domingo, 10 de novembro de 2024

Ainda Estou Aqui

"Singelo", "sensível", "sutil" — meus filmes favoritos não costumam ser definidos por adjetivos como esses, mas são neles que Ainda Estou Aqui aposta. Walter Salles dirige o filme como se sua regra número 1 na vida fosse "jamais ostentar". Assim como o título em Times New Roman no pôster, tudo em Ainda Estou Aqui é simples, porém eficiente e de bom gosto. Claro que essa simplicidade muitas vezes é reflexo de um talento nada simples dos realizadores — e nos detalhes você pode ver aqui um tipo de sofisticação incomum no cinema brasileiro. Mas os virtuosismos da produção tendem a ficar nas entrelinhas, exceto no caso da Fernanda Torres, que mesmo na sutileza consegue ser excelente — ela passa boa parte do filme aguardando, mas sem se tornar uma personagem passiva; sofre, mas sem se fazer de vítima. Minha cena favorita do filme é apenas ela sentada em uma sorveteria observando as famílias "normais" ao seu redor. Sem dizer uma palavra, ela consegue fazer a ausência do marido ganhar uma dimensão nova que não existia até o instante anterior.

Não tenho muito a reclamar do filme, exceto das limitações inevitáveis da abordagem Naturalista. Mas dentro disso, o filme é um exemplo bastante respeitável desse tipo de cinema. A mini história que ele conta é dramática o bastante pra prender a atenção, o estudo de personagem foca em personalidades gostáveis, em ambientes nostálgicos, a execução é caprichada (a direção de atores e a reconstituição de época são particularmente bem feitas). E a política, que poderia ter sido um problema, não contamina demais a experiência, pois assim como em O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias (2006), vemos a ditadura militar pelo ponto de vista de uma pessoa bastante alheia às atividades políticas dos desaparecidos. Isso também fica nas entrelinhas, mas nesse caso, para o bem do filme.

Ainda Estou Aqui / 2024 / Walter Salles

Satisfação: 7

Categoria: Naturalismo / Idealismo Moderado

Filmes Parecidos: O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias (2006) / Aquarius (2016) / Roma (2018) / Central do Brasil (1998) / Terra Estrangeira (1995)

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Megalópolis

Simpatizei com o filme, apesar da abordagem Experimental. A falta de uma trama estruturada e a linguagem obscura impedem o Paradigma Idealista de existir, mas o filme não chega a cair no tédio, pois há sempre temas ambiciosos sendo discutidos, ideias originais surgindo na tela, e há certo valor de entretenimento nas escolhas excêntricas de Coppola. Num caso meio "Picasso", é aquele tipo menos comum de Experimentalismo que não parece apenas um disfarce para falta de talento e conteúdo. Há criatividade o bastante em Megalópolis para sentirmos que Coppola poderia ter narrado essa história de maneira mais tradicional e entregue algo interessante — ainda que o filme não tenha muita profundidade intelectual (tirando a comparação básica dos EUA com o Império Romano, o filme não traz grandes insights sobre política, cultura). É como se Coppola tivesse tentado criar seu A Revolta de Atlas, uma obra épica que pretende discutir temas atemporais, solucionar os grandes conflitos da civilização, mas sua megalomania estivesse além de sua real capacidade de cumprir a tarefa. Isso não quer dizer que Megalópolis seja uma obra vazia, charlatã (como penso de O Brutalista). Apenas que as qualidades do filme estão em outro campo, não no intelectual/filosófico. Parece mais um musical extravagante onde Coppola despejou centenas de ideias que foi acumulando ao longo de décadas. O resultado não é muito coerente, mas as ideias não são desinteressantes. Em textos como A Importância de Ideias e Inspiração ou Mentalidade Clichê eu discuto qualidades artísticas importantes que Megalópolis tem de sobra, e que faltam muito no cinema atual. São qualidades "hemisfério direito do cérebro". É uma pena que Coppola pareça achar que o artista de verdade é aquele que ignora em grande parte seu hemisfério esquerdo.

Quanto aos paralelos com A Nascente, deixei um comentário em vídeo:


Megalopolis / 2024 / Francis Ford Coppola

Satisfação: 6 

Categoria: Não Idealismo (Experimentalismo / Filme de Autor)

Filmes Parecidos: Babilônia (2022) / A Viagem (2012) / Satyricon de Fellini (1969) / Southland Tales: O Fim do Mundo (2006) / Sinédoque, Nova York (2008)

terça-feira, 5 de novembro de 2024

Aviso

Pretendo dar um tempo nas postagens aqui. Se surgir algum filme muito interessante ou polêmico que mereça maiores comentários, pode ser que eu escreva algo. Mas pelas próximas semanas pelo menos, vou tentar saciar meus impulsos de criticar os filmes deixando apenas as avaliações no Letterboxd e quem sabe fazendo comentários breves no Instagram (@amaralcaio). 


P.S.: Coringa 2 eu vi agora e achei bem ruim. É menos revoltante que o primeiro (tem menos violência, menos críticas tolas ao "sistema"), mas esteticamente, tem muito mais defeitos óbvios. Além do roteiro pobre, sem trama, e dos problemas do filme original que se repetem, a ideia de transformar essa história em um musical realmente não deu certo (o trailer me enganou que eles tinham dado um jeito de fazer funcionar — devia ter confiado na minha intuição inicial), e Joaquin Phoenix tem mais uma daquelas performances desajeitadas, irregulares, tipo a de Napoleão.