sexta-feira, 22 de março de 2024

Matador de Aluguel

O original de 1989 é o tipo de entretenimento burro, porém divertido, que as pessoas colocam na categoria de guilty pleasure. O que me faz simpatizar com o antigo é justamente sua ingenuidade, que sem querer acaba expondo a masculinidade primitiva da história (as racionalizações ligadas ao instinto de luta, ao sentimento de invencibilidade) como algo de fato infantil, não sofisticado, digno de riso (meu problema com John Wick / Equalizer é que eles conseguem em parte camuflar isso dando um verniz sério pra produção). O filme tinha a inocência de um garoto de 8 anos expressando esses delírios de grandeza ao brincar com bonequinhos de ação. Mas uma sociedade cínica e excessivamente autoconsciente como a atual não permitiria mais esse tipo de inocência. O filme, portanto, precisa anunciar que é "adulto" e que não se leva a sério. Há quem diga que o filme de 89 não se levava a sério, mas Patrick Swayze interpretava James Dalton com a mesma seriedade de um herói do John Wayne ou do Bruce Lee. O que fazia o filme parecer não-sério eram só os exageros da ação, que não tinham uma intenção cômica explícita, e eram percebidos apenas pelo espectador com senso crítico. Mas no remake, o James Dalton do Jake Gyllenhaal se mostra totalmente consciente do fato que ele está dentro de um guilty pleasure, e precisa ficar fazendo comentários autorreferenciais, soltando piadas incongruentes no meio da ação pra não correr o risco do espectador achar que o filme é de fato imaturo. O problema é que em vez de um garoto de 8 anos, o filme agora é como um adulto infantilizado brincando com bonecos de ação, mas ao mesmo tempo tirando sarro do jeito que garotos brincam. Enquanto o espírito genuinamente imaturo do original ainda tinha certo charme, produzia uma forma honesta de entretenimento (o filme pelo menos estava tentando simular virtudes como coragem, força, ainda que de forma desajeitada), a imaturidade autoconsciente do remake já não tem a menor graça. O que o remake realmente está tentando simular não é mais coragem, força, mas a ironia do Idealismo Corrompido — a atitude de autoparódia que, quando acompanhada de certa inteligência, pode resultar em filmes populares como Deadpool ou Kill Bill. Só que Matador de Aluguel (2024) é tolo na própria tentativa de simular essa ironia. As tentativas de piada, os one-liners péssimos e a atuação risível do Conor McGregor devem tornar o filme um forte concorrente pra Madame Teia no próximo Framboesa de Ouro. No máximo, Matador de Aluguel (2024) poderá funcionar como uma nova espécie de guilty-pleasure pro espectador moderno — não o filme que diverte porque queria ser Idealista e falhou de forma cômica no processo, mas o filme que queria ser Idealista Corrompido e foi igualmente malsucedido.

Road House / 2024 / Doug Liman

Satisfação: 3 (Idealismo Corrompido)

4 comentários:

  1. Em resumo: o filme se apoia em piadas a lá filmes da Marvel e acaba arruinando a experiência que poderia ser melhor.

    ResponderExcluir
  2. Sim, lembra algumas coisas da Marvel.. tanto no tipo de humor quanto na ruindade dos diálogos etc.

    ResponderExcluir
  3. Achei interessante teu comentário de "Delírios de grandeza" e essa certa inocência em criar uma atmosfera séria dentro de um filme que tem absurdos, me lembrou quando eu brincava de bonequinhos quando criança. Era isso que me encantava nesses "Filmes Cerveja" - uma classificação dada a esses tipos de filmes com frases como o do Stallone Cobra "Você é a doença e eu sou a cura" e como criava-se coisas divertidas, mas sem tirar esse tom de ser algo sério.

    ResponderExcluir
  4. Alguns desses filmes dos anos 80 tinham um espírito mais lúdico/ingênuo que os tornavam mais interessantes pra alguém como eu, que não se sente atraído pelo gênero em si.. mas é importante diferenciar isso que chamei de masculinidade primitiva de filmes de ação que projetam Autoestima.. vou até elaborar isso num post separado pra já ficar de registro.

    ResponderExcluir