quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Update: YouTube

Continuo sem planos de voltar a fazer críticas no YouTube. Se eu voltar, será provavelmente com uma abordagem diferente. Nessa experiência de 1 ano, entendi que seria muito difícil atrair um público considerável com a minha atitude e com o tipo de conteúdo que eu estava fazendo. Não é novidade pra mim que a "verdade não vende", e que pra ser comercial você precisa evitar assuntos e opiniões polêmicas que alienarão grande parte dos espectadores (quando fiz o curta A Coisa Mais Simples do Mundo em 2017 já tinha isso claro). A surpresa pra mim foi só perceber o grau em que seria necessário fazer isso. Ingenuamente, achei que daria pra "hackear" o sistema, que bastaria eu ser mais ponderado com minhas palavras, focar em valores abstratos, e quando discutisse política, religião, temas tabu, bastaria não citar pessoas/entidades específicas, tomar cuidado pra não criar caricaturas, criticando só os aspectos daquilo que acho nocivos, sem atacar o todo, sem condenar o público etc.

Mas aparentemente, o que pra mim era ponderado se provou ainda meio indigesto pros algoritmos e pro espectador casual. Pra crescer no YouTube, entendi que eu teria que separar totalmente 2 objetivos que eu tinha: o de analisar sinceramente os filmes que assisto vs. o de falar sobre cinema pra um público maior e quem sabe transformar isso em um trabalho. Os 2 objetivos são auto-excludentes. Vi que eu precisaria adotar uma postura mais próxima de uma Isabela Boscov ou de um Dalenogare — ser mais um comunicador, um indicador de filmes, mas mantendo uma superficialidade estratégica e aceitando o fato que 90% do público só estaria me seguindo por não saber exatamente o que eu penso.

No passado, eu via isso como uma atitude desprezível. Hoje, porém, já não condeno tanto esse tipo de estratégia. Se é um fato que a vasta maioria das pessoas tem certa aversão à realidade (ou pelo menos a partes dela), não é lógico esperar ter um grande público discutindo honestamente todos os fatos que você enxerga. 99% do dinheiro do mundo está nas mãos de pessoas que não suportariam ouvir a verdade sobre diversos assuntos. Portanto, se você quiser fazer parte deste mercado mais amplo e trocar valores com essas pessoas, você necessariamente terá que ser mais superficial (ou então adotar uma segunda tática, menos defensável, que é a de ativamente promover as racionalizações do público).

É menos incômodo adotar um discurso mais superficial quando o que você vende é roupa, comida, ou até mesmo arte/entretenimento. Mas quando seu produto são ideias, opiniões, dá a impressão que qualquer tipo de superficialidade ou de edição da sua autenticidade seria antiética, diminuiria seu trabalho. Mas se este for o caso, nenhum jornalista, professor, escritor de não-ficção ou crítico poderia ganhar dinheiro honestamente. Omitir parte do que você pensa não é o mesmo que mentir. E ser superficial não é o mesmo que abraçar e promover valores opostos aos seus.

É por isso que todo mundo que é renomado na cultura parece cair em uma dessas duas categorias: ou é alguém desprezível que ativamente promove as racionalizações do público, ou é alguém mais admirável, que tem valores superiores, mas que os promove de maneira relativamente superficial, não-explícita, evitando ir muito longe na discussão da verdade, e deixando brechas no seu produto/discurso que possam ser confundidas ainda como uma tolerância às racionalizações (isso parece ser indispensável). Praticamente todas as melhores pessoas que já impactaram a cultura e se tornaram bem-sucedidas caem nessa categoria. 

Foi por causa dessa constatação que eu dei uma pausa no canal pra repensar meus propósitos. Eu não teria nenhum problema ético em produzir um conteúdo mais leve e menos profundo pra ter maior potencial de alcance. Mas provavelmente me incomodaria em deixar as tais brechas pra poder ser confundido com um progressista, um conservador, um religioso, um geek etc. Além disso, não sei se eu conseguiria criar um conteúdo realmente interessante (tanto de assitir quanto de produzir) eliminando aquilo que sempre considerei meu diferencial: a análise mais objetiva e filosófica dos filmes. Minha necessidade de analisar/discutir o cinema honestamente (especialmente aqueles aspectos que a maioria das pessoas parece estar deixando escapar) sempre foi a "máquina de movimento perpétuo", o moto-contínuo que me manteve escrevendo no blog esses anos todos. Se eu elimino isso e adoto um discurso mais mainstream, não sei se o que sobra é forte o bastante pra manter essa máquina em movimento.

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