segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

Mufasa: O Rei Leão

O "live action" de 2019 já era um filme sem razão criativa para existir. Mas, por se tratar de um remake, pelo menos ainda tinha as canções de Elton John e o enredo do sucesso de 1994 como base. Agora, por mais que tentem transformar a história de Mufasa em um grande déjà-vu da jornada de Simba, precisamos de personagens diferentes, de canções novas. E aí, Mufasa tem dificuldade de caminhar com as próprias pernas — ou patas.

O filme começa no "presente", quando Simba já é o Rei Leão. Num dia qualquer, quando Simba e Nala precisam sair para resolver questões "de adultos", a filha deles, Kiara, fica sob os cuidados de Timão, Pumba e Rafiki. A narrativa inteira é contada em flashback, a partir de uma história narrada por Rafiki. Emoldurar uma narrativa dessa forma pode ser interessante, quando há uma boa justificativa para a história estar sendo contada no presente e algum conflito que ainda precise ser resolvido. Mas aqui, Rafiki conta a história apenas para passar o tempo, o que faz o filme todo parecer desimportante, com cara de produção "direto para VHS".

A jornada de Mufasa, por sua vez, também tem pouco peso. No filme original, era plausível que Simba fugisse de casa, manipulado por Scar e acreditando ser culpado pela morte do pai. Já neste, Mufasa deixa seu lar apenas por causa de um acidente — um, aliás, que não faz o menor sentido. Quantos metros o rio pode tê-lo arrastado para longe dos pais? 300? 1 km? Se ele simplesmente seguisse o rio de volta, não chegaria exatamente no ponto onde caiu?

Vários incidentes na trama soam forçados, numa tentativa de recriar situações do original, mas sem a mesma lógica ou carga emocional. Por exemplo: assim como tivemos a debandada de gnus no primeiro filme, agora temos uma debandada de elefantes. O que provoca a debandada aqui? Uma colmeia de abelhas derrubada por Sarabi — que devem ter ferrões excepcionais para assustarem animais de cinco toneladas revestidos por um couro de três centímetros! Assim como no original tínhamos uma canção para o vilão ("Be Prepared"), aqui temos uma para o antagonista. O problema é que a melodia e a letra da canção "Bye Bye" fazem o vilão parecer cômico, ridículo — seria uma música mais apropriada para um dueto de Timão e Pumba. E, assim como o primeiro acabava com um ritual grandioso na Pedra do Rei, este segue o mesmo modelo — mas faz sentido Mufasa subir na pedra nesse filme, sendo que ele passou o filme todo sendo um Herói Envergonhado que tem aversão a qualquer expressão de orgulho?

Quando o filme não está tentando replicar passagens do original, ele está explicando a origem de elementos do original: como Rafiki encontrou seu cajado, como Scar ganhou seu apelido, etc. Mas tudo parece um fan service inventado de última hora, não uma ideia bem desenvolvida que agregue algo interessante à narrativa original (como Wicked buscou fazer).

O contraste entre o orçamento do filme, o enorme investimento na animação, e a pobreza da parte criativa, me faz pensar que, assim que a inteligência artificial for liberada para produções desse tipo, os produtores não hesitarão em entregar algo ainda mais fraco. Durante a sessão, me peguei refletindo se, num futuro próximo, sentirei saudades de filmes como este, que, apesar de vazios criativamente, ainda parecem fruto de equívocos humanos "orgânicos", e que tiveram centenas de profissionais pensando cuidadosamente em cada frame na tela. Ainda que o investimento esteja limitado ao aspecto técnico/visual, isso ainda não é melhor do que nada?

Mufasa: The Lion King / 2024 / Barry Jenkins

Satisfação: 4

Categoria: Idealismo Corrompido

Filmes Parecidos: O Rei Leão (2019) / Moana 2 (2024) / Mogli: Entre Dois Mundos (2018)

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