quarta-feira, 31 de março de 2021

Março 2021 - outros filmes vistos

Bad Trip (2021): 6.0

Comédia que mistura ficção com pegadinhas "reais" estilo Sacha Baron Cohen. Embora eu não goste deste formato, comparando com Borat, Bad Trip tem um humor mais bem intencionado, não é motivado por política — eu particularmente gosto mais, dei algumas boas risadas (Eric André parece um cruzamento dos irmãos Wayans com Jackass) mas claro que eventualmente a falsidade de algumas das pegadinhas começou a arruinar a graça pra mim. Tentei me esforçar pra tirar o foco disso (agir como um espectador "normal") e no começo estava dando certo, pois acho que muita coisa de fato pode não ter sido combinada... Mas bastou 1 cena obviamente desonesta, como a que o carro capota e "explode" a poucos metros de "pedestres", pra eu desconfiar de todo o resto e achar que o filme estava me chamando de burro. Valeu por algumas piadas no entanto.



Professor Polvo (My Octopus Teacher / 2020): 4.0

Indicado ao Oscar 2021, o documentário acompanha um cineasta/mergulhador no sul da África que forma uma "amizade" com um polvo, que o ensina a ser mais "humano" e a ter mais apreço pela natureza. Achei o filme triste e perturbador... Eu realmente não tenho essa visão romântica da vida selvagem; onde o cineasta enxerga beleza, eu vejo apenas vazio, uma existência horrível, um animal com uma vida curta, que vive sozinho, num estado de medo constante, onde tudo é sobre matar ou ser morto, cuja biologia é toda voltada pra se esconder, se proteger, escapar da morte, nada positivo. Algumas das cenas de animais comendo outros animais são de embrulhar o estômago, sem falar que o polvo é uma das criaturas mais feias do planeta — ver o cineasta tentando retratá-lo de forma poética é como a experiência de ver uma cena de amor entre a Sigourney Weaver e o "Facehugger" de Alien. Craig Foster não tem carisma pra carregar o documentário sozinho, e suas reflexões não são tão ricas a ponto de tornar documentário interessante do ponto de vista psicológico/filosófico. É curioso pensar como seu estado emocional acaba provocando essa visão trágica da vida; como o Senso de Vida de uma pessoa e as coisas nas quais ela escolhe focar definem todo o tom da realidade física ao redor dela. Consigo imaginar um outro documentário sobre o fundo do mar que não me causasse o mesmo incômodo, se narrado e dirigido por outra pessoa. Mas Craig Foster era claramente uma pessoa deprimida em sua vida anterior na "civilização". Ele foi pro mar e se apegou ao animal numa tentativa de fugir da realidade, da depressão, mas em vez de se livrar dela, ele parece apenas ter trazido sua escuridão para um novo ambiente.



The United States vs. Billie Holiday (2021): 6.5

Estava curioso pra entender por que a crítica não tinha gostado tanto deste filme (exceto pela performance de Andra Day), mas adorado A Voz Suprema do Blues, por exemplo, e me parece que o motivo é o fato da bússola política/moral do filme ser um pouco ambígua e às vezes ir contra os ideais progressistas do momento, o que é uma grande desvantagem se seu objetivo é ganhar prêmios. O filme tem seus problemas; o roteiro é um pouco confuso, desestruturado, e eu pessoalmente não sou fã dessas biografias que focam na decadência dos artistas. Mas em geral achei um filme honesto, e a performance de Andra Day de fato é incrível, uma dessas estreias no cinema que de tão maduras e acertadas parecem inexplicáveis.



Cherry - Inocência Perdida (Cherry / 2021): 6.0

Tom Holland faz um estudante que vai pra guerra do Iraque nos anos 2000, volta com Transtorno do Estresse Pós-Traumático e começa a se afundar em drogas e crimes. É um desses filmes tipo Réquiem para um Sonho que parecem se orgulhar de serem "barra pesada", e concentram seus esforços criativos não em coisas positivas, mas em retratar o fundo do poço dos personagens de forma impactante e "cool". Temas como drogas, crime, guerra, prisão são ótimos pra esse tipo de "culto à dor", e esse filme dá um jeito de costurar isso tudo numa trama só. É certamente envolvente, bem produzido — mas bem mais clichê e juvenil do que provavelmente gostaria de ser. 



Liga da Justiça de Zack Snyder (Zack Snyder's Justice League / 2021): 4.0

Não vi diferença alguma entre a primeira versão e esta em termos de qualidade cinematográfica — qualidade de história, direção, texto, performances, ação... Continua tudo tão vazio e enlatado quanto antes, apenas bem mais longo e pretensioso, o que na verdade torna o filme pior na minha visão — afinal, quando algo não é muito bom, o ideal é que seja o menos pretensioso possível (uma versão de 1h30 do filme talvez tivesse mais chances de subir no meu conceito do que esta de 4h, que apesar de ter todo o tempo do mundo, ainda não consegue criar uma experiência satisfatória, conclusiva, tendo que inserir vários ganchos no epílogo pra dar aquela sensação de que tudo não passou de um aperitivo e "o melhor ainda está por vir"). Me senti maratonando uma série de TV (coisa que não faço), como se algum seriado desses atuais tivesse se disfarçado de filme, empurrado o padrão estético da TV (e seus problemas) para o mundo do cinema, e conseguido me trapacear para consumi-lo.



The Mauritanian (2021): 7.5

História real de um prisioneiro de Guantánamo que ficou detido por anos sem provas concretas (por suspeita de envolvimento no 11/9), e uma advogada que lutou ao seu lado por justiça. É um daqueles filmes que parecem "estranhos" hoje em dia justamente por serem bons; por se parecerem com um filme de verdade, como se fazia antigamente... Há 20 anos talvez não fosse um grande destaque (não chega a ser tão bom quanto um Questão de Honra, que me parece a comparação mais óbvia), mas hoje merece reconhecimento por ter um roteiro sólido, ótimos atores, uma produção redonda, e por simplesmente ser decente em termos de valores... por conseguir contar uma história que fala de política, mas que não cai no discurso partidário vulgar, que nos lembra que racionalidade, justiça e liberdade estão acima de tudo, e são os únicos valores capazes de trazer pessoas de diferentes origens e crenças a algum acordo.



Raya e o Último Dragão (Raya and the Last Dragon / 2021): 6.0

Parece uma amálgama de Mulan, Moana e diversas produções recentes da Disney, tentando trazer uma mensagem de união, paz, ajudar a combater a polarização da sociedade atual, etc. A protagonista Raya é uma dessas "princesas" mais cínicas e modernas que me dão um pouco de preguiça, e o roteiro é extremamente clichê e familiar. Mas comparando com outras animações recentes, acabou me parecendo uma das menos negativas. A mensagem de união não chega a inspirar muito por ser bem fantasiosa e desconectada da realidade — em vez de sugerir que o bem pode vencer o mal, há uma noção meio mística aqui de que o mal nem existe no fundo, que se todos derem as mãos e confiarem uns nos outros, poderemos "voltar" a viver numa espécie de Jardim do Éden, etc. Há também a obsessão habitual por auto-sacrifício e uma série de toques duvidosos, mas na balança final acho que os pontos positivos compensam os negativos. Em termos de visual e de trilha sonora foi um dos filmes mais bonitos que vi no último ano.



Um Príncipe em Nova York 2 (Coming 2 America / 2021): 6.5

Sequência do sucesso de 1988, o filme tenta ser fiel à estética e ao espírito do original, e até que não se sai mal (os figurinos em particular continuam incríveis). O filme só não é tão engraçado quanto, em partes porque a história do primeiro era essencialmente mais cômica e divertida (a ideia de um príncipe africano disfarçado na América, animado pra viver como um pobre no Queens). No segundo, já existe um toque de correção política no coração da trama que estraga um pouco o humor e diminui o carisma de Eddie Murphy — sem falar que o rapaz que faz o filho dele foi um erro de casting grotesco, um dos personagens mais sem graça que já vi. Ainda assim, achei agradável e bem intencionado de modo geral.



Duas Tias Loucas de Férias (Barb and Star Go to Vista Del Mar / 2021): 5.0

Duas amigas inseparáveis que nunca viajaram resolvem ir de férias pra Flórida e viver uma grande aventura. Kristen Wiig e Annie Mumolo formam uma boa dupla e o começo é divertido (o humor é muito em cima da "cafonice" associada ao estado e a senhoras de classe média), mas como toda comédia atualmente, falta uma boa dose de seriedade no roteiro e principalmente uma curadoria melhor de piadas — as boas sacadas acabam sendo ofuscadas por outras que de tão péssimas te tiram a coragem de indicar o filme. Algo na linha de A Missy Errada (2020) ou Festival Eurovision da Canção (2020) - embora Eurovision ainda esteja uns pontinhos acima.



Meu Pai

Um homem idoso reluta em aceitar a ajuda de sua filha, enquanto lida com um tipo de demência que gera perda de memória progressiva. O filme é contado pelo ponto de vista dele, portanto a linearidade da história é constantemente quebrada pra gerar na plateia um estado de desorientação psicológica parecida com a do protagonista. É um ótimo filme pra assistir levando em conta o que discuti no texto 1999 e o Declínio da Objetividade. Aqui vemos mais uma vez a realidade objetiva sendo questionada, mas por uma tática diferente, esperta, pois retrata as percepções do personagem como sendo perfeitamente racionais, consistentes do ponto de vista dele, e mostra o protagonista como um homem particularmente orgulhoso de sua racionalidade, sempre tentando provar as coisas que percebe através da lógica — mas obviamente, quem vê de fora sabe que ele está apenas criando racionalizações, e está completamente desconectado da realidade. O filme não sugere subtextos políticos, mas achei interessante o fato da pessoa perdendo a razão aqui ser uma espécie de "patriarca", um homem do século 20, do "velho mundo", uma figura frequentemente diminuída no cinema atual — é quase como se o filme estivesse sugerindo que o conceito de objetividade estivesse morrendo e se tornando ultrapassado junto com essa geração, que a lógica do passado não fizesse mais sentido no mundo atual.

O filme é bem feito, tem personagens ricos, uma performance magistral de Anthony Hopkins, sutilezas interessantes como a obsessão do personagem por seu relógio de pulso, que ele vive esquecendo onde guardou — um instrumento de precisão que pode ser visto como suas últimas tentativas de se agarrar a algo objetivo, preservar um senso de controle (em determinada cena ele acusa a empregada de ter roubado o relógio, mostrando que suas racionalizações podem ser motivadas por preconceitos, não fatos). O filme não chega a mergulhar no subjetivismo a ponto de deixar o espectador completamente perdido na trama. Mas às vezes acaba parecendo um "one-trick pony" — foca demais nesse recurso narrativo, e a história vai se tornando um pouco monótona e repetitiva depois que isso deixa de ser novidade. Como o protagonista está perdendo sua mente, ele não tem como levar a história adiante, pois a essa altura já é incapaz de perseguir propósitos, ter grandes aprendizados ou transformações no filme. Ele parece impotente e perdido na maior parte do tempo, o que dá um tom mais episódico/Naturalista pra história. Se o filme focasse mais na filha, nos dilemas dela em relação a cuidar ou não do pai, se sacrificar ou priorizar seus planos, teríamos um arco mais satisfatório possivelmente. De qualquer forma, é um dos poucos filmes sólidos do Oscar 2021, que está lá por méritos artísticos, por conteúdo, não por fazer panfletagem política.

The Father / Reino Unido, França / 2020 / Florian Zeller

NOTA: 7.0

* Um detalhe que gostaria de comentar é que o filme está indicado ao Oscar de Melhor Edição, e vi alguns críticos como o Dalenogare elogiarem bastante a edição do filme, que pra mim não pareceu nada além de correta, eficiente. Mas vou comentar isso num texto separado, que poderá ser adicionado aos posts teóricos depois: 

Julgando edição e outros aspectos técnicos

terça-feira, 30 de março de 2021

1999 e o Declínio da Objetividade

Uma das coisas mais assustadoras da cultura atual é o desprezo pela razão e pela objetividade que pode ser visto não só no entretenimento, mas também na política, no jornalismo, nas discussões comuns entre pessoas etc. É difícil dizer o que exatamente deu início a essa era "anti-razão", "pós-verdade" em que vivemos — se foi a educação, a mídia, crises globais, etc. Mas o entretenimento sempre teve uma relação muito íntima com mudanças na cultura, e mesmo que ele não tenha sido a causa inicial dessa mudança, ele certamente respondeu a ela imediatamente, e acho interessante rastrear esse processo através dos filmes.

Creio que o ponto de virada que nos trouxe à situação atual (em termos epistemológicos) ocorreu no final dos anos 90. Antes de Matrix, por exemplo, não era normal o espectador (e o cidadão comum) ficar questionando a natureza da realidade, a validez da razão e das estruturas sociais no seu dia a dia. Filmes eram sobre acontecimentos concretos, se passavam numa realidade objetiva, estável, até mesmo quando retratavam coisas sobrenaturais. Se aliens invadissem a Terra, eram criaturas sólidas, com características específicas, e o herói tinha que usar a razão pra solucionar o problema da mesma forma que a usaria pra resolver qualquer outro problema mundano.

É interessante lembrar que ao longo dos anos 80/90, eram comuns filmes de grande orçamento onde cientistas eram personagens principais. E não apenas técnicos, nerds, mas figuras heroicas, admiráveis, como Jodie Foster em Contato, Sam Neill em Jurassic Park, Pierce Brosnan em O Inferno de Dante, Helen Hunt e Bill Paxton em Twister (sem falar que vários desses filmes eram baseados em livros escritos por cientistas de fato). Quando criança eu sonhava em ser inventor por causa de filmes como De Volta para o Futuro ou Querida, Encolhi as Crianças... arqueólogo por causa de Indiana Jones... A impressão que os filmes davam é que tudo de fantástico que pudesse acontecer no mundo aconteceria por causa de cientistas, pessoas criativas inventando algo novo. Usar a razão pra lidar com a natureza e resolver problemas era uma virtude constantemente celebrada nos filmes. Questões emocionais subjetivas podiam fazer parte das histórias também, mas não eram o foco principal, existiam para dar certa profundidade à história, gerar mais conexão e envolvimento.

Mas no fim dos anos 90, as coisas começaram a mudar. Lembro de sair da sessão de Matrix com alguns familiares, e as pessoas estavam realmente confusas, perplexas. Havia algo de novo naquele filme, que fazia a gente pensar de uma maneira nada familiar. Matrix não foi o primeiro sucesso desse período a questionar nossa percepção da realidade, mas se destacou por abordar essa questão de forma explícita e inovadora. No ano anterior, em 1998, O Show de Truman já começava a estimular na plateia certos questionamentos existenciais que não eram comuns na cultura mainstream. E se nossa vida não passasse de um reality show? Um grande palco pra vender produtos? Mas 1999 foi o ano que marcou essa transição. Depois de O Sexto Sentido, ninguém mais confiava 100% na realidade da trama de um filme de terror (o que foi reforçado em 2001 com Os Outros). Depois de Matrix, nenhuma cena de ação precisava mais fingir qualquer respeito pelas leis da física. A Bruxa de Blair nos fez questionar se o próprio filme em questão era cinema ou um pedaço de evidência. Um filme realista podia subitamente ter uma chuva de sapos sem maiores explicações (Magnólia). Clube da Luta, assim como O Sexto Sentido, mostrou que não só não podíamos mais confiar nas nossas percepções, como trouxe isso ainda pra mais perto da nossa realidade: agora não era mais necessário o sobrenatural ou algo fantástico existir pra colocar a realidade objetiva em xeque: nossos problema psicológicos já estavam fazendo isso o tempo todo. Até mesmo a noção de família foi desafiada e exposta como uma farsa, quando Beleza Americana levou o Oscar de Melhor Filme.

Daí pra frente não houve mais volta. No começo dos anos 2000, vimos Donnie Darko Cidade dos Sonhos se tornarem cults instantâneos, Charlie Kaufman se tornar o roteirista mais cobiçado do mundo com Quero Ser John Malkovich, Adaptação, Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças, uma avalanche de filmes sobre pessoas com distúrbios psicológicos (Uma Mente Brilhante, A Identidade Bourne, Efeito Borboleta) e é claro, o surgimento daquele que iria encabeçar essa nova onda e levá-la para as décadas seguintes: Christopher Nolan, com Amnésia. O subjetivismo se tornou o "padrão ouro" do cinema. Filmes que focavam em ações concretas e não traziam uma mensagem subjetivista, algum tipo de questionamento existencial, já pareciam datados, pouco sofisticados, menos "sexy".

É importante dizer que muitos filmes desse período ainda eram excelentes. Eles questionavam a realidade, nossos sentidos, mas faziam isso através de tramas inteligentes, compreensíveis, se comunicavam de maneira racional com o espectador — eram "objetivos ao questionarem a objetividade", pois traziam uma herança das décadas anteriores, dominadas por uma epistemologia mais racional (e principalmente, um respeito pelo talento). Mas obviamente, isso apresenta uma contradição, e contradições tendem a buscar uma resolução ao longo do tempo.

Conforme avançamos nos anos 2000 e 2010, esse elemento racional foi sendo abandonado pouco a pouco, e o subjetivismo deixou de ser apenas um tema discutido dentro de filmes racionais, mas foi sendo incorporado na própria forma em que os filmes eram feitos e as histórias eram contadas. Enquanto Matrix (1999) tinha um roteiro bem estruturado, contava com a racionalidade e o foco do espectador para transmitir a ideia de que a realidade é uma ilusão, A Origem (2010) já apresenta uma narrativa caótica, e conta com a irracionalidade e a confusão mental do espectador para sugerir a mesma ideia. A Origem destrói a capacidade cognitiva do espectador como tática para promover a mensagem anti-razão, o que é muito mais eficiente (da mesma forma que livros de certos filósofos subjetivistas são frequentemente impossíveis de entender e de serem lidos em foco, e o estado de confusão mental provocado pelo estilo da escrita trabalha para validar a mensagem de que a razão é inválida).

Esses temas foram se tornando cada vez mais comuns nos filmes, ao ponto que hoje, se eu fosse com familiares ver um filme como Matrix ou Clube da Luta no cinema, ninguém ficaria minimamente surpreso. Questionar a realidade objetiva já faz parte dos hábitos mentais do espectador comum. Por exemplo: outro dia na rua, um amigo caminhando ao meu lado deixou cair algo no chão e parou pra pegar... Eu não percebi e continuei andando, até que alguns segundos depois me surpreendi com sua ausência e olhei pra trás intrigado. Ele riu e brincou: "Imagina se você olhasse pra trás e eu não estivesse lá? E você descobrisse que eu fui uma projeção da sua mente todos esses anos?". Uma brincadeira casual, mas que provavelmente apenas um roteirista criativo teria feito 30 anos atrás. Hoje, são coisas que a gente pensa a todo momento, pois fomos treinados por centenas de filmes ao longo de 2 décadas a questionar a realidade do mundo ao nosso redor — da mesma forma que quando eu era pequeno, eu imaginava constantemente a possibilidade de uma invasão extraterrestre, ou de um meteoro entrar em rota de colisão com a Terra, ou de dinossauros voltarem à vida etc.

Pensar em desastres pode soar algo negativo, mas enquanto os filmes afirmavam que podíamos lidar com esses problemas racionalmente, eles promoviam um senso de otimismo. Agora quando a razão e a realidade objetiva começam a ser questionadas, a primeira coisa que vai embora é o otimismo. Dificilmente um personagem descobre que sua realidade é falsa, que tudo é relativo, que sua mente não está em contato com a realidade, e isso resulta em autoconfiança, em uma história alegre e inspiradora. Subjetivismo vem sempre acompanhado de pessimismo, melancolia e cinismo. Portanto, não é acidente que no final dos anos 90, junto com o subjetivismo, os filmes começaram também a ficar mais sombrios (e com o 11 de Setembro, que tornou o pessimismo a nova realidade da cultura americana, essa tendência parece ter se tornado irreversível).

Outra coisa que começa a ir embora com a objetividade é o talento e os padrões de qualidade. Pois enquanto um filme respeita a objetividade da plateia, tudo nele precisa significar algo, tudo tem que ser comunicado claramente, fazer algum sentido, ser feito com competência, portanto as exigências sobre os criadores são muito maiores — da mesma forma que um modelo precisa ser realmente atraente pra ser fotografado em plena luz do dia, com uma lente cristalina, em foco total — mas as exigências diminuem bastante no escuro, numa atmosfera nebulosa, com uma lente turva (o que indica por que muitas pessoas se sentem atraídas pela "névoa" do subjetivismo). Se um filme é livre para ter finais abertos, contradições internas, buracos na trama, coisas aleatórias, não precisa ter um impacto específico na plateia, afinal tudo é uma experiência subjetiva, emocional, tanto para os personagens da história, quanto pro artista criando o filme, quanto pro espectador na poltrona, muito menos habilidade é exigida dos realizadores. 

É difícil dizer o que começou primeiro, se foi o declínio do talento, da objetividade, do otimismo — mas uma virtude essencial, quando rejeitada, vai sempre arrastando as outras pra baixo com ela. Portanto se os filmes já foram talentosos, objetivos e otimistas, eles passaram para talentosos, semi-objetivos e mais sombrios, e terminaram amadores, irracionais e deprimentes.

Durante os anos 70–90, filmes de terror costumavam ser sobre vilões e monstros reais, com identidades bem estabelecidas. E mesmo quando apareciam só nos sonhos dos personagens (como em A Hora do Pesadelo) havia um senso de que era uma criatura real no universo do filme, que outros personagens podiam vê-lo também, e que ele podia ser derrotado através de alguma ação inteligente. Agora observe a quantidade de filmes de terror hoje em dia onde o monstro no fundo não existe concretamente, nem mesmo no universo do filme — é apenas uma metáfora, uma maneira simbólica do filme retratar algum problema emocional do protagonista. Tudo no cinema se tornou sobre emoções, sobre a experiência subjetiva do personagem. Pense nos inúmeros filmes de ficção-científica recentes onde em vez de lidarem com a natureza, com o mundo externo, solucionarem problemas científicos, os cientistas terminam apenas lidando com traumas pessoais, relações familiares, sentimentos de perda — como O Céu da Meia-Noite ou Interestelar, por exemplo, onde ciência e emoções se tornam indistinguíveis.

Nos filmes atuais, a solução para os problemas não está na racionalidade, na competência, na criatividade, em saber lidar com a natureza — e sim em algum tipo de "cura emocional". Até filmes mais mainstream, que não trazem discussões filosóficas pretensiosas, promovem essa ideia ao colocarem todo o foco das histórias nas emoções dos personagens. Por exemplo: personagens de animações infantis não buscam mais o amor verdadeiro, não precisam derrotar um monstro de fato, não têm que desenvolver habilidades interessantes. Tudo é sobre a "cura emocional". Os problemas de Elsa em Frozen se derretem quando ela aprende a lidar com suas emoções. Raios mágicos trazem paz e abundância ao mundo de Raya e o Último Dragão no momento em que a vilã deixa de ser fria e aprende o valor da confiança. Em Festa no Céu, em vez de matar o touro no duelo final, o herói pega um violão e canta uma canção de paz, pois entende que seu maior problema no fundo é o medo de ser autêntico, e quando ele supera isso, o monstro demoníaco a sua frente se desintegra.

A cura emocional é o novo "príncipe encantado", o novo "matar o monstro", o novo "passar na audição", o novo "sobreviver ao desastre", o novo "criar DNA de dinossauro". Todos os seus sonhos parecem se tornar realidade uma vez que você foque nas suas emoções e elimine conflitos internos (como se nosso universo interno estivesse desconectado do externo, ou melhor, como se ele criasse o universo externo, e nós pudéssemos atingir a felicidade apenas manipulando nosso estado interior, sem depender de ações no mundo real: obter consequências sem causas, recompensas sem ações). O que obviamente é uma mensagem perigosa — e se você nasceu nos últimos 20/25 anos, essa é uma das principais ideias que você absorveu da cultura popular.

Não que emoções não sejam importantes. Elas só não devem ser utilizadas como meios de cognição, colocadas acima da razão, especialmente quando surge algum conflito entre uma coisa e outra (e quanto menos racional você é, mais conflitos surgem). Filmes do passado não eram anti-emoção, mas emoções não eram tratadas como o principal referencial das pessoas. Como ilustrado no curta da Disney, Reason and Emotion (1943), sanidade exige que a razão ocupe o "assento do motorista", e que emoções permaneçam no banco do passageiro. Se há um conflito entre fatos e emoções, você aceita os fatos, mesmo que isso te cause desconforto emocional por um tempo. Esse era o senso comum no passado. Mas hoje, se surge um conflito entre fatos e emoções, é a razão que é jogada pro banco de trás.

Portanto não é surpresa que todos hoje desconfiem da ciência, das notícias — já que nos filmes, até as mentes mais racionais e brilhantes parecem cegas para a realidade e no fundo são motivadas por emoções subjetivas (e se os cientistas de hoje sofreram influência o bastante da cultura, eles podem de fato ter perdido a objetividade, e assim entramos no velho ciclo onde o subjetivismo se retroalimenta de suas próprias crias). Não é surpresa que a liberdade de expressão esteja em constante ataque: se emoções são a base de toda sua existência, palavras e insultos se tornam tão destrutivos quanto violência física; ambos representam uma ameaça para a "cura emocional" que é a chave de tudo. Desinteressadas na realidade, as pessoas foram perdendo (ou nem chegaram a desenvolver) a sensibilidade para distinguir verdade de mentira, fatos de opiniões e sentimentos.

Como cinéfilo, minha grande perda nisso tudo tem a ver com os filmes. Mas esse declínio da objetividade é uma questão que deveria preocupar a todos, pois atinge a sociedade em todos os aspectos e tem graves consequências a longo prazo. Não é possível colocar um satélite em órbita através da "cura emocional", inventar o iPhone através da "paz interna", assim como não é possível produzir Lawrence da Arábia focando na "sua verdade".

Quanto tempo o equilíbrio emocional de uma pessoa poderá durar quando o mundo físico começar a desmoronar ao redor dela? E não precisamos nem esperar o mundo físico ruir pra sofrermos as consequências dessa mentalidade. Afinal, até pra solucionar problemas emocionais é preciso usar a razão: se você atinge sucesso no mundo material, ou sucesso na sua vida emocional, em ambos os casos, foi seu lado racional que tornou isso possível. Se você observar o estado emocional das pessoas hoje em dia, o tom de revolta, confusão e pessimismo que marcou a última década, talvez essa seja a maior prova de que o subjetivismo só leva à destruição, e que sua primeira vítima é o próprio equilíbrio emocional que as pessoas tanto buscam.

domingo, 28 de março de 2021

Seaspiracy: Mar Vermelho

O nível de burrice e irracionalidade aqui é tão extremo que é daqueles casos onde eu realmente começo a questionar a saúde mental de alguém que acredite plenamente na narrativa apresentada pelo filme — a pessoa pra mim começa a entrar na categoria de terraplanistas ou coisas piores. Não é preciso ter conhecimento especializado sobre oceanos pra detectar a desonestidade intelectual do cineasta, basta ter algum senso de lógica, observar a coerência interna dos argumentos (ou a falta dela), e as estratégias pelas quais o documentário tenta passar "informações" e persuadir o espectador. É puro teatro, entretenimento para pessoas com um viés de esquerda (e um Q.I. baixo) relaxarem num domingo à noite. O grande "benefício" do documentário talvez seja que, em sua obsessão por provar que a pesca comercial (o fato de seres humanos comerem peixes) é de longe o maior problema ambiental do planeta, ele acaba minimizando a importância de todas as outras causas favoritas dos ambientalistas. Ele afirma que canudos plásticos são insignificantes e representam uma porcentagem desprezível do plástico no mar... Que as emissões de gases por automóveis no mundo todo não são nada perto das consequências da pesca para a atmosfera... Diz que grandes vazamentos de óleo no oceano não são grande problema, e na prática são até bons, pois durante um período diminuem a pesca na região! É estranho, pois o filme fala de pescadores como se estivesse falando de pessoas garimpando ouro, um material raro, prestes a ser extinto, impossível de se reproduzir (sugere que os peixes estão quase acabando nos oceanos, e ao mesmo tempo se contradiz dizendo que 80% da vida do planeta vive nos mares, e que a maior parte dos oceanos permanece inexplorada até hoje). Pense... Será que existem mais ou menos galinhas no mundo pelo fato delas servirem de alimento para humanos? Mais ou menos vacas do que existiriam caso elas não tivessem utilidade alguma para nós? E porcos? Indústrias que precisam de morango para produzir certos produtos, saem por aí tentando achá-los na natureza, e depois ficam sem quando acabam com todos? Ou passam a cultiva-los? Outra pérola é um trecho onde eles falam do "absurdo" dos americanos gastarem 35 bilhões de dólares por ano pra subsidiar a indústria da pesca, enquanto apenas 30 bilhões seriam necessários para combater a fome mundial. Mas pera aí... Se as pessoas que comeriam os peixes não tiverem mais peixes no menu, elas não terão que comer outra coisa no lugar? E o investimento para essa outra indústria agora não terá que subir em 35 bilhões ou algo equivalente? E será que tudo bem pro cineasta comermos outros animais, que não peixes? Ou apenas plantas são permitidas? Pois certamente deve dar pra achar outros documentários tão "sérios" quanto Seaspiracy na Netflix que revelam os horrores da indústria agropecuária (Cowspiracy?), expõem os males do desmatamento, etc. Esses documentários politizados da Netflix parecem ter ocupado o lugar que antigamente era ocupado por documentários sobre abduções por OVNIs, autópsias em extraterrestres, ou por tablóides de supermercado cujas manchetes anunciavam o homem "meio-humano, meio-jacaré" (que pelo menos eram divertidos e inofensivos politicamente). Se notícias falsas podem dar banimento em redes sociais hoje em dia, o que mereceria alguém que produz um documentário inteiro disseminando mentiras ridículas e mal intencionadas como essas?

Seaspiracy / EUA / 2021 / Ali Tabrizi

NOTA: 0.0

terça-feira, 16 de março de 2021

O Tigre Branco

Indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Adaptado, o filme conta a história de um garoto indiano pobre que passa a trabalhar como motorista para uma família milionária e começa a mudar suas crenças em relação a dinheiro, riqueza e tradições culturais. Apesar do meu Alerta Vermelho ter soado logo no início (por causa da atitude cínica do narrador em relação ao capitalismo, aos EUA, etc.), acompanhei a história com curiosidade e até com uma leve simpatia pelo personagem principal, que a princípio me parecia apenas uma vítima da cultura indiana (que prega submissão, pobreza, auto-sacrifício etc.). Estava vendo potencial pra um tema positivo na trama — pensei que ele poderia se libertar de suas "crenças limitantes", desenvolver uma mentalidade empreendedora saudável, e quem sabe até ir embora do país. Foi só no 3º ato que vi que estava enganado, e que se trata de mais um filme do gênero "kill the rich" para as plateias estúpidas e ressentidas da atualidade se sentirem vingadas.

Se a cultura indiana anti-sucesso é mostrada negativamente pelo filme, a alternativa que ele apresenta não é muito melhor... É a típica visão de mundo onde ou você é presa, ou você é predador; onde ou você é devorado, ou você devora; onde ou você é pobre, oprimido e miserável (mas honrado), ou você abre mão da ética e se torna um rico ladrão, corrupto e opressor, mas que vive a boa vida (o protagonista é "esperto" o bastante para escolher a 2ª opção). Pense em quem é que se sente confortado com essa interpretação da realidade. A pessoa honesta, que aceita os fatos, que quer apenas o que é justo e merecido? Não — os fracassados medíocres, desonestos, que dessa forma podem acreditar que não são ricos pois são "bons demais", que aqueles que têm mais que eles não têm virtude alguma; e também os trapaceiros, malandros, bandidos, que agora podem acreditar que não tiveram escolha, que não são responsáveis por tudo de criminoso e abominável que tiveram que fazer na subida ao "topo".

Há muito em comum com Parasita aqui, inclusive essa noção de que a moralidade é um "luxo" apenas para os que nascem ricos. Mas Parasita é um filme mais cômico, mais alegórico, que dá pra assistir sem levar tão a sério. Já O Tigre Branco é um filme que, apesar do tom irônico, tenta parecer mais realista, discutir questões sociais de maneira mais madura, equilibrada. [SPOILER] Então quando ele mostra o protagonista roubando, assassinando o patrão, e trata isso como se fosse um mal necessário, sem mostrá-lo pagando o preço depois, decaindo no final — mas se tornando confiante e bem sucedido, isso é ainda mais chocante e odioso.

É um filme bem realizado, bem escrito (além do texto ser inteligente, a história é envolvente, bem estruturada), mas que treina os espectadores (como tantos filmes hoje) para enxergarem os ricos como ladrões, trapaceiros, exploradores, que devem ser destruídos e ter suas riquezas expropriadas. 

The White Tiger / India, EUA / 2021 / Ramin Bahrani

NOTA: 4.5

sexta-feira, 5 de março de 2021

Como a diversidade está arruinando o cinema

Vendo o Globo de Ouro 2021 ficou claro não só pra mim, mas para muitos, que esse foi um dos piores anos da história do cinema em termos de qualidade. Ficou evidente também que foi um dos anos mais "diversos" do Globo de Ouro, onde mais minorias ganharam prêmios, onde mais mulheres foram indicadas como diretoras... Será que esses 2 fatos são coincidentes? Provavelmente não. Calma, não estou dizendo que as minorias sejam menos competentes do que os americanos brancos héteros — apenas que a forma como a diversidade vem sendo imposta em Hollywood é destrutiva para o cinema (espero que como gay, não americano, membro de um casal "inter-racial" e fora da indústria, eu possa falar isso sem parecer ter uma agenda racista/xenofóbica/interesseira oculta).

A imposição atual de diversidade é basicamente uma fórmula para diminuir qualidade de resultado, algo que ocorre não só no cinema mas em qualquer área onde essa mentalidade é aplicada. É apenas uma consequência lógica: pra obter o melhor resultado em qualquer coisa, você tem que ser livre para selecionar os melhores profissionais, considerando antes de mais nada a capacidade deles de entregarem o melhor resultado. Se você coloca na equação uma segunda exigência arbitrária, por exemplo, "alguém capaz de entregar o melhor resultado, mas que também seja sul-coreano", você já diminui consideravelmente o leque de opções, e o resultado será provavelmente pior do que se você pudesse ter considerado todas as opções disponíveis, visando o melhor resultado possível. Isso ocorreria até se você impusesse limitações em questões aleatórias, que nada tivessem a ver com etnia, nacionalidade — por exemplo, exigir diversidade em termos de signos do zodíaco.

Imagine esse processo se repetindo dezenas de vezes na produção de um filme — questões de diversidade sendo priorizadas não apenas no elenco, mas em toda a equipe, em toda a produção (pra poder concorrer ao Oscar, a Academia agora está exigindo representatividade em vários aspectos dos filmes, às vezes até no conteúdo das histórias).

Não me parece coincidência que os filmes estejam se tornando mais fracos ao mesmo tempo em que essas tendências se tornam mais e mais fortes em Hollywood. É ignorância achar que existe um número infinito de pessoas talentosas, que não faltam excelentes escritores, diretores, atores em qualquer país ou grupo social, a qualquer momento, e que portanto exigir diversidade não interfere em nada na qualidade do resultado. Quanto melhor um filme e melhor um cineasta, mais você verá uma equipe cuidadosamente selecionada, parcerias insubstituíveis, sintonias especiais que às vezes se assemelham a de relacionamentos românticos, e que só acontecem quando o produtor/diretor tem total liberdade de escolha, quando está atento a todas as possibilidades, empenhado em encontrar as melhores parcerias possíveis.

Algumas áreas e indústrias não exigem um processo tão rigoroso de seleção, não exigem profissionais tão específicos e raros para chegar num bom resultado. Mas quando estamos falando de Oscar, de grandes produções de Hollywood, estamos falando de reunir o que há de mais profissional e de mais talentoso no mundo... Não estamos falando de bons profissionais apenas, de pessoas competentes. Mas das mais habilidosas do ramo. De celebrar talentos raros. E obviamente, se um profissional está entre os melhores do mundo, é porque não existem 200 alternativas igualmente boas para você escolher. Se houvesse, então é porque ele ainda não estaria entre os melhores, e portanto não deveria ser a escolha final para as produções mais ambiciosas. São nessas áreas que buscam o grau máximo de excelência onde limitações e burocracias do tipo se tornam especialmente destrutivas (não estou dizendo que em todas as situações existe sempre 1 única opção perfeita, como um ideal platônico, apenas que as opções se tornam cada vez mais escassas conforme você se aproxima do "topo da pirâmide"; e que nesse momento, impor questões como diversidade te força a permanecer sempre uns degraus abaixo, onde há um número maior de candidatos).

Um dos principais dons que um diretor deve ter é saber se cercar dos melhores profissionais, para que estes lhe ajudem a criar o melhor filme. Pense no que acontece quando você coloca uma série de travas e obstáculos nesse processo extremamente delicado — quando um estúdio já seleciona o próprio diretor (que é a figura mais importante de um filme) com base em questões de diversidade, e esse diretor (que agora já não é o ideal) usa o mesmo critério na seleção de todas as outras pessoas chave da equipe?

O movimento atual da diversidade é um movimento anti-qualidade. E se você pensar que "qualidade" nada mais é do que algo que serve bem à vida humana — assim como uma comida de qualidade é aquela que tem os melhores ingredientes, que nutre melhor o organismo, que é mais saborosa — podemos dizer que a diversidade se tornou um movimento anti-vida, pois foi colocada acima de questões mais importantes como habilidade (e com menos habilidade, tudo o que é produzido se torna pior, e por consequência nosso padrão de vida diminui). Isso talvez não fique tão evidente no mundo do cinema, pois as consequências da arte mal feita não são letais a curto prazo (tenho certas dúvidas quanto ao longo prazo), mas pense nesse mesmo raciocínio sendo aplicado a outras atividades... à indústria... à medicina... Imagine você tendo que fazer uma cirurgia complicada, e não poder selecionar os médicos com base em competência, em qualidade de resultado... Imagine o médico não ter liberdade pra selecionar sua equipe (o anestesista, etc.) com base naquilo que trará os resultados mais garantidos, mas ter que necessariamente selecionar pessoas levando em conta questões irrelevantes para o contexto, como etnia, orientação sexual? Isso não criará limitações no processo de escolha? E limitações desse tipo não resultam, pela lógica demonstrada, em resultados menos ideais do que seriam possíveis?

A cultura de hoje está sendo inteira levada a abraçar essa mentalidade, sob uma falsa aura de benevolência. Enquanto essas políticas de diversidade não forem questionadas e a cultura não voltar a priorizar mérito, habilidade, talento, teremos que nos acostumar com padrões de qualidade cada vez mais baixos.

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