Recentemente o Yaron Brook fez um comentário interessante em seu programa de rádio: ele disse que as pessoas de esquerda nos EUA são mais instruídas e mais educadas do que as de direita, e que o motivo disso seria, na visão dele, o fato da direita estar associada à religião. Ou seja - já que pessoas mais intelectualizadas costumam se distanciar da religião, elas tendem a se distanciar da direita também, e a se aproximar mais da mentalidade da esquerda, que é não-religiosa. Brook parece achar que isso é algo aleatório; que se a direita não tivesse historicamente se associado à religião, que o caminho poderia ter sido outro. Eu já acho que existe uma relação natural e menos óbvia entre esses fatos. Acompanhe o raciocínio:
A direita está, de maneira geral, associada a conceitos como individualismo, ambição, à vontade de competir em busca de seus objetivos e de ser bem sucedida. Isso reflete uma certa dose de autoconfiança e otimismo.
A esquerda está, de maneira geral, associada a conceitos como coletivismo, igualdade, ao desejo de viver numa sociedade onde ninguém tenha mais vantagens que ninguém, ninguém seja mais bem sucedido que ninguém, onde suas necessidades básicas não dependam de suas habilidades. Isso reflete uma dose mais baixa de autoconfiança e otimismo.
Quando somos crianças ou adolescentes, normalmente todos nós temos sonhos e expectativas positivas em relação ao nosso futuro. Pensamos que somos indivíduos especiais com grandes coisas reservadas para nossas vidas. Nessa fase, estamos mais em harmonia com a autoconfiança da direita.
Mas nessa fase, boa parte de nossa autoestima e esperança são baseadas em irracionalidades, na "fé" de que algo irá tornar nossas vidas automaticamente fáceis e nossas felicidades garantidas - nós simplesmente fechamos os olhos e escolhemos acreditar em nossos sonhos, acreditar que somos especiais, melhores que os outros, sem considerarmos friamente os fatos da realidade: nossas reais virtudes e chances de sermos bem sucedidos.
Esta é a conexão entre misticismo, racionalizações - nosso lado mais cego e irracional - e sentimentos positivos como otimismo e autoconfiança (que estão mais em sintonia com a direita).
É daí que vem a expressão "ignorância é uma bênção". Quando você é ignorante, não está comprometido com a realidade e se sente livre pra acreditar no que quiser, é mais natural ser otimista, acreditar que você tem um grande potencial e que o universo conspira ao seu favor - mesmo que você não tenha nenhuma educação, dinheiro, saúde e que todos os fatos indiquem o contrário. A ignorância e a fé permitem que multidões cultivem sentimentos de esperança e autoestima; sentimentos que a maioria não teria se elas tivessem um nível mais elevado de consciência a respeito da realidade, pois lhes faltariam fatos pra sustentar essas ideias.
Na medida em que uma pessoa amadurece intelectualmente e passa a enxergar a realidade de maneira mais objetiva, ela muitas vezes tem que abandonar esses sonhos ilusórios da juventude, pois geralmente eles não estão baseado em fatos. E com isso - com a chegada do realismo intelectual - podem ir embora também os sentimentos de esperança e autoconfiança.
Esta é a conexão entre entre racionalidade, inteligência, e sentimentos de baixa autoestima, pessimismo (mais em sintonia com a esquerda).
É por isso que a esquerda, de maneira geral, é mais instruída e mais intelectual que a direita - pois eles são aqueles que tiveram intelecto pra superar a fase da autoestima ilusória da juventude, e se tornaram inteligentes e maduros o bastante pra aceitarem melhor a realidade - que na grande maioria dos casos é menos colorida do que essas pessoas gostariam.
A direita em geral continua se agarrando ao misticismo, como forma de proteger a noção confortadora de um universo benevolente, ordenado, familiar, e de um valor próprio inquestionável - o que não é um grande convite à curiosidade intelectual.
Claro que as opções não se limitam a essas 2. Você também pode ser uma pessoa intelectualmente madura e ainda assim ter ambição, autoestima, otimismo. Mas isso dá muito mais trabalho - pois você tem que ter motivos concretos pra sustentar esses sentimentos, sem poder baseá-los em uma fé cega; nos sentimentos automáticos da infância. Você tem que ter a força pra abandonar o otimismo superficial e místico da juventude, e a capacidade pra reconstruí-lo na vida adulta com base em fatos e em suas reais qualidades, e essa é uma virtude raramente conquistada.
É por isso que, em geral, a direita representa uma massa autoconfiante, porém mais ignorante e religiosa (seu orgulho depende de uma boa dose de fé e racionalizações pra se sustentar) e a esquerda representa uma minoria mais intelectual, realista (em relação às limitações humanas, pelo menos), não-religiosa, porém com menos autoestima e com uma visão de mundo mais trágica (e inteligente o bastante pra manipular a maioria conservadora e chegar ao poder).
Algumas pessoas acham que conceitos como "direita" e "esquerda" são inúteis e não fazem mais sentido, pois eles não representam práticas políticas consistentes (e nessa área os 2 grupos são até parecidos). Mas os conceitos passam a ter relevância quando você entende que eles no fundo falam sobre psicologia e identidade social, e aí sim existe uma enorme rivalidade - 2 grupos que não têm um sentimento de valor próprio, e usam táticas opostas e antagônicas para lidar com este problema. Enquanto um está determinado a sentir superior, parte de uma "elite", mesmo que tenha que ignorar a realidade e viver num mundo de fantasias, o outro está tentando se conformar com o fato de que nunca conseguirá se sentir superior, e por isso precisa negar o conceito de virtude e a ideia de que o ser humano é capaz de atingi-la. No fim, ambos precisam negar a realidade em algum nível e formar racionalizações para se protegerem, porém fazem isso em níveis e em áreas diferentes.
Os que conseguem manter um grau elevado de autoestima e otimismo baseados na realidade (sem depender dessas racionalizações comuns) em geral não pertencem nem à direita nem à esquerda tradicionais — representam uma minoria menor ainda, incompreendida pelos 2 grupos maiores, e pequena demais pra influenciar as massas e mudar o curso da sociedade através da democracia.
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