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Mas em vez de um drama trágico, o filme é contado como se fosse uma aventura - uma viagem ao paraíso onde o garoto vive uma experiência inesquecível (dá pra lembrar de O Corcel Negro, A Lagoa Azul, Náufrago e até filmes como Amor Além da Vida, Um Olhar do Paraíso, O Mensageiro do Diabo, que também usam desse contraste entre o desastre e a fantasia).
A história tem uma introdução divertida (há tantos detalhes que até parece um filme diferente), apresentando Pi como um garoto independente, profundamente místico, e estabelecendo a relação dele com seus familiares. O pai é extremamente racional, e é interessante como o roteiro aborda a discussão de fé X razão com inteligência, mas sem atacar os valores de ninguém.
É difícil comparar o filme pois ele reúne vários tipos de história em uma só, e dessa mistura acaba surgindo algo novo. Já vimos filmes de sobrevivência no mar, já vimos filmes sobre um garoto domando um animal selvagem, já vimos filmes sobre a descoberta de um lugar paradisíaco, já vimos comédias sobre famílias estrangeiras exóticas, já vimos filmes sobre homens que narram suas histórias de vida e aumentam os fatos - mas nunca isso tudo junto, o que dá ao filme um aspecto familiar e original ao mesmo tempo.
SPOILER: No final, surge a questão: a história de Pi é real, ou é apenas uma versão enfeitada de eventos muito mais dolorosos? Ouvi algumas pessoas reclamando que essa questão é colocada de maneira muito explícita, mastigada - que seria mais interessante deixar a platéia lidar sozinha com a ambiguidade. Talvez. Mas isso não me incomoda, pois o filme não apresenta a ideia de maneira pretensiosa - e uma boa ideia não deixa de ser boa apenas por ser fácil de entender. Me incomoda um pouco o toque de pessimismo, pois nesse momento o filme acaba expressando um senso de vida trágico - dizendo que a realidade é cruel e portanto existe certa sabedoria em fugir pra um mundo de ilusão.
Mas isso não tira a beleza do filme, que é uma aula de narrativa visual e um dos melhores exemplo de como a computação gráfica e o 3D podem contribuir artisticamente para um filme. O espectador é constantemente presenteado com imagens impossíveis que parecem ter sido extraídas diretamente de um sonho - o mar iluminado por plânctons, a sequência na ilha flutuante, o barco perdido em meio às estrelas... Mais pro começo do filme, há uma tomada magnífica do navio submergindo que é um daqueles momentos mágicos do cinema onde fotografia, música, tecnologia e narrativa se unem com tal perfeição que Ang Lee mereceria um Oscar por ela apenas.
Life of Pi (EUA, China / 2012 / 127 min / Ang Lee)
INDICAÇÃO: Pra quem gostou de Avatar, Náufrago, Forrest Gump, O Corcel Negro.
NOTA: 9.0