segunda-feira, 7 de julho de 2025

Julho 2025 - outros filmes vistos

F1: O Filme (F1 / 2025 / Joseph Kosinski) — Apesar de falar sobre aviação, Top Gun: Maverick não exigia que você se interessasse pelo tema para se emocionar com a história. F1 já é um filme que deve funcionar melhor para quem se interessa pelo universo do automobilismo. Como cinema, é um filme de esporte bem básico e previsível, que se destaca pela maneira como fotografa as cenas de corrida, mas que não tem um enredo realmente sólido por trás. O principal problema, pra mim, foi o protagonista — não só por achar que Brad Pitt, com seu jeito "good vibes", não convence muito como atleta disciplinado ou como mentor sábio, mas também porque Sonny Hayes tem apenas conflitos externos superficiais para superar ao longo do filme. Embora ele seja mais velho que a maioria dos pilotos, isso nunca se torna um obstáculo real na história, nem gera qualquer insegurança nele. Ele age o tempo todo como se tivesse certeza de que é o melhor do mundo e nunca duvida de que chegará ao pódio. Mesmo que ele se mostrasse de fato o melhor, isso ainda roubaria carga dramática da história. Mas Hayes passa o filme inteiro cometendo erros, se envolvendo em acidentes bobos, sendo eliminado — de forma que, quando a vitória finalmente chega, tudo parece fruto de sorte, não uma recompensa justa. O filme é cheio de músicas de rap que não são nada o meu estilo, mas a trilha instrumental do Hans Zimmer achei muito boa.

segunda-feira, 23 de junho de 2025

Férias: Disney World

Entre 26 de junho e 5 de julho, estarei em Orlando visitando os parques da Disney e Universal — e provavelmente sem ver filmes (devo só tentar pegar a estreia de Jurassic World: Recomeço). Se surgir algo interessante pra comentar sobre os parques, talvez eu poste algumas atualizações por aqui, mas o mais provável é que eu deixe pra fazer qualquer postagem só depois que voltar. Pra quem quiser me seguir no Instagram (@amaralcaio), devo estar mais ativo por lá nesse período!

Elio

Após o acerto com Divertida Mente 2, a Pixar volta ao patamar inferior que se tornou a norma nos últimos anos e entrega mais um filme de "herói envergonhado" enlatado e sem nenhum senso de entretenimento.

A história é sobre um garoto que sonha em ser abduzido por extraterrestres — não por um verdadeiro senso de aventura, mas porque isso seria um bom remédio para sua solidão e seu sentimento de inadequação na Terra. Da forma mais conveniente possível, aliens resolvem fazer contato com o planeta e abduzem justamente Elio. Enquanto está sendo teletransportado para a nave, em vez de ficar apavorado como qualquer ser humano crível, Elio comemora como se fosse um garoto que acabou de fazer um gol. Nesse momento, é como se o filme dissesse: este é apenas um filme bobinho para passar o tempo — não leve a sério nada do que está acontecendo. E é só com essa atitude despretensiosa mesmo que se pode acompanhar o resto da trama, que não faz o menor esforço para soar inteligente ou plausível (Elio, que era um garoto tímido e vítima de bullying, subitamente se torna embaixador da Terra no espaço e enfrenta, sem hesitação, monstros dez vezes maiores que ele).

Recentemente assisti a O Voo do Navegador (1986) e fiquei impressionado com como o roteiro, com toda a sua simplicidade, parecia saber o tempo todo o que havia de divertido na possibilidade de aliens contatarem um garoto na Terra — e estruturava o enredo ao redor disso. Essa é uma noção que passa longe de Elio, que tem uma trama chata de "política externa" que nunca se conecta com as emoções do espectador (o grande "sonho" do protagonista é receber um crachá que o torna membro de uma espécie de ONU intergaláctica — alguém se importa?).

Como de costume, o foco do filme acaba não sendo a aventura, mas o drama familiar, a cura de traumas, etc. Elio começa o filme deprimido porque perdeu os pais e está sendo criado pela tia, com quem não se dá muito bem. (SPOILER) Ele se volta para o espaço como forma de fugir dessas frustrações, mas, no fim, em vez de ter seus sonhos realizados, ele apenas se conecta melhor com a tia (principalmente após descobrir que ela também é solitária e imperfeita como ele) e volta para a vida que tinha antes — só que agora mais conformado e com uns amiguinhos novos.

Não estou dizendo que as lições do filme seriam completamente inválidas para uma família quebrada do mundo real, mas será que alguma criança ficaria empolgada de ir ao cinema pra aprender esse tipo de coisa? Em vez de um momento de diversão, levar as crianças ao cinema hoje tem se parecido vez mais com levá-las para uma conversa com a psicopedagoga da escola.

Elio / 2025 / Adrian Molina, Madeline Sharafian, Domee Shi

sexta-feira, 20 de junho de 2025

Extermínio: A Evolução

Fui completamente enganado pelo trailer, que dava a impressão de um terror eletrizante, quando na verdade o filme está mais pra um drama sobre um garoto tentando achar um médico para sua mãe doente. A estrutura é aquela da “jornada melancólica em um mundo devastado”, estilo The Last of Us / A Estrada, onde um pequeno grupo de pessoas precisa ir do ponto A até o ponto B em um cenário pós-apocalíptico, e no meio do caminho se depara com monstros, faz aliados, etc. Mas tudo é muito episódico e tedioso, até porque o protagonista é um garoto de 12 anos que não sabe o que está fazendo, e a outra é uma mulher insana: sabemos desde o início que não há chance de o plano deles ser minimamente eficaz. A "graça" do filme é sentir pena dessas almas perdidas perseguindo sonhos ilusórios em um mundo cruel — o filme é uma das expressões mais puras do Senso de Vida Malevolente

É estranho chamar um filme de zumbi de "Idealismo Corrompido", pois o gênero já nasceu Corrompido em 1968 com A Noite dos Mortos-Vivos, e permaneceu assim mesmo durante os anos 80. Mas Extermínio: A Evolução merece esse título, pois representa uma subversão até dos padrões estabelecidos pela própria franquia. Os zumbis são quase irrelevantes para a história e não têm relação alguma com a doença ou a cura da mãe. Assim como Um Lugar Silencioso: Dia Um e tantos outros, o filme se distancia das convenções do gênero para focar em dramas pessoais — se a jornada se passasse em uma zona de guerra ou qualquer outro ambiente inóspito, não faria grande diferença.

Outro problema é que aqui não apenas temos o tom mórbido típico do gênero (cuja maior obsessão parece ser mostrar personagens testemunhando entes queridos morrendo de forma brutal), como também aquela combinação terrível de má escrita com pretensão artística, responsável por colocar muitos filmes nas minhas listas de piores do ano. A produção é decente, mas o roteiro é incrivelmente ilógico e cheio de furos. Há várias coisas aleatórias também, como o tal do menino Jimmy, que só aparece no prólogo e no final, ou uns inserts de filmes antigos no meio da ação, que dão a impressão de que serão justificados apenas nas continuações (às vezes, parece que estamos vendo o início de uma série de TV, não um filme). Assim como Pecadores, é mais um terror que confunde qualidade com originalidade — e originalidade com excentricidade e subversão de expectativas.

28 Years Later / 2025 / Danny Boyle

quarta-feira, 18 de junho de 2025

Como Treinar o Seu Dragão

Esse filme pra mim foi um grande experimento científico: no cinema, você raramente consegue testar hipóteses de forma controlada, como na ciência, pois não é simples levar um filme para um laboratório e manipular variáveis específicas (como a escolha de um ator) pra medir com precisão o impacto de cada elemento. Mas este remake live-action de Como Treinar o Seu Dragão (do qual eu não gostei na época) cria essa oportunidade, pois segue à risca a animação de 2010, mas com uma alteração crucial (na perspectiva do Idealismo): ele substitui o protagonista sem graça — que se tornou um dos meus exemplos favoritos de "herói envergonhado" no cinema — por um ator bastante talentoso e carismático, que "descorrompe" o herói ao interpretá-lo de maneira atraente, eliminando as caretas, os trejeitos abobalhados, o tom azedo e sarcástico de voz, etc. Com isso, o filme ficou surpreendentemente melhor. Tive até dificuldade de acreditar que estava acompanhando o mesmo enredo do original — parecia que eu estava vendo novas cenas, ações e falas, não apenas um novo ator. Mas, ao rever trechos da animação chegando em casa, vi que muito pouca coisa foi alterada de fato. Isso reforçou, pra mim, a teoria do Spielberg de que o casting representa de 40% a 60% de um filme. O filme de 2010 é tecnicamente bem feito, tem um roteiro bem estruturado, mas fica difícil investir emocionalmente em uma história quando o próprio protagonista passa o tempo todo agindo para descreditá-la.

Acho que o final continua deixando um pouco a desejar — Hiccup matar o dragão, apesar disso ir contra seus princípios, e depois ter a perna amputada (uma cicatriz teria sido um sinal de bravura mais que suficiente). Mas, desta vez, essas foram queixas isoladas dentro de um filme sólido — em vez de evidências de um problema mais profundo.

How to Train Your Dragon / 2025 / Dean DeBlois

quarta-feira, 11 de junho de 2025

Junho 2025 - outros filmes vistos

Até a Última Gota (Straw / 2025 / Tyler Perry) — "Pornô de vitimização" que beira a comédia de tão ingênuo e escrachado — e com uma bússola moral tão deturpada que faz filmes como Bonnie e Clyde e Coringa parecerem moralistas em relação aos bandidos. A ideia parecia ser contar a história de uma "criminosa com um coração de ouro" estilo Thelma & Louise — a diferença é que a personagem aqui, além de ser uma mulher desprovida de qualquer qualidade positiva de caráter (e a principal causadora dos próprios problemas), assassina um homem inocente antes de partir em sua "jornada de redenção". Em vez de uma inocente injustiçada, temos uma mulher que deveria de fato estar na cadeia. Mas o filme não pensa assim e espera que torçamos por ela pelo simples fato dela ser pobre e ter uma vida desgraçada — em um único dia, tudo de ruim que poderia acontecer a alguém acontece com ela. Se você é do tipo que confunde sofrimento com nobreza de caráter, ela soará como uma das personagens mais virtuosas de todos os tempos! Dessa forma, como julgá-la "só" por matar, cometer extorsão, fazer reféns? Já vi muitos filmes moralmente ambíguos, que tentam relativizar as ações de personagens maus, mas poucos pareceram tão entusiasmados e livres de culpa ao perdoar atos criminosos quanto este.

O Esquema Fenício (The Phoenician Scheme / 2025 / Wes Anderson) — Apesar de ser um dos diretores mais monótonos da atualidade, Wes Anderson pelo menos não é preguiçoso — ele se dedica 100% toda vez que repete a mesma receita. O filme é puro Estilo Acima de Conteúdo — uma trama que ninguém em sã consciência diria que é interessante — mas Anderson executa esse "nada" com imaginação, capricho e leveza, preservando certa dignidade como artista (ainda que eu continue achando que ele é um designer preso no corpo de um cineasta).

Bailarina (Ballerina / 2025 / Len Wiseman) — Gun Fu (filmes que combinam artes marciais com o uso de armas de fogo) é um dos subgêneros que menos me atraem no cinema, e John Wick se tornou, pra mim, uma das piores influências sobre a ação moderna. Dito isso, Bailarina foi uma boa surpresa. Achei o melhor filme da franquia — não por ser inovador ou transcender totalmente os problemas do gênero, mas por ser mais sólido narrativamente e por Len Wiseman se mostrar um cineasta mais hábil que Chad Stahelski, tornando inclusive as cenas de luta mais bem dirigidas, detalhadas e divertidas de assistir.

Predador: Assassino de Assassinos (Predator: Killer of Killers / 2025 / Dan Trachtenberg, Joshua Wassung) — Levar o Predador para o universo de vikings e samurais me pareceu esquisito a princípio, mas não deixa de ser o reconhecimento de um fato: a franquia Predador sempre foi mais sobre músculos e testosterona do que sobre os elementos de ficção científica que sustentam a franquia Alien. A animação até que é bem realizada, mas se você não vê um valor intrínseco no combate físico, na "arte" de dar porrada (o roteiro poderia facilmente ser transformado em um videogame de luta), vai ser difícil se importar com qualquer coisa. O filme ainda "moderniza" a franquia exaltando os oprimidos, dignificando o sofrimento e o sacrifício — toques meio estoicos/cristãos que destoam do Predador original.

Mountainhead (2025 / Jesse Armstrong) — Sátira social fraquíssima que parece mais um descarrego de um hater de bilionários do que um filme com algo útil a dizer. A ideia é mostrar o quão patéticos (e perigosos) são CEOs de big techs, talvez na esperança de promover algum tipo de regulação sobre eles. Há críticas válidas que se poderia fazer a esse tipo de figura, mas para isso, o filme precisaria mostrar uma compreensão minimamente equilibrada de seus alvos, em vez de apenas criar versões caricatas deles e atacar esses estereótipos vazios. O título Mountainhead é uma referência explícita ao livro A Nascente (The Fountainhead), da Ayn Rand — e se o diretor vê alguma semelhança entre a mensagem de The Fountainhead e o caráter dos personagens do filme, isso só prova o quanto seu discurso é raso e tendencioso.

O Predador (1987)

Apesar de ser de um gênero que eu gosto, de uma era que eu gosto e com um ator que eu gosto, O Predador é um filme que nunca achei tão bom quanto sua popularidade sugere. Depois de assistir ao spin-off Predador: Assassino de Assassinos, acabei decidindo rever o original para fazer algumas comparações, e a primeira coisa de que me dei conta é que, apesar de já ter visto O Predador mais de uma vez, é um filme do qual sempre tenho uma lembrança vaga — lembro da ambientação na selva, da criatura, mas é quase como se eu não tivesse visto o filme de fato, como se tivesse pegado essas referências de trailers. Dessa vez, entendi melhor o porquê disso: ao contrário dos filmes da franquia Alien, O Predador é um bom exemplo de um filme sem bons set pieces. Todos os momentos significativos da narrativa são executados de maneira casual, desleixada, esquecível — não há nenhum trecho que renderia um “corte” fantástico, digno de ser revisitado e apreciado por si só. A criatura é revelada de maneira esparsa, sem nenhuma entrada ou momento emblemático; a primeira morte não traz nenhuma ideia memorável; a primeira vez que o protagonista vê o alien também não marca; nem a maneira como ele o derrota no final. Para mim, é como se bons set pieces dessem identidade a um filme — e, quando não há esses momentos excepcionais, o filme não se cristaliza direito na memória; o que se guarda é apenas um borrão ou imagens fragmentadas.

Na prática, O Predador está mais para um macho-filme daqueles estilo Stallone/Van Damme do que para uma ficção científica como Alien. É como se eles tivessem pensado inicialmente em um filme de guerra repleto de músculos e metralhadoras e, no fim, alguém tivesse dado a ideia de jogar um alien fortão no meio da história só pra tornar o combate mais intenso (até porque extraterrestres estavam em alta nos anos 80, assim como halterofilistas — por que não unir Rocky e E.T.?). Durante os primeiros 40 minutos, a criatura nem interfere na trama — fica apenas observando os personagens à distância, o que torna a narrativa arrastada. As tentativas do filme de nos envolver na missão de guerra no começo são totalmente fúteis. Depois, o Predador começa a matar um membro da equipe por vez — mas o protagonista só vai descobrir sua existência lá pela meia hora final, o que nos distancia dele enquanto personagem. É como um slasher estilo Sexta-Feira 13, em que os personagens não têm muito o que fazer durante dois atos, e tudo se concentra no showdown da última meia hora. Bons slashers conseguem se safar com essa estrutura, usando essa primeira hora para assustar o espectador e apresentar cenas de morte impressionantes. Mas, como disse, O Predador não tem essas grandes cenas, e eu particularmente não acho que a criatura dê medo — principalmente pela ambientação: o que torna um monstro assustador não é apenas a criatura em si, mas o contexto em que ela aparece. Quanto maior o contraste, mais assustador. O alien que aparece na festa infantil de Sinais (2002) não é horripilante por ter um design particularmente bem-feito — ele assusta pelo contexto em que aparece: em um local familiar, cotidiano, inocente. Tubarão (1975) cria tensão porque a criatura aparece em praias ensolaradas, onde crianças estão se divertindo, famílias estão de férias relaxando. Agora, em O Predador, os personagens são soldados durões numa selva cheia de cobras e criaturas perigosas, onde estão sendo perseguidos por guerrilheiros sanguinários. Nesse contexto, a criatura se torna apenas uma ameaça extra — seria como esperar que o tubarão fosse igualmente impactante se aparecesse na praia de O Resgate do Soldado Ryan.

Com um roteiro melhor, o confronto final entre o Schwarzenegger e o Predador poderia ter rendido um clímax recompensador, mas o que acontece é muito sem lógica e criatividade. O Predador supostamente só enxerga calor — mas, por algum motivo, o herói consegue se esconder dele passando lama no corpo e se mesclando visualmente com o fundo, além de despistá-lo arremessando pedras na mata, dando a entender que o monstro também capta movimento ou som. Um dos momentos de heroísmo que mais se destacam envolve uma flecha explosiva que parece uma imitação preguiçosa da cena de Rambo 2. A armadilha que Schwarzenegger prepara para matar o Predador no fim também não tem muita plausibilidade. Durante a maior parte do filme, o herói parece perdido em uma situação sobre a qual não tem o menor controle. Daí, no final, ele subitamente se torna um perito em caçar Predadores — o que não gera admiração, por ser feito de forma forçada.

Com uma direção e um roteiro fracos, O Predador só merece certo crédito porque foi feito numa época em que a indústria cinematográfica era robusta, repleta de talentos, e algum valor de entretenimento acabava recaindo sobre a maioria dos filmes: o longa é encabeçado por um verdadeiro astro, a trilha sonora de Alan Silvestri ajuda a manter a experiência estimulante, o trabalho de Stan Winston com a criatura é ótimo, etc. Mas, pra mim, o legado do filme não é proporcional à sua real qualidade.

quinta-feira, 29 de maio de 2025

O Voo do Navegador (1986)

Este é um filme que eu gostava de ver no SBT quando criança, mas que nunca tinha revisto depois de adulto por achar que teria envelhecido mal — ou que pareceria malfeito em comparação com as produções do Spielberg que muitos desses filmes infantis/família dos anos 80 tentavam imitar (já viram Mac - O Extraterrestre?!). De fato, não dá pra comparar O Voo do Navegador com um filme do Spielberg em termos de direção e refinamento artístico, mas entre as produções da época que tentaram surfar na onda de E.T., esta é uma das que melhor se sustentam como filme independente. O que acontece nos quinze primeiros minutos é tão desconcertante e bem feito como gancho (lembrando também de De Volta para o Futuro) que acompanhar o resto da história se torna imprescindível. E o resto do roteiro é muito bem estruturado, no sentido de não ter blocos desinteressantes ou que não atendam progressivamente às expectativas criadas pela premissa inicial. Em termos de visual e execução, o filme também é mais bem cuidado do que eu me lembrava. A atuação do garoto principal é convincente, o design da nave cria um ótimo "movie prop" (considerando que o filme tem um dos primeiros usos de CGI no cinema, os efeitos da nave até que surpreendem), e o retrato da Flórida naquele período (associado aos sintetizadores de Alan Silvestri) é puro suco de nostalgia oitentista.


Flight of the Navigator / 1986 / Randal Kleiser

quarta-feira, 28 de maio de 2025

Maio 2025 - outros filmes vistos

Pee-wee as Himself (2025 / Matt Wolf) — Tinha apenas uma vaga noção de quem era Pee-wee Herman (nunca tinha visto nem o filme do Tim Burton, As Grandes Aventuras de Pee-wee) e adorei conhecer sua história através deste documentário. Parte de sua tragédia se deve ao fato dele ter encontrado o sucesso na época "errada". Paul Reubens, em essência, era muito mais alinhado com a contracultura dos anos 70, mas foi na era Idealista dos anos 80 que seus dons encontraram um público. Esse conflito entre quem Reubens era de fato e quem seu público gostaria que ele fosse reflete o conflito interno do artista que, eventualmente, destruiria sua carreira. Apesar do desfecho trágico, a existência deste documentário acaba criando uma espécie de final feliz para Reubens, ao mostrar sua vida por uma perspectiva mais compreensiva e desconhecida pela maioria.

Sonic 3: O Filme
(Sonic the Hedgehog 3 / 2024 / Jeff Fowler) — Uma coleção de clichês tentando se amontoar em um filme. Não é uma produção malfeita ou com falhas notáveis, mas não há uma cena sequer que emane autenticidade. Tudo é incrivelmente pasteurizado, baseado em ideias excessivamente reutilizadas no cinema — desde a trama geral sobre a arma destruidora de mundos que, para ser desativada, depende dos heróis juntarem duas partes de uma chave, até as cenas individuais: temos a "dança" através do salão cortado por feixes de laser, a montagem cômica/nostálgica ao som de Wouldn't It Be Nice, piadinhas sobre a cafonice de novelas mexicanas — toda cena é composta de ideias enlatadas como essas, e nada mais (Mentalidade Clichê). A mensagem sobre o amor superar o ódio é a versão simplificada de algo que você leria num livro de autoajuda de banca de jornal.

Premonição 6: Laços de Sangue (Final Destination: Bloodlines / 2025 / Zach Lipovsky, Adam B. Stein) — Os set pieces não são tão satisfatórios quanto os dos filmes anteriores, mas a fórmula geral da franquia ainda rende um filme assistível. Há alguns toques de Idealismo Corrompido no casting e no humor (um dos roteiristas trabalhou em Pânico VI, Abigail), mas nada que arruíne totalmente a diversão.

Homem com H
(2025 / Esmir Filho)
— Segue o modelo das cinebiografias modernas, com algumas de suas limitações narrativas, mas em termos de atuações, capacidade de emocionar e de criar intimidade com o artista, faz melhor que muitas das grandes produções vindas de fora.

Thunderbolts* (2025 / Jake Schreier) — Acima do padrão Marvel em termos de direção e atuações, mas a história é tão insípida quanto de costume: um grupo de semi-vilões ou anti-heróis (há toda uma romantização do sofrimento, da melancolia) é atacado por um vilão maior ainda e passa o resto do filme tentando neutralizá-lo — um monte de negativos combatendo outros negativos, e a trama não envolve nenhum objetivo empolgante, que gere real antecipação. Permanece razoável até o clímax, que escorrega ao tentar uma abordagem mais psicológica, onde a "cura emocional" se torna o foco de todos os esforços, e a ação física vira puramente simbólica.

domingo, 25 de maio de 2025

TV Aberta, Monocultura e o Consumo Passivo

Parece haver uma correlação entre o declínio da audiência de mídias como TV aberta e rádio (em favor do YouTube, podcasts e redes sociais) e o senso de desintegração cultural, alienação social, etc. A internet foi, aos poucos, promovendo o fim da "monocultura" — aquela época em que todos pareciam estar por dentro das mesmas notícias, sabiam que novela estava no ar, que filmes faziam sucesso nos cinemas, que gírias estavam em alta, quem era famoso ou não, qual era a música do momento — e da sensação reconfortante de que, se você saísse na rua e abordasse uma pessoa aleatória, haveria uma grande interseção entre seus universos.

A cultura atomizada criada pela internet pode ter seu lado positivo, mas a ausência de uma "monocultura" também traz problemas. Acredito, inclusive, que a nostalgia que muitos sentem hoje em relação ao passado — às vezes acompanhada de uma aversão equivocada a estrangeiros — pode estar ligada a um anseio por esse senso de coesão cultural promovido pelas mídias tradicionais.

De uns meses pra cá, voltei a consumir mais rádio e TV aberta — não só para resgatar um pouco dessa coesão, mas também por sentir falta do "modo passivo" de consumo de conteúdo. Na internet, cada um é responsável por criar sua própria cultura. Isso te força a um modo "ativo" constante de consumo: você está sempre escolhendo os conteúdos aos quais será exposto, sempre selecionando, tomando decisões, se autoestimulando. Sem essa autoestimulação, nada acontece — nada vem do mundo externo. Não há nada de errado com isso, mas é importante lembrar que existe uma diferença entre esse tipo de atividade e a de ser exposto passivamente à "monocultura" — pense na diferença entre escutar sua música favorita em um CD e ouvi-la inesperadamente no rádio. Quando um conteúdo é transmitido por uma mídia de massa "oficial", ele ganha uma existência pública — uma relevância cultural que não pode ser construída individualmente.

Sabe quando você fica horas procurando algo para ver no streaming, mas simplesmente não consegue decidir? O problema, nessas situações, muitas vezes não é a ausência do "filme perfeito" para o momento — o que você quer, na verdade, pode ser sair do modo ativo de consumo e simplesmente relaxar, entrar em contato com a cultura ao seu redor — ser conduzido por uma programação definida externamente. E há valor nisso. Não só no descanso mental e no senso de conexão, mas também no lado prático de estar em contato com a sociedade em que você vive. Temos que lidar diariamente com pessoas diferentes de nós, com eventos externos que impactam nossas vidas — então, mesmo que você seja crítico a boa parte da cultura, há vantagens em estar familiarizado com a realidade além da sua bolha.

Acredito, inclusive, que plataformas como a Netflix estão perdendo uma grande oportunidade ao ignorarem esses modos diferentes de consumo. Se, além do catálogo normal, os serviços de streaming tivessem um modo "ao vivo", com uma programação 24h de conteúdos selecionados pela plataforma, haveria um grande público para isso. Seria uma forma de promover estreias simultâneas e outras experiências que sempre associamos à TV tradicional.

A polarização política foi uma das grandes responsáveis por espantar o público da TV aberta, já que o contato com ela passou a ser desgastante para quem não estava sintonizado com determinadas ideologias. Isso pode ter tido consequências piores do que se imaginava. De uns tempos pra cá, no entanto, os discursos polarizantes perderam força, e emissoras como a Globo parecem estar tentando atenuar seu conteúdo para atrair de volta as pessoas que haviam se afastado. Se a TV aberta voltar a ser convidativa para todo tipo de público, e parte da "monocultura" for resgatada, essa pode ser uma das formas mais eficientes de reintegrar aquilo que foi desintegrado na sociedade nas últimas décadas.