(Os comentários a seguir foram baseados nas anotações feitas durante a sessão.)
- O filme começa num flash-forward desnecessário já revelando uma das cenas de ação mais grandiosas e irreais do filme (o herói pulando em cima de cargas penduradas fora de um avião em pleno voo). Ao fazer isso ele anuncia: em vez de levar a aventura a sério, construir pra um clímax, este será um desses filmes que irão banalizar o heroísmo, o espetáculo, e levar tudo no "humor". (Idealismo Corrompido)
- Claro que o protagonista também não pode ser muito nobre em caráter: logo na apresentação, o filme já deixa claro que o Tom Holland é um ladrão (mesmo isso não sendo fundamental pra trama), e que a história será apenas uma disputa entre times rivais de trapaceiros, não entre bem e mal (um conceito "ultrapassado").
- Parece que Holland é o mocinho mais pelo fato dele não ligar tanto pro tesouro, e estar na jornada motivado pelo amor fraternal. O grande pecado aqui pelo visto é querer o dinheiro, ser ganancioso. Se você for um ladrão, mas não ligar muito pra bens materiais, tiver um passado triste, você ainda é do bem.
- O problema é que o filme quer que a gente fique 2 horas interessado no tesouro, já sabendo que isso não terá importância alguma pro protagonista. A expectativa é nula; o gancho narrativo é fraudulento de certa forma.
- A maneira como eles vão desvendando as pistas é muito rápida e forçada: batem o olho acidentalmente num símbolo numa parede, e em 1 segundo já têm uma sacada brilhante, que um expert levaria dias pra ter — como por exemplo a cena em que Holland vê uma caveira com asas na parede, e imediatamente interpreta aquilo como um estágio intermediário entre "céu e inferno". Tudo soa como uma revelação aleatória e banal, não como uma sacada inteligente e bem escrita. Até porque o roteiro soa estúpido em diversos outros aspectos (ainda não sei como no meio câmaras secretas no subsolo de igrejas antigas na Espanha eles conseguiram enfiar uma cena de balada, onde Holland luta contra capangas enquanto prepara coquetéis).
- "Quando foi que você resolveu virar Indiana Jones?" - Holland diz pra Chloe. Muitas dessas pseudo-aventuras que venho comentando (Alerta Vermelho, Cidade Perdida, Projeto Adam) fazem menções explícitas aos filmes do passado que estão imitando, mas não como uma homenagem honesta, de alguém que está tentando aspirar ao mesmo nível, e sim num tom levemente cínico, como algo distante, inatingível, que não existe mais. Mas reparem que o filme é tão aventuroso (e em alguns pontos até mais extremo) que Indiana Jones. No fundo, o que parece inatingível não é tanto a ação, os acontecimentos grandiosos, a fantasia — e sim o senso de nobreza, a dignidade do herói, a inteligência, seriedade, a atitude Idealista (assim como a qualidade cinematográfica daqueles filmes, claro).
- Clichê tedioso que tem em todo filme: o parceiro que de repente puxa uma arma pro herói e se revela um traidor. Se a Chloe precisava de Holland e Wahlberg pra desvendar as pistas e chegar até aqui, por que agora ela se expõe como inimiga, sendo que ainda há muito o que ser desvendado nas Filipinas pra ela chegar no tesouro?
- A ação física é tão irreal quanto as ações mentais (de desvendar pistas): desde coisas pequenas, como Holland brincando de cipó em lâmpadas fluorescentes, que quebram ou não, esticam ou não, de acordo com a conveniência (e não cortam suas mãos), ou a Chloe que se afoga e está desacordada no minuto 56:10, mas 30 segundos depois já cuspiu a água, voltou à vida, e está trocando ideia casualmente com Holland, ou a Braddock que usa um pano pra enforcar o Mark Wahlberg contra uma coluna (minuto 54:30), sendo que no corte seguinte vemos que o tecido não estava passando ao redor da coluna — até as cenas de ação maiores, como a do avião (Holland despencando do céu numa velocidade muito mais alta que a carga, que é centenas de vezes mais pesada que ele, etc.).
- A sequência do helicóptero içando o navio vai além do ridículo. Acho que nem a saga Velozes e Furiosos rompe com a realidade com tanto orgulho assim... O filme insiste a todo momento que a gente não o leve a sério, não 'suspenda a descrença', pois é tudo uma infantilidade.
- SPOILER: Fico indignado deles destruírem esses navios históricos durante a ação como se fossem objetos banais, e nem pararem pra lamentar, sentir culpa. Eles ainda enfatizam que o navio vale bilhões de dólares (sem falar no valor cultural), antes de mostrá-lo afundando num tom irônico, sob piadinhas casuais. É como se houvesse um certo prazer niilista em ver destruição de riqueza. Óbvio que o ouro também foi jogado fora, sacrificado em nome do "sentimento" — Wahlberg tem que escolher entre o saco de ouro e a vida do amigo, num dilema que não faz o menor sentido, pois a inimiga estava longe ainda escalando a corda, armada apenas com uma faca, e Wahlberg podia facilmente ter esticado o braço pra puxar Holland sem abrir mão da fortuna (imagine o nível de debilidade mental que o diretor precisa esperar da plateia pra achar que ela vai aceitar que é fisicamente possível um helicóptero erguer um navio, mas impossível Wahlberg salvar Holland e o ouro ao mesmo tempo).
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Uncharted / 2022 / Ruben Fleischer
Satisfação: 3
Categoria C: Idealismo Corrompido
Filmes Parecidos: Alerta Vermelho (2021) / Kingsman: Serviço Secreto (2014) / Cidade Perdida (2022) / Projeto Adam (2022) / Godzilla vs. Kong (2021) / A Múmia (2017)