A impressão é que a única questão na mente dos produtores neste filme era "Como parecer respeitável?". Eles sabem que os fãs entram na sala já querendo amar tudo e dar nota 10, portanto não existe a necessidade básica de elaborar uma boa história, pensar em como estimular e envolver o público (eles não precisam ganhar pontos, como filmes normais, só não querem perder os que já têm garantidos) — então todos os princípios e técnicas que discuto aqui no blog vão por água abaixo. E como é que eles conseguem "parecer respeitáveis"? Simples: colocando uma espécie de filtro sobre o filme todo, que deixa tudo escuro, chuvoso, com uma trilha tenebrosa, e faz os atores falarem num tom grave, dramático, independentemente do contexto — se Batman parasse no drive-thru de um McDonald's pra pedir um lanche, tanto ele quanto a funcionária estariam na penumbra falando desse jeito anti-natural. É o que falo no texto Pseudo-Sofisticação (a analogia do garoto fumante). Filmes que de fato são densos e sérios não precisam fazer esse teatro todo. Pois a seriedade é fundada no conteúdo. Se você assiste a O Poderoso Chefão, até as cenas mais pesadas do filme têm mais sentimento e naturalidade do que as de Batman, que é totalmente árido e forçado. Batman é um filme vazio em ideias, conteúdo, inteligência... É apenas uma reciclagem de dezenas de outras produções que vimos antes. Portanto, a única forma dele parecer um filme imponente é através do tom, do estilo. É um filme que funciona muito bem pra quem senta na poltrona e se conecta apenas com a aparência das coisas: quer saber se Pattinson ficou com um visual cool, se a estética do filme está dentro do que é considerado legal no momento, se é fiel aos quadrinhos. Mas se você se conecta com uma história através do conteúdo: do que acontece, dos valores em jogo, dos personagens, das ideias, o filme não tem nada pra você. Até porque mal somos apresentados ao protagonista. Apesar de não ser uma sequência, e o título sugerir um reboot ou uma história stand-alone, Bruce Wayne é jogado na tela sem grandes introduções e já parte pra missão da vez, como se fosse uma série já na segunda temporada... Não há um cuidado em apresentá-lo, mostrar seus atuais dramas e desejos, então vira um típico "filme de serviço". Existem mistérios, traições, perigos na história, mas o que o espectador vê 90% do tempo são personagens conversando sobre uma trama vaga que está ocorrendo em outro lugar, falando sobre personagens secundários que mal conhecemos — e não vendo a trama de fato se desenrolar diante de seus olhos. Nada do que acontece tem grande impacto emocional. E o filme parece propositalmente evitar coisas muito dramáticas, grandiosas. O mundo não parece correr um grande perigo, o vilão fica em segundo plano, os próprios gadgets do Batman estão mais discretos que no passado (tecnologias, carros, motos, etc), SPOILERS — o "grand finale" é uma sequência de ação bem capenga onde Batman apenas solta umas pessoas presas numas ferragens em um ginásio alagado. Os filmes de Nolan, embora sérios e sombrios, pelo menos buscavam espetáculo, grandiosidade. Aqui é tudo mais contido, reprimido, realista... Batman não luta grandes batalhas, não derrota o vilão definitivamente (aliás quase nenhum bandido morre o filme todo; punir o mal virou politicamente incorreto), não vive o romance com a mocinha (em vez de suicídio, o auto-sacrifício desta vez tem ares celibatários). Não há nada de terrível ou de tão incômodo no filme (além do tempo de duração), mas também não há nada de bom. É apenas um grande nada, algo que nem me parece um filme; porém um nada "respeitável".
OBS: se eu fosse atualizar a lista das 10 Tendências Irritantes do cinema, eu acrescentaria agora essa moda de traduzir textos para o português já na imagem em si, em vez de colocar legendas (textos que aparecem em celulares, telas, até mesmo o título do filme no início). Em Batman eles foram além, e traduziram até um texto pichado no chão em uma cena! Qual a lógica por trás disso (exceto a do exibicionismo tecnológico)? Daqui a pouco vão começar a substituir digitalmente dólares por cédulas de Real nas cenas... e quando surgir um noticiário na TV, veremos o William Bonner inserido digitalmente para que o espectador daqui "entenda" melhor.
The Batman / 2022 / Matt Reeves
Nível de Satisfação: 2
Categoria C: Idealismo Corrompido (Pseudo-Sofisticação; tom sombrio / Emoções Irracionais)
Filmes Parecidos: Liga da Justiça de Zack Snyder (2021) / Batman vs Superman: A Origem da Justiça (2016) / Coringa (2019)
5 comentários:
Uma coisa não citada é como esses artifícios da pseudo sofisticação escondem as falhas do filme como o fato do Robert Pattinson não ter o físico do Batman. Não consegue trasmitir o background do personagem, porque o Batman foi um ser que dedicou sua vida e treinamento ao combate ao crime.
O Batman original era fortão? Sempre achei que por ser um milionário cujos poderes vêm mais das armas/tecnologia.. que até faria sentido ele não ser tão bombado..
No caso ter uma característica física de alguém medianamente atlético, não um bodybuilder
Eu nunca vi um filme tão inacreditável na minha vida. Durante as 3 horas que pareciam 30, eu torcia para o Arnold pular na tela fazendo algumas piadas com gelo, ou até mesmo para o Jared Letho salvar o filme com aquele coringa horroroso dele. O ritmo é tão lento e tão parado que eu não acreditava no que eu estava assistindo. A sensação daquele momento lento antes do susto em filmes de terror, só que o filme todo é só aquele momento e nada mais. Como a mulher que está em um corredor com várias portas e o monstro atrás de alguma das portas. Ela vai andando e abrindo bem devagar cada porta e a musica tem aquele tom sinistro como se fosse acontecer algo. Só que no Batman é só o corredor, sem monstro e sem susto.
Mas o inacreditável é como o publico e a crítica parecem ter preferencia por uma história super chata de máfia, quem matou quem, quem traiu quem, como se isso trouxesse alguma importância. Se nesse filme de pessoas conversando não tivesse um cara vestido de Batman, seria lançamento direto em home vídeo pra evitar a certeza da bomba.
E este herói que vc fala que não vive, não morre e não faz nada, também não consegue evitar os planos do vilão. Então passamos 3 horas vendo um cara vestido de batman em discussões sobre corrupção de 30 anos atrás, esperando resolver todo o mistério e impedir o vilão para no final falhar miseravelmente. O charada mata todos que capturou, inunda a cidade e só vai preso e o pinguim termina livre e mais poderoso ainda.
Mas o que me deixou insultado foi o filme gastar uns 30 minutos do tempo do espectador com toda especulação sobre quem seria O rata alada (um pinguim? um morcego? Um pombo?), para no final o pinguim falar que era A rata alada e tornar automaticamente obsoletos aqueles 30 minutos anteriores.
É estranho né..! Pois pra alguns pode parecer que essas reclamações são abstratas, papo de cinéfilo chato, e que na prática o filme não pode ser tão estranho assim.. mas pra mim é essa coisa inacreditável mesmo que você descreveu..! E a estética de filme policial realista acaba deixando até meio ridículo o personagem se fantasiar de morcego.. talvez por isso seja tudo tão escuro.. Quanto à rata alada, a essa altura eu já nem estava mais prestando atenção nas charadas.. pois o filme só apresentava uma charada, e depois mostrava o Batman solucionando magicamente, tipo Sherlock Holmes, sem dar tempo da gente participar do raciocínio, ver sentido na sacada.. não eram apresentadas boas ideias, como num filme do David Fincher por exemplo.. o filme só queria dar a impressão de um filme nesse estilo, um policial de reviravoltas inteligentes, mas o roteiro não tinha substância o bastante pra prender a atenção nesse nível.
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