quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Marighella

Filme dirigido por Wagner Moura sobre a vida do guerrilheiro comunista Carlos Marighella que foi um dos líderes da luta armada contra a ditadura militar no Brasil nos anos 60. Nos últimos anos vimos diversas histórias parecidas no cinema, como Judas e o Messias NegroMangrove, então os adiamentos na estreia de Marighella fazem ele chegar aos cinemas agora com uma cara de lugar-comum que não é totalmente merecida. Mas parte dessa impressão é também culpa do próprio filme e da caracterização dada ao protagonista, que pra mim pareceu apenas mais um de tantos líderes similares que lutaram pelas mesmas causas nessa época, sem nada de particularmente extraordinário ou diferente (algo que ocorre também em biografias de músicos famosos, que seguem sempre a mesma fórmula: falam do vício em drogas, das relações abusivas, etc.). Essa qualidade genérica é típica também de filmes que querem retratar "mitos" em vez de personalidades críveis (como filmes sobre Jesus) pois o personagem já surge na tela pronto, com seu caráter formado, com uma missão pré-estabelecida, e o espectador assiste a tudo de fora, sem conhecer as motivações e conflitos mais pessoais que movem aquele indivíduo, o que gera menos envolvimento.

Não costumo gostar muito de filmes biográficos e nem de dramas políticos, pois são gêneros que tendem a colocar a função histórica/informativa acima da satisfação do público, então filmes como Marighella pra mim são naturalmente chatos de assistir (sem falar que este é bem longo). Ele é basicamente um relato histórico dos últimos anos do guerrilheiro, e pula de um evento relevante para o próximo de forma meio desconexa, sem grandes ideias narrativas, sem criar suspense, cenas elaboradas, etc. A direção é igualmente funcional; quase tudo é filmado com câmera na mão, reforçando essa ideia de um relato realista, sem rodeios (apesar da produção ser de ótimo nível). Outro ponto negativo pra mim é que este é daqueles filmes que romantizam personagens de caráter duvidoso, onde todo mundo na história parece motivado por ódio, vingança (tanto os "mocinhos" quanto os "bandidos") e não há nada de realmente positivo pra esperar. Desde o começo você sabe que o ápice de "satisfação" do filme será provavelmente um grande massacre, uma cena de tortura difícil de assistir, e que a intenção do diretor é causar indignação na plateia, ganhar respeito através da brutalidade, etc. Então não é um filme pra mim, mas levando em conta os grandes hits do cinema brasileiro como Tropa de Elite e Cidade de Deus, não duvido que faça sucesso, pelo menos entre os que não cancelarem o filme de antemão por conta do teor político.

Marighella / 2021 / Wagner Moura

Nível de Satisfação: 4

Categoria D/C: Não Idealismo (função política/social) / Entretenimento com valores negativos

Filmes parecidos: Judas e o Messias Negro (2021) / Small Axe: Mangrove (2020) / Infiltrado na Klan (2018) / Tropa de Elite (2007)

2 comentários:

Anônimo disse...

Eu sei que o cinema chegou ao fundo do poço quando entre tantos trailers de filmes de heróis e de outros blockbusters, o único que tem “cara de filme” de verdade é o Marighella.
Não vi o filme, mas acho que não estou errado em supor que ao colocar um ator negro com cara de trabalhador rural (rosto cansado, olhos vermelhos molhados com lágrimas), em vez de alguém realmente parecido com o Marighella é chamar todos os anti-comunistas de racistas que querem matar pobres.

Caio Amaral disse...

Eu acho que pra esse papel eles precisavam de alguém com um rosto mais de vítima/minoria do que o Marighella da vida real.. pra manter um ar de superioridade moral mesmo cometendo atos duvidosos. Tipo uma Viola Davis que parece sempre "honrada" em qualquer situação hehe. Mas não acho que precisaria ser negro necessariamente pra passar essa qualidade.. A Frances McDormand é outra que pode fazer qualquer barbaridade num filme, que as pessoas ainda ficam do lado ela, rs. De qualquer forma, em Marighella eles reforçam sim essa questão racial.. até em cenas que não envolvem o Marighella mas mostram opressão, bullying, etc.