sexta-feira, 27 de setembro de 2024
A Substância
quinta-feira, 19 de setembro de 2024
Pesquisa de tráfego
Queria ter uma noção de quantas pessoas realmente veem uma postagem nova no blog. (Google Analytics e ferramentas do tipo acho meio confusas por causa dos bots, dos visitantes recorrentes, VPNs, etc.)
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quarta-feira, 18 de setembro de 2024
Cultura - Setembro 2024
segunda-feira, 16 de setembro de 2024
Setembro 2024 - outros filmes vistos
sexta-feira, 6 de setembro de 2024
Os Fantasmas Ainda se Divertem - Beetlejuice Beetlejuice
quinta-feira, 5 de setembro de 2024
Han Solo e Leia: Quase Corrompidos
terça-feira, 3 de setembro de 2024
Problemas do Objetivismo #11 - O Homem Comum Como Racional
Já abordei este tópico da "natureza humana vs. a implementação do Objetivismo" na postagem #8, mas enquanto lá eu estava focando mais no lado da implementação das ideias, aqui eu queria elaborar melhor a questão da natureza humana.
No Objetivismo, acredita-se piamente no livre arbítrio e na capacidade do ser humano de pensar e agir racionalmente (e, consequentemente, no potencial de todo homem de se tornar um indivíduo independente, produtivo, que vive em sociedade sem violar os direitos de outras pessoas). Ainda que objetivistas reconheçam que a maioria dos homens não faz um bom uso dessa capacidade, eles ainda acreditam que todo ser humano poderia atingir este potencial se ele realmente quisesse (exceto no caso de pessoas com graves deficiências, que são uma pequena minoria).
Eu não concordo 100% com essa posição, e pra desenvolver essa ideia eu provavelmente teria que escrever um livro, o que não é minha intenção. Mas vou tentar fazer um resumo simplificado da ideia, já que ela está na base de algumas das principais divergências que eu tenho com o movimento objetivista "ortodoxo".
Assim como Rand, eu acredito no livre-arbítrio. A diferença é que eu não acredito que ele existe plenamente, no mesmo grau, em toda a espécie humana. Pra mim, o livre-arbítrio, assim como a inteligência e a racionalidade, parece existir em um espectro entre os homens — como se sua origem fosse um "órgão" relativamente novo no processo evolutivo da humanidade, que não tivesse sido 100% consolidado na espécie, como os pulmões e os olhos. Cada pessoa, portanto, nasce com um certo potencial intelectual, e ela até tem algum controle sobre este potencial, mas não um controle irrestrito. A elasticidade deste potencial parece existir também em um espectro: quanto maior o potencial intelectual com o qual a pessoa nasce, maior a elasticidade e a capacidade dela se auto programar na vida adulta para ampliar sua inteligência e o escopo do seu livre-arbítrio. Quanto menor o potencial inicial, menor a elasticidade e menor essa capacidade de "auto programação". Alguns homens, portanto, seriam menos limitados por seus instintos primitivos (que governam todos os outros animais) e mais capazes de viver conforme a razão e o livre-arbítrio, e outros seriam mais ligados aos seus instintos primitivos, e menos capazes de viver racionalmente. E, pra mim, os mais capazes de viver racionalmente (ou seja, não dominados por seus instintos primitivos, como aqueles descritos na teoria do Dabrowksi) estão em minoria, não em maioria como alguns objetivistas sugerem.
Ou seja, o homem não seria tanto o "animal racional", mas o animal "potencialmente racional" ou "parcialmente racional". E o Objetivismo não seria "uma filosofia para viver na Terra", mas "uma filosofia para as minorias mais racionais viverem na Terra".
O Objetivismo baseia toda sua teoria política no fato do homem ser racional e ter livre-arbítrio. Por isso há um certo receio em questionar este ponto, afinal, se o homem não for racional, isso poderia colocar a filosofia em xeque e abrir a porta para todo tipo de autoritarismo, para ideias nietzschianas / platônicas sobre como as massas ignorantes devem ser comandadas por uma elite iluminada, etc.
Mas eu não acho que esta visão espectral da racionalidade coloca em xeque os princípios básicos do Objetivismo, nem mesmo na política. Continuo achando válidos os conceitos de direitos individuais, de igualdade perante à lei, de governo limitado, etc. Se, em vez de uma minoria, a maioria dos homens tiver tendências irracionais, a função do governo de proteger direitos individuais não muda em essência — a diferença está mais no tamanho do governo, na quantidade de "policiais" necessários para impedir os trapaceiros, os criminosos, que seriam mais numerosos do que gostaríamos de imaginar, nesse caso.
O Objetivismo diz que o conceito de direitos individuais só é aplicável a seres racionais — por isso Rand não defendia a autonomia absoluta de menores de idade, de fetos, de animais, etc. Portanto, mesmo que a maioria dos homens se prove irracional por natureza, isso não quer dizer que temos que alterar esta visão política e abraçar o autoritarismo. Liberdade continuará sendo defendida para quem respeitar os direitos dos outros. Limitar a liberdade de criminosos nunca foi "autoritarismo".
O que teria que ser mudado no objetivismo é apenas essa visão positiva que se tem às vezes da índole do homem comum (que inclui o trabalhador comum, o homem de negócios comum, o leitor de A Revolta de Atlas comum), pois isso interfere nos caminhos escolhidos para implementar ideias, para tentar melhorar a sociedade, etc. A estratégia atual de educar intelectuais e expor o maior número possível de jovens às ideias de Ayn Rand, até que elas se tornem mainstream, faz sentido apenas se a maioria dos homens for racional e tiver um grande potencial intelectual. Mas se a maioria não for tão racional assim, o Objetivismo nunca será mainstream e a estratégia provavelmente terá que ser outra.
Na minha visão, uma sociedade baseada em liberdade/direitos individuais só existe quando é formulada por homens mais conscientes e "imposta" de cima para baixo, sem a total compreensão e a total sanção do cidadão médio (que, por ser amplamente dominado por instintos, vai sempre preferir economias mistas e governos semi-autoritários que permitem uma boa dose de parasitismo nas relações humanas).
Na minha visão, o normal da espécie humana não é a independência, a honestidade, a produtividade, a racionalidade. O normal é a inconsistência, a mistura de algumas dessas virtudes com uma série de vícios — ações motivadas por racionalizações, por impulsos emotivos, por "egoísmo irracional", pelo pensamento a curto prazo, etc. O enorme progresso da civilização ocidental nos últimos séculos não é necessariamente uma prova da racionalidade humana, e sim uma prova da racionalidade daqueles que elaboram o sistema capitalista. Quando um rio passa por uma hidrelétrica e gera eletricidade, isso não prova que o rio é inteligente e produtivo, e sim que os cientistas que criaram a hidrelétrica são. A humanidade em seu estado natural tende à estagnação, à pobreza, à violência, ao parasitismo. Além disso, toda a riqueza e a prosperidade gerada pelos homens mais produtivos tende a ser corroída ao longo do tempo pelo parasitismo do homem comum. Apenas dentro de um sistema político meticulosamente planejado para conter seus impulsos destrutivos e liberar seu potencial produtivo é que o homem comum prospera e esse processo de "oxidação" pode ser retardado, revertido. Mas esse sistema nunca é espontaneamente criado pelas massas, nem é espontaneamente preservado pelas massas. Na ausência de proteções firmes e monitoramento constante por parte dos homens mais conscientes, o curso natural se segue, que é a corrupção do sistema.
Rand escreveu em "Conservatism: An Obituary":
"Qual é a racionalidade daqueles que esperam enganar as pessoas rumo à liberdade, enganá-las rumo à justiça, iludi-las rumo ao progresso, trapaceá-las para que elas preservem os seus direitos e, ao mesmo tempo que as doutrinam com o estatismo, dar-lhes uma rasteira para que um dia acordem numa sociedade capitalista perfeita?"
Por passagens como esta, fica claro que Rand era contra qualquer tipo de jogo ou manipulação na implementação da liberdade, pois na visão dela, isso levaria a uma corrupção dos ideais e a um sistema impuro. De fato, seria incoerente apelar para o estatismo para chegar à liberdade. Mas o tipo de "jogo e manipulação" que eu tenho em mente não envolve autoritarismo nem a corrupção do sistema. Envolve apenas a constatação de que é inútil tentar lidar racionalmente com o lado irracional do público; que você deve lidar com ele da mesma forma que se lida com crianças que precisam ir ao dentista, ou com animais ferozes que precisam de uma focinheira: você não espera aprovação, compreensão intelectual plena, mas você também não age sem tato, sendo violento, sendo explícito quanto às suas intenções, pois você sabe que se despertar uma reação de revolta, você não atingirá seu objetivo tão facilmente.
Quando você está lidando com um ser que é parte racional, parte irracional, você deve ao mesmo tempo respeitar os direitos de seu lado racional e negar "direitos" (como honestidade plena) ao seu lado irracional. Não deve nem ser autoritário e atropelá-lo, nem confiar totalmente em sua autonomia. Você deve conduzi-lo inteligentemente e cautelosamente na direção certa, mas sem feri-lo.
De certa forma, os Founding Fathers talvez tenham sido mais sagazes que Rand nesse ponto. Claro, é provável que a Declaração de Independência seja intelectualmente vaga e superficial por limitação filosófica da parte deles, não por uma estratégia brilhante. Mas suspeito que se Rand tivesse escrito o documento e deixado ele "perfeito" em suas definições, os EUA nunca teriam sido fundados, pois as maiorias se rebelariam.
Muitos dos dilemas e das frustrações no movimento objetivista não estão ligados aos princípios filosóficos em si, mas à maneira de implementá-los na sociedade e de comunicá-los aos outros. E esses conflitos me parecem ser causados em grande parte por esse otimismo duvidoso quanto à racionalidade do homem comum. Quando você olha para o mundo de maneira mais fria, considerando que 50%, 60% ou uma fatia até maior da população pode ser amplamente incapaz de viver racionalmente, muitos dos dilemas da filosofia desaparecem.
Soa como uma visão deprimente e determinista da humanidade, mas não estou dizendo que é inútil tentar melhorar a sociedade, educar as pessoas, e que uma sociedade livre é impossível de ser implementada nesse cenário. Acredito que as transições entre "vermelhos", "laranjas" e "verdes" no gráfico sejam móveis; que a parte verde possa aumentar um pouco, que a parte vermelha possa encolher um pouco em determinada sociedade. Só não acho que seja possível tornar o gráfico inteiro verde — e nem acho necessário tornar a humanidade inteira verde para que o sistema possa ser verde. Uma sociedade baseada em liberdade e em direitos individuais pode existir mesmo à luz dessas tendências das maiorias. Mas as pessoas que irão promover e assegurar esta sociedade precisam ter uma visão realista da natureza humana para serem eficazes.