sábado, 11 de janeiro de 2020

Outros filmes vistos - Janeiro 2020

Perdi Meu Corpo (J'ai perdu mon corps / 2019): 4.0 - Costuma sempre ter 1 animação estrangeira mais "artística" entre as finalistas pro Oscar, da qual eu não costumo gostar muito. Essa aqui conta uma história desconexa e interpretativa sobre um garoto que tem sua mão decepada enquanto vive um amor não-correspondido. É um quase romance entre 2 pessoas comuns, não muito interessantes, que transmite uma visão de mundo cinzenta bem típica do cinema francês. Autoral demais pro meu gosto.





Um Lindo Dia na Vizinhança (A Beautiful Day in the Neighborhood / 2019): 7.5 - Quando começou, achei um pouco frustrante e enganoso o fato do filme não ser uma biografia de Fred Rogers (como o pôster sugere), e sim a história de um jornalista que vai escrever um artigo sobre ele e acaba tendo sua vida transformada. Não me importei tanto pelos dramas pessoais do jornalista, mas no momentos em que Rogers está em cena, o filme é um retrato fascinante de uma personalidade única, de uma generosidade quase sobre-humana, e Hanks está perfeito no papel.




O Caso Richard Jewell (Richard Jewell / 2019): 6.5 - Tenho um pouco de preguiça desses filmes atuais de Clint Eastwood que são sempre histórias reais de americanos comuns que arriscam suas vidas pra salvar outros americanos de desastres e ataques terroristas. Não acho que esse tipo heroísmo torne alguém automaticamente interessante como foco de um filme, e o compromisso com as histórias reais às vezes impede Clint de criar uma narrativa satisfatória, dramática, surpreendente o bastante, como é o caso de Richard Jewell, que prende a atenção na maior parte, mas acaba tendo um desfecho um pouco morno, nunca atinge os picos de tensão que uma obra de ficção atingiria. Ainda assim é um filme decente, provavelmente o melhor dele desde Sniper Americano (2014).





1917 (2019): 8.0 - É daqueles filmes que você admira mais pela técnica e pela enorme dificuldade de realização do que pelo conteúdo em si. Não há personagens muito memoráveis, uma mensagem interessante, uma narrativa particularmente prazerosa, mas é um show tão incrível de direção, produção, fotografia, que a cada 5 minutos você se vê perguntando "como eles fizeram isso?". É uma experiência imersiva, um espetáculo audiovisual estilo Dunkirk, porém feito com inteligência e uma noção superior de cinema.









Jumanji: Próxima Fase (Jumanji: The Next Level / 2019): 5.0 - Não basta ser sequência de um remake, o filme ainda copia vários elementos de Indiana Jones e o Templo da Perdição (1984), refletindo a crise de imaginação e criatividade em Hollywood. É uma aventura bem intencionada, fácil de assistir, mas a pobreza do roteiro e a completa falta de estímulo intelectual me deixaram entediado na poltrona apesar de toda a ação física rolando na tela.




Judy: Muito Além do Arco-Íris (Judy / 2019): 4.0 - Biografia ofensiva, rasa, pobre em roteiro, sem o menor respeito por quem foi Judy Garland. É um desses filmes medianos que saem todo ano apenas como veículos pra atores ganharem prêmios, como foi Hitchcock, Sete Dias com Marilyn, Diana, A Dama de Ferro, onde todo o foco é a performance central (a intenção é sempre a mesma: não celebrar talento, mas expor os males do sucesso, da fama, do poder). Não dá pra dizer que Renée está mal, mas os dentes falsos e a voz ruim para canto (por que não chamaram uma dubladora?) incomodam em vários momentos, então pra mim não chega a ser a performance do ano.




Apollo 11 (2019): 7.5 - Não é um documentário com grandes méritos criativos pois ele consiste apenas de imagens de arquivo da missão Apollo (imagens sensacionais, devo dizer, algumas nunca antes vistas), mas não há novos conteúdos criados pra esse filme em particular (tirando trilha e algumas animações explicativas), não há nem uma narração pra tentar dar um novo ângulo pro evento. Mas talvez nem precisasse mesmo, pois a realidade da missão é tão fantástica que as imagens falam por si mesmas. Vale no mínimo como um documento histórico impressionante, me senti realmente testemunhando a missão pela 1ª vez.




Jojo Rabbit (2019): 3.5 - Não dei 1 risada sequer, Taika Waititi me parece extremamente equivocado na ideia de que humor é seu ponto forte. O filme tem sérios problemas de tom, não consegue achar um equilíbrio satisfatório entre comédia e drama, e no fim não funciona nem como um, nem como outro. Vale no máximo como um exercício em excentricidade no estilo Wes Anderson (mas sem o mesmo requinte visual).




Adoráveis Mulheres (Little Women / 2019): 8.0 - História um pouco Naturalista, focada no retrato de uma época, sem uma narrativa muito forte, porém perfeitamente produzido, atuado (melhor elenco que vi esse ano), a trilha sonora é lindíssima e o final satisfatório compensa algumas das mensagens menos otimistas que absorvemos ao longo da história. Merecidas as 6 indicações ao Oscar.









O Escândalo (Bombshell / 2019): 7.0 - Me lembrou um pouco Spotlight (2015); é um daqueles filmes que apesar de terem uma pauta de esquerda e atacarem alguns símbolos do conservadorismo, não são tão polarizadores, daqueles que agradam apenas os militantes de um lado ou de outro. O roteiro consegue apresentar o problema de forma equilibrada, e o que vemos são apenas mulheres íntegras, lutando honestamente contra um problema real. Destaque pras 3 atuações centrais e pra John Lithgow também.







Frozen II (2019): 6.5 - Alguns dos meus problemas com o primeiro filme foram amenizados aqui; Elsa não é mais aquela princesa rancorosa e niilista, as canções se encaixam melhor na narrativa... A força do filme está nos elementos de fantasia (há algumas ideias ótimas como o cavalo de água) e também nos momentos musicais "showstopper" de Elsa. Não é grande coisa, as mensagens continuam bem duvidosas, mas dá pra aproveitar como um divertimento despretensioso.









quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Joias Brutas

Desde Irreversível (2002) não via um filme tão repulsivo e incômodo em termos de técnica (direção, edição, fotografia, e principalmente som). Claro, isso não é nenhum acidente - o filme foi cuidadosamente planejado pra gerar o máximo de desconforto no espectador, não só através da técnica, mas também do conteúdo, nos mostrando personagens decadentes sempre gritando uns com os outros, passando por situações desagradáveis, estressantes, agindo de maneira autodestrutiva e irracional, tudo isso apresentado para o espectador da maneira mais caótica e de mau gosto possível. Nas minhas postagens sobre Idealismo eu discuto como Objetividade é a qualidade mais fundamental que aprecio na arte, e como os bons filmes conseguem transformar a realidade (frequentemente confusa) em algo ordenado, claro, simplificado, digerido para nossas mentes e nossos sentidos. O que esse filme faz de propósito é justamente o oposto - criar um nível de caos e desorientação sensorial que não encontramos nem nas situações mais estressantes do dia a dia. Descartando a hipótese dos cineastas serem simplesmente sádicos e niilistas, uma explicação mais generosa seria aquilo que discuto na postagem Pseudo-sofisticação - tentar enxergá-los apenas como diretores pretensiosos e imaturos que acham que subverter as regras é uma virtude em si, que ir contra o desejo da plateia, causar desprazer e incômodo prova algum tipo de capacidade ou sofisticação intelectual, simplesmente por ir contra o óbvio.

Em termos de conteúdo / mensagem o filme nem é tão condenável quanto eu esperava. Ele conta a história de um vendedor de joias endividado, fazendo uma série de jogadas e apostas arriscadas pra recuperar seu dinheiro, mas se enfiando num buraco cada vez maior no processo. O joalheiro é uma caricatura do judeu que só pensa em dinheiro e está disposto a abrir mão de qualquer escrúpulo para obtê-lo (se os próprios cineastas e Adam Sandler não fossem judeus, o filme provavelmente seria considerado antissemita ao extremo). Inicialmente parecia que ia ser um ataque ao capitalismo, ao dinheiro, aos ricos em geral (uma das primeiras cenas do filme é a câmera entrando dentro de uma pedra preciosa e isso se transformando em imagens da colonoscopia do protagonista, o que disparou meu alerta vermelho) porém o filme não chega a generalizar - e em vez de uma crítica ao capitalismo em si, ele acaba sendo uma crítica mais centrada na obsessão por dinheiro e na falta de escrúpulos de certas pessoas, o que é válido. O grande problema mesmo é a direção revoltante e a falta de elementos positivos. Mostrar um personagem desprezível pra criticá-lo não é errado - mas ainda não é o bastante pra gerar uma experiência enriquecedora para a plateia (ainda mais quando o filme tenta criar certa empatia por ele - não deixa claro que condena o personagem totalmente). Na ausência de heróis, de coisas para admirar, é apenas uma experiência incômoda. Barry Lyndon (1975) é uma boa prova de que, pra falar sobre pessoas desagradáveis, o filme em si não precisa ser desagradável.

Uncut Gems / EUA / 2019 / Benny Safdie, Josh Safdie

NOTA: 2.0

sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

O Farol


Um dos filmes mais aclamados do ano (do diretor de A Bruxa) mas que não passa de um exercício bobo de estilo, de visual, sem conteúdo, sem trama, sem sentido - algo que pertence mais a uma galeria de arte moderna, a uma exposição fotográfica ou desfile de moda do que a uma sala de cinema. O mais irritante é que fica clara a pretensão do cineasta de parecer "cerebral", inteligente. Stanley Kubrick é um dos cineastas mais influentes da história, e muitos cineastas jovens (como Robert Eggers) parecem admirá-lo, mas o que me frustra é que praticamente todos esses "descendentes" de Kubrick acabam espelhando apenas as características superficiais dos filmes dele (imitando o estilo visual, fazendo referência a cenas específicas, usando efeitos sonoros similares, estilos de atuação) e o que falta em todos eles é justamente aquilo que tornava Kubrick grande - sua enorme inteligência e respeito pela racionalidade (tanto dele quanto da plateia). Sim, os filmes de Kubrick tinham um senso estético forte, mas isso nunca vinha em primeiro lugar - seus filmes sempre priorizavam conteúdo, história, ideias - e a notável inteligência era o que integrava todos os elementos (inclusive as decisões estéticas) e os tornavam bons filmes. Mesmo cineastas como Ingmar Bergman ou Andrei Tarkovsky (que também parecem inspirar Eggers) apesar de não serem tão objetivos quanto Kubrick, ainda se baseavam em conteúdo, intelecto, tinham algo interessante a dizer, não eram apenas decoradores focados em imagens estilosas e impressões sensoriais. É como pensar que se você imitar o penteado de Albert Einstein, usar roupas parecidas, e colocar a língua pra fora, você estará de alguma forma mais próximo de sua genialidade.


The Lighthouse / Canadá, EUA / 2019 / Robert Eggers

NOTA: 3.0