segunda-feira, 28 de julho de 2014

Senso de Vida e preferências artísticas

(Capítulo 4 do livro Idealismo: Os Princípios Esquecidos do Cinema Americano)

Embora a maioria das pessoas não tenha uma filosofia formada e consciente, todos nós carregamos uma série de valores e julgamentos filosóficos de maneira subconsciente, que formam aquilo que Ayn Rand chamava de “Senso de Vida”.

Essa é uma ferramenta valiosa que ela criou e que vou pegar emprestada aqui para explicar melhor por que as pessoas têm preferências tão diferentes no campo da arte.

Senso de Vida é a soma dos valores fundamentais de um homem, que resulta numa maneira particular de encarar o mundo. É uma avaliação subconsciente que fazemos do ser humano e da existência e que estabelece a natureza das nossas reações emocionais e a “lente” pela qual enxergamos o mundo. Nosso Senso de Vida não vem primeiramente de nossas convicções explícitas, intelectuais; é algo formado subconscientemente, baseado em experiências e julgamentos que acumulamos desde a infância, e que pode estar ou não em harmonia com nossas opiniões conscientes.
Mesmo sem entender nada a respeito de filosofia, ao longo da vida um homem tem que fazer escolhas, formar uma opinião a respeito dele próprio e do mundo ao seu redor, e, dependendo de suas conclusões, ele chegará a um sentimento generalizado em relação à existência — uma emoção básica que estará por baixo de todas as suas experiências.

A importância de entender o que é Senso de Vida é que ele é a principal ferramenta de avaliação das pessoas nas questões do dia a dia. É com base em nosso Senso de Vida que nós escolhemos os nossos amigos, nossos pares românticos, nossas músicas e filmes favoritos. Nós nos sentimos atraídos por coisas que estão em harmonia com nosso Senso de Vida, e repelidos pelas que não estão.

Na medida em que uma pessoa tem controle sobre sua mente, seu Senso de Vida pode ser moldado por ela própria ao longo de sua formação, e chegar à vida adulta em harmonia com suas convicções conscientes. Mas, na maior parte dos casos, o Senso de Vida de uma pessoa é formado por influências aleatórias, osmose cultural, é cheio de contradições e frequentemente está em conflito com suas ideias explícitas. De qualquer forma, ninguém pode evitar de formar um Senso de Vida.

Alguns exemplos de perguntas filosóficas que são essenciais na formação de um Senso de Vida:

— O universo é um lugar governado por leis naturais, estável, lógico, ou é um caos incompreensível para o homem?

— Nossa mente é capaz de compreender a realidade, ou a razão é impotente?

— O homem tem livre-arbítrio, ou suas escolhas e seu caráter são determinados por outros fatores (cultura, genética, classe social, instintos)?

— O homem é capaz de atingir sucesso, felicidade, ou a vida é feita de dor e de tragédia?

— O homem é essencialmente bom, admirável, ou ele é mau e desprezível por natureza?

— As pessoas podem conviver em plena harmonia, ou seus interesses estão necessariamente em conflito?

— Buscar a felicidade é importante, ou evitar a dor é o que realmente importa?

— Um homem deve buscar seus objetivos pessoais e ser feliz, ou deve se sacrificar pelo bem dos outros?

— O homem deve ter ambição, autoestima, sonhar alto, ou não deve se sobressair?

Respostas diferentes às perguntas acima resultarão em pessoas com Sensos de Vida diferentes e irão interferir diretamente em todas as suas escolhas, preferências — incluindo suas preferências artísticas. É importante lembrar que, de um extremo a outro, existem posicionamentos intermediários entre todas essas respostas. Por exemplo, uma pessoa pode sentir que: 1) A felicidade é o estado natural do homem e que conflitos são a exceção; 2) Que a vida é feita de conflitos, mas que eles podem ser superados com grande esforço; 3) Que conflitos não são totalmente superáveis e que a felicidade só pode ser atingida em moderação; 4) Que a vida é trágica por natureza e a felicidade é uma utopia.

Nosso Senso de Vida classifica as coisas de acordo com as emoções que elas evocam. No livro The Romantic Manifesto, Rand cita uma série de exemplos concretos e imagina quais emoções esses exemplos iriam provocar em pessoas com diferentes Sensos de Vida. Por exemplo: “uma nova descoberta, triunfo, um homem heroico, o horizonte de Nova York, cores puras, música extasiante”, ou “as pessoas da casa ao lado, uma rotina familiar, um homem humilde, um vilarejo antigo, uma paisagem nebulosa, cores turvas, música folk”. Para uma pessoa com uma visão mais positiva da vida e do ser humano, os exemplos do primeiro grupo devem provocar admiração, exaltação, um senso de desafio. Os exemplos do segundo grupo devem provocar tédio, desinteresse ou repulsa. Já para uma pessoa com uma visão de mundo mais negativa, as emoções sentidas com os exemplos do primeiro grupo devem ser de medo, culpa, ressentimento. As emoções sentidas com os exemplos do segundo grupo devem ser de alívio, conforto; a segurança de viver em um universo não muito exigente.

O Senso de Vida de uma pessoa é algo que percebemos quase instantaneamente quando entramos em contato com ela, pois envolve tudo a seu respeito: cada pensamento, emoção, gesto, postura, tom de voz, expressão facial, a maneira de se vestir. Numa obra de arte, o Senso de Vida de um artista se expressa através de seu conteúdo e de seu estilo (o que ele decide retratar, e a maneira como ele o retrata). Esses dois aspectos — conteúdo e estilo — podem estar em harmonia ou podem estar em conflito um com o outro, assim como os valores conscientes e subconscientes de uma pessoa podem estar em harmonia ou em conflito.

O conteúdo reflete os valores mais conscientes do artista. Que tipo de mensagem a obra transmite? Que tipo de eventos e pessoas o artista decide retratar? Heróis buscando objetivos nobres? Pessoas comuns sem grandes virtudes? Ou pessoas decadentes e imorais? Essas pessoas são retratadas positivamente (sendo eficazes, vitoriosas) ou negativamente (sendo ineficazes, derrotadas)? Um herói retratado positivamente indica um artista com um Senso de Vida benevolente. Um personagem imoral retratado negativamente também pode indicar um Senso de Vida benevolente, como já foi dito antes. Porém, um herói retratado negativamente ou um personagem imoral retratado com simpatia já sinalizam um Senso de Vida malevolente.

O estilo reflete os valores mais subconscientes (e geralmente mais reveladores e verdadeiros) da obra. Por exemplo: o artista comunica suas ideias de maneira clara, precisa, compreensível? Ou de maneira nebulosa, turva, caótica? A história é dramática, excitante, estruturada? Tem uma direção clara, propósito, clímax? Ou ela é monótona, os eventos são episódicos e não caminham para nenhuma resolução? O artista retrata pessoas admiráveis, atraentes? Ou coloca figuras comuns na tela?

Sensos de Vida são formados pela combinação de inúmeras percepções a respeito da vida, e podem ser extremamente diversificados. Ainda assim, é possível classificar, grosso modo, Sensos de Vida como mais malevolentes e mais benevolentes. Um Senso de Vida malevolente é dominado pelas respostas negativas às questões filosóficas mais fundamentais: a vida é trágica, o universo é caótico, a razão é impotente, o homem é desprezível e está condenado ao sofrimento, nossos interesses estão em conflito etc. Um Senso de Vida benevolente é dominado pelas respostas positivas: a vida é essencialmente boa, o universo é compreensível, o homem é admirável e capaz de atingir seus objetivos, seus interesses não precisam estar em conflito. Como já deve estar claro a esta altura, o Idealismo é essencialmente baseado em um Senso de Vida benevolente.

Qualificar o Senso de Vida não é suficiente para dizer se uma obra de arte é boa ou ruim, mas ao mesmo tempo não há como chegar a critérios estéticos absolutos que não estejam ligados a um Senso de Vida, a certos pré-julgamentos filosóficos. Por exemplo: mesmo méritos como “clareza” ou “coerência”, que parecem qualidades estéticas inquestionáveis, desejáveis em qualquer obra, na verdade já são expressão de um Senso de Vida benevolente: refletem alguém que acredita que o universo é inteligível, que a razão é eficaz, que uma comunicação objetiva entre artista e espectador é possível, que mostrar algo harmonioso e agradável ao espectador é algo desejável. Seria impossível um artista com um Senso de Vida totalmente malevolente, tanto em conteúdo quanto em estilo, realizar uma grande obra de arte, pois se ele realmente acreditasse que o homem é desprezível (o que incluiria ele próprio e também os espectadores), incapaz de atingir seus objetivos, que a comunicação é uma ilusão, ele não teria nem a motivação nem a capacidade para realizar uma obra de arte de valor. Portanto, apenas na medida em que um artista possui um Senso de Vida benevolente, mesmo que de forma inconsciente, é que ele consegue realizar algo de qualidade e valor estético.

Embora o Senso de Vida seja um elemento crucial, outros elementos podem contribuir para determinar as preferências artísticas de uma pessoa — questões como temperamento, contexto cultural. Por exemplo: duas pessoas podem ter Sensos de Vida parecidos, mas operarem intelectualmente em níveis diferentes. Uma pode ter uma capacidade de abstração maior do que a outra, uma inteligência maior do que a outra, uma capacidade maior de atenção, e isso a atrairá a obras mais complexas, que estejam mais em harmonia com seu tipo de funcionamento mental.

A seguir, um exemplo concreto de como um Senso de Vida interfere em nossas preferências artísticas:

POR QUE NÃO GOSTO DE GAME OF THRONES

Game of Thrones, do meu ponto de vista, tem uma visão de mundo conflituosa baseada na ideia de escassez, de que vivemos num universo de poucos recursos e, portanto, que a vida é uma grande batalha entre os homens para ver quem conseguirá o controle desses recursos. É uma ideia bastante defendida tanto pela esquerda quanto pela direita no mundo da política, mas enquanto a esquerda foca o que deve ser feito em relação aos fracos nesse contexto — em como eles tirarão os recursos dos fortes para garantir um mínimo necessário aos menos favorecidos —, aqueles que acreditam ser os fortes (como os personagens de Game of Thrones), já estão mais focados no ato de obter esses recursos e em como irão imperar sobre os fracos quando forem vitoriosos (são pessoas em geral bastante interessadas em táticas de guerra, estratégias etc.). Os dois lados no fim têm a mesma visão conflituosa e pessimista de mundo segundo a qual apenas alguns podem ter sucesso, e por isso os outros deverão ser inevitavelmente sacrificados no processo.

Outra coisa que rejeito aqui é a visão relativista de virtude que costuma acompanhar esse tipo de mentalidade: ser poderoso e vitorioso nesse contexto está totalmente relacionado a superar os outros, derrotar adversários. Essas pessoas são incapazes de pensar em autoestima e virtude de maneira objetiva, independente, baseadas na nossa capacidade de lidarmos com a realidade, de sermos eficazes, produtivos, atingirmos nossa felicidade pessoal. É apenas a derrota do outro que prova sua virtude — a capacidade de dominar, de superar, de ser relativamente melhor no campo de batalha (arrogância e agressividade acabam sendo traços de caráter atraentes para quem pensa assim).

É uma mentalidade que reflete um desejo do imerecido, o desejo de obter valores à custa dos outros, contra a vontade dos outros. Enquanto os fracos (dentro dessa perspectiva) buscam o imerecido motivados por ideias altruístas, dizendo que eles devem ter aquilo que desejam justamente por serem fracos e incapazes, e que sem o sacrifício dos fortes eles não teriam chance — ou seja, os fortes devem dar a eles o que eles querem, mesmo que não queiram fazer isso, pois é uma necessidade —, os fortes já querem que os fracos deem a eles o que querem por terem poder. Como eles são fortes, ricos, têm as melhores táticas, as armas mais potentes, os maiores exércitos, e os fracos dependem deles para sobreviver, então estes devem fazer o que aqueles querem, devem obedecê-los, servi-los, amá-los, respeitá-los, mesmo que não queiram fazer isso.

É a ética da mãe vs. a ética do pai numa dinâmica familiar arcaica: a mãe que quer que o filho faça o que ela quer por um senso de culpa, de dever, por ela ser frágil, desamparada, e que ele o faça mesmo contra sua vontade. E o pai que quer que o filho faça o que ele quer por obediência, por medo, “respeito”, também contra sua vontade.

O maior medo dessas pessoas no fim é o de descobrir o que os outros de fato gostariam de fazer se tivessem opção — medo de lidar com pessoas em plena liberdade, agindo voluntariamente, baseadas em seus reais valores e desejos, pessoas que estão buscando felicidade e não apenas a mera sobrevivência física. Isso ocorre, pois elas sentem no fundo que se todos fossem independentes, livres, e pudessem escolher com quem compartilhar suas riquezas (materiais ou espirituais), elas não teriam a menor chance de obtê-las. Então elas se sentem atraídas por essa visão problemática de mundo segundo a qual os sacrifícios são necessários, as pessoas são dependentes umas das outras e os recursos são escassos: é a única forma de elas sentirem que terão algum poder, que serão vitoriosas, que terão aquilo que elas querem das outras pessoas, pois as vontades reais dos outros não representarão mais uma ameaça, não farão mais parte da equação.

Apenas como um exemplo de como essa visão de mundo é transmitida pela série, observe como é natural no universo de Game of Thrones vermos mulheres que demonstram desprezo por certos homens, não parecem sentir um desejo real, mas ainda assim acabam indo para a cama com eles (só no 1º episódio da 8ª Temporada já me lembro da cena em que Euron consegue persuadir Cersei a fazer sexo com ele, e uma outra cena em que Bronn está na cama com 3 mulheres ao mesmo tempo, aparentemente prostitutas). São cenas comuns essas — personagens que são desprezados no fundo, mas que mesmo assim conseguem fazer os outros agirem da maneira desejada, pois eles têm o poder, e neste universo de conflitos e sacrifícios, as pessoas não têm alternativa a não ser servi-los.

Não quero dizer que todo mundo que gosta da série o faz por esse motivo, ou por compartilhar desses valores, nem estou dizendo que a série é ruim artisticamente só por ter essa característica, mas é por essa lente que Game of Thrones me faz enxergar o mundo toda vez que paro para assistir a um episódio, essa visão da realidade em que o poder acaba sendo o valor mais importante e desejado — poder sobre os outros, poder de coerção —, e esse é o principal motivo para eu não me sentir atraído por ela.


quinta-feira, 24 de julho de 2014

Juntos e Misturados (anotações)

- Drew é sempre carismática, Sandler também é simpático... Elenco tem boa química.

- Piadas são irregulares e não muito inteligentes (como em todo filme do Adam Sandler). Roteiro parece ter sido escrito às pressas, sem nenhuma sutileza ou capricho.

- Divertido o contexto da história (viagem pra África, o fato dos 2 serem perfeitos um pro outro, etc). O grande problema é que não há nenhum conflito forte - nada de sério que impeça os 2 de ficarem juntos imediatamente - nenhuma decisão importante a ser tomada, etc, então a resistência deles acaba parecendo artificial e o romance perde força.

CONCLUSÃO: Comédia familiar bem intencionada, porém muito comum, previsível e com piadas meio óbvias e nada sofisticadas.

(Blended / EUA / 2014 / Frank Coraci)

FILMES PARECIDOS: Gente Grande, Separados pelo Casamento, Como Se Fosse a Primeira Vez.

NOTA: 4.0

domingo, 20 de julho de 2014

Planeta dos Macacos: O Confronto (anotações)

- Linda a fotografia e a direção de arte. Visualmente o filme é impecável, e os efeitos especiais estão entre os mais perfeitos que já vi!

- Filme começa bem. A introdução antes do título é boa pra apresentar a situação, e a primeira cena da caça sem diálogos é ótima também e super bem dirigida.

- De novo a trilha sonora do 2001: Uma Odisséia no Espaço (que também usaram em Godzilla)? Aqui pelo menos faz mais sentido (lembramos dos macacos do 2001, etc).

- Não simpatizo pelo macaco principal (Caesar), sempre com essa cara de revoltado / injustiçado. O filme parece querer dar mais dignidade a ele do que aos humanos.

- Gosto da trilha sonora. É bem integrada à imagem e enfatiza momentos específicos das cenas, ajudando a narrar o filme.

- Direção também é muito boa. Adoro que não há tantos cortes e que temos tempo de nos sentir dentro de cada ambiente.

- Não concordo com o diálogo de que os macacos são superiores por não precisarem de tecnologia, armas, etc. Talvez os macacos comuns não precisem mesmo, mas esses do filme (que são inteligentes) já usam fogo, derrubam árvores pra construir suas casas, então eles precisam sim de ciência, tecnologia, etc - só estão uns estágios mais atrasados que nós.

- Personagens humanos do filme são distantes e pouco cativantes. No Planeta dos Macacos antigos, Charlton Heston era claramente o herói, e a gente vibrava toda vez que ele demonstrava sua inteligência (os macacos achavam que ele era um animal inferior).

- Um ponto fraco é que não torcemos nem pra um lado nem pro outro direito. Tanto os macacos quanto os humanos têm suas razões, mas nenhum dos lados é extremamente gostável. O filme acaba sendo um conflito sem solução entre 2 grupos distantes.

- SPOILER: Discussão ética do filme é um pouco superficial (a mensagem de que não devemos brigar, de que a guerra é sempre ruim, etc). Mas é legal a mensagem anti-racismo, quando o filme mostra que o que separa as pessoas não é a raça delas, e sim seus valores (Caesar e Malcolm no fim têm muito mais em comum do que Caesar e Koba, que são ambos macacos).

- SPOILER: História fica mais envolvente no final (Malcolm contra o personagem do Gary Oldman, que quer explodir a torre, e a luta entre Caesar e Koba acontecendo ao mesmo tempo). Agora Malcolm e Caesar parecem estar no mesmo time, pois ambos lutam pela paz entre humanos e macacos - no outro time estão Koba e o Gary Oldman, que apesar de lutarem entre si, concordam com a ideia de que humanos e macacos devem entrar em guerra).

CONCLUSÃO: Filme incrivelmente bem realizado, que poderia ter sido melhor se tivesse personagens mais cativantes e se o conflito real (que não é entre humanos e macacos e sim entre pessoas civilizadas e selvagens) tivesse sido estabelecido mais cedo.

(Dawn of the Planet of the Apes / EUA / 2014 / Matt Reeves)

FILMES PARECIDOS: Godzilla (2014), Guerra Mundial Z, Oblivion, Planeta dos Macacos: A Origem.

NOTA: 7.0

terça-feira, 15 de julho de 2014

O Enigma Chinês (anotações)

- Interessante o monólogo inicial sobre o personagem não ter propósito na vida (ponto A, ponto B, etc). Faz a gente entender a situação dele e introduz uma discussão sobre felicidade com a qual a plateia pode se relacionar.

- Um pouco forçada a cena no banco de sêmen. Feita pra tirar risadas baratas do público.

- Naturalismo. Personagem é muito comum, sem nada de muito interessante.

- Ele não é escritor? Isso não é um propósito em sua vida? Ele não é pai e deseja criar os filhos? A vida dele não parece ser tão sem rumo assim quanto ele afirma.

- Audrey Tautou é carismática e traz alguns dos melhores momentos do filme.

- Comparação do bordado do Schopenhauer (de que a vida se passa metade do lado certo do bordado e metade do lado de trás) pode até ser válida pra vida, mas na arte, não há por que mostrar o lado de trás. Esse filme é como o bordado do lado errado: só vemos o aspecto bagunçado e pouco atraente das coisas. O interessante é que o protagonista acha reconfortante essa ideia do Schopenhauer - pois isso parece justificar o fato da vida dele ser uma bagunça. Ligando os pontos - assistir a um filme como esse pode ser reconfortante pro espectador que leva uma vida frustrante.

- Xavier acha que a glória da cidade de Nova York é diminuída pelo fato de haver um cruzamento desorganizado em um ponto da cidade - e ele sente prazer nessa pequena descoberta. Ele se sentiria inseguro diante de algo muito grandioso (mesmo uma cidade), portanto ele sente prazer em procurar falhas nas coisas ("se até Nova York é imperfeita, então eu posso ter minhas falhas também").

- Ele acha que o ato banal de cruzar a rua com os filhos é um momento digno de atenção, pois isso também faz parte da infância delas. Ou seja, o filme quer que um momento não-especial seja especial. Quer que uma cidade especial seja não-especial. Quer que o lado errado do bordado tenha tanta relevância quanto o lado certo (!).

- Depois de 1 hora a história começa a cansar (falta um "ponto B" pra trama também, não só pra vida do Xavier). Filme começa a focar em sub-tramas desinteressantes (como a traição da amiga lésbica) que não parecem ter muita relevância (exceto pra mostrar como "a vida é complicada").

- A reação da Audrey quando termina de ler o livro é mais ou menos a minha reação em relação ao filme: a vida do cara não é tão complicada assim. É apenas comum. Ele é que foca nos problemas.

- SPOILER: Não vejo graça na correria no final pra não deixar a amiga ser pega traindo a namorada. Seria melhor que as duas fossem pegas em flagrante! O Xavier está ajudando elas a mentirem.

- SPOILER: Xavier dizia que pra namorar era preciso haver uma "chama" especial - mas no fim, ele decide ficar com a Audrey (por quem ele não parecia sentir essa chama). Outra vez, o filme quer tornar especial o não-especial.

CONCLUSÃO: O filme tem alguns personagens simpáticos e serve como uma reflexão leve sobre a felicidade, mas eu pessoalmente não me identifico com os valores por trás da história.

(Casse-tête chinois / França, EUA, Bélgica / 2013 / Cédric Klapisch)

FILMES PARECIDOS: Bonecas Russas.

NOTA: 5.0

sábado, 12 de julho de 2014

O Teorema Zero

ANOTAÇÕES:

- O filme é muito estilizado visualmente, mas não dá pra dizer que é um visual bonito (ou que ele tem uma boa fotografia de fato).

- O personagem central é tão excêntrico e distante que fica difícil se identificar com ele ou mesmo entendê-lo.

- É o tipo de filme que faz as pessoas levantarem e irem embora do cinema no meio da sessão. Ele quer ser excêntrico, bizarro, mas não há nada de envolvente na história. O que importa pra plateia a solução do teorema? Isso nem é de grande importância pro personagem - ele foi só contratado pra trabalhar no problema, mas não é algo pelo qual ele se importa pessoalmente. O filme não comunica nada palpável num nível intelectual. Por que o protagonista se chama de "nós"?

- A atriz que faz Bainsley é linda e tem muita personalidade. Pelo menos há 1 personagem mais humano no filme, com reações naturais, compreensíveis (Bob também traz um pouco de vida pra história).

- O cineasta sem dúvida quer fazer grandes afirmações a respeito do homem e da existência, o problema é que ele não consegue (ou não quer) comunicar essas ideias pra plateia com clareza. Tudo é muito bagunçado, subjetivo, desintegrado - parece a mente de uma pessoa louca mesmo (algumas cenas são tão lunáticas que parecem as animações que o diretor fazia no Monty Python, só que sem o humor). Pelo menos ele é um "louco" criativo, original, o que torna o filme no mínimo curioso de ver (não é um desses cineastas que apenas imitam o estilo excêntrico de outros, mas não são de fato originais).

CONCLUSÃO: O filme coloca a própria loucura e excentricidade acima das ideias que quer comunicar, alienando o espectador.

(The Zero Theorem / EUA, Romênia, Reino Unido, França / 2013 / Terry Gilliam)

FILMES PARECIDOS: O Mundo Imaginário do Doutor Parnassus, Brazil: O Filme.

NOTA: 4.5

quinta-feira, 10 de julho de 2014

O Espelho (anotações)

- Não gosto quando o espírito existe pra trazer conflitos banais pras pessoas, gerar desentendimentos, brigas entre marido e mulher, tornar a rotina desagradável. Prefiro espíritos quando eles vêm pra trazer espanto, ação, surpresa - unir os personagens (e a plateia) numa aventura divertida (ainda que assustadora).

- Os personagens são sofredores, vítimas do universo - há todo um tom sério de drama psicológico que me soa inapropriado (num filme que não tem uma premissa séria).

- Nada de notável em termos de direção, música, elenco, diálogos, etc. Produção é bastante comum.

- Muitos clichês: o cachorro que percebe os espíritos, o cético teimoso, etc. Pouca originalidade.

- Gostei até dos atores, a única coisa que não convence muito é a menina ter armado esse circo todo sozinha (amarrado uma âncora no teto, etc).

- Um espelho é um vilão muito fraco e pouco assustador. Como derrotá-lo também não fica muito claro.

- Nunca sabemos se o que estamos vendo é real ou se é o espelho brincando com a mente dos personagens. Filmes com alucinações precisam tomar muito cuidado, pois essa dúvida constante torna o filme entediante. Mais pro fim, além de não sabermos o que é real ou imaginação, também não sabemos direito o que é presente ou passado, pois o filme começa a misturar flashbacks com cenas reais!

CONCLUSÃO: Filme comum sobre espíritos com cenas e vilões menos assustadores que a média.

(Oculus / EUA / 2013 / Mike Flanagan)

FILMES PARECIDOS: Mama, Os Escolhidos, A Entidade, A Mulher de Preto, etc.

NOTA: 4.0

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Vizinhos (anotações)

- Pessoalmente, não sou fã do humor vulgar (excesso de piadas sexuais, etc). Elas meio que ofendem os protagonistas, que são boas pessoas (não tenho problemas com piadas vulgares num filme como Pink Flamingos, onde os protagonistas são aberrações sem nenhuma dignidade pra ser manchada).

- Elenco bom e com ótima química. Muito boa a Rose Byrne que faz a esposa.

- Premissa divertida mas um pouco irreal. Não acredito que essa situação com os vizinhos escalaria pra esse nível. Não parece algo tão sério (a polícia provavelmente resolveria esse problema).

- SPOILERS: Nível das piadas é um pouco irregular. Não chega ao nível trash das comédias do Adam Sandler, mas ainda assim há muitas piadas forçadas que destoam do resto do filme (como a do roubo dos air-bags ou mesmo a do Seth Rogen ordenhando a mulher).

- Acho que o maior problema do filme é o fato da situação não ser tão urgente assim. Por mais que seja uma comédia, precisa haver envolvimento com a história... Coisas sérias em jogo, com que a plateia se identifique. Vizinhos barulhentos são péssimos, mas não algo a ponto de arruinar a vida de uma família. Depois de 1 hora a história começa a cansar um pouco. Seria melhor se houvesse uma rivalidade pessoal mais forte entre o casal e o personagem do Zac Efron (se eles fossem rivais no emprego, por exemplo, ou ex-amigos que brigaram - algo que tornasse mais interessante esse duelo entre eles, que fizesse eles passarem por uma transformação pessoal, etc).

CONCLUSÃO: Atores divertidos e boas piadas fazem valer o ingresso, apesar de alguns momentos mais apelativos ou forçados.

(Neighbors / EUA / 2014 / Nicholas Stoller)

FILMES PARECIDOS: É o Fim, Missão Madrinha de Casamento, Se Beber, Não Case!, As Loucuras de Dick & Jane

NOTA: 6.5

domingo, 6 de julho de 2014

Transformers: A Era da Extinção (anotações)

- EXPECTATIVA: Muito baixa, pois não gostei nada dos 2 últimos filmes da série (o primeiro ainda achei divertido).

- "Filmes de hoje é que são o problema: sequências, remakes..." - engraçado o filme brincar consigo mesmo.

- Fotografia e direção de arte muito bonitas (cores vivas, contraste alto, reflexos na lente, faíscas, cenários cheios de objetos, bandeiras dos EUA - Michael Bay tem uma identidade visual muito forte). Fato do filme ter sido filmado em 3D (e não apenas convertido na pós-produção) também dá pra notar (esse foi o primeiro filme rodado com uma câmera IMAX 3D digital).

- Cadê os personagens dos outros filmes?!? Estranho fazer um "reboot" da série, sendo que a equipe continua a mesma - diretor, roteirista, etc). Só mostra o quão insignificantes são os personagens pra história; que o foco mesmo são os efeitos especiais.

- Filme até que não começa mal. Gosto dessa primeira parte mais "simples" que se passa no interior, etc. Personagem do Mark Wahlberg tem conflitos com a filha, suas invenções não funcionam direito - tudo isso é um bom preparo pra descoberta do Optimus Prime.

- Por que inserir a extinção dos dinossauros nessa trama? Parece tão tolo e fora de contexto. Aliás, todo o filme tem um clima tolo... Desde a premissa, até o comportamento dos personagens, dos Transformers, os diálogos... Sinto falta de pelo menos 1 personagem central mais sério e admirável (filme não tem um interesse humano forte - relação entre Wahlberg, filha e namorado da filha é muito monótona e banal).

- Objetivo dos personagens na história é vago e mal explicado. No meio das cenas de ação fico tentando lembrar: "mas o que eles precisam fazer mesmo?".

- Atores no fundo são coadjuvantes pros robôs e pros efeitos especiais. É incrível o quão pouco vemos os ROSTOS dos atores. 2% das imagens do filme devem ser de rostos de pessoas.. 98% são de robôs, efeitos especiais, planos gerais, imagens de cidades sendo destruídas, etc. Diretor parece evitar ao máximo a situação de estar com a câmera apontada para os personagens e ter que fazer uma cena interessante apenas com isso. Ele não sabe nada sobre drama, caracterização, relacionamentos, etc.

- Lembra um pouco Velozes e Furiosos - um filme com zero de intelecto, feito pra quem fica satisfeito apenas em olhar máquinas incríveis e mulheres atraentes.

- Algumas cenas de ação são tão sem sentido que são um insulto pra nossa inteligência. Por que existem esses cabos amarrados entre os prédios? E quem teria a ideia de atravessar de um prédio pro outro por ali?

- Depois de 1 hora e pouco o filme se torna inassistível! 80 minutos disso ainda daria pra aguentar, mas 2 horas e 45???? Filme não tem envolvimento emocional pra durar isso tudo... Não há nem uma curiosidade pela história. Diretor claramente não se importa por narrativa, e não se esforça nem um pouco pra fazer a gente entender a trama (ou pra criar uma interessante).

- Apesar do visual impecável, o filme tem uma falha grave: a câmera sempre tremendo e os cortes rápidos vão te dando dor de cabeça depois de 1 hora e meia. E olha que eu sou forte pra essas coisas!!

- Meu Deus... O ser alienígena robô que se transforma em carros agora virou um robô-Tiranossauro!!! E ainda entra uma música emocionante como se isso fosse levar o público ao delírio! É uma mentalidade meio Sharknado: "Ah, aliens são maneiros, robôs são maneiros, dinossauros são maneiros... Por que não juntar isso tudo numa coisa só?".

- Lembrei por que odiei tanto os outros filmes! Estou há 1 hora vendo efeitos especiais sem um enredo envolvente, sem interesse pelos personagens, sem ideias inteligentes... E ainda com a vista doendo. É como entrar numa câmara de tortura!! E por que essa obsessão atual por destruir PRÉDIOS em tudo que é filme?

CONCLUSÃO: Não tenho nada contra a aparente intenção do filme (assim como a de outros filmes do Michael Bay), o problema é que ele é feito por pessoas tão insensíveis, tão sem-noção do que é que emociona e diverte uma plateia, que você começa a questionar se essa era realmente a intenção delas.

(Transformers: Age of Extinction / EUA / 2014 / Michael Bay)

FILMES PARECIDOS: Transformers: O Lado Oculto da Lua, Velozes e Furiosos, Pearl Harbor, Armageddon.

NOTA: 2.0