Tinha um mau pressentimento a respeito desse filme desde que Spielberg o anunciou. Por algum motivo, a história de uma amizade entre uma garotinha inglesa e um gigante idoso não me parecia muito empolgante. Resolvi assistir à animação de 1989 pra ver do que se tratava, e continuei achando que o material era fraco e que não renderia um bom filme. Ainda assim, minha confiança no Spielberg é tanta que eu estava pondo fé que ele acharia uma forma de modificar o material original e transformá-lo num grande entretenimento (ainda mais o roteiro sendo da Melissa Mathison, que apesar de não ter uma carreira muito extensa, escreveu E.T. - O Extra-Terrestre que eu considero um dos melhores filmes já feitos). Infelizmente isso não aconteceu. Spielberg parece ter confiado cegamente que o livro de Roald Dahl era um clássico, e se propôs apenas a transpor a história para as telas, emprestando seu talento apenas como narrador visual (não li o livro, mas pela semelhança do filme com o desenho de 89, suponho que ele seja uma adaptação fiel).NOTAS DA SESSÃO:
- A fotografia, os cenários / direção de arte são lindíssimos.
- O começo da história é ruim. Mal somos apresentados à personagem e ela já é raptada por um gigante. Como assim? Por que gigantes caminham por Londres à noite e ninguém os vê? Não sabemos quem é essa menina, o que ela busca, o que o fato dela ser raptada muda na vida dela. Não existe nem o simples desejo de voltar pra casa (como Alice ou Dorothy), afinal ela vivia num orfanato e não tinha ninguém em sua vida. E ela gosta do gigante. Sem falar que é aquilo que eu chamo de "fantasia dentro da fantasia". Antes de aparecer o gigante, esse universo de Londres já parecia um lugar fantasioso. Não há um contraste interessante com a realidade. Spielberg raramente comete esse erro. Ele costumava dizer que não fazia filmes de fantasia como Star Wars, etc, porque gostava de trazer o fantástico pro mundo familiar do espectador (E.T. aparece numa típica casa americana, etc).- A reação da Sophie ao gigante é meio falsa. Em vez de estar apavorada, ela já fala com ele de forma confiante, o desafia, etc. Não dá pra acreditar no que está acontecendo. Ele não é uma figura muito atraente, e a amizade entre os dois não empolga. Até porque o personagem da menina é muito raso. Em E.T., por exemplo, o Elliott era visto como loser, imaturo, não era aceito no grupo do seu irmão... E o E.T. vem pra dar a ele independência, poder e maturidade. Em vez de filho, ele passa a ter um papel de protetor, e ao longo da aventura prova seu valor e sua coragem. Não há nada parecido aqui. Não temos uma conexão emocional com a história.
- A ideia de transformar flatulências em uma coisa mágica e divertida simplesmente não dá!
- Talvez o Spielberg tenha se identificado com essa ideia do BFG ser uma criatura benevolente que traz sonhos pra vida das pessoas - algo que ele sempre fez com seus filmes. É uma metáfora bonita, mas que não está embutida em uma boa história.
- Faltam conflitos, antagonistas... Esses gigantes "do mal" não são nada ameaçadores. E não faz sentido eles se mobilizarem todos pra encontrarem 1 garotinha. O que eles vão fazer com ela, comê-la? A Sophie não serviria nem como um lanche da tarde pra 1 deles. Por que eles dão tanta bola pra ela? No fim da sequência em que eles invadem a casa do BFG, o BFG consegue espantá-los facilmente com um balde d'água. Ou seja, não são obstáculos sérios que precisam ser superados. O BFG não pode simplesmente se mudar pra outro lugar e deixar os "bullies" de lado?
- Essa mudança no ato final da história me parece estranha (no desenho já achei isso). O filme todo é uma fantasia na terra dos gigantes que foca apenas na garotinha e no BFG. Depois de uma hora e tanto de filme, de repente somos jogados no Palácio de Buckingham e estamos com a rainha da Elizabeth discutindo estratégias militares pra derrotar os gigantes?! Isso não parece fazer parte do mesmo filme. E qual a necessidade deles criarem esse sonho pra rainha antes de aparecerem? Se ela visse o gigante e a Sophie sem ter sonhado com eles antes, ela não iria acreditar no que estava vendo?! Não é uma história inteligente.
- O capricho técnico do Spielberg acaba irritando numa história tão sem vida e sem emoção como essa. Incomoda ver ele se divertindo criando planos bem coreografados, cuidando obsessivamente do visual a ponto de deixar tudo plastificado - quando algo tão mais importante está sendo ignorado (a alma do filme).
- Se o Spielberg se identifica com o papel do BFG de implantar sonhos na cabeça das pessoas, o que esse trecho da rainha significa, simbolicamente? Que as decisões políticas de um país também estão à mercê dos "sonhos" dos governantes? E que quem cria e controla esses sonhos (o artista) no fim é quem governa o mundo? Dá pra viajar um pouco nessas teorias.
- A sequência final da captura dos gigantes não interessa porque é muito falsa fisicamente (esses helicópteros não conseguiriam derrubar gigantes desse tamanho). E também pelo fato dos vilões serem fracos e não representarem uma grande ameaça no contexto da história.
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CONCLUSÃO: Tecnicamente bem feito, mas a história é fraca e sem vida.
The BFG / Reino Unido, Canadá, EUA / 2016 / Steven Spielberg
FILMES PARECIDOS: Jack, o Caçador de Gigantes / As Aventuras de Tintim / A Invenção de Hugo Cabret / Os Fantasmas de Scrooge / O Expresso Polar
NOTA: 6.0





















