segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Cultura - Agosto 2024

26/8 - Tendências 2024

Dando uma olhada na lista de filmes que avaliei em 2024 e nos lançamentos mais aguardados do ano, notei alguns padrões e tendências culturais no mundo do cinema que merecem destaque. Existem várias tendências ocorrendo simultaneamente, claro, e muitas que persistem há anos (comentei recentemente sobre a repressão do Sex Appeal e do Humor), mas olhando para a "safra" 2024 como um todo, essas foram as que mais me chamaram atenção:

Tendências Positivas:

- "Anciões" vindo para o resgate: comebacks de figuras como Francis Ford Coppola (Megalopolis), Kevin Costner (Horizon) ou Jerry Bruckheimer (Um Tira da Pesada 4 / Bad Boys: Até o Fim) podem nem sempre estar resultando em grandes filmes, mas têm ajudado a ressuscitar um senso de ambição na indústria e a reinserir um pouco de Idealismo "não-corrompido" no entretenimento, coisas que estiveram em baixa nas últimas décadas. Depois da pandemia, artistas veteranos começaram também a investir pesadamente em autobiografias, projetos de legado, e ultimamente, documentários sobre a carreira de boomers (ou de artistas até de gerações anteriores) pra mim têm sido a fonte mais consistente de inspiração e de valores positivos no cinema — entre os 10 lançamentos mais bem avaliados por mim até agora em 2024, 5 deles são documentários sobre carreiras célebres do passado: The Beach Boys, Jim Henson: Idea Man, Faye, The Greatest Night in Pop, Made in England: The Films of Powell and Pressburger. Não deixa de ser uma fórmula, algo que em breve estará hiper saturado também (já exploraram ao infinito as criações desses artistas, agora vão explorar ao infinito as figuras dos artistas em si, e extrair daí o pouco de matéria-prima Idealista que ainda resta na cultura — já que as Gerações X e Millennial se recusaram a produzir novas reservas), ainda assim, é um conteúdo positivo, que pode motivar uma nova onda no futuro.

- Talentos de fora do sistema: sucessos como Bebê Rena e É Assim que Acaba (ambos adaptados de textos originais recentes) devem seu apelo à autenticidade e à qualidade do material base. E em ambos os casos, o material tinha se provado primeiro fora do "sistema" antes de virar filme ou série. Como Hollywood deixou de ser um ambiente que desenvolve talentos, e como bons escritores são cada vez mais escassos por lá, esse tipo de fenômeno (artistas que se desenvolvem no mercado-livre da internet) pode acender a luz na cabeça de produtores e mostrar um método melhor pra encontrar escritores talentosos e materiais originais de qualidade (que não pareçam um tiro no escuro em termos de investimento). Pode ser o caminho para que a indústria possa a curto prazo diminuir sua dependência de franquias, IPs antigas, etc.

- Esquerda abandona o discurso Woke: assim como na política, estúdios e artistas com um perfil mais Democrata têm desistido das mensagens woke explícitas que se provaram ineficazes e financeiramente desastrosas na última década. Filmes como Divertida Mente 2 e Twisters parecem ter lucrado em cima do fato de não terem empurrado mensagens divisivas. O diretor de Twisters (que fez o super-político Minari) surpreendeu ao dizer em entrevistas que evitou de propósito o tema "mudanças climáticas" no filme, pois ele sente que "filmes não devem ser orientados por mensagens". Isto é algo que alguém (inclusive ele) dificilmente teria dito 3 ou 4 anos atrás, um sinal que os tempos realmente mudaram nesse aspecto.

Tendências Negativas:

- Estúdios engolidos por corporações: parece um discurso anticapitalista, mas não estou pedindo intervenção estatal nem nada. É só a triste constatação de que não parece existir em Hollywood mais aqueles produtores / CEOs com inclinação artística que preservavam o equilíbrio entre o lado criativo e o lado comercial do cinema. A tendência de estúdios serem dominados por investidores e homens que só pensam em dinheiro a curto prazo (os "ricos sem lastro") parece estar só crescendo e corroendo as instituições por dentro. Isso se vê na persistência de franquias desgastadas e no vazio criativo de produções que já teriam tido tempo pra ouvir o público e corrigir o curso caso tivessem real preocupação com qualidade, mas não o fazem: Deadpool e Wolverine, The AcolyteMeu Malvado Favorito 4Ghostbusters: Apocalipse de Gelo, Madame Teia, Godzilla e Kong: O Novo Império, Alien: Romulus etc. Se o público estivesse rejeitando esses produtos, isso poderia ser a semente pra uma tendência positiva no futuro. Mas olhando para as maiores bilheterias do ano, este ainda não é o caso.

- Primitivismo / niilismo masculino: essa não é uma tendência nova, mas é uma que achei que já teria perdido o fôlego a essa altura (assim como o movimento woke). Mas olhando para os destaques do ano (ou filmes que tiveram uma repercussão maior do que eu esperava), percebi que ela continua a todo vapor: Deadpool & Wolverine, Matador de Aluguel, Beekeeper: Rede de Vingança, Guerra Sem Regras, Fúria Primitiva, a popularidade crescente do cinema da Índia, etc.

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