quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Aqui

Mais um daqueles experimentos frustrantes do Robert Zemeckis, em que ele coloca um gimmick ou uma inovação técnica acima do entretenimento. A ideia de um filme inteiro onde a câmera não se mexe até me pareceu uma restrição interessante a princípio, que poderia resultar em um exercício criativo de direção. Mas eu imaginava que haveria uma tentativa de contar uma história com começo, meio e fim — que os saltos temporais mais bizarros se limitariam à introdução e que, depois, conheceríamos o casal central (Tom Hanks e Robin Wright) e seguiríamos com um drama mais ou menos linear. Mas não é o que acontece. Os saltos temporais (que incluem até a era jurássica) persistem ao longo do filme, de forma que você vê apenas fragmentos da vida do casal. A história nunca começa, porque o filme nunca escolhe um tema central para desenvolver.

A tagline do filme diz: "Alegria, esperança, perda, amor, a vida acontece...". Essa frase poderia servir para um filme como Laços de Ternura também. Mas, em Laços de Ternura, o filme foca na jornada de uma mãe superprotetora que precisa aprender a deixar a filha sair do "ninho". Há um conflito humano específico sendo discutido, e é esse tema que nos prende à história. Aqui, não há um tema equivalente. Há apenas uma colagem de momentos aleatórios de alegria, esperança, perda e amor, mas os personagens de Hanks e Wright permanecem o "casal central genérico" — uma representação Naturalista de uma típica família americana, como se o observador estivesse a milhas de distância (o "vale da estranheza" também não ajuda a tornar os personagens mais relacionáveis). 

Zemeckis parece estar vivendo um real conflito em relação às Categorias do cinema. Ele é um Idealista por natureza, mas que, por algum motivo, tem dificuldade de se limitar a essa categoria, ao mesmo tempo em que não consegue abandoná-la completamente. Aqui, temos essencialmente um filme Naturalista com toques de Experimentalismo. Porém, ele não irá agradar ao público alternativo, que acharia interessante experimentos como o de Arca Russa (um filme feito em apenas um take), porque o mise-en-scène de Aqui é totalmente Idealista, "comercial". Há um paradoxo na tela. Parte do filme (cenário, música, atuações, luz, diálogos) é romantizada, escapista, mas a câmera catatônica, que nunca se mexe e nunca responde ao conteúdo (um artifício típico do Experimentalismo), comunica algo oposto.

O mise-en-scène sugere um artista que molda o universo para expressar certas ideias, para projetar seus valores, mas a câmera fixa é uma negação desse poder. Ela reflete a não seletividade, o não "moldar o universo". O resultado é que esse olhar indiferente, que atravessa os séculos sem responder a nada, passa a sensação de que a vida é efêmera, sem sentido, enquanto outros aspectos do filme estão lutando para dar sentido à vida. Quem ganha a disputa? A falta de sentido. Pois o Idealismo requer que todos os elementos da obra trabalhem em conjunto para criar a magia. O problema é que, como filme sobre vazio existencial, Aqui é água-com-açúcar demais para satisfazer aqueles que se divertiriam com uma reflexão mais sombria sobre a passagem do tempo.

Here / 2024 / Robert Zemeckis

Satisfação: 4

Categoria: Idealismo Corrompido (via Naturalismo / Experimentalismo)

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