Um "primo" mais Corrompido de Ford vs Ferrari. Assim como Oppenheimer, temos aqui a história real de um homem bem-sucedido, elegantemente vestido, operando máquinas potentes e perigosas, e cujo foco é todo em suas imperfeições morais, seus relacionamentos conflituosos, o aspecto trágico/destrutivo de seu trabalho. O filme não é nem crítico e nem favorável a Enzo Ferrari; não é nem uma tragédia, nem uma história de sucesso. É um retrato amoral, em cima do muro. Fiquei me perguntando se o filme (assim como o personagem) acha que conquistas profissionais são um fim em si mesmo, algo que tem o poder de inspirar independentemente da moralidade, do caráter do personagem, da relação dessas conquistas com sua felicidade pessoal. A trama tenta se sustentar no objetivo de Ferrari de construir um carro mais rápido e assegurar o prestígio de sua empresa, só que não existe um porquê por trás deste objetivo que dê um sentido moral maior à história. A graça do filme se torna basicamente a imersão no universo Ferrari pra quem gosta desse tipo de assunto. Homens elegantemente vestidos, moralmente imperfeitos, operando máquinas potentes e perigosas — este parece ser o "porquê" real do filme.
Satisfação: 5 (Idealismo Corrompido)
Começa com uma premissa tola que estabelece uma relação arbitrária entre aranhas e o poder de prever o futuro, e o que segue é um show de falta de talento (e de noção) que só o atual sistema de estúdios de Hollywood seria capaz de proporcionar. O filme já teria dificuldade de agradar o público Marvel/DC com sua energia feminina e seu tom lúdico (não-dark) mesmo que ele tivesse um roteiro decente (como no caso de The Flash) e uma produção respeitável. Só que nesse caso o filme é de fato horrível. Eu achei a experiência divertida até, pois a cada nova cena algo absurdo acontece que consegue surpreender até suas expectativas reajustadas. Há uma sequência em que a heroína salva 3 garotas no metrô de Nova York, daí rouba um táxi e acha um esconderijo pra elas no meio de uma floresta próxima (?!) de onde elas dão uma fugida mais tarde até uma lanchonete que às vezes parece do lado, às vezes parece a quilômetros de distância de onde elas estavam, desafiando o senso de geografia até de quem não sabe em que país se passa a história. O roteirista demonstra uma liberdade criativa invejável: tudo que ele deseja que aconteça a cada momento, ele coloca no papel, sem as restrições e a auto-censura que paralisariam a maioria dos profissionais. Se ele acha que seria surpreendente ver uma ambulância atravessando a parede de um prédio e voando pelos ares com a Dakota Johnson dentro, mesmo ninguém entendendo de onde ela saiu, isso vira uma cena do filme. Se ele precisa que em 2003 computadores já tenham I.A. e possam fazer um reconhecimento facial de toda a população pela internet, eles fazem. Se ele precisa que fogos de artifício se comportem como meteoritos, arrebentando concreto e atingindo pessoas que estão a vários metros embaixo d'água, isso acontece. Madame Teia não chega a ser um filme que "de tão ruim fica bom", mas é um filme cuja ruindade tem uma leveza e uma qualidade imprevisível que o torna mais assistível que as bombas habituais gênero.
Satisfação: 3 (Idealismo Imperfeito)
Filme genérico e incrivelmente superficial surfando na onda dos Biopics musicais. O filme começa "do meio" com Bob Marley já famoso na Jamaica, com alguns de seus sucessos já lançados — não mostra como ele iniciou a carreira, como ele encontrou seu estilo, como era seu processo criativo, por que subitamente ele se tornou um hit nos EUA com o álbum Exodus... É uma narrativa desestruturada, episódica, que te deixa esperando pelo menos a convenção de ter um grande show no final, ou a eventual morte do artista, pra dar um senso de conclusão, mas o filme não entrega nada disso, e ainda deixa de fora alguns dos maiores sucessos do cantor, como Could You Be Loved e Is This Love (essa pelo menos toca nos créditos). Outro equívoco foi o casting do protagonista, que te dá mais a sensação de estar vendo o biopic do Lenny Kravitz (o cinema atual enfeia os personagens sempre que pode e nos contextos mais ilógicos possíveis — quando a ausência de beleza finalmente seria justificada pelo conteúdo, eles transformam Bob Marley num cantor charmosinho com ares pop, indo contra a estética e o arquétipo que fizeram dele um ídolo pra tanta gente). Lashana Lynch é quem se salva como a esposa de Bob.
Satisfação: 4 (Idealismo Corrompido)
Nada ilustra melhor o estado deprimente do cinema brasileiro que o fato deste filme ter sido considerado por muitos um dos melhores filmes nacionais do ano. Eu literalmente achei que estava vendo um trabalho de escola em alguns momentos, algo feito por completos iniciantes (tanto por trás quanto na frente das câmeras) e me surpreendi depois entrando no IMDb de ver que o diretor tem longas de destaque no currículo, inclusive Bruna Surfistinha (2011) que na época achei um filme competente. Nós estamos tão acostumados ao padrão internacional de qualidade, que às vezes começamos a achar que é fácil fazer cinema; que atuações realistas ocorrem naturalmente, que um CGI que não constranja é algo fácil de fazer com a tecnologia atual... Filmes como Sequestro acho que servem pra nos lembrar como é difícil fazer cinema, e que muito talento e experiência já estão envolvidos até num nível Madame Teia de produção. O filme só não é uma perdição total pois a premissa do sequestro do avião é naturalmente dramática, e o filme segue uma estrutura clássica de roteiro que o mantém assistível mesmo com a execução amadora. Nesse aspecto, a falta de sofisticação do filme o ajuda — ao se ater a uma narrativa simples, funcional, ele adquire um mérito básico que muitas vezes é esquecido pelos cineastas mais ambiciosos — o famoso "gancho", que nem alguns dos favoritos ao Oscar esse ano possuem.
Satisfação: 2 (Idealismo Imperfeito)
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