sábado, 22 de junho de 2019

Toy Story 4

(Esta crítica está no formato de anotações - em vez de uma crítica convencional, os comentários a seguir foram baseados nas notas que fiz durante a sessão.)

ANOTAÇÕES:

- O flashback inicial serve pra estabelecer que Bo foi doada e se separou da turma, mas toda a sequência de ação pra salvar o carrinho da enxurrada parece desnecessária, jogada ali só pro filme começar num ritmo acelerado.

- Muitas vezes os alívios cômicos acabam sendo as melhores coisas nos filmes da Pixar (sacadas divertidas como Forky ser complexado por ser feito de lixo, etc).

- A animação é excelente como de costume, mas o filme acaba parecendo uma continuação desnecessária, redundante, pois volta a falar de abandono, temas já explorados em episódios anteriores. Sem falar que a trama é não é das mais envolventes: a garotinha Bonnie apenas corre o risco de perder um garfo descartável que ela gosta de brincar, e Woody cria toda uma mobilização pra evitar que o garfo se perca - mas não é algo que pareça sério o suficiente pra prender a plateia. Falta um conflito mais dramático.

- Woody é um protagonista meio desinteressante pois é daqueles heróis altruístas cuja missão na história é apenas servir, ajudar os outros a conseguirem o que querem, mas que nunca busca um objetivo pessoal, atraente, com o qual a gente possa se identificar (no começo do filme, fica claro que o desejo real dele é ser importante pra Bonnie, ser amado por ela como ele era amado pelo Andy - com isso a gente até poderia se identificar, o problema é que daí ele percebe que Bonnie gosta mais do garfinho descartável, e então ele passa a fazer de tudo pra que Bonnie e o garfinho fiquem juntos, ignorando suas necessidades pessoais).

- O roteiro é cheio de desvios e sub-tramas desnecessárias, pouco interessantes. Por exemplo Buzz indo atrás de Woody e ficando preso no parque de diversões, ou a missão dos brinquedos de roubar a chave da velhinha pra abrir o armário (várias piadas em cima disso), sendo que não fica claro que o armário está trancado (o boneco de ventríloquo entra e sai de lá pra falar com Gabby Gabby sem parecer usar chave). Daí tem o motoqueiro que precisa fazer o salto pra chegar no armário (criam todo um "arco" pro motoqueiro, vemos flashbacks, ficamos sabendo de seus traumas pessoais) sendo que parece um personagem desnecessário - não parece tão difícil assim subir num armário, ainda mais pra brinquedos que estão o tempo todo saltando de carros, voando pelos ares, etc. SPOILER: No fim tudo ainda dá errado, Forky continua preso no antiquário, e nada disso serviu pra qualquer coisa.

- SPOILER: O filme romantiza tanto o auto-sacrifício que faz Woody praticamente doar um rim (sua caixinha de voz) pra resgatar Forky. E como se isso não bastasse, depois que eles já estão livres, Woody resolve voltar e arriscar tudo de novo só pra ajudar Gabby Gabby, a vilã do filme!

- A sequência de ação final é meio fraca (inventam que é necessário dar um salto épico da roda-gigante pra chegar a tempo no carrossel, o que não parece ter lógica). Isso é como a ação inicial pra salvar o carrinho da enxurrada - o roteirista deve ter lido em algum lugar que é necessário começar um filme com uma cena de ação, terminar com uma ainda mais intensa, e daí inventa qualquer desculpa pra enfiar essas cenas, mesmo que a trama não justifique.

- SPOILER: O final é um festival de abnegação, auto-sacrifício (e oportunidades pra mensagens progressistas sutis). Gabby Gabby, que era a vilã, agora parece ser boazinha pois abandonou seu "sonho americano" (que o filme caracteriza como algo retrógrado, artificial, nocivo - a boneca perfeitinha que serve chá, etc) e ao mesmo tempo passou a ser "socialmente consciente", se doando pra uma garotinha necessitada de família inter-racial. Woody também abre mão de sua estrela de xerife e a entrega para Jessie (assim como o Capitão América e o Thor se aposentaram e entregaram suas armas para representantes de "minorias" no final de Vingadores: Ultimato). Pior de tudo é a ideia de Woody abandonar tudo aquilo que sempre valorizou, seus amigos, sua "criança", pra ficar com uma personagem como a Bo, com quem ele não tem real afinidade (os dois têm valores incompatíveis, tiveram atrito ao longo do filme todo). Em nenhum momento ele pareceu ter romance como seu grande objetivo, ou valorizar Bo mais do que ele valoriza sua vida com uma criança. Toda a proposta de Toy Story costumava ser romantizar a relação entre criança e brinquedo, tornar essa relação algo mágico, parte essencial da infância. É muito claro que felicidade, no universo do filme, é ser querido por uma criança. E que ser abandonado, perdido, é o equivalente à morte para um brinquedo (todos os brinquedos perdidos ou sem dono no filme invejam aqueles que têm uma criança). Mas a esse ponto já está claro que, pra Pixar atual, há algo de maduro e profundo em abrir mão da felicidade, de seus sonhos - em aceitar a infelicidade, a morte (como na pavorosa cena da parte 3, onde os brinquedos dão as mãos em direção à fornalha). É o que discuto na postagem Pseudo-sofisticação. A personagem da Bo representa bem essa vertente "Anti-Idealista" do entretenimento atual. Ela é aquela que não acredita mais na felicidade; fala como se o sonho de Woody de viver com uma criança fosse uma espécie de romantismo ultrapassado, inadequado pros tempos atuais. Ela vive agora numa realidade "pós-idealista", num mundo meio Mad Max, cheia de cicatrizes, endurecida pela vida, vivendo por conta própria, excluída da sociedade - uma realidade onde a magia acabou. E é isso que o filme faz Woody escolher no fim - os amigos, a vida feliz com uma criança, essas são fantasias tolas que ele deve abandonar.

Toy Story 4 / EUA / 2019 / Josh Cooley

NOTA: 5.0

18 comentários:

Dood disse...

Dei um jeito de ver aqui na encolha. Foi pavoroso, mais um universo de fantasia sendo deteriorado. E essa moda de fazer o herói se render ao vilão como foi no caso desse filme, que péssimo.

Anônimo disse...

Woody nunca foi um personagem muito interessante. O melhor personagem de Toy Story sempre foi o Buzz Lightyear, tanto que ele chegou a ter uma série animada, há alguns anos.
Francamente, esse filme é mais uma daqueles que não precisava ter sido feito. A única justificativa para sua produção parece ser a de servir de propaganda para a nova Toy Story Land inaugurada em Orlando, mantendo a imagem dos personagens fresca na memória das pessoas.
Nem sei se aquela parte 3 que todo mundo elogiou é tão boa assim. Nunca a assisti inteira. Achei que o tema já estava desgastado naquela época, e já estavam reciclando elementos das duas partes anteriores. O vilão Lotso era uma cópia do Stinky Pete do Toy Story 2.
Parece que esta parte 4 está com 100% de aprovação no Rotten Tomatoes, talvez porque a Disney esteja investindo demais em temas "adultos", "maduros". Foi por isso que os críticos gostaram tanto de Zootopia, que era um filme policial adulto com mensagem políticas progressistas disfarçado de desenho para crianças. Como história, Zootopia era bastante chato, e talvez por isso nem se vê brinquedos dos personagens por aí, apesar da enorme bilheteria. Quanto a Bo Peep, era uma personagem que dizem ter sido criado só porque a Mattel não autorizou a aparição da Barbie no primeiro Toy Story, mas nunca justificou sua existência em nenhum momento da série.
Pedro.

Anônimo disse...

Achei a história fraca,nada de novo.
Os temas que já foram explorados foram explorados de novo a exaustão,nada convence pra falar a verdade,a motivação do Wood,o desenrolar da historia...nada.
Acredito que Toy story 1,2,3 já foram suficientes,se fizessem o quarto filme teria que apresentar algo novo,não mais do mesmo como foi.

Esse 4 Filme não acrescenta nada e o personagem garfinho é ruim de doer.
Tudo que já foi abordado nos outros filmes só que reciclado a exaustão...basicamente isso.

Renato.

Anônimo disse...

Ultimamente a Disney parece estar fazendo sempre o mesmo filme, com personagens e estilos diferentes, repisando sempre os mesmos temas em seus filmes, auto-sacríficos e correção política. Até isso de casais que se desentendem todo o tempo até que começam de repente a se amar de um minuto para outro já foi feito várias vezes, como foram os casos de Tiana e Naveen em "A Princesa e o Sapo", Anna e Kristof em "Frozen", ou mesmo o Robert e a Giselle de "Encantada".
Pedro.

Caio Amaral disse...

"A única justificativa para sua produção parece ser a de servir de propaganda para a nova Toy Story Land inaugurada em Orlando" - bem lembrado Pedro, hehe.

"Ultimamente a Disney parece estar fazendo sempre o mesmo filme" - talvez o problema não seja tanto a semelhança temática entre os filmes, afinal uma pessoa anti-idealista poderia usar o mesmo argumento de que antigamente a Disney fazia sempre o "mesmo filme" onde a princesa realizava seu sonho, o mal era derrotado e todos eram felizes para sempre.. e nesse caso eu não veria um grande problema.. afinal 1000 filmes podem expressar os mesmos valores básicos, ter temas parecidos, e ainda assim serem autênticos, criativos, únicos.. acho que a Disney e a Pixar até se esforçam mais que a média pra não serem clichês, pra manter um nível bom de originalidade, imaginação (ao contrário do que vejo no mundo da Marvel, por exemplo - aí sim me parece uma eterna repetição da mesma coisa).. o problema que tenho de fato com algumas dessas animações é o fato de eu rejeitar os valores de muitas das histórias.. abs!

Dood disse...

É perceptível nesse filme uma quebra de ideias pré estabelecidas dos filmes anteriores, até mesmo com as do terceiro filme que tem momentos tão depressivos e tenta remendar tudo no final. A ideia de passar o legado com Andy entregando os brinquedos para a Bonnie é algo visto com valor por nossa cultura o desapego. Só que dentro da tematica do filme amigos inseparáveis é um equívoco já que era o legado dele pra mim a conclusão mais obvia seria isto passar para o filho dele ou mesmo manter a história na fase da infância do personagem, mas cada vez mais os filmes da Disney querem se afastar da fantasia e isso a destrói.

Anônimo disse...

E o mais impressionante é que a Disney vai conseguir convencer pessoas a pagar caro um garfo de plástico com olhinhos.

Pedro.

Caio Amaral disse...

Tenho acompanhado uns podcasts sobre cinema... e o povo fala muito na "desconstrução" que Toy Story 4 faz... a desconstrução do Woody como o brinquedo mais importante... da relação criança-brinquedo como um grande propósito de vida... só que os críticos enxergam isso como uma grande virtude do filme hehe, abs.

Dood disse...

Engraçado que aqui acompanhei um video de um tal de Matheus Canela um humorista que se revoltou com o filme. Tipo via ele claramente dividido com o filme. Claramente ele tava irritado mas disse que gostou do filme so nao quer considerar canonico. E algo sem nexo ou você gosta ou não gosta.

Dood disse...

Achei aqui por 80 reais pegaria so pela zueira e porque da pra mudar a expressao dele. Gosto de tirar fotos de brinquedos. Meu sonho e ter uma figura japonesa do Woody da Revoltech. Por favor não pesquisem fotos dela no google o pessoal é bizarro.

Anônimo disse...

Seria comprar um pacote de garfos de plástico no supermercado, um novelo de lã e um tubo de cola, e fazer quantos forkys se quisesse. Seria mais fiel ao espírito do filme, e a Disney que aguente o prejuízo da sua hipocrisia.
Pedro.

Anônimo disse...

Corrigindo: "Seria melhor comprar um pacote de garfos de plástico no supermercado, um novelo de lã e um tubo de cola, e fazer quantos forkys se quisesse. Seria mais fiel ao espírito do filme, e a Disney que aguente o prejuízo da sua hipocrisia."
Pedro.

Dood disse...

Não sou muito bom em artesanato e a figura dele vem com as expressões que podem ser trocadas. Tambem concordo com o fato do personagem ser escroto, tanto que só pegaria em promoção e acredito que poucos se interessam por ele.

Anônimo disse...

Ao menos a Pixar anunciou que não pretende fazer mais continuações, o que não deixa de ser uma coisa boa.
Pedro.

Caio Amaral disse...

Hmm tomara mesmo.. a Pixar era uma das poucas que ainda conseguia ter hits com histórias originais..

Anônimo disse...

Falando da franquia Toy Story saiu uma notícia de que a Disney iria remover uma cena dos créditos finais de Toy Story 2, em que Woody flagra o Stinky Pete assediando duas bonecas barbie. Talvez seja um exagero, pois não é difícil para os espectadores perceber a cena como uma situação errada, afinal nessa altura todos sabem que Stinky Pete é um vilão. Mas esse tipo de expurgo do "passado impróprio" soa como algo saído do livro 1984 de Orwell.
A cena em questão é esta:
https://www.youtube.com/watch?v=ZLbHZuBGHcU
Pedro.

Caio Amaral disse...

Fiquei sabendo dessa polêmica.. Realmente, se alguém interpretou aquilo como a Pixar incentivando o assédio.. precisa voltar pras aulas de interpretação de texto, hehe. abs.

Anônimo disse...

Provavelmente daqui a algum tempo removerão aquela cena pós-créditos do Wifi-Ralph onde o Ralph faz o coelho comer até explodir, para coibir a crueldade com animais.
Pedro.