sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Problemas do Objetivismo #12 - Ambição vs. Ganância

Alguns intelectuais objetivistas às vezes ignoram ou "passam pano" para um aspecto negativo do mundo dos negócios que é extremamente comum e malvisto pela maior parte da população: a atitude de empresários que não enxergam a diferença entre ganhar dinheiro e criar algo de valor.

Ansiosos por defender o capitalismo e os princípios do livre mercado, eles às vezes esquecem que muitas coisas feitas em liberdade podem, e frequentemente são, menos que heroicas.

Um objetivista concordaria que é imoral um marido violentar fisicamente sua esposa e que ele deveria ser punido por isso. Mas, dentro do que é permitido pela lei, existe uma diferença enorme entre um casamento feliz e uma relação tóxica, dominada por mentiras, incompatibilidades e ressentimento — embora esse tipo de relação seja perfeitamente legal. Não precisamos sugerir que o governo deva interferir ou proibir aquilo que é imoral ou desprezível — mas isso não significa que devemos ignorar as diferenças entre o que é admirável e o que não é.

Há uma diferença enorme, por exemplo, entre Walt Disney e Bob Iger (atual CEO da Disney). Ambos queriam fazer dinheiro, mas Walt Disney claramente buscava isso como consequência de criar algo magnífico e oferecer um grande valor para seus clientes. Ele disse uma vez que, na Disneyland, queria que o cliente pudesse entrar em um prédio de 1 milhão de dólares pra comprar um hambúrguer por 50 centavos. Obviamente, ele esperava lucrar com essa troca — Disney não era um altruísta. Ainda assim, ele parecia se animar ao fazer o cliente sentir que pagou pouco em comparação com o benefício que teve. Iger já parece ser do tipo que se orgulharia de conseguir vender por 1 milhão de dólares um produto que, na prática, vale 50 centavos.

Muitos acreditam que não é possível ser bem-sucedido prejudicando seus clientes, pois as forças do mercado trabalhariam contra você. A longo prazo, isso pode até ser verdade. Mas essas forças de mercado frequentemente demoram décadas para agir, permitindo que empresários acumulem fortunas por muito tempo através de táticas desprezíveis.

Entre atitudes virtuosas, que promovem relações ganha-ganha, e ações destrutivas que levam uma empresa à falência, existe uma vasta zona cinzenta com inúmeras graduações intermediárias. No extremo positivo, temos o empresário do "Tipo 1" que foca no quanto de valor ele pode produzir, em quão excelente pode tornar seu produto ou serviço, e no quanto pode satisfazer seus consumidores (sempre dentro de um modelo lucrativo). No extremo negativo, temos o empresário "Tipo 2" que busca o máximo de lucro testando os limites de seu público: flertando com atitudes abusivas e manipulativas, vendo até onde pode baratear e degradar seu produto antes de sofrer prejuízos concretos.

Na minha percepção, o primeiro tipo de empresário tende a lucrar mais a longo prazo (além de Walt Disney, citaria Steve Jobs como outro bom exemplo de empresário preocupado com qualidade e com o valor gerado para o consumidor). Mas é possível que, em certos contextos, o segundo tipo seja mais lucrativo. Isso não o torna superior como empresário. O objetivismo diz que devemos produzir, gerar riquezas e buscar uma vida materialmente confortável — mas não diz que devemos sempre buscar o máximo de dinheiro possível. Nosso foco deve ser nossa felicidade, nosso desenvolvimento pessoal. E o tipo de empresário focado em criar o máximo valor e em promover relações ganha-ganha está muito mais alinhado com esses objetivos.

Infelizmente, muitas pessoas parecem cegas para o verdadeiro valor de um produto. Enxergam apenas dados e números, interpretando o sucesso comercial de algo como sua principal medida de valor. Se você é bom em economia, mas não entende nada de entretenimento, por exemplo, você pode achar que Bob Iger tomou uma decisão brilhante ao colocar Moana 2 nos cinemas, em vez de lançá-lo como série no Disney+, como era o plano original. Olhando apenas para os números, Iger vai parecer um empresário virtuoso, promovendo o crescimento de sua empresa e atendendo os desejos do consumidor (o filme se tornou uma das maiores bilheterias de 2024). É necessária alguma sensibilidade estética e conhecimento da indústria para reconhecer que Iger agiu como o segundo tipo de empresário.

Consigo imaginar cenários em que priorizar o lucro, e não a geração de valor, seja aceitável (situações de pobreza, por exemplo, onde o foco do produtor é a sobrevivência). Mas lucrar sem gerar algo tangível de valor (riquezas "com lastro") não proporciona um senso de realização pessoal. Se uma pessoa trabalha apenas para ganhar dinheiro, seu trabalho dificilmente será gratificante, e ela terá que buscar essa realização em outro lugar. A situação ideal, portanto, é alinhar trabalho com valores e propósitos mais elevados.

A maioria das pessoas, creio eu, admira empresários do Tipo 1. Existem anti-capitalistas que rejeitam sucesso de qualquer tipo, mas muitos ataques a empresários que vemos na cultura popular não são contra o capitalismo em si, mas contra a atitude dos empresários do Tipo 2. Sugerir que esses empresários devam ser punidos pelo governo é errado, mas o desprezo ou falta de admiração por parte da população não são necessariamente maus.

Assim como o termo "egoísmo" tem uma conotação positiva no objetivismo, o termo "ganância" às vezes recebe o mesmo tratamento. Mas ganância não é sinônimo de ambição. É um termo usado principalmente para descrever processos imorais de obter riqueza.

Há pessoas demais lucrando através desses processos para ignorarmos as diferenças entre os gênios produtivos retratados nos romances de Ayn Rand e os empresários do Tipo 2. Enquanto objetivistas tratarem essas mentalidades distintas com o mesmo senso de respeito, eles continuarão promovendo a falsa impressão de que o objetivismo coloca riqueza material acima da felicidade humana e dos valores que a possibilitam.

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2 comentários:

Dood disse...

Concordo totalmente com o texto, especialmente no ponto sobre a importância de gerar valor tangível. Tenho percebido que essa falta de lastro é um fenômeno muito comum no marketing digital, onde muitas vezes o foco está apenas em gerar lucro rápido, sem se preocupar com a entrega de algo realmente significativo para o público. Esse tipo de abordagem acaba desvalorizando o trabalho e afastando o consumidor. Por isso, tenho me interessado muito pelo tema e estou estudando mais a fundo, inclusive fazendo um curso para entrar na área. Quero alinhar minha futura atuação no marketing digital com valores e propósitos que realmente gerem impacto positivo.

Caio Amaral disse...

Isso do marketing digital eu discuti um pouco naquele post "Riquezas Sem Lastro" né. As redes sociais e a tecnologia realmente criam milhares de novas formas de lucrar gerando pouco valor... mas os dois tipos de mentalidade existem desde sempre né. Boa sorte aí nos seus estudos..!