sábado, 27 de abril de 2019

Vingadores: Ultimato


(Esta crítica está no formato de anotações - em vez de uma crítica convencional, os comentários a seguir foram baseados nas notas que fiz durante a sessão - um método que adotei para passar minhas impressões de forma mais objetiva.)

ANOTAÇÕES:

- Incrível como a Brie Larson está ótima aqui como a Capitã Marvel (foi uma das minhas coisas favoritas do filme todo), enquanto no filme solo ela me pareceu mal dirigida, como se fosse a atriz errada pro papel. Deram uma outra atitude pra ela que combinou muito mais com seu perfil natural, e isso tornou a personagem mais carismática.

- SPOILER: Surpreendente eles matarem o Thanos logo no comecinho do filme. Cria uma imprevisibilidade interessante.

- Tenho certos problemas com o elemento de viagem no tempo no filme. Primeiro porque dá um senso de que nada que acontece na história é definitivo e deve ser levado a sério, afinal tanto o vilão quanto os heróis poderão usar esse recurso pra desfazer qualquer evento do filme (tira o peso dramático das mortes). Depois porque o filme tem uma atitude extremamente não-científica com o assunto: parece muito vaga e fácil a maneira como eles conseguem viabilizar a viagem no tempo, e é tudo levado num tom de piada, o que tira a seriedade da história (os testes iniciais que dão errado e um deles vira um bebê, etc). As regras da viagem no tempo também são muito confusas e mal estabelecidas. Por exemplo: por que ao viajar no tempo eles também se deslocam no espaço e vão parar em lugares dramaticamente convenientes?

- O humor do filme é legal - em geral são comentários divertidos que não diminuem a estatura dos personagens, apenas os fazem parecer inteligentes e espirituosos (o comentário sobre receber e-mails de um guaxinim, por exemplo), diferente do humor destrutivo de outros filmes da Marvel (ok, o Thor gordo talvez tenha passado um pouco do ponto).

- SPOILER: Não fica claro por que eles precisam revisitar diversas cenas dos filmes anteriores pra encontrar as pedras. É uma ideia copiada de De Volta para o Futuro (alguns momentos parecem roubados diretamente do filme, como o Tony Stark encontrando o pai, e o pai achando ele familiar, etc). Só que aqui parece um movimento forçado do roteiro só pra criar essa interação nostálgica entre os personagens do passado e os do presente (ou seja, a única ideia mais marcante do roteiro acaba sendo uma ideia copiada de um filme extremamente conhecido, e usada de maneira menos eficiente, o que reforça o que discuto na postagem A Importância de Ideias e Inspiração).

- SPOILER: Chato auto-sacrifícios ainda serem necessários mesmo eles tendo o poder de viajar no tempo. Não é muito bem explicado por que a Scarlett Johansson não pode voltar depois.

- Também não fica claro por que a luva não funciona no Hulk (ou se funcionou, o que aconteceu). O filme é cheio de crises e obstáculos que não são muito justificados; surgem de qualquer jeito apenas porque a fórmula diz que coisas devem dar errado pra gerar conflito.

- SPOILER: Na minha sessão a plateia aplaudiu quando o Capitão América usou o martelo do Thor. Eu fiquei meio perdido, pois não entendi por que agora de uma hora pra outra ele adquiriu esse poder (ou resolveu mostrá-lo, caso já o tivesse antes). É o tipo de cena que talvez faça sentido pra fã, pra quem conhece bem o universo, mas que fica fora de contexto pro espectador normal, pois não foi construída nenhuma expectativa nesse filme em específico em relação a isso.

- SPOILER: A cena em que todos os Vingadores se reunem contra o Thanos pra mim também foi um pouco insatisfatória. Óbvio que isso eventualmente iria acontecer (já é uma ideia batida), mas não entendi direito como foi que eles conseguiram ressuscitar todo mundo finalmente. Foi quando o Hulk colocou a luva? Acho chato quando um momento crucial como esse deixa margem pra dúvidas. Não consigo curtir a cena plenamente se o filme não me convenceu primeiro de que aquilo faz sentido, não se trata apenas um fan-service jogado na trama.

- SPOILER: Como o Homem de Ferro conseguiu roubar as pedras do Thanos no último momento? Por que elas funcionaram na luva dele? É outra reviravolta mal explicada. Se o herói vai realizar o ato mais importante do filme, a jogada que irá salvar o mundo, você espera que isso seja algo claro, que você realmente consiga observar a ação dele, entender qual foi a sacada que resultou na vitória, e que também seja uma ideia interessante, inesperada  - não apenas o Homem de Ferro distrair o Thanos e tomar as pedras da mão dele como se fosse uma criança roubando balas da mão da outra.

- SPOILER: Chatíssimo esse clichê mais uma vez do auto-sacrifício no final (o Homem de Ferro ter que morrer pra salvar os outros). Sempre achei que esses filmes funcionam melhor pra quem tem uma mentalidade cristã. Eu por exemplo já não vejo nada de muito admirável nesses auto-sacrifícios gratuitos nos finais dos filmes. O fato de eu ter uma mentalidade mais "científica" também me faz questionar a coerência dos poderes dos personagens, querer entender direito as regras da magia, a lógica dos eventos - já os mais místicos costumam ser bem mais permissivos em relação a essas coisas mal explicadas: enxergam tudo de forma mais simbólica, abstrata, que funciona por uma lógica alternativa, afinal é assim que eles foram acostumados a digerir os textos religiosos.

- SPOILER: Péssimo esse final do Thor e do Capitão América abdicando de seus poderes, passando o bastão para as "minorias da América" (o momento politicamente correto do filme). É mais um reflexo dos valores altruístas / coletivistas por trás desses filmes - que na verdade parecem surgir pra contrabalancear o que veio antes - a culpa gerada pelo desejo por poder, ambição, etc. Me remete ao que discuti no texto Por que não gosto de Game of Thrones. Imagino que quem deseje poder, autoestima, sucesso, mas enxergue essas coisas como coisas destrutivas, ruins, imorais, acabe se sentindo culpado e vivendo essa dualidade - querer poder e tudo mais, mas ao mesmo tempo achar que o nobre e moral no fim é abrir mão dessas coisas - se sacrificar, ser humilde, altruísta, etc. Como eu não tenho essa visão, um final como esse pra mim é apenas tedioso. Mas pra quem aceita essa dualidade, talvez pareça um ato nobre dos heróis, e a pessoa se sinta mais ética saindo do cinema. Só como ilustração, observe como Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal faz o oposto disso na cena final, e brinca com esses valores de forma sutil e inteligente, fingindo por um momento que irá tombar pro lado do auto-sacrifício, da abdicação, só pra enganar a plateia (ou seja, o filme aqui pressupõe que o espectador rejeite esses valores altruístas, e irá vibrar quando Indiana tomar o "bastão" de volta, representado pelo chapéu - mas a verdade é que muito do público atual aceita sim esses valores, admira o auto-sacrifício, rejeita expressões de autoestima, individualismo, e provavelmente não irá se deleitar como eu nessa cena, o que mostra como nossos valores morais influenciam diretamente na maneira como reagimos aos filmes).

Avengers: Endgame / EUA / 2019 / Anthony Russo, Joe Russo

NOTA: 5.5

10 comentários:

Korvoloco Aspicientis disse...

A morte do Tony Stark eu já previa, pois como todo mundo sabe,o Robert Downey Jr. disse que não iria mais interpretar o Tony Stark. E tomara que não volte mesmo, estou querendo ver outros filmes dele sem ser de heróis.
Eu não assisti Ultimato, mas é como se tivesse visto tudo depois de tantos spoilers, mas não ligo. Sei lá, esses filmes de Vingadores já me cansaram há um tempinho.
Percebi mesmo foi quando assisti "Guerra Civil" em casa e logo em seguida "Moscou contra 007" e me diverti muito mais com James Bond que Homem de Ferro e cia. Mas se eu disser isso para um fã da Marvel, certamente vai me achar um babaca, mas não me importo, logo essa febre de filmes de super heróis vai diminuir e o público vai achar outro altar para adorar.
E mesmo não ter assistido a "Ultimato", pelo visto é um pouco melhor que "Guerra Infinita", já que dessa vez você não abandonou o cinema no meio do filme. Se fosse um crítico mais famoso, iriam te acusar de ter se vendido pra Disney, hahahahaha.

Caio Amaral disse...

Esses filmes têm funcionado muito na base do "fan service" né.. e no fim isso é o bastante pra garantir retorno financeiro, aclamação do público.. pois a base de fãs é gigante.. então pros estúdios é o que importa.. antigamente não existia tanto esse conceito de fan service no cinema, os filmes eram feitos pra um público mais amplo.. tinham que funcionar de uma forma mais universal, por isso a arte narrativa era tão fundamental.. Isso é reflexo dos tempos atuais né.. hoje em dia as pessoas acreditam menos no universal, no racional, tudo é mais segregado.. os filmes querem apelar pra "tribos" específicas, com base em interesses e ideologias específicas, questões de "identidade".. e os filmes conquistam o público com base nessas coisas mais primitivas, então pouco importa se a narrativa funciona de forma universal, etc. abs!

Dood disse...

O problema é que o Universo Cinematográfico da Marvel é muito limitado. Porque cada estúdio estava com licença pra determinado personagem e por exemplo pelo evento citado Guerra Civil nos quadrinhos é totalmente diferente e afeta todos os personagens deste universo.

Isso acaba gerando discussão pra quem é fã dos quadrinhos com quem é fã dos personagens do cinema - chamados de Neo Nerds. Esse pessoal costuma só consumir algo desses heróis por conta da sua popularidade no cinema, nada mais.

Alguns são tão ignorantes no assunto que chegam a escrever matérias questionando por que Batman não está nos Vingadores.

Os quadrinhos ao menos são mais bem trabalhados que no cinema, mesmo o Hulk não teve filme solo por ainda ter direitos com um estúdio (acho que a Universal). Por isso a Disney comprou a Fox, porque ela tem X-Men e Quarteto Fantástico que ela deve usar na fase 4 da Marvel. Que eu acho difícil emplacar, porque a Guerra Infinita é o evento máximo desse universo.

Caio Amaral disse...

Também acho difícil eles manterem o mesmo nível de popularidade depois dessa fase que acabou agora com o Ultimato... não tem muito mais pra onde crescer em termos de escala... teria muito pra onde crescer em termos de criatividade, qualidade cinematográfica, isso sim... mas não acho que eles irão por esse caminho... "escala" acaba sendo tudo nesse universo... e agora meio que eles chegaram no fim dessa linha - seria cansativo tentar fazer um filme com ainda mais heróis, ainda mais astros reunidos, eventos ainda mais catastróficos, etc... a evolução teria que ocorrer por outro caminho... abs!

Anônimo disse...

Parece que, de uns tempos pra cá, todo filme do conglomerado Disney, não importa se da Marvel, de princesas ou de Star Wars, vem seguindo uma fórmula pronta na qual auto-sacrifício e correção política são tópicos obrigatórios.
Agora estão dizendo que esse filme vai superar a bilheteria de Avatar. Claro que bilheteria nunca foi sinal de qualidade, não deixa de ser indicativo dos maus tempos atuais. Titanic e Avatar eram obviamente mais relevantes artisticamente falando, enquanto que as coisas da Marvel dificilmente importarão para alguém de fora da tribo. Também essa euforia não leva em conta a inflação, que superdimensiona o sucesso dos blockbusters recentes. Com valores atualizados, ninguém até agora superou "E o Vento Levou".
Pedro.

Caio Amaral disse...

Exatamente Pedro.. tava falando disso esses dias no Instagram, inclusive postei o ranking das bilheterias com a inflação corrigida.. essa me representa bem mais hehe. Abs!

Dood disse...

Quando achei que ia deslanchar esse negócio de Universo Cinematográfico da Marvel eu mesmo esperava mais. Nada contra uma coisa mais comercial, menos artística. É tant coisa com politicagem barata, sem aquele feeling da HQ. A mesma coisa vai pra DC deram um poder ao Zack Snyder e ele criou um Superman anti idealista, acabou com o personagem. Batman idem, as animações da DC são mil vezes melhores. Parece que a linguagem do cinema tem que seguir uma fórmula pré disposta.

Heróis como Shazam tratatos como bocós, cara Shazam é um personagem tão idealista quanto Super Homem até mais, porque ele é invocado por um menino genuinamente bom, que tem dificuldades na vida, mas mantém seus valores e não se integra ao pessimismo e cinismo. Aí dão o poder no filme para um garoto de valores questionáveis. Fica difícil.

Caio Amaral disse...

Infelizmente poucos filmes comerciais são autênticos o bastante pra irem contra as tendências culturais... esses valores que parecem ser o padrão da época... a maioria só quer repetir a fórmula, entregar o que o público está pedindo, e rezar pro filme dar lucro...

Anônimo disse...

Noticiaram que chegou alcançou o posto de maior bilheteria da história, descontada a inflação, mas só graças a um relançamento sem muita justificativa além da de permitir aos 'marvelistas' assistir ao filme uma segunda ou terceira vez.
Pedro.

Caio Amaral disse...

Está cada vez mais fácil passar de 1 bilhão de bilheteria.. no Top 20, a maioria dos filmes são dos últimos 4, 5 anos.. nem vejo muita surpresa mais nisso..