quarta-feira, 29 de março de 2017

Fragmentado

(Os comentários a seguir foram baseados nas notas que fiz durante a sessão.)

ANOTAÇÕES:

- A cena inicial do sequestro no estacionamento não chega a ser um grande prólogo, mas prende a atenção. Incomoda um pouco o comportamento artificial dos personagens - Shyamalan às vezes dirige as cenas de forma um pouco forçada pra torná-las mais "cinemáticas". A intenção é boa, mas às vezes destrói o realismo do que está acontecendo.

- A personagem / atriz principal (Casey) não é das melhores. Faltam aspectos positivos e atraentes nela, além do fato dela ser meio perturbada e "pronta pra guerra". A personagem da Dra. Karen é mais gostável, embora ela pareça só estar no filme como um mecanismo de exposição meio preguiçoso (explicar pra plateia as teorias por trás das personalidades, etc). O show mesmo é do James McAvoy. Nosso interesse na trama nem é tanto o de saber se a mocinha vai escapar ou não, e sim o de descobrir as diversas personalidades do Kevin e ver o que ele é capaz de fazer.

- A Casey tem uma sacadas muito forçadas às vezes. Por exemplo quando ela manda a amiga fazer xixi na calça pra não ser estuprada. Ou quando tenta manipular o Hedwig dizendo que a "fera" está vindo pra pegar ele. Ou quando as meninas descobrem a saída secreta pelo teto do quarto. É boa a intenção do filme de criar essas pequenas reviravoltas pra tornar a trama mais movimentada, porém as ideias quase nunca são muito inteligentes ou plausíveis. Não faz sentido por exemplo o cara levar as 2 meninas pra comer na cozinha. Óbvio que elas tentariam atacá-lo, fugir ou algo do tipo.

- De qualquer forma o filme prende a atenção, principalmente por anunciar a existência de um "monstro". Os flashbacks mostrando a infância da Casey também dão uma sensação de que há algo importante ainda a ser revelado.

- A premissa não é muito bem explorada. A ideia de 3 meninas raptadas por um cara com 23 personalidades poderia ter rendido um roteiro muito mais engenhoso que esse. A única coisa que a protagonista faz é tentar se aproveitar quando o Kevin vira criança e se torna uma personalidade mais vulnerável. Mas essa sacada é repetida várias vezes ao longo do filme. A gente fica imaginando as dezenas de outras possibilidades que foram desperdiçadas.

- Bons os momentos do James McAvoy quando ele muda de expressão e se torna uma outra personalidade.

- Essas diversas sessões de terapia não fazem muito sentido (como disse, é apenas um mecanismo de exposição do roteiro). Se as outras personalidades do Kevin estão pedindo socorro pra doutora, por que elas não dizem no e-mail qual é o problema? Ou ligam pra polícia de uma vez?

- Forçado a doutora ir até a casa do Kevin no meio da noite - e ainda por cima ele deixá-la entrar, sabendo que as meninas estão lá sequestradas, etc. Por que ela coloca aquele lenço branco na porta?!

- As outras 2 meninas raptadas parecem não servir pra nada no filme. Ridícula a cena delas tentando destravar a porta com um cabide! Como o arame entortou pra baixo depois que passou pela fresta? A Casey também consegue destravar a porta facilmente com um prego, daí acha um computador que convenientemente está sem internet, daí acha um molho de chaves que convenientemente permite que ela fuja... É essa falta generalizada de inteligência que vai tornando o filme frustrante.

- Quando a doutora desmaia, por que o Kevin sai da casa, vai até o metrô, se transforma na fera e depois volta? Parece só pra dar tempo da doutora acordar e deixa aquele recado no papel pra Casey que também não faz o menor sentido.

- Shyamalan parece funcionar de maneira puramente emocional. Tem ideias pra cenas que ele acha interessantes e as coloca no roteiro sem se perguntar se aquilo faz qualquer sentido. Por que a fera sobe pelas paredes, por exemplo? Por que o Shyamalan achou que seria uma imagem meio assustadora. Por que a técnica de chamar o Kevin pelo nome pra fazê-lo "acordar" só funciona 1 vez? Porque o Shyamalan não queria que o filme acabasse tão cedo, etc.

- SPOILER: Os flashbacks da Casey dão a sensação pra plateia de que a personagem passou por uma espécie de "arco" ao longo do filme. Mas na prática isso não ocorreu. Ela começou e acabou o filme do mesmo jeito, a única diferença é que a plateia ficou sabendo sobre seus traumas do passado. E no fim não foi nem ela que se salvou ou fez algo que mostrasse superação - o Kevin apenas descobriu que ela era uma sofredora como ele e resolveu poupá-la. Nem dos abusos do tio fica claro que ela irá se livrar após essa experiência.

- SPOILER: Divertido o final com o Bruce Willis. O conceito de um final supresa envolvendo a própria filmografia do Shyamalan é excelente - só que foi mal executado. Não fica clara qual a conexão do Kevin com os personagens de Corpo Fechado. Por que a mulher no balcão associou as múltiplas personalidades do Kevin com o personagem do Samuel L. Jackson?

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CONCLUSÃO: História divertida, com um bom senso de entretenimento, uma ótima performance do James McAvoy - mas o roteiro é sub-aproveitado e pouco inteligente.

Split / EUA / 2016 / M. Night Shyamalan

FILMES PARECIDOS: O Homem nas Trevas (2016) / Rua Cloverfield, 10 (2016) / A Visita (2015)

NOTA: 6.0

2 comentários:

Marcus Aurelius disse...

Quando foi anunciado, era uma história real com Leonardo DiCaprio (pré-oscar) e iria ser um filme de tribunal, provavelmente dirigido por James Cameron. Como diabos o filme deu essa volta mística doida e entrou em um universo compartilhado de heróis????

A respeito do filme, achei um potencial perdido, uma proposta mentirosa e uma orientação enganosa. Esperava ver um filme sobre um homem com múltiplas personalidades (foi o que venderam), mas era na verdade um filme de cativeiro, daí a garota "esperta" dá a entender que ela vai fazer coisas impressionantes e o que vai ter uma grande reviravolta. Mas daí o filme esquece disso e resolve contar a história que foi vendida, mas que não tinha integração com o terceiro ato e nem o plot twist... sei lá, talvez eu estivesse esperando o filme do DiCaprio (não vi trailers e entrei na sala sem saber de nada).

Mas concordo contigo, faltou inteligência.

Caio Amaral disse...

Oi Marcus, esse do DiCaprio é um outro projeto que nada tem a ver com Fragmentado.. Fragmentado é um roteiro original do Shyamalan.. Aliás pra mim esse é o grande problema dele... Se meter a ser sempre roteirista solo em seus filmes... Ele é bom diretor e criador de premissas... Mas precisava de uma ajudinha de roteiristas mais competentes...