminta é bela e "profunda"? Sofrimento pra mim é algo a ser corrigido, não contemplado. As pessoas que ele fotografa provavelmente dariam tudo pra trocar de lugar com ele. Elas não enxergam nada de belo na situação em que estão. Me parece até uma agressão à dignidade delas fotografa-las em condições tão horríveis: nuas, feias, deterioradas, mortas - e ainda buscando enquadramentos bonitos e luzes interessantes pra mostrar o horror de maneira visualmente sensual.
Mais pro final o tom se torna um pouco mais leve quando a atenção se volta pro Instituto Terra (um projeto lindo de reflorestamento em Minas Gerais). Salgado se cansa de fotografar o sofrimento humano, e passa a se interessar mais pelo meio-ambiente. Primeiro ele quer montar um livro mostrando a natureza destruída pelo homem (desmatamentos, etc). Mas depois ele descobre que o mundo não está tão devastado assim - ainda há muitas florestas intactas, índios, lugares onde o homem civilizado não chegou, então ainda há esperança (cultura ocidental = mal). E mesmo aí seu interesse pelo sofrimento está presente. Numa caminhada por uma floresta jovem e exuberante, o que chama sua atenção é uma cigarra morta no tronco de uma árvore. "Ela cantou até morrer", ele diz (em suas falas há esse tema recorrente da beleza que se transformou em morte, do paraíso que virou deserto, etc).
O documentário não fala nada sobre a técnica dele como fotógrafo (algo que eu amaria saber), não se aprofunda em suas ideias sobre política (um tema que grita em suas fotos), não vai a fundo em sua vida pessoal - se limita a contar de maneira mais externa a trajetória de sua carreira: quais foram seus principais projetos, pra onde ele viajou, quanto tempo ficou em cada lugar, o que viu nesses lugares, etc. É uma carreira impressionante, digna de um documentário - eu só não gosto muito das lentes pelas quais Salgado enxerga o mundo.
(The Salt of the Earth / França, Brasil, Itália / 2014 / Juliano Ribeiro Salgado, Wim Wenders)
NOTA: 6.5
Muito interessante sua crítica. Abordagem crítica do documentário de forma e ângulo diferente das que os sites mais renomados apresentam. Parabéns.
ResponderExcluirBrigadão :)
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