(Capítulo 10 do livro Idealismo: Os Princípios Esquecidos do Cinema Americano)
Uma das características importantes que diferenciam o Idealismo de outras categorias de arte é o seu respeito pelo espectador. No Idealismo, a experiência do espectador nunca é desprezada e nunca é colocada em 2º plano — nem em nome do realismo, nem em nome da expressão pessoal do artista, nem em nome de outras questões práticas: da função educativa, social ou política da arte etc. No Idealismo, um filme pode (e deve) refletir a realidade em algum nível, pode (e deve) ser uma expressão autêntica do autor, e pode também ter alguma funcionalidade prática — porém isso nunca será mais importante do que a experiência e a satisfação do espectador final.
Como uma escola que se baseia numa visão benevolente de mundo e tem a felicidade individual como um valor de primeira importância, o Idealismo não pede que o espectador sacrifique sua felicidade em nome de algo “maior”.
O Idealismo também não cria uma relação de conflito entre prazeres a curto prazo e prazeres a longo prazo. Na vida real, certos desprazeres são necessários a curto prazo quando buscamos nosso bem-estar a longo prazo (uma cirurgia ou um emprego estressante, por exemplo). Mas, na arte, não há um benefício a longo prazo a ser obtido que exija que o consumo da obra seja tedioso ou desagradável.
Nas outras escolas de arte, a experiência do espectador geralmente é colocada em 2º plano ou é até mesmo sacrificada em nome de algo visto como mais importante. No caso do Naturalismo, por exemplo, pede-se que o espectador abra mão de sua satisfação pessoal em nome de questões sociais, da preocupação pelos mais fracos. No caso de filmes de arte ou Experimentais, pede-se que o espectador abra mão de sua satisfação pessoal em nome da expressão individual do artista.
Este é um critério decisivo na hora de avaliar as qualidades de um filme. Se uma pessoa acredita que a função da arte é primeiramente expressar a individualidade do autor, ela não irá “tirar pontos” de um filme, por exemplo, por ele ser confuso, lento, mal estruturado, desagradável — desde que ele continue parecendo autoral o bastante. E se ela acredita que a função da arte é primeiramente social ou jornalística, ela não reclamará da falta de admiração pelos personagens, da ausência de trama, da produção precária, da negatividade, da falta de habilidade técnica, desde que a obra continue representando com eficácia os problemas sociais de determinada população. É apenas sob a premissa de que a arte é feita para o espectador que a maioria dos valores técnicos e artísticos de um filme fazem qualquer sentido.
Isso não quer dizer que o artista deva abrir mão de sua autenticidade em nome do espectador ou deva servi-lo altruisticamente (pelo contrário, o espectador inteligente quer que o artista seja autêntico e faça o filme que ele deseja fazer). Apenas que ele deve sempre buscar uma maneira de tornar seus interesses pessoais algo de interesse do espectador também. Como disse H. L. Mencken: “não existem assuntos chatos, apenas escritores chatos”. Qualquer que seja o assunto que você queira abordar na arte, há sempre uma maneira de torná-lo interessante e prazeroso para o espectador.
E é apenas natural e humano que o artista queira proporcionar uma experiência prazerosa para o espectador, afinal de contas, o artista também já foi (e ainda é) um deles. Um mestre chicoteando seu escravo talvez consiga se dar ao “luxo” de não se identificar com o escravo por nunca ter estado em sua posição —, mas um artista que deseja causar desprazer no espectador nem isso tem para justificar a sua falta de empatia. A noção de que o prazer do espectador não importa em geral é baseada num Senso de Vida malevolente que acha que a felicidade não é atingível, que os interesses humanos estão em conflito, que sacrifícios são uma constante, que vê felicidade e virtude como duas coisas incompatíveis: que uma obra importante e artística não pode ser prazerosa, e que uma obra prazerosa não pode ser importante e artística.
Mas existem também aqueles artistas que ignoram o espectador e se refugiam no Não Idealismo não por convicções filosóficas, mas por pura insegurança — por sentirem que eles não conseguiriam agradar o espectador mesmo que tentassem.
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