quarta-feira, 30 de abril de 2025

Dinâmica da Espiral - Insights

A Dinâmica da Espiral pode ser aplicada a inúmeros tópicos e gerar infinitas reflexões. Seria impossível cobrir todas elas, mas vou fazer um breve resumo dos principais insights que tive lendo os livros Spiral Dynamics (Beck / Cowan), A Theory of Everything (Ken Wilber) e outros conteúdos relacionados — contrastando a Dinâmica da Espiral com o Objetivismo e outros conceitos relevantes aqui para o blog.

IDEALISMO

Não cabe a mim posicionar o Idealismo na Espiral, mas a Dinâmica pode ser muito útil no universo do entretenimento. Ao entendermos os sistemas de valores que governam cada nível, podemos garantir que não estaremos ignorando necessidades humanas essenciais, nem nos entregando aos aspectos negativos de cada estágio — aqueles que são insustentáveis ou que impedem a convivência harmoniosa com os outros níveis.

Acredito que a maioria das necessidades legítimas de cada nível da Espiral é coberta pelos 4 Pilares e por outros princípios do Idealismo: Objetividade atende às necessidades dos níveis AZUL e LARANJA; Autoestima, às do VERMELHO e LARANJA; Benevolência, às do VERDE; Excitação, às dos níveis BEGE, ROXO e VERMELHO, etc. Muitos dos "inimigos do entretenimento" que discuto combatem os aspectos negativos de cada estágio: a fantasia desconectada da realidade do nível ROXO; a violência e os "excessos de testosterona" do VERMELHO; o Idealismo Reprimido do AZUL; o comercialismo vazio do LARANJA, etc. Como, nos últimos 15 anos, o nível que mais vem causando tumulto na cultura é o VERDE, muitos dos meus textos são focados nos aspectos problemáticos desse estágio: a cultura woke, heróis envergonhados, Anti-Idealismo, Casting Naturalista, Naturalismo, Experimentalismo, etc.

----------------------------------------

OBJETIVISMO

Objetivismo na Espiral

Na minha visão, a filosofia Objetivista apresenta uma perspectiva de 2º Patamar, apesar de carregar fortes características do nível LARANJA. Os Problemas do Objetivismo que costumo discutir derivam de algumas "sombras" dos níveis LARANJA e AZUL que atingem na filosofia. Minha percepção é a seguinte: Ayn Rand tinha uma animosidade nem sempre saudável ou justificada em relação ao nível VERDE, por associá-lo à esquerda radical da época — o que a fazia regredir, em alguns tópicos, a níveis anteriores da Espiral.

Nathaniel Branden me parece ter transicionado para o 2º Patamar de forma mais plena (Branden, aliás, era amigo de Ken Wilber). Quando ele brincava dizendo que “Ayn Rand nem sempre era uma boa objetivista”, acredito que ele se referia às sombras do 1º Patamar que se revelavam em algumas posições dela, que nem sempre refletiam seus ideais mais elevados.

É importante notar que o movimento Objetivista é diferente da filosofia de Rand em si, e que muitos seguidores dela (especialmente os mais ortodoxos) podem ter mais características do nível AZUL do que do 2º Patamar. 

Vícios Humanos

Embora a Dinâmica da Espiral não tenha uma ética desenvolvida, os males que ela atribui a cada nível (em sua versão não saudável) dialogam bastante com os males que o Objetivismo observa na sociedade. O misticismo e o tribalismo do nível ROXO; o uso da força bruta e o desrespeito pelos direitos individuais do VERMELHO; o autoritarismo e o racionalismo do AZUL, etc.

Nesse ponto, a teoria pode ser bastante útil ao Objetivismo, e traz uma vantagem: enquanto o Objetivismo vê todos esses “vícios” como expressões de uma mesma coisa — irracionalidade — a Dinâmica da Espiral dá uma explicação de por que diferentes pessoas adotam formas distintas de irracionalidade. O Objetivismo talvez esteja tão distante dos níveis mais baixos da Espiral que não enxerga com clareza os detalhes que fazem as pessoas adotarem um estilo de destruição ou outro.

A Dinâmica da Espiral dá um “zoom” em cada estágio e mostra que há uma ordem cronológica para cada tipo de problema, e que cada nível surge como resposta aos dilemas do nível anterior. Isso ajuda a entender por que certos fenômenos sempre andam juntos:

- Por que o “Attila” (VERMELHO) tem o “Witch Doctor” (ROXO) como parceiro.

- Por que há tanta hipocrisia na Igreja e em organizações conservadoras, onde pessoas supostamente no nível AZUL vivem tendo recaídas e revelando traços do nível VERMELHO ainda não totalmente reprimido (padres molestando crianças; maridos conservadores que traem esposas etc.).

- Por que certos ideais de esquerda (VERDE) são mais comuns entre pessoas “bem-nascidas”, que já usufruíram dos benefícios do capitalismo (LARANJA), e menos entre populações mais pobres e religiosas (VERMELHO/AZUL), que ainda não vivenciaram plenamente o nível LARANJA.

- Por que há tanta hipocrisia na esquerda militante (VERDE), especialmente em relação ao luxo e ao consumo (o fenômeno do “socialista de iPhone”), que são “ecos” do nível anterior (LARANJA).

Tudo isso acontece porque as características de um nível muitas vezes “vazam” para o nível seguinte, antes de serem substituídas por comportamentos mais elaborados.

Tabula Rasa

O principal desafio que a Dinâmica da Espiral apresenta para o Objetivismo é a sugestão de que o ser humano não nasce tão “tabula rasa” quanto Ayn Rand acreditava. Os teóricos da Dinâmica não afirmam que o ser humano nasce com ideias inatas, mas sugerem que nossos valores são moldados por fatores biológicos, psicológicos e sociais.

Por exemplo: uma pessoa não nasce com uma crença ou descrença no papel do governo; não há ideologia política inata. Mas, se suas condições “biopsicossociais” fizerem o nível VERMELHO predominar em sua personalidade, essa pessoa terá impulsos dominantes/agressivos, que a farão enxergar o mundo por uma lente de conflito — o que pode incentivá-la a desprezar a ordem social e os direitos individuais.

Pra que uma pessoa assim compreenda verdadeiramente a visão de direitos individuais e aja de acordo, ela precisará internalizar novos valores com base em experiência: vivenciar o nível AZUL, descobrir os problemas deste novo nível, resolvê-los, e então ascender ao nível LARANJA, onde talvez consiga viver segundo esses princípios — não basta ela ser exposta a argumentos lógicos e se convencer de um dia pro outro.

Natureza Humana

Como discuti no texto O Homem Comum Como Racional, a crença de Rand de que o homem não seria dominado por instintos e de que todos poderiam viver racionalmente sugere que, pra ela, o lugar natural do ser humano seria no 2º Patamar da Espiral (AMARELO / TURQUESA). Rand tinha a tendência de condenar moralmente os níveis do 1º Patamar (com exceção parcial do LARANJA — que ela romantizava e enxergava às vezes como AMARELO) e não percebia que havia certos degraus a serem subidos antes de alguém alcançar o nível de consciência de seus heróis.

Por isso, embora ela oferecesse aos seus leitores uma visão de 2º Patamar como modelo, ela não ajudava muito as pessoas a ascender até lá, pois não reconhecia a necessidade do 1º Patamar — queria apenas se livrar dele.

Capitalismo: 1º Patamar vs. 2º Patamar

O empreendedor que a Espiral posiciona no nível LARANJA tem uma atitude mais compatível com o “capitalismo predatório” — que Rand rejeitava — do que com o egoísmo racional representado por seus heróis. A visão de capitalismo proposta por Rand (e pelos Founding Fathers) é mais compatível com o 2º Patamar. Mas apenas uma pequena minoria da população está nesse nível. Isso significa que, na prática, o capitalismo é exercido majoritariamente por pessoas no 1º Patamar, que são menos éticas do que gostaríamos. Isso ajuda a esclarecer as confusões que discuti no texto Ambição vs. Ganância. Rand, por entender que o sistema criado pelos Founding Fathers vinha do 2º Patamar, às vezes romantizava os empresários que usufruíam desse sistema como se também tivessem uma consciência de 2º Patamar, quando, na verdade, a maioria permanecia no 1º.

Autossacrifício

A Dinâmica da Espiral pode trazer uma visão esclarecedora para Objetivistas sobre o conceito de autossacrifício. Como Rand via o ser humano naturalmente no 2º Patamar, o autossacrifício para ela era incompreensível: se o homem é essencialmente bom, por que ele deveria sacrificar seus valores? Agora, se a Espiral estiver certa — e a vasta maioria da população ainda estiver no 1º Patamar — as éticas de sacrifício do nível AZUL se tornam mais compreensíveis. O nível AZUL surge como resposta aos problemas do VERMELHO, caracterizado por gratificação imediata, egocentrismo e ausência de remorso. Se a consciência de uma pessoa está no nível VERMELHO, ela precisará da disciplina e do absolutismo do nível AZUL, em algum momento, para controlar seus impulsos. A grande confusão aqui (além das diferentes formas de se definir o termo “sacrifício”) é que, em geral, as ideologias de sacrifício são criadas para pessoas em um nível inferior ao AZUL — são elas que devem ouvir os pedidos de autossacrifício e abnegação, já que seus objetivos são, de fato, destrutivos. Mas Rand achava que esses filósofos altruístas estavam se dirigindo a seres humanos também nos níveis AMARELO/TURQUESA, e pedindo que eles vivessem uma vida de abnegação. Pode até ser que alguns filósofos mais niilistas quisessem o sacrifício de todos, até daqueles no 2º Patamar. Mas, no geral, esses discursos me parecem se dirigir ao 1º Patamar, muitas vezes nem levando em conta a existência do 2º, por se tratar de uma minoria numericamente insignificante.

----------------------------------------

OUTROS INSIGHTS

Teoria dos Arquétipos

Os 12 Arquétipos e os níveis da Espiral têm muitos paralelos. Em vez de substituir uma teoria pela outra, acho que elas podem ser usadas em conjunto de forma eficaz no entretenimento, já que é possível imaginar variações de um mesmo Arquétipo em cada um dos níveis da Espiral (um Revolucionário no nível VERMELHO seria mais violento e impulsivo, enquanto um no nível VERDE seria mais democrático e intelectual).

Pêndulo

A noção de que a cultura dominante oscila entre eras mais individualistas e eras mais coletivistas é apoiada pela Dinâmica da Espiral, mas ela traz uma visão mais plausível que a ideia de ciclos perfeitamente simétricos e previsíveis proposta pelo livro Pendulum. Além disso, na Dinâmica da Espiral, a cultura nunca retorna exatamente ao mesmo ponto anterior. Ela oscila entre fases individualistas e coletivistas, mas sempre em um nível diferente, incorporando aprendizados dos ciclos anteriores e, portanto, se tornando mais sofisticada e trazendo novos desafios e qualidades.

Declínio Cultural

O declínio cultural que vem caracterizando o século 21 pode ser explicado pelo que a teoria chama de Gamma Trap — uma fase de frustração, ressentimento, cinismo, violência e radicalismo que acontece quando o sistema vigente de valores não consegue lidar adequadamente com os desafios da realidade, e a cultura entra em estagnação ou regride a níveis anteriores. No final do século 20, diria que a sociedade estava predominantemente no nível LARANJA, com muitos líderes já nos níveis VERDE/AMARELO. Mas o livro Spiral Dynamics aponta um erro que pode levar à regressão cultural ou a uma Gamma Trap: a tentativa de um nível mais complexo impor prematuramente seus valores a um nível menos complexo. O livro foi escrito nos anos 90, antes da era das redes sociais, mas já citava o exemplo de culturas mais simples sendo expostas, via televisão, a visões de mundo que não tinham maturidade pra absorver, que acabavam funcionando como “vírus psicológicos”. No século 21, podemos dizer que a internet e as redes sociais criaram uma pandemia desse tipo de vírus, levando várias culturas a se fecharem e a regredirem a níveis anteriores. Em especial, me parece que foi o desenvolvimento não saudável do nível VERDE que levou os níveis anteriores a preferirem regredir ao nível VERMELHO/AZUL, em vez de evoluírem para o AMARELO (os lockdowns e a resposta da sociedade à Covid, aliás, foram uma clara regressão ao nível AZUL).

Influência e Liderança

O livro Spiral Dynamics traz um insight útil quanto à liderança: líderes eficazes geralmente estão cerca de meio nível acima de seu público na Espiral. Assim, eles compartilham em grande parte da mesma visão de mundo, o que facilita a comunicação, mas trazem também uma perspectiva nova do próximo nível, ajudando seu público a ascender. A implicação é que, se você estiver mais de um nível acima de seu público-alvo, será mais difícil você influenciá-lo, por mais clara que seja sua comunicação. Para liderar ou impactar diretamente outras pessoas, o ideal é mirar no nível (ou na transição) logo abaixo da sua posição atual (LARANJA influencia quem está na transição AZUL/laranja; LARANJA é liderado por quem está na transição laranja/VERDE, etc.).

Isso não quer dizer que pessoas no 2º Patamar não possam ter influência nos níveis mais baixos, mas talvez sugira que essa influência será menos direta — será exercida com o auxílio de pessoas mais próximas dos níveis do público-alvo.

Dabrowski e Desintegração Positiva

Os 6 instintos humanos descritos por Dabrowski têm fortes paralelos com as motivações dos 6 níveis do 1º Patamar da Espiral:

- Instinto de Auto-Preservação (BEGE)

- Instinto Sexual (BEGE/VERMELHO)

- Instinto Religioso (ROXO/AZUL)

- Instinto de Luta (VERMELHO)

- Instinto de Posse (LARANJA)

- Instinto Social (ROXO/VERDE)

Na teoria de Dabrowski, há apenas dois tipos de estágios integrados (Integração Primária vs. Integração Secundária), separados por vários estágios de desintegração. A Dinâmica da Espiral, por outro lado, sugere que cada um dos oito níveis da Espiral permite personalidades integradas, e que desintegrações ocorrem toda vez que a pessoa muda de nível. Isso contradiz parcialmente Dabrowski, mas as duas teorias poderiam ser integradas da seguinte forma: as desintegrações que acompanham as mudanças de nível dentro do 1º Patamar da Espiral seriam “mini desintegrações”, que não transformam completamente a personalidade. Já a “Desintegração Positiva” proposta por Dabrowski seria a transição mais drástica, que ocorre entre o 1º Patamar da Espiral (VERMELHO, AZUL, LARANJA — onde vive a maioria da população) e o 2º Patamar (AMARELO/TURQUESA), onde o indivíduo tem que adquirir independência psicológica da cultura. O nível VERDE, atualmente, seria o nível onde ocorre a Desintegração descrita por Dabrowski, o que explicaria a instabilidade particular deste nível.

Extrema Esquerda e Extrema Direita

O nível VERDE em si é (ou pode ser) saudável, mas a Dinâmica da Espiral explica como níveis mais baixos podem se mascarar como níveis mais elevados e socialmente aceitos para impor suas agendas. A cultura woke e o moralismo autoritário da esquerda moderna seriam, portanto, não expressões genuínas do nível VERDE, mas manifestações dos níveis VERMELHO e AZUL, que adotam discursos VERDES para ganhar controle. Da mesma forma, a direita nacionalista e autoritária frequentemente adota discursos do nível LARANJA (livres mercados, direito à propriedade), quando na verdade expressa os mesmos níveis VERMELHO e AZUL em que se encontra a esquerda radical.

----------------------------------------

CRÍTICAS À TEORIA

TURQUESA

O nível TURQUESA não me parece tão bem diferenciado do nível AMARELO quanto os níveis do 1º Patamar se distinguem entre si. O TURQUESA parece apenas uma repetição do AMARELO, mas com uma linguagem mais mística/esotérica que não esclarece muita coisa. Por isso, tenho certas dúvidas quanto à validade do nível TURQUESA (talvez por eu não ter chegado lá) e quanto à ideia de que a Espiral continuaria oscilando eternamente entre individualismo e coletivismo, repetindo as dinâmicas do 1º Patamar, sem nunca chegar a qualquer certeza ou a valores estáveis.

VERDE vs. LARANJA

O nível VERDE, dependendo de como é descrito, pode adquirir ares socialistas que tornam difícil, especialmente para quem vem de uma perspectiva Objetivista, enxergá-lo como superior ao nível LARANJA. Nem sempre concordo com a forma como o VERDE é caracterizado. A maneira pela qual considero aceitável colocá-lo acima do LARANJA é a seguinte: o LARANJA seria aquele tipo de sociedade científica, capitalista, mas excessivamente focada no mundo material — ainda alienada do universo interior do ser humano, de questões psicológicas, sociais, etc. Nesse sentido, o LARANJA é de fato um nível incompleto. Isso não quer dizer que aquilo que vem depois do LARANJA deixe de ser científico ou racional — como às vezes sugerem alguns teóricos da Espiral — mas sim que o nível VERDE passa a considerar as ciências humanas tão importantes quanto as demais. No nível LARANJA, por exemplo, veríamos aquelas pessoas que escolhem ser médicas ou advogadas por ser a carreira que traz maior retorno financeiro, segurança e oportunidades — uma trajetória profissional típica do século 19 e da primeira metade do século 20 (acompanhada de casamentos arranjados, etc.). Só no nível VERDE as pessoas começam a levar a sério suas emoções, a compatibilidade da carreira com seus valores, aptidões, propósito de vida, etc. Por essa ótica, o VERDE surge, sim, como uma evolução do LARANJA, promovendo uma vida mais plena e feliz. Agora, quando certas leituras da Espiral associam o VERDE à redistribuição de propriedade, a um ambientalismo que não leva em conta o ser humano, a um igualitarismo que desmantela qualquer senso de hierarquia — aí já vejo essas características como manifestações "não saudáveis" do nível VERDE — não como parte do lado virtuoso.

Política

Até agora, não vi teóricos da Espiral darem soluções políticas viáveis para as divergências entre os níveis. Líderes de 2º Patamar, supostamente, deveriam conseguir conciliar os interesses de todos os níveis da Espiral — mas como chegar a um acordo entre a anarquia do nível VERMELHO, o autoritarismo do nível AZUL, o liberalismo do nível LARANJA e o coletivismo do nível VERDE? A visão de governo Objetivista, que defende uma liberdade limitada apenas pelos direitos individuais dos outros, ainda me parece a melhor solução para qualquer sociedade. Um dos perigos da teoria é que algumas interpretações da Espiral podem levar à erosão do conceito de direitos individuais (pelo desejo de acomodar os interesses de todos os níveis) e à visão de que seria aceitável impor ditaduras "leves" para disciplinar os níveis abaixo do AZUL.

Embasamento

O embasamento científico que vi até agora para a Dinâmica da Espiral não é muito forte. Embora a teoria descreva muito bem diversos fenômenos, ainda não vi boas explicações sobre o que leva esses sistemas de valores a se desenvolverem nas pessoas, o quão maleáveis ele são, se há influência genética, etc. Há muitas perguntas no ar, então não quero dar a impressão que abracei tudo o que a teoria propõe. Para mim, a Espiral vem se tornando só uma ferramenta útil pra compreender a sociedade e o comportamento humano — uma espécie de teoria dos Arquétipos turbinada, mais aplicável a problemas mundiais e questões do dia a dia.

terça-feira, 29 de abril de 2025

Cultura - Abril 2025

29/4 - O sucesso de Pecadores

Fiz uma avaliação breve e meio desdenhosa de Pecadores que talvez tenha dado a impressão de ser um filme irrelevante, mas ele na verdade deve se tornar um dos lançamentos mais aclamados de 2025, com impacto significativo na temporada. O que explica isso? Pra mim, um dos motivos é o fato do filme cair parcialmente na categoria Estilo Acima de Conteúdo — e filmes autorais, com uma estética cool/desconstruída, um estilo visual sexy e um conteúdo vago, que traz alguma reflexão mais profunda, mas não exige real elaboração do público, costumam ser os que recebem as avaliações mais entusiasmadas hoje em dia (pense nos quatro filmes mais populares do ano passado no Letterboxd: A Substância, Rivais, Nosferatu, Duna: Parte 2).

Mas, em vez de ser artsy demais, Sinners leva essa estética para o universo dos "macho filmes" de ação, acrescentando testosterona (do tipo ruim), o que cria um apelo popular extra. Além disso, o filme tem um discurso duvidoso de orgulho racial que inflama as emoções daqueles que se deixam levar por esse tipo de empoderamento.

Sim, Pecadores é um filme original, com imagem e som de ótimo nível, mas não acho que é só sua qualidade técnica que vem gerando essa resposta positiva.


5/4 - Vi dois vídeos esta semana que me fizeram sentir um pouco menos desalinhado com as discussões no mundo mainstream.

The Era Of Slop Entertainment — Este vídeo (citado inclusive pelo Critical Drinker) traz o ponto que discuti em fevereiro: apesar de a era woke do cinema estar em declínio, o problema da falta de talento e criatividade continua sendo uma grande questão. Até agora, alguns falavam como se acabar com a cultura woke resolveria a maioria dos problemas, mas muita gente já está começando a perceber que esse não será o caso. Me preocupam um pouco as referências que esses analistas mais populares têm de cinema ideal (voltar para os "tempos áureos" de Homem de Ferro, pra mim, ainda não seria o bastante), mas pelo menos há uma insatisfação apontada pro lugar certo.

How Capitalism Killed the Movie Star — Este vídeo discute a questão da "morte dos astros", que descrevi como um problema-chave no texto Como Salvar o Cinema. Há vários pontos interessantes no vídeo, mas ele atribui o declínio dos astros ao "capitalismo" — ao fato de que, hoje, os estúdios estão mais focados em IPs e personagens do que em atores. Mas vejo furos nessa explicação. Julia Roberts e Schwarzenegger não foram exatamente frutos do comunismo. E por que os astros da música hoje também seriam menores em estatura e impacto global? Apesar de uma coisa interferir na outra, atribuo a morte dos astros mais ao lado cultural do problema do que ao lado financeiro. Ainda assim, é bom ver mais e mais gente apontando o dedo para essa questão.

segunda-feira, 21 de abril de 2025

Abril - outros filmes vistos

O Contador 2 (The Accountant 2 / 2025 / Gavin O'Connor) — Achei bem mais fraco que o primeiro. A produção tem um clima de filme para streaming, daqueles sem verba para sequências de ação espetaculares, que acabam sendo forçados a focar no desenvolvimento de personagem e em diálogos em cenários de escala modesta. O problema é que a trama e os personagens não são interessantes a ponto do espetáculo não fazer falta. A química entre Affleck e o irmão ("buddy criminals") passa longe dos filmes buddy cop antigos, que apesar das tramas simples, muitas vezes brilhavam pelo carisma das duplas.

Tempo de Guerra (Warfare / 2025 / Alex Garland, Ray Mendoza) — Só assisti a 40 minutos e fui embora do cinema. É daqueles filmes desconstruídos que te jogam no meio de uma situação sem introduzir os personagens, sem nunca estabelecer motivações pessoais, propósitos, obstáculos — e esperam que você continue assistindo só por respeito à tragédia real que ele retrata, não por um real envolvimento narrativo. 

Pecadores (Sinners / 2025 / Ryan Coogler) — O tipo de subversão de gênero misturada com comentário social que eu esperaria de um cineasta como Jordan Peele, não de Ryan Coogler. Vem nessa onda de filmes autorais desajeitados que, na tentativa de se provarem "não-formulaicos" e de atender à atual demanda por obras originais, jogam fora todos os princípios narrativos — inclusive os que não deviam.

G20 (2025 / Patricia Riggen) — Leva o troféu "tão ruim que é bom" de 2025. A única explicação que consigo dar para esse filme é a seguinte: era um roteiro dos anos 90, estilo Força Aérea Um, que foi engavetado na época por ser absurdo demais, e que agora decidiram reescrever, inverter os gêneros dos protagonistas e transformar em uma paródia de filmes woke. O problema é que, no fim, o roteiro foi entregue a alguém sem um pingo de senso de humor, que dirigiu tudo de maneira séria.

Como Ganhar Milhões Antes que a Avó Morra (2024 / Pat Boonnitipat) — Dramédia tailandesa semi-naturalista que, por um lado, me desagrada por ser baseada em uma visão malevolente de mundo e em uma ética de culpa e dever, mas, por outro, tem minha simpatia por tentar contar a história mais agradável possível dentro dessas premissas, focando em personagens gostáveis e em uma versão "higienizada" do horror existencial que normalmente acompanha esse tipo de enredo.

Black Mirror (2011—) T7.E1 "Common People" — Nem todos os episódios da 7ª temporada me agradaram, mas este primeiro é um excelente exemplo do que Black Mirror faz de melhor: pegar conceitos inovadores de ficção científica para gerar reflexão, alertar o espectador e fazer comentários culturais ácidos (é aquela rara crítica ao "capitalismo" no entretenimento que consegue trazer pontos válidos sem distorcer totalmente a realidade).

Reagan (2024 / Sean McNamara) — Outro dia vi um vídeo do Andrew Klavan onde ele disse algo pertinente: não é possível substituir os atuais artistas de Hollywood por conservadores, apenas por outros artistas (que talvez até acreditem no conservadorismo, mas essa seria uma questão à parte). Reagan é um filme que parece feito por conservadores, não por cineastas. O resultado é sofrível, e se depender do "dream team" que Trump escolheu para liderar Hollywood (Mel Gibson, Jon Voight, Stallone), veremos cada vez mais dessa estética.

Um Filme Minecraft
(A Minecraft Movie / 2025 / Jared Hess) — Chama atenção por não ser cínico nem ter os toques Corrompidos que costumam definir esse tipo de filme. Em vez de uma aventura irônica, Minecraft funciona como uma comédia de fato, sustentada por um fluxo constante de piadas e por personagens abertamente cômicos (o filme em nenhum momento os confunde com heróis). Não dá para dizer que é um bom roteiro, mas o elenco e o humor orgulhosamente juvenil podem render uma sessão divertida.

Desconhecidos (Strange Darling / 2024 / JT Mollner) — Tenta, através do estilo e de desconstruções narrativas, tornar interessante um conteúdo que, por si só, não renderia um filme satisfatório. Imagine a mesma história contada de forma linear e pergunte-se: algum dos personagens se tornaria gostável? Os eventos da trama e a conclusão gerariam algum prazer ou significado?

Vitória (2025 / Andrucha Waddington) Se O Outro Lado da Rua (2004) foi uma espécie de versão Naturalista de Janela Indiscreta, Vitória seria um "remake" ainda mais simplificado de O Outro Lado da Rua. E o problema não é o filme não ter uma trama ágil, suspense, etc. Se fosse como Ainda Estou Aqui, que compensa a narrativa mais esparsa/Naturalista com ótimas atuações, questões políticas/históricas interessantes, não haveria problema. Mas Vitória não oferece essas qualidades que sustentam os melhores filmes Naturalistas. Ele tenta prender o espectador pelo aspecto "thriller", mas tem a energia que se espera de um filme brasileiro estrelado por uma senhora de quase 95 anos. Quem foi assistir no embalo do Oscar, esperando outro grande destaque nacional, provavelmente saiu decepcionado — mas com pena de admitir, por respeito a Fernanda Montenegro.

sábado, 19 de abril de 2025

Vídeos: Dinâmica da Espiral

Trouxe aqui recentemente o tema da Dinâmica da Espiral, que vem se mostrando uma das "chaves mestras" que eu procurava para solucionar alguns "mistérios" sobre a natureza humana e a sociedade que as teorias que eu já conhecia ainda não explicavam. Pelo que pude ver até agora, a teoria se integra muito bem ao Idealismo e me ajuda a entender melhor o propósito dos princípios que venho estabelecendo aqui — que não é condenar a natureza humana ou ignorar estágios necessários de desenvolvimento, mas tentar promover versões mais saudáveis de cada um desses estágios e mostrar o que pode haver de universal e não conflituoso entre eles (assim como na Teoria dos Arquétipos, não existem estágios de desenvolvimento intrinsecamente maus — mas cada estágio tem sombras que precisam ser evitadas). 

Vou deixar abaixo quatro vídeos de pessoas diferentes dando um resumo da teoria, para quem quiser se aprofundar um pouco mais no tema.

Clare W. Graves é o criador original da emergent cyclical theory.


Don Edward Beck utilizou os estudos de Graves para escrever o livro Spiral Dynamics, que deu mais corpo e alcance à teoria.


Ken Wilber incorporou a Dinâmica da Espiral à sua Teoria Integral (que, eventualmente, passou a usar um esquema diferente de cores para descrever os estágios).


Este é um resumo do canal Actualized.org, para quem quiser uma linguagem mais moderna e com legendas em português.