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(Esta crítica está no formato de anotações - em vez de uma crítica convencional, os comentários a seguir foram baseados nas notas que fiz durante a sessão - um método que adotei para passar minhas impressões de forma mais objetiva.)
ANOTAÇÕES:
- Incrível como a Brie Larson está ótima aqui como a Capitã Marvel (foi uma das minhas coisas favoritas do filme todo), enquanto no filme solo ela me pareceu mal dirigida, como se fosse a atriz errada pro papel. Deram uma outra atitude pra ela que combinou muito mais com seu perfil natural, e isso tornou a personagem mais carismática.
- SPOILER: Surpreendente eles matarem o Thanos logo no comecinho do filme. Cria uma imprevisibilidade interessante.
- Tenho certos problemas com o elemento de viagem no tempo no filme. Primeiro porque dá um senso de que nada que acontece na história é definitivo e deve ser levado a sério, afinal tanto o vilão quanto os heróis poderão usar esse recurso pra desfazer qualquer evento do filme (tira o peso dramático das mortes). Depois porque o filme tem uma atitude extremamente não-científica com o assunto: parece muito vaga e fácil a maneira como eles conseguem viabilizar a viagem no tempo, e é tudo levado num tom de piada, o que tira a seriedade da história (os testes iniciais que dão errado e um deles vira um bebê, etc). As regras da viagem no tempo também são muito confusas e mal estabelecidas. Por exemplo: por que ao viajar no tempo eles também se deslocam no espaço e vão parar em lugares dramaticamente convenientes?
- O humor do filme é legal - em geral são comentários divertidos que não diminuem a estatura dos personagens, apenas os fazem parecer inteligentes e espirituosos (o comentário sobre receber e-mails de um guaxinim, por exemplo), diferente do humor destrutivo de outros filmes da Marvel (ok, o Thor gordo talvez tenha passado um pouco do ponto).
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- SPOILER: Chato auto-sacrifícios ainda serem necessários mesmo eles tendo o poder de viajar no tempo. Não é muito bem explicado por que a Scarlett Johansson não pode voltar depois.
- Também não fica claro por que a luva não funciona no Hulk (ou se funcionou, o que aconteceu). O filme é cheio de crises e obstáculos que não são muito justificados; surgem de qualquer jeito apenas porque a fórmula diz que coisas devem dar errado pra gerar conflito.
- SPOILER: Na minha sessão a plateia aplaudiu quando o Capitão América usou o martelo do Thor. Eu fiquei meio perdido, pois não entendi por que agora de uma hora pra outra ele adquiriu esse poder (ou resolveu mostrá-lo, caso já o tivesse antes). É o tipo de cena que talvez faça sentido pra fã, pra quem conhece bem o universo, mas que fica fora de contexto pro espectador normal, pois não foi construída nenhuma expectativa nesse filme em específico em relação a isso.
- SPOILER: A cena em que todos os Vingadores se reunem contra o Thanos pra mim também foi um pouco insatisfatória. Óbvio que isso eventualmente iria acontecer (já é uma ideia batida), mas não entendi direito como foi que eles conseguiram ressuscitar todo mundo finalmente. Foi quando o Hulk colocou a luva? Acho chato quando um momento crucial como esse deixa margem pra dúvidas. Não consigo curtir a cena plenamente se o filme não me convenceu primeiro de que aquilo faz sentido, não se trata apenas um fan-service jogado na trama.
- SPOILER: Como o Homem de Ferro conseguiu roubar as pedras do Thanos no último momento? Por que elas funcionaram na luva dele? É outra reviravolta mal explicada. Se o herói vai realizar o ato mais importante do filme, a jogada que irá salvar o mundo, você espera que isso seja algo claro, que você realmente consiga observar a ação dele, entender qual foi a sacada que resultou na vitória, e que também seja uma ideia interessante, inesperada - não apenas o Homem de Ferro distrair o Thanos e tomar as pedras da mão dele como se fosse uma criança roubando balas da mão da outra.
- SPOILER: Chatíssimo esse clichê mais uma vez do auto-sacrifício no final (o Homem de Ferro ter que morrer pra salvar os outros). Sempre achei que esses filmes funcionam melhor pra quem tem uma mentalidade cristã. Eu por exemplo já não vejo nada de muito admirável nesses auto-sacrifícios gratuitos nos finais dos filmes. O fato de eu ter uma mentalidade mais "científica" também me faz questionar a coerência dos poderes dos personagens, querer entender direito as regras da magia, a lógica dos eventos - já os mais místicos costumam ser bem mais permissivos em relação a essas coisas mal explicadas: enxergam tudo de forma mais simbólica, abstrata, que funciona por uma lógica alternativa, afinal é assim que eles foram acostumados a digerir os textos religiosos.
- SPOILER: Péssimo esse final do Thor e do Capitão América abdicando de seus poderes, passando o bastão para as "minorias da América" (o momento politicamente correto do filme). É mais um reflexo dos valores altruístas / coletivistas por trás desses filmes - que na verdade parecem surgir pra contrabalancear o que veio antes - a culpa gerada pelo desejo por poder, ambição, etc. Me remete ao que discuti no texto Por que não gosto de Game of Thrones. Imagino que quem deseje poder, autoestima, sucesso, mas enxergue essas coisas como coisas destrutivas, ruins, imorais, acabe se sentindo culpado e vivendo essa dualidade - querer poder e tudo mais, mas ao mesmo tempo achar que o nobre e moral no fim é abrir mão dessas coisas - se sacrificar, ser humilde, altruísta, etc. Como eu não tenho essa visão, um final como esse pra mim é apenas tedioso. Mas pra quem aceita essa dualidade, talvez pareça um ato nobre dos heróis, e a pessoa se sinta mais ética saindo do cinema. Só como ilustração, observe como Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal faz o oposto disso na cena final, e brinca com esses valores de forma sutil e inteligente, fingindo por um momento que irá tombar pro lado do auto-sacrifício, da abdicação, só pra enganar a plateia (ou seja, o filme aqui pressupõe que o espectador rejeite esses valores altruístas, e irá vibrar quando Indiana tomar o "bastão" de volta, representado pelo chapéu - mas a verdade é que muito do público atual aceita sim esses valores, admira o auto-sacrifício, rejeita expressões de autoestima, individualismo, e provavelmente não irá se deleitar como eu nessa cena, o que mostra como nossos valores morais influenciam diretamente na maneira como reagimos aos filmes).
Avengers: Endgame / EUA / 2019 / Anthony Russo, Joe Russo
NOTA: 5.5