domingo, 8 de setembro de 2019

It: Capítulo Dois

(Esta crítica está no formato de anotações - em vez de uma crítica convencional, os comentários a seguir foram baseados nas notas que fiz durante a sessão.)
ANOTAÇÕES:

- O filme começa muito bem: a produção é ótima, a primeira aparição do palhaço após o ataque homofóbico é bem sinistra, a apresentação dos personagens adultos é interessante (os atores são bons e há umas transições visuais bem legais entre as cenas), o filme vai construindo tensão conforme os personagens vão recebendo as ligações de Derry, etc.

- Logo em que todos se reunem (a cena estranha dos biscoitos da sorte) o filme já começa a apresentar alguns problemas de tom. O humor na cena em que o garotinho reconhece o comediante no restaurante é bem inadequado (todos ainda deveriam estar choque após o que viram).

- Meio nada a ver essa história de usar alucinógenos e rituais tribais pra derrotar o palhaço. Não fica clara qual a conexão entre uma coisa e outra.

- Meio bobo eles terem que encontrar artefatos do passado pro ritual funcionar. Parece uma regra aleatória criada só pra encher linguiça até o confronto final (o filme agora vai ficar mostrando personagem por personagem indo atrás dos artefatos, vai mostrar dezenas de flashbacks, etc). Todo o segundo ato do filme acaba sendo meio arrastado, monótono, sem grandes evoluções na história.

- Desnecessária a cena da estátua do lenhador. Essas sequências de terror em flashbacks parecem gratuitas, não acrescentam muito em conteúdo e nem ajudam a avançar a história (e não criam tensão afinal são apenas lembranças, os personagens não estão de fato em perigo).

- Mais problemas de tom: em vez de assustadora, a velhinha acaba parecendo cômica na cena em que a Beverly vai até a antiga casa dela. As cenas de terror do filme em geral parecem forçadas, apelam demais pra artificialidades, pra efeitos, caretas, como se a cada cena o filme precisasse mostrar uma técnica nova e esquisita pra assustar, esquecendo que em geral a simplicidade e a sugestão impactam mais.

- Idealismo Corrompido: Assim como no primeiro, o uso de humor é destrutivo e compromete muitas das cenas (por exemplo, tocar "Angel of the Morning" enquanto o monstro vomita na cara do Eddie, ou depois quando um deles leva uma facada na bochecha e depois ainda fica fazendo piadinhas sobre o cabelo do outro).

- Não dá pra entender direito como eles pretendem derrotar o palhaço (começa com a noção de "lutar com luz", depois muda tudo e a estratégia passa a ser diminuir o palhaço de tamanho passando pelo túnel - e depois tudo muda de novo). O filme não está de fato tentando entreter, fazer o espectador se envolver no confronto, suspender a descrença, acreditar no vilão - tudo é pra ser visto de maneira simbólica - o foco todo está na mensagem de autoajuda, na metáfora dos "losers" lidando com seus traumas e inseguranças (representados pelo palhaço), então pouco importa pro cineasta se a situação na tela convence. Em vez de um confronto empolgante entre bem e mal, o filme acaba sendo mais sobre confortar os losers, celebrar os losers, discutir dramas pessoais, etc.

- SPOILER: Totalmente subjetivista a maneira como eles derrotam o vilão. Não é uma mensagem de fato inspiradora ou útil. Em vez de ensinar que pra superar inseguranças você tem que desenvolver sua autoestima, se tornar mais forte, que pra atingir um objetivo é necessário usar a razão, ser competente, o filme sugere que basta atacar o bully na mesma moeda - insultá-lo de volta e fazê-lo se sentir pequeno através de joguinhos emocionais.

- SPOILER: A frase final é bem emblemática: "Não se esqueçam, nós somos losers e sempre seremos" (dita em tom de orgulho). O filme reflete bem as tendências anti-virtude, anti-individualismo da cultura atual - a ênfase é toda no grupo, no trabalho em equipe, nas fragilidades do ser humano, etc.

It Chapter Two (Canadá, EUA / 2019 / Andy Muschietti)

NOTA: 5.0

3 comentários:

Anônimo disse...

Eu li o livro.

Essas cenas de comentários sobre homofobia e racismo não são mérito do filme, pois são presentes no livro desde o início. O monstro acaba por ser uma manifestação desses preconceitos.

A cena dos alucinógenos não está no livro, mas no livro eles cavam um buraco, fazem uma fogueira e fecham. Na alucinação com a funaça eles vêem um espírito em forma de tartaruga que ensina um ritual para derrotar a coisa, que é uma criatura alienígena também. A forma de derrotar é dentro da mente e envolve morder a língua da criatura e contar uma piada. Daí a criatura é distraída por um enquanto outro ataca ela. Coisa assim. É bem confuso e que bom que não foi no filme.

Já a cena com o lenhador no livro é mais justificada. A história deles crianças acontece nos anos 50, época dos monstros da universal. Todas as aparições da coisa são os monstros (múmia, lobisomem, pássaro gigante, monstro da lagoa negra, etc). Fica bem claro que a coisa aparece usando aquilo que a pessoa está pensando na hora. No livro o menino está cansado, senta no banco e pensa no lenhador. A coisa se manifesta pelo pensamento dele.

Outra coisa ruim é a forma final da coisa. No livro é bem mais assustador. Eu até estava com medo de como eles fariam. Quando chegam na caverna, eles percebem que o teto está se mexendo. Ao prestar atenção, percebem, nas palavra do livro "o maior horror do mundo". Uma criatura aracnídea toda preta, gigante, da qual eles nunca viram algo assim e ficam paralisados, incapazes de explicar o que viam.

Cortaram o arco da esposa do Bill e do marido da Bev. Se esforçaram demais em mostrar criaturas assustadoras e acabaram tirando o drama que dava conexão dos medos dos personagens com os do espectador.

Caio Amaral disse...

Legal! Eu nunca li o livro... minha única referência era a versão de 1990 que até onde lembro não tinha essas questões que apontei aqui...

Anônimo disse...

Não me arrependi em ir no cinema, por que a experiência de filme de terror em telona é outra coisa. Concordo com você em vários pontos. Achei muiiiiiiiita fantasia e aquela cena no restaurante chinês foi ridícula. Parecia mais filme do Ghilherme Del Toro

XX :-)