Apesar de não gostar muito das músicas e de certos subtextos da história, acho que o musical
Wicked tem uma narrativa forte, atemporal, e se o filme funciona, é por causa dos méritos originais da peça. Mas esta é uma versão menos acertada, com certos problemas de tom e ritmo que eu não lembro dos palcos (já vi 2 montagens, uma no Brasil e uma na Broadway). Pra começar, não há sentido algum dividir essa história em 2 filmes, sendo que tudo que há de mais icônico e memorável no musical acontece na Parte 1. Imagine dividir
A Noviça Rebelde em 2 filmes: no primeiro, temos Maria girando nas colinas, "My Favorite Things", "Do-Re-Mi", "Climb Ev'ry Mountain", o casamento, daí no segundo filme, ficamos com a chegada dos nazistas e a fuga. Essa primeira parte de
Wicked tem 2h40min — praticamente a mesma duração da história inteira no teatro. Isso quer dizer que muita coisa foi inflada, e essas gorduras ficam perceptíveis, às vezes prejudicando cenas que no palco eram redondas. Enquanto algumas sub-tramas continuam mal desenvolvidas (o romance com o príncipe Fiyero, a perseguição contra os animais falantes, a promessa de transformar Elphaba em uma garota popular), outras parecem desnecessariamente esticadas. O número showstopper "Defying Gravity", por exemplo, ficou cheio de intervalos no meio da canção (sendo que as composições de
Wicked já são meio dispersas), como se o cineasta soubesse da importância do momento e não quisesse que a cena acabasse rápido demais. O problema é que tempo e ritmo são elementos fundamentais na música. Ao esticar uma boa cena cuja base é uma canção, você não termina com uma cena mais prazerosa necessariamente, pois pode estar comprometendo o que fazia a cena funcionar em primeiro lugar.
O melhor do filme pra mim é a performance da Cynthia Erivo como Elphaba, que traz uma delicadeza nas expressões que é impossível de se criar nos palcos. Já Ariana Grande se sai bem mais por causa da eficácia do texto do que por sua interpretação particular de Glinda, que não é tão magnética quanto poderia ser (a maquiagem dá uma qualidade meio anêmica pra personagem que também não ajuda). Falando em anemia, eu realmente detesto a névoa esbranquiçada jogada sobre a fotografia do filme. É quase um pecado desbotar um universo tão marcado pela cor quanto o de
O Mágico de Oz, sem falar que o tratamento de imagem faz os cenários (vários deles reais) parecerem tão falsos quanto os desses filmes da Marvel criados inteiros no computador.
Dito isso, Wicked tem uma base narrativa sólida que continua rendendo um bom entretenimento. Vimos incontáveis histórias de origem nas últimas décadas, mas Wicked acho que ainda é a que melhor constrói uma narrativa original a partir de uma história familiar. As conexões com O Mágico de Oz são criativas, bem integradas à trama, e a produção não se limita fan-service: que torna o musical popular é a relação carismática entre as protagonistas, a discussão universal sobre preconceito, sobre introversão vs. extroversão — elementos que não dependem de O Mágico de Oz para tocar o público.
Wicked / 2024 / Jon M. Chu
Satisfação: 7
Categoria: Idealismo Imperfeito
Filmes Parecidos: Wonka (2023) / Malévola (2014) / Oz: Mágico e Poderoso (2013) / Frozen: Uma Aventura Congelante (2013) / A Bela e a Fera (2017)
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