sexta-feira, 3 de junho de 2022

Jurassic World: Domínio | Crítica

Jurassic World Domínio crítica
A franquia Jurassic Park se tornou a mais nova vítima do anti-idealismo, e comete aqui uma atrocidade na linha de "Os Últimos Jedi". Nem sei explicar o que houve, pois o diretor Colin Trevorrow é o mesmo do 1º Jurassic World (do qual eu gostei bastante) e até onde vi, não houve nenhuma mudança tão significativa na equipe que justifique um 3º filme tão inferior e destoante do resto da série.

Meu primeiro mau pressentimento em relação a Domínio veio quando lançaram aquela prévia de 5 minutos ano passado. O que estranhei foi a intenção de mostrar os dinossauros de forma mais realista, como se fosse um documentário da Discovery. O prólogo foi cortado da edição final, mas aquele realismo de fato reflete o tom do novo filme. Agora, em vez das criaturas míticas, grandiosas, que encantaram o mundo em 1993, há uma completa banalização dos dinossauros. Diversos toques naturalistas agem pra destruir o encanto das criaturas, por exemplo:

— A aparência física dos dinossauros: alguns surgem com novos detalhes, como penas, que podem até ser realistas, mas não são necessariamente mais dramáticos ou visualmente interessantes.

— A "atuação" das criaturas: esqueça aqueles animais perspicazes, que às vezes projetavam mais inteligência que os próprios humanos; os dinossauros aqui parecem criaturas burras, com olhos vazios, como bichos selvagens; a própria animação é esquisita e faz alguns (como os velociraptors) se moverem rápido demais, sem peso e solenidade.

— O ambiente e o contexto em que eles aparecem: dinossauros já fazem parte do dia a dia, não são mais surpresa pra ninguém; aparecem em locações rurais, correndo ao lado de cavalos, como animais típicos de fazenda ("igualitarismo animal"); são vitimizados e resgatados em operações à la Luisa Mell; aparecem perseguindo motos em ruazinhas rústicas e "charmosas" da Europa, como num filme Bourne / James Bond; ou sob uma luz rotineira, tediosa (quando pensamos no Jurassic Park original, lembramos de grandes entradas, cenários dramáticos — aqui, os dinossauros são apresentados às vezes em contextos casuais; dias frios e cinzentos); sem falar na pavorosa cena do "mercado negro", onde vemos os dinossauros num cenário meio Narcos, participando de rinhas, sendo vendidos como churrasquinho (na crítica de Chappie, comentei que Neill Blomkamp transformaria Jurassic Park em Jurassic Ghetto se pudesse — a porta já foi aberta).

Ou seja, acabaram com a magia dos dinossauros, e assim, temos um Jurassic Park que parece uma fraude. Os dinossauros são apenas um pano de fundo pra algo "mais importante" — o thriller ambientalista, sobre o bilionário do mal destruindo o meio-ambiente por lucro e ganância. 

A trama envolvendo os gafanhotos geneticamente modificados é tão péssima que fica difícil escolher um aspecto pior pra comentar. Mas tenham em mente que estamos num mundo onde os dinossauros fugiram, estão soltos pela Terra — e no meio de tantas possibilidades fantásticas, o que o filme escolhe explorar é a questão de uns super-gafanhotos que estão ameaçando a agricultura! A cena épica do primeiro filme, onde Sam Neill tira o óculos no jipe ao se deparar com o primeiro braquiossauro, aqui é espelhada na cena onde Laura Dern, boquiaberta, tira o óculos olhando para algo impressionante fora da tela — mas quando a câmera corta, em vez de um dinossauro espetacular, vemos umas plantas murchas.

Outro fundamento da trama que é difícil de engolir é toda a noção de que cientistas da BioSyn ("sin", entenderam?), em um mundo que já clona dinossauros há décadas, precisam sequestrar a garota Maisie pra estudá-la, pois ela seria a única solução para a praga de gafanhotos.

Assim como Coringa, Cruella, e tantos "monstros" em filmes recentes, os dinossauros aqui foram transformados em vítimas do sistema. O real monstro é o bilionário, mas como seria muito estranho ter um Jurassic World inteiro sem grandes sequências de pessoas fugindo de dinossauros, algumas cenas dessas foram inseridas, só que agora elas parecem totalmente soltas, desnecessárias, pois não têm relação alguma com a narrativa principal. No terço final do filme, subitamente nos vemos numa situação parecida com a dos outros Jurassic Park, onde os protagonistas estão na natureza correndo de T-Rexes etc. Mas nos perguntamos: esses dinossauros fugiram? Eles já não estavam soltos o tempo todo? Em que momento houve um erro de segurança? Aqui, não existe mais o contexto de um parque que era pra ser seguro e saiu do controle. Portanto, as situações de perigo parecem forçadas... Do nada, Sam Neill aparece numa caverna, segurando uma tocha tipo Indiana Jones, e mal entendemos como ele foi parar ali. Várias imagens famosas dos filmes antigos são referenciadas, mas acabam parecendo fan-services baratos, enfiados de qualquer jeito. Dá até pra imaginar alguém na produção sugerindo: "Precisamos ter uma daquelas cenas onde um veículo está à beira de um penhasco, isso é muito Jurassic Park; e também um duelo entre o T-Rex e um outro predador grande, mesmo que não tenha nada a ver com nada".

Um dos grandes chamarizes de Domínio seria o retorno de Sam Neill, Laura Dern e Jeff Goldblum, reunidos pela 1ª vez desde o filme de 1993 — uma oportunidade incrível que também foi muito mal aproveitada, pois a história é dividida entre várias tramas paralelas, dando a impressão de um filme sem foco, sem protagonista, onde ninguém tem espaço para brilhar. Como se não bastasse a reunião do elenco clássico com os protagonistas da nova trilogia Chris Pratt e Bryce Dallas Howard (que também ficam parecendo coadjuvantes), por questões de diversidade, incluíram ainda novos personagens que não têm grande relevância, mas ficam lá no meio fazendo volume. Há uma cena onde o grupo se depara com o Giganotossauro e precisa se esconder atrás de um carro capotado — remetendo à cena do T-Rex do primeiro filme — só que agora fica parecendo uma excursão de umas 10 pessoas agachadas, girando em torno do automóvel, e o público se perguntando como o dinossauro não está vendo aquele monte de gente.

Eles nem se preocupam mais em explicar como cada dinossauro funciona (se só enxergam movimento ou não etc.), deixando muitos momentos confusos e sem suspense (até agora não sei por que a Bryce Dallas Howard afundar naquele pântano a impediu de ser devorada).

Falando em falta de lógica, adoraria saber também como é possível uma moto e um velociraptor conseguirem subir na rampa de um avião no momento em que ele levanta voo. Não sou um grande expert em velocidades de aviões, motos e animais pré-históricos, mas imagino que um avião daquele não deva conseguir levantar voo a menos de 150 km/h, e nem voar numa velocidade na qual possa ser alcançado e atacado por um pterodáctilo (um avião de carga caindo aos pedaços, com cockpit fechado, ter um assento ejetor operante e com GPS, até soa plausível perto de tudo).

A lista de más ideias é longa, mas no fim, tudo pode ser traçado de volta a um problema principal — que é o fato do filme ter sido feito com intenções anti-idealistas, algo que afetou a produção em múltiplos níveis. O intrigante é que, neste caso, não dá pra dizer que o problema é o olhar do diretor, ou falta de talento, pois Colin Trevorrow fez um bom trabalho em Jurassic World (2015). O que houve com ele de lá pra cá eu não sei, mas pelo visto ele foi picado pelo mesmo bicho que picou a Patty Jenkins entre Mulher-Maravilha e Mulher-Maravilha 1984, e o David Gordon Green entre Halloween e Halloween Kills.

Jurassic World Dominion / 2022 / Colin Trevorrow

Satisfação: 2

Categoria: C/F

Filmes Parecidos: Star Wars: Os Últimos Jedi (2017) / Dumbo (2019) / Mulher-Maravilha 1984 (2020) / Halloween Kills: O Terror Continua (2021)

2 comentários:

Korvoloco Aspicientis disse...

Não assisti esse filme ainda e quem sabe eu assista quando sair pra TV. Mas uma coisa que me incomodou bastante foram os vários trailers lançados antes da estreia, principalmente naquele trailer tipo documentário que você falou. Deu a entender que os estúdios sabiam que o filme seria ruim e foram lançando trailer atrás de trailer pra deixar o público animado. E claro que como toda franquia moderna, não podia faltar o fator nostalgia, trazendo o elenco original de volta.
E outra coisa que me incomodou. Como raios os dinossauros se multiplicaram tão rapidamente ao redor do mundo, chegando a dividir espaço com outras espécies de animais modernos, em apenas alguns anos após o fim do segundo filme?
E sério isso de gafanhotos geneticamente modificados??? Quer dizer que um filme de dinossauros precisava mesmo dessa ideia idiota de meterem gafanhotos na trama?
Hollywood entrou numa de ''esvazie sua mente e aproveite o filme'' de uma forma nunca vista antes na história do cinema mundial.

Caio Amaral disse...

Pode ser, parece que o estúdio impediu as críticas de serem liberadas até o último momento.. o que ocorre normalmente quando o boca a boca inicial é negativo.

Realmente, estranhei isso mas não questionei na hora.. pelo tempo que passou, os dinossauros se proliferaram praticamente na velocidade de um vírus pelo planeta, rss.

Os gafanhotos são gigantes, mais ou menos do tamanho de gatos.. então há um elemento "sci-fi".. só que é um animal que não tem nada a ver com o universo Jurassic Park.. fica parecendo um episódio de Arquivo X ou um filme de ficção qualquer sobre experimentos científicos secretos.