
Em Horizon, o desencontro entre a ambição e a capacidade real de Costner é tão contrastante que se torna o verdadeiro foco de interesse - eu só tive paciência de ver a essa "1ª Temporada" de Horizon porque havia tanta coisa errada na tela que eu fiquei as 3 horas "entretido" tentando desembaraçar e entender os problemas do filme.
Pra começar, Horizon de fato parece uma série de TV metida a besta, como os críticos vêm apontando. O roteiro é episódico, cheio de núcleos desconectados, passagens irrelevantes, conflitos que não levam a lugar nenhum (qual o propósito, por exemplo, da cena em que escorpiões que são encontrados no chão da cabana, ou a do garotinho que é desafiado a duelar com um índio no bar?), e o filme segue todos os moldes narrativos preguiçosos das série de TV modernas (o que já era esperado, considerando a magnitude do projeto - Costner só deve ter encarado essa missão de escrever 4 longas épicos para o cinema pois aprendeu em Yellowstone com os profissionais como é que se enche linguiça).
Mas mesmo se perdoássemos isso, Horizon ainda seria uma série de TV ruim - apesar das imagens bonitas, os amadorismos do roteiro e da direção começam a se revelar já nos primeiros minutos de filme. Reparem, por exemplo, a maneira esquisita como o título "Horizon" surge na tela, sem nenhum timing, logo após um breve prólogo que não mostra nada substancial a ponto de justificar a música triunfante que entra em seguida. Essa falta senso narrativo/estético permeia o filme todo. Lá pela 1h45, há uma cena estranhíssima em uma caravana (onde uma carroça está sendo consertada e um cavalo fica agitado) que eu tive que rever umas 3 vezes e ainda fiquei sem entender completamente o que aconteceu. Outra cena visivelmente mal escrita/dirigida é a aquela em que a Mrs. Riordan bate com o guarda-chuva nos rapazes que estão "roubando" a cama de sua casa, mas depois muda de ideia pois descobre que a cama seria para a bela Miss Frances e sua filha Elizabeth. Mas a Mrs. Riordan sabia quem eram as duas? Por que ela muda tão bruscamente de atitude? Pela boa aparência das mulheres? Há vários momentos confusos assim, onde um conflito que você nem sabe pra que começou, envolvendo personagens que você mal sabe quem são, é resolvido de maneira arbitrária. Costner consegue deixar confusa qualquer cena que seja mais complexa que duas cabeças conversando, e muito disso é problema da fotografia também - por isso nunca se deve confundir "imagens bonitas" com uma boa direção de fotografia.
Eticamente/politicamente, a visão da América que Costner projeta aqui também é problemática - não é mais a América representada pelos faroestes de John Ford ou Howard Hawks, mas uma releitura dela, influenciada por crenças e valores do conservadorismo moderno "pós-liberal". O que é romantizado aqui não é a América "terra dos livres", o país onde instituições garantiam as liberdades dos cidadãos para perseguirem seus objetivos - mas uma terra ainda livre de instituições sólidas, onde os homens passam a maior parte do tempo não perseguindo seus objetivos, mas lutando contra bandidos - o tipo de sociedade primitiva, dominada por força bruta e por valores tradicionais que é cultuada por muitos críticos da sociedade moderna, e que me remete a séries como Game of Thrones. (A maneira como o filme demoniza o casal jovem "elitizado" da caravana é particularmente reveladora e reflete o teor populista/anti-ricos da política moderna).

Essa abordagem (decorrente da epistemologia mística/platônica/não-objetiva do artista) em vez de intensificar a abstração e deixar o Oeste ainda mais colorido e grandioso na mente do espectador, acaba fazendo o oposto - a memória que o filme deixa é apenas a de um borrão sem forma - como fatos que você ouve em uma aula de história, mas que são tão impessoais e fora de contexto que no dia da prova você já esqueceu tudo.
Horizon: An American Saga - Chapter 1 / 2024 / Kevin Costner
(Evito baixar torrents de lançamentos, mas Horizon ainda não tem previsão de estréia Brasil, e por conta do fracasso, é bem possível que ele venha direto para o streaming - caso seja lançado no cinema, comprarei o ingresso, mas não pretendo ver o filme de novo, até porque a linguagem de TV não cria nenhum senso de urgência de vê-lo na tela grande.)
Satisfação: 2
Categoria: Idealismo Corrompido
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