quarta-feira, 11 de junho de 2025

Junho 2025 - outros filmes vistos

Até a Última Gota (Straw / 2025 / Tyler Perry) — "Pornô de vitimização" que beira a comédia de tão ingênuo e escrachado — e com uma bússola moral tão deturpada que faz filmes como Bonnie e Clyde e Coringa parecerem moralistas em relação aos bandidos. A ideia parecia ser contar a história de uma "criminosa com um coração de ouro" estilo Thelma & Louise — a diferença é que a personagem aqui, além de ser uma mulher desprovida de qualquer qualidade positiva de caráter (e a principal causadora dos próprios problemas), assassina um homem inocente antes de partir em sua "jornada de redenção". Em vez de uma inocente injustiçada, temos uma mulher que deveria de fato estar na cadeia. Mas o filme não pensa assim e espera que torçamos por ela pelo simples fato dela ser pobre e ter uma vida desgraçada — em um único dia, tudo de ruim que poderia acontecer a alguém acontece com ela. Se você é do tipo que confunde sofrimento com nobreza de caráter, ela soará como uma das personagens mais virtuosas de todos os tempos! Dessa forma, como julgá-la "só" por matar, cometer extorsão, fazer reféns? Já vi muitos filmes moralmente ambíguos, que tentam relativizar as ações de personagens maus, mas poucos pareceram tão entusiasmados e livres de culpa ao perdoar atos criminosos quanto este.

O Esquema Fenício (The Phoenician Scheme / 2025 / Wes Anderson) — Apesar de ser um dos diretores mais monótonos da atualidade, Wes Anderson pelo menos não é preguiçoso — ele se dedica 100% toda vez que repete a mesma receita. O filme é puro Estilo Acima de Conteúdo — uma trama que ninguém em sã consciência diria que é interessante — mas Anderson executa esse "nada" com imaginação, capricho e leveza, preservando certa dignidade como artista (ainda que eu continue achando que ele é um designer preso no corpo de um cineasta).

Bailarina (Ballerina / 2025 / Len Wiseman) — Gun Fu (filmes que combinam artes marciais com o uso de armas de fogo) é um dos subgêneros que menos me atraem no cinema, e John Wick se tornou, pra mim, uma das piores influências sobre a ação moderna. Dito isso, Bailarina foi uma boa surpresa. Achei o melhor filme da franquia — não por ser inovador ou transcender totalmente os problemas do gênero, mas por ser mais sólido narrativamente e por Len Wiseman se mostrar um cineasta mais hábil que Chad Stahelski, tornando inclusive as cenas de luta mais bem dirigidas, detalhadas e divertidas de assistir.

Predador: Assassino de Assassinos (Predator: Killer of Killers / 2025 / Dan Trachtenberg, Joshua Wassung) — Levar o Predador para o universo de vikings e samurais me pareceu esquisito a princípio, mas não deixa de ser o reconhecimento de um fato: a franquia Predador sempre foi mais sobre músculos e testosterona do que sobre os elementos de ficção científica que sustentam a franquia Alien. A animação até que é bem realizada, mas se você não vê um valor intrínseco no combate físico, na "arte" de dar porrada (o roteiro poderia facilmente ser transformado em um videogame de luta), vai ser difícil se importar com qualquer coisa. O filme ainda "moderniza" a franquia exaltando os oprimidos, dignificando o sofrimento e o sacrifício — toques meio estoicos/cristãos que destoam do Predador original.

Mountainhead (2025 / Jesse Armstrong) — Sátira social fraquíssima que parece mais um descarrego de um hater de bilionários do que um filme com algo útil a dizer. A ideia é mostrar o quão patéticos (e perigosos) são CEOs de big techs, talvez na esperança de promover algum tipo de regulação sobre eles. Há críticas válidas que se poderia fazer a esse tipo de figura, mas para isso, o filme precisaria mostrar uma compreensão minimamente equilibrada de seus alvos, em vez de apenas criar versões caricatas deles e atacar esses estereótipos vazios. O título Mountainhead é uma referência explícita ao livro A Nascente (The Fountainhead), da Ayn Rand — e se o diretor vê alguma semelhança entre a mensagem de The Fountainhead e o caráter dos personagens do filme, isso só prova o quanto seu discurso é raso e tendencioso.

O Predador (1987)

Apesar de ser de um gênero que eu gosto, de uma era que eu gosto e com um ator que eu gosto, O Predador é um filme que nunca achei tão bom quanto sua popularidade sugere. Depois de assistir ao spin-off Predador: Assassino de Assassinos, acabei decidindo rever o original para fazer algumas comparações, e a primeira coisa de que me dei conta é que, apesar de já ter visto O Predador mais de uma vez, é um filme do qual sempre tenho uma lembrança vaga — lembro da ambientação na selva, da criatura, mas é quase como se eu não tivesse visto o filme de fato, como se tivesse pegado essas referências de trailers. Dessa vez, entendi melhor o porquê disso: ao contrário dos filmes da franquia Alien, O Predador é um bom exemplo de um filme sem bons set pieces. Todos os momentos significativos da narrativa são executados de maneira casual, desleixada, esquecível — não há nenhum trecho que renderia um “corte” fantástico, digno de ser revisitado e apreciado por si só. A criatura é revelada de maneira esparsa, sem nenhuma entrada ou momento emblemático; a primeira morte não traz nenhuma ideia memorável; a primeira vez que o protagonista vê o alien também não marca; nem a maneira como ele o derrota no final. Para mim, é como se bons set pieces dessem identidade a um filme — e, quando não há esses momentos excepcionais, o filme não se cristaliza direito na memória; o que se guarda é apenas um borrão ou imagens fragmentadas.

Na prática, O Predador está mais para um macho-filme daqueles estilo Stallone/Van Damme do que para uma ficção científica como Alien. É como se eles tivessem pensado inicialmente em um filme de guerra repleto de músculos e metralhadoras e, no fim, alguém tivesse dado a ideia de jogar um alien fortão no meio da história só pra tornar o combate mais intenso (até porque extraterrestres estavam em alta nos anos 80, assim como halterofilistas — por que não unir Rocky e E.T.?). Durante os primeiros 40 minutos, a criatura nem interfere na trama — fica apenas observando os personagens à distância, o que torna a narrativa arrastada. As tentativas do filme de nos envolver na missão de guerra no começo são totalmente fúteis. Depois, o Predador começa a matar um membro da equipe por vez — mas o protagonista só vai descobrir sua existência lá pela meia hora final, o que nos distancia dele enquanto personagem. É como um slasher estilo Sexta-Feira 13, em que os personagens não têm muito o que fazer durante dois atos, e tudo se concentra no showdown da última meia hora. Bons slashers conseguem se safar com essa estrutura, usando essa primeira hora para assustar o espectador e apresentar cenas de morte impressionantes. Mas, como disse, O Predador não tem essas grandes cenas, e eu particularmente não acho que a criatura dê medo — principalmente pela ambientação: o que torna um monstro assustador não é apenas a criatura em si, mas o contexto em que ela aparece. Quanto maior o contraste, mais assustador. O alien que aparece na festa infantil de Sinais (2002) não é horripilante por ter um design particularmente bem-feito — ele assusta pelo contexto em que aparece: em um local familiar, cotidiano, inocente. Tubarão (1975) cria tensão porque a criatura aparece em praias ensolaradas, onde crianças estão se divertindo, famílias estão de férias relaxando. Agora, em O Predador, os personagens são soldados durões numa selva cheia de cobras e criaturas perigosas, onde estão sendo perseguidos por guerrilheiros sanguinários. Nesse contexto, a criatura se torna apenas uma ameaça extra — seria como esperar que o tubarão fosse igualmente impactante se aparecesse na praia de O Resgate do Soldado Ryan.

Com um roteiro melhor, o confronto final entre o Schwarzenegger e o Predador poderia ter rendido um clímax recompensador, mas o que acontece é muito sem lógica e criatividade. O Predador supostamente só enxerga calor — mas, por algum motivo, o herói consegue se esconder dele passando lama no corpo e se mesclando visualmente com o fundo, além de despistá-lo arremessando pedras na mata, dando a entender que o monstro também capta movimento ou som. Um dos momentos de heroísmo que mais se destacam envolve uma flecha explosiva que parece uma imitação preguiçosa da cena de Rambo 2. A armadilha que Schwarzenegger prepara para matar o Predador no fim também não tem muita plausibilidade. Durante a maior parte do filme, o herói parece perdido em uma situação sobre a qual não tem o menor controle. Daí, no final, ele subitamente se torna um perito em caçar Predadores — o que não gera admiração, por ser feito de forma forçada.

Com uma direção e um roteiro fracos, O Predador só merece certo crédito porque foi feito numa época em que a indústria cinematográfica era robusta, repleta de talentos, e algum valor de entretenimento acabava recaindo sobre a maioria dos filmes: o longa é encabeçado por um verdadeiro astro, a trilha sonora de Alan Silvestri ajuda a manter a experiência estimulante, o trabalho de Stan Winston com a criatura é ótimo, etc. Mas, pra mim, o legado do filme não é proporcional à sua real qualidade.