terça-feira, 31 de outubro de 2017

Stranger Things 2

Isso não é uma crítica completa à segunda temporada, apenas uma observação que acho importante fazer. A série obviamente se apresenta como uma homenagem a filmes dos anos 80, e se inspira particularmente em produções de Steven Spielberg e James Cameron como E.T. - O Extraterrestre, Aliens - O Resgate, Poltergeist - O Fenômeno, Os Goonies, O Exterminador do Futuro, Contatos Imediatos do Terceiro Grau, etc. Como já disse aqui várias vezes, Steven Spielberg e James Cameron são 2 dos meus cineastas favoritos e a maioria dos filmes citados estão no meu "top 100". E como um fã e estudante desse estilo de cinema, me sinto na obrigação de vir aqui lembrá-los que Stranger Things não tem nada a ver com esses filmes.

Stranger Things é uma "homenagem" aos filmes dos anos 80 na mesma medida em que La La Land é uma "homenagem" aos musicais clássicos. Nos 2 casos as produções soam inautênticas, pois não só não têm o mesmo compromisso com qualidade técnica, como não têm o mesmo espírito e os mesmos valores dos filmes que tentam homenagear. Elas fingem que estão resgatando o espírito do passado (um período considerado mais feliz, divertido e inocente do que o atual - e que justamente por isso provoca nostalgia nas pessoas), mas na prática fazem isso apenas no nível da superfície: através do visual, do estilo da trilha sonora, dos figurinos, de referências explícitas a outros filmes, etc. Naquilo que realmente importa, nos valores essenciais transmitidos através da história, dos personagens, são produtos totalmente "2017", que estão em plena harmonia com o espírito da atualidade - que é bem diferente do da época e em muitos aspectos é hostil ao espírito da época.

Portanto não - Stranger Things não é um bom exemplo do tipo de entretenimento que eu costumo defender aqui (eu tinha gostado até da primeira temporada, apesar de algumas ressalvas, mas agora na segunda vendo os defeitos da série de forma mais exagerada, já não fico tão entusiasmado em recomendá-la).

5 comentários:

Marcus Aurelius disse...

Bem observado, não tinha pensado por este ponto de vista e faz muito sentido.

Então para uma obra ter o "espírito" dos anos 80 e não de 2017, ela teria que ser tão inovadora e autêntica quanto os filmes feitos naquela década. É como alguém que diz que vai imitar o estilo clássico de alguém como Alfred Hitchcock, mas não considera que Hitchcock era na verdade inovador e revolucionário em seu tempo. Logo, para "imitar" seu estilo, então o realizador deveria ser revolucionário hoje e não fazer uma obra recriando elementos estéticos do cineasta.

Roger Olivieri disse...

Tive a exata mesma sensação, Caio. É bem o zeitgest de 2017 fantasiado com o estilo "80's". Nada mais que isso. Senti nessa temporada o mesmo incômodo que sinto quando vejo uma produção contemporânea pós moderna. Só mudaram a estética, pois o "ethos" é o mesmo da maioria das produções pós 2010...

Caio Amaral disse...

Marcus, como eu não fiz uma crítica mais detalhada, não fui muito claro no que quis dizer com o espírito da época..

Pra mim, o fundamental aqui é a atitude da série em relação aos valores que listei na postagem "Os 4 Pilares do Entretenimento" - em particular os conceitos de Autoestima e Benevolência (são sempre esses 2 que entregam o "senso de vida" da obra).

Enquanto em filmes como Aliens, E.T., etc, havia uma atitude pró-autoestima, por exemplo (a ideia era glamourizar e tornar o protagonista "maior que a vida", inspirador para o espectador, celebrar suas forças, mostrá-lo se tornando mais forte ao longo da história), em Stranger Things já temos mais aquela noção de coletivismo, ausência de protagonista, foco nas fragilidades e limitações dos personagens, etc. Sem falar no foco excessivo em relacionamentos conflituosos, personagens moralmente "cinzas" (Eleven se tornou mais rancorosa, vingativa, por exemplo) nos desentendimentos entre os personagens (estão todos o tempo inteiro brigando, discutindo, discordando, mentindo), dramas pessoais, traumas, sofrimento, romances baseados em fragilidades mútuas e necessidade de aceitação - em vez de admiração mútua, paixão, etc. Isso tudo vai destruindo esses conceitos que listei (Autoestima, Benevolência, etc). Os filmes antigos citados eram simplesmente sobre indivíduos atraentes realizando coisas fantásticas, perseguindo sonhos, formando relações ideais com outras pessoas, superando problemas e caminhando em direção a uma vida melhor.

Não necessariamente Stranger Things teria que ser original, inovadora (não ser retrô) pra abraçar esses valores. Spielberg por exemplo era um cara nostálgico, e alguns de seus filmes eram quase que homenagens a coisas que ele gostava quando criança.. Indiana Jones foi inspirado em seriados dos anos 40, etc. Isso não tira os valores positivos do filme.

O erro com os imitadores atuais de Hitchcock geralmente é que eles tentam fazer uns filmes "sofisticados", frios, pouco divertidos, focados em técnica pela técnica, etc.. e raramente fazem sucesso comercial.. Hitchcock era um entertainer popular assim como Spielberg, só que especializado em suspense.. (diria que o "pilar" mais ignorado aqui é o da Diversão).

Roger... realmente... parecia que eu estava vendo algo como "13 Reasons Why"... e não um filme antigo do Spielberg / Cameron. É tipo um músico atual que resolve gravar um cover de um sucesso antigo... mas daí muda totalmente o arranjo, canta com os trejeitos atuais, deixa tudo com uma cara contemporânea, e elimina justamente aquilo que tornou a música original um sucesso.. hehe. Abs!

Dood disse...

Achei interessante esse link:

http://bocadoinferno.com.br/artigos/2017/11/as-11-falhas-de-stranger-things-2/

Realmente essa temporada destoa do que era o espírito dos anos 80, ela só pegou a ambientação e nada mais.

Caio Amaral disse...

É.. ele tb não gostou da temporada.. mas por razões diferentes das minhas.. ele gostou por exemplo da relação entre a Eleven e o Hooper, que eu achei uma das coisas mais irritantes da série.. o Hooper parecia um pedófilo doentio..